Akai ito escrita por R Marxx


Capítulo 20
Vizinhos que nasceram no mesmo dia, mês e ano


Notas iniciais do capítulo

É o fim!
Eu chorei escrevendo esse capítulo. É tão triste, mas tão gostoso finalizar uma história - e eu estava enrolando essa a um bom tempo.
Espero que seja a finalização que esperavam e que acalentem o coração de vocês!

Obrigada por tudo até agora! Boa leitura



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Dois meses se passaram em um piscar de olhos. Com Will por perto os dias pareciam ter menos horas e antes que eu percebesse era fim de semana. Existia essa reunião não comunicada que acontecia todos os sábados, no começo era sempre em casa, depois começamos a migrar. O encontro com os pais de Percy aconteceu, assim como com os de Piper e Annabeth. No fim escolhemos a casa de Will como sede, mais espaçosa e definitivamente mais divertida.

Will havia se tornado voluntário na cafeteria. Ele aparecia para me ver e de alguma forma acabava envolvido no atendimento – principalmente em dias frios onde o movimento triplicava. No começo eu reclamava, afinal não era necessário e ele estava trabalhando de graça, mas no fim eu aceitei que ele se divertia. Acho que era uma distração para a cabeça ociosa dele que ainda não havia decidido que curso fazer de faculdade, ou se faria algum. Mark havia dito um dia que ele deveria usar a vida dele para fazer aquilo que o deixava feliz e realizado, independente de ser algo que normalmente se espera de um adulto, como cursos, faculdade e trabalho. Ele sugeriu que Will viajasse o mundo, ou que demorasse o tempo que fosse para tomar uma decisão que ele “bancaria o estilo de vida dele enquanto pudesse”. Will não gostou da ideia. Como uma pessoa completamente fora dessa realidade era engraçado ver como eles se relacionavam, principalmente em relação ao dinheiro. O que ele ouviu era provavelmente o sonho de qualquer jovem adulto, mas sua mente funcionava ao contrário. Ele era muito mais maduro que seu pai, ele queria metas objetivas e funcionais – acho que essas eram as características que vieram de sua mãe.

— Eu quero um trabalho. Algo que eu goste, que eu conquistei e que me de perspectiva. Não consigo viver que nem o meu pai, sem planos e decidindo tudo em cima da hora, como se a vida fosse uma brincadeira. E não é que eu ache errado, a verdade é que eu invejo a forma como ele vive, eu só não consigo ser assim. – Ele havia me dito um dia enquanto jantávamos e olhávamos a descrição de diversos cursos profissionalizantes.

Sua visão de mundo acabou agregando aos poucos a minha, e quando notei estava vendo cursos que me interessavam também. Will e Percy haviam feito um acordo de só iniciarem a faculdade juntos, então enquanto Will não decidisse o que fazer, Percy aguardaria. No fim acabei sendo incluído na promessa. Não preciso nem dizer que Jason amou a ideia – ele parecia um pai orgulhoso ao ver seu filho tomando decisões sobre o futuro.

Quanto ao meu pai, não o procurei. Ainda. Bianca havia me ligado dizendo que estava voltando para casa nas suas férias e eu estava pensando em visita-la. Qualquer que fosse minha decisão Will, Percy e Jason iriam comigo.

***

Era uma sexta feira agradável, não estava exatamente quente, mas meus dedos não estavam congelando – fluxo sanguíneo e tudo mais. Will havia me chamado para jantar e disse que era uma ocasião especial. Eu não sabia o que esperar, ou melhor, não queria esperar tanto por isso quanto eu estava. Veja bem, nosso relacionamento estava indo muito bem. Eu conseguia me imaginar vivendo ao lado de Will, estudando juntos, nos mudando para um lugar próximo a faculdade – mas que continuasse perto de Jason – e até mesmo um futuro mais longínquo onde nos casaríamos, adotaríamos 3 cachorros, 4 gatos e talvez crianças. O problema era... nós ainda não estávamos namorando. Não havia existido pedido, embora Jason insistisse que não era necessário porque já éramos um casal – mas esse argumento era inútil contra a minha ansiedade.

Will não veio hoje ao café durante o dia e só apareceu ao fim do expediente. Eu o aguardei do lado de fora por alguns minutos e quando ele apareceu em meu raio de visão meu coração deu um salto. Descobri que aquela agitação dentro de mim era muito mais duradoura do que imaginei inicialmente. Will Solace ainda tinha os mesmos efeitos sobre a minha pessoa mesmo após dois meses e eu acredito que era a mesma coisa com ele. Sempre que trocávamos olhares durante muito tempo ele corava, seus sorrisos continuavam envergonhados e brilhantes e ele ainda me abraçava como se tentasse me sufocar todas as vezes. Sem falar nos beijos – a única coisa que mudou foi que as mordidas aumentaram conforme ele foi ganhando confiança.

— Boa noite amor! – Cumprimentei primeiro, já que parecia que o gato comeu a língua dele. Ele havia simplesmente parado na minha frente e ficou me encarando até que eu o abracei. – Você está nervoso. – Não era uma pergunta.

— Estou. Muito. – Seus braços me rondaram e sua empolgação foi tanta que me levantou do chão. Mais um abraço sufocante para a lista. Sua boca beijou meu pescoço antes de me colocar no chão e beijar a minha boca.

Ficamos trocando carinho durante algum tempo. Não existia nervosismo ou ansiedade quando estávamos juntos daquela forma.

— Melhor? – Sussurrei contra sua boca entre um selinho e outro.

— Sim. – Ele sorriu e agarrou minha mão, começando a me puxar na direção contrária a que tomávamos normalmente.

— Você vai me contar onde estamos indo? – Perguntei depois de algum tempo em silêncio, notando que ele não iniciaria o diálogo.

— Quero te apresentar alguém e contar aquela história que estou te devendo.

Demorei um pouco para conectar os pontos, mas então me lembrei. Logo que nos conhecemos, o primeiro bolo que ele havia me dado, a promessa de me contar quando estivesse pronto para falar sobre o assunto. Depois de dois meses o dia chegou e ele tremia de nervoso. Apertei sua mão com mais força, obrigando-o a parar. Eu não sabia bem o que dizer, mas sentia que o devia algo.

— Você tem certeza amor? – Foi a única coisa que consegui balbuciar.

— Eu pensei bastante sobre isso e quero te contar para que possamos seguir em frente. Preciso te contar para poder perguntar o que eu quero. – Eu não compreendi bem, mas assenti e o abracei mais uma vez. Abraços nunca são demais.

Depois disso seguimos o caminho todo em silêncio sem mais interrupções. Conforme os passos eram dados seus dedos em minha mão paravam de tremer. Ao invés de ficar mais nervoso ele parecia se acalmar conforme nos aproximávamos do nosso destino. Por fim paramos em frente a um sobrado antigo enfeitado com luzes de natal - embora estivéssemos longe da data. Will me puxou para sentar em um banco que ficava no jardim da casa.

— Isso não é invasão de propriedade privada? – Perguntei me aconchegando nele, sem nenhuma intenção de me levantar.

— Eu tenho permissão da dona. – Ele respondeu depois de alguns minutos remoendo algo. Deixei que guiasse o assunto em seu tempo uma vez que ele ainda parecia hesitar. – É ela que eu quero te apresentar. A tia Branca, a mãe da minha alma gêmea. – O silêncio perdurou por muito mais tempo dessa vez, a informação se assentando aos poucos.

Will nunca havia falado sobre sua alma gêmea. Tínhamos tocado no assunto uma vez já, mas não foi difícil notar que isso o incomodava e o deixava triste, então eu evitava falar sobre. Minha aposta é que ele não tinha encontrado alguém ainda e por isso se sentia decepcionado. Já havia ouvido relatos de pessoas que nunca conheceram a sua e de como sentiam que um pedaço delas faltava, e sobre seus desejos desesperados de encontrá-la. A maioria das histórias eram angustiantes e pareciam sair de um enredo de tragédia e depois de ler e ouvir algumas eu prometi a mim mesmo que nunca mais me aprofundaria no assunto. Vários gatilhos. Quando levantei a hipótese de Will lembro de ter sentido um medo incomodo, uma insegurança astuta. Eu conversei bastante com Jason sobre isso para superar a ideia de que quando ele a encontrasse ele me largaria.

— Eu o encontrei quando tinha três anos. – Continuou enfim, observando a casa que se estendia ao lado da que estávamos. – Éramos vizinhos que nasceram no mesmo dia, mês e ano. Meu pai disse que logo que nos colocaram frente a frente pela primeira vez o fio apareceu e todos conseguiram ver. A tia Branca contou várias vezes sobre a festa que fizeram naquele dia, explicando que era muito raro nos encontrarmos tão jovens e sobre a coincidência de termos nascido no mesmo dia. Sério, ouvimos tanto sobre isso que decoramos seu discurso. Lee costumava imitar a tia nas noites de sexta feira quando nos juntávamos para comer pizza. – Ele ria nostálgico. Um riso triste que eu quis arrancar de seu rosto imediatamente.

— Então o nome dele era Lee. – Comentei no silêncio que ele deixou estender mais uma vez.

— Lee Fletcher. – O sorriso cortou meu coração mais uma vez. – Nós vivíamos brigando. Minha mãe dizia que éramos como todos os bons irmãos. Fazíamos tudo juntos e estávamos sempre um na casa do outro, isso nunca mudou, mesmo depois que recebemos o diagnóstico dele com quinze anos. Leucemia. – As primeiras lágrimas desceram, não só em seu rosto, mas no meu também. Apertei mais o nosso abraço tentando lhe passar alguma segurança que o permitisse continuar sem desmoronar.  – A doença avançou rápido, era agressiva demais. Ele precisava de um transplante de medula, mas o banco nunca encontrou ninguém compatível. Eu fiz o teste, achei que como éramos almas gêmeas que tinham nascido no mesmo dia eu com certeza conseguiria ajudar, afinal, do que servia tanta coincidência, certo? Mas eu não consegui e no fim não serviu de nada. Ele morreu antes de fazermos dezesseis. – Eu queria dizer que sentia muito, e realmente sentia, mas me segurei. Não lhe traria nenhum conforto. Apenas continuei o abraçando e puxei sua cabeça para que apoiasse no meu ombro e eu pudesse acariciar seus cabelos emaranhados. Com a voz embargada ele continuou. – O pai dele morreu pouco depois e eu acabei sendo a única coisa que sobrou de Lee. A única lembrança física que a tia tem, e ela é tudo que eu tenho. Nós mantemos contato e ela é como uma segunda mãe para mim. Sempre que ela sente saudades eu venho imediatamente. Aquele dia do jantar ela me ligou chorando com saudades do Lee, então eu vim. Percy não gosta muito, diz que não é saudável e que eu não deveria largar tudo sempre para vir aqui, mas eu não consigo não vir. Lee é uma parte de mim, uma parte muito grande que se foi e a tia é a única coisa que preenche esse vazio, mesmo que só um pouco.

Ficamos nos braços um do outro por quase uma hora. Eu nunca fui bom em consolar ninguém e não acho que palavra alguma poderia diminuir sua dor naquele momento então só fiquei ali. O apertei, beijei, fiz carinho e acolhi da melhor forma que consegui, respeitando seu silêncio e sua dor. Will Solace era humano e tinha acabado de expor a parte quebrada que existia dentro de si e eu a amaria, da mesma forma que ele amou a minha. Era angustiante e desesperador sentir sua respiração quebrada e seus soluços, mas me mantive forte para lhe manter inteiro.

— Eu te amo. – Sussurrei em seu ouvido inúmeras vezes. Quando ele respondeu já não chorava. Suas lágrimas tinham secado em seu rosto e o marcavam profundamente, mas ele sorriu e por um momento pareceu inteiro de novo.

— Eu também te amo. – Um, dois, três beijos. – Vem. Quero te apresentar a tia, ela já está nos esperando a um tempão.

E assim fui arrastado para dentro do sobrado que brilhava na escuridão da noite. “Lee amava o natal” Will havia dito em algum momento em meio ao choro.

— Seja bem vindo querido, é um prazer te conhecer. – Tia Branca me recebeu com um abraço caloroso. – Will falou muito de você. Vocês são um lindo casal.

A forma como ela sorria me fazia sentir o namorado de seu próprio filho. Aquela mulher vivia a vida de seu filho através de Will e isso era tão triste e solitário que eu a abracei uma vez mais com o coração pesado. Nós jantamos juntos como uma família e ela me contou sobre a infância de Will e Lee com lágrimas nos olhos. Ao falar sobre a festa do dia em que o fio apareceu eu tive que segurar o choro.  

Já passava da meia noite quando nos despedimos e fomos para a casa de Will. Eu já havia esquecido de tudo que tinha imaginado para aquela noite, mas quando entramos em sua sala eu desabei. Literalmente. Meus joelhos ficaram fracos e eu cai para frente como um bobão quando vi os balões com forma de coração pendurados. Aquilo era tão Will.

— Então, lembra que eu disse que queria perguntar algo?

— Puta que pariu Will. – Foi a única coisa inteligível que consegui falar.

— Namora comigo? Eu sei que você disse que flores são inúteis já que não são comestíveis, mas meu pai insistiu que não era um pedido de namoro sem flores, então... – Ele estava parado na minha frente, com o sorriso que eu amava, os olhos que eu amava, a cara que eu amava, o cabelo que eu amava, enquanto segurava um buquê de flores com as mãos que eu amava.

— Puta que pariu. – Não foi bem um sim, mas eu acho que ele entendeu quando eu pulei em cima dele com um sorriso que poderia facilmente rasgar o meu rosto.

Flores são realmente inúteis. Elas morrem rápido e não agregam em nada, mas aquelas eu guardaria. O quanto aguentassem e mesmo depois de secas.

— Você planeja levantar de cima de mim em algum momento? – Ele perguntou ladino quando interrompemos o vigésimo beijo.

— Sinceramente? Só para chegarmos no quarto.

Eu não precisei realmente levantar, ele se levantou e me levou no colo. Sua cama estava com os lençóis de toy story naquela noite também, mas eu não pude prestar muita atenção uma vez que ele deitou e me trouxe junto de si. Seu corpo era febril colado ao meu e sempre me causava arrepios por conta da diferença de temperatura. Meu corpo era sempre gelado demais, mesmo debaixo das cobertas e com a boca dele cobrindo tudo que alcançava. Tudo era confuso quando estávamos juntos assim, minha mente parecia um borrão e refletia somente o que meus olhos viam – e eles viam tudo. Sua boca entreaberta, a respiração entrecortada, os braços que corriam por tudo, o peito que subia e descia rápido demais, afoito demais. Eu não sei dizer se eram suas pernas que me abraçavam ou as minhas que o rondavam. Era coisa demais para processar, Will era sempre muito, de tudo. Eu me afoguei nele como sempre fazia, porque era impossível me controlar. Ele era tudo e eu queria tudo e um pouco mais. Eu mal conseguia sentir a dor quando tinha sua língua em todos os lugares, eu só pedia por mais e ele me entregava.

— Eu te amo. – Sussurrei pela quinquagésima vez na noite.

— Eu te amo muito mais. – Ele respondeu em todas.


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Notas finais do capítulo

Como foi?

Espero pelos comentários de vocês e mais uma vez obrigada! ❤️

Um grande beijo ❤️



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