It's a Match! escrita por mandy


Capítulo 15
Uma Coisa de cada vez


Notas iniciais do capítulo

Bom dia, navegantes! Como estão? Venho com mais um capítulo quentinho para vocês.
Aproveito para dizer que estou sem computador em tempos de quarentena, o que é uma verdadeira porcaria, mas eu tenho alguns capítulos reservas ainda. A minha prévia solução é conseguir, esporadicamente, um computador emprestado e, como sou adepta ao caderno, a única coisa que preciso fazer é passar a limpo o que for escrevendo.
Outro aviso: este capítulo pode conter gatilho.



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Você não sabe se tem a ver com a intuição

Ou se é apenas uma desculpa do medo para te manter preso

Aparentemente nada mais é seguro ou confortável

Nem a sua própria cabeça.

 

Eu não sei por quanto tempo fiquei perambulando pelo parque, sem reconhecer rostos comuns que cruzavam o meu caminho, fugindo como se alguém pudesse estar mesmo me procurando. Como se Regulus pudesse estar me procurando. No bolso, o celular não parava de vibrar. A cada vez que o fazia eu sentia uma pontada no coração, sempre mais forte, como uma bomba relógio prestes a explodir e cheguei mesmo a cogitar se aquelas pontadas eram sérias, se eu poderia morrer de verdade porque o celular não parava de tocar. Perto da quinta ou sexta ligação, acompanhada de mensagens na caixa de SMS e no Tinder, eu joguei o aparelho no lixo.

Na ocasião eu ainda não havia percebido. Estar dentro de um surto não é como assistir a um filme em que toda coisa lógica pode ser captada pelo espectador, mesmo quando este assinou ao pacto da narrativa. Estar em surto é estar submerso. Não há espaço na sua mente para perceber o que é real e o que é uma peça de mau gosto do seu cérebro doente. Você sente e absorve.

Quando me encontraram, eu estava sentado numa calçada já fora dos limites do parque. Sentia os músculos doerem de frio, sem me atinar ao fato de ter levado um casaco justamente para o caso de uma queda de temperatura. Reconheci o velho Slughorn, monitor da Sonserina, junto de outros três alunos que o acompanhavam. Questionou-me diversas vezes onde havia me metido, mas eu não conseguia sequer formular uma resposta e, ao final, me guiaram para a praça central, o nosso ponto de encontro. James, Sirius, Peter e Lily viram até mim tão rápido que me pareceram apenas vultos num primeiro momento.

— Onde se meteu? Te ligamos milhares de vezes, porque não atendeu o telefone? – Sirius perguntava, levando ambas as mãos aos meus ombros.

— Sr. Lupin – interrompia, no instante seguinte, a voz de Minerva McGonagall. A monitora se aproximou, afastando aos marotos e parando diante de mim, com expressão carrancuda – Onde o senhor estava? O combinado era estarmos todos aqui às oito da noite. São quase nove, Sr. Lupin.

— Me desculpe, eu... – senti o nariz arder e prendi a respiração por um momento, tentando não fungar – Eu me perdi, eu não sabia como voltar.

Não era toda a verdade. O que eu havia perdido era a noção do tempo, mas como poderia explicar para ela?

— Não pensou em ligar para os seus amigos?

— Eu... Perdi o celular.

— Remus Lupin, o senhor está bem?

Antes que eu respondesse qualquer coisa, Slughorn da Sonserina se aproximava uma vez mais, demorando-se um pouco mais enquanto me olhava e, assim, voltando-se à McGonagall.

— Já podemos ir? Os motoristas estão esperando – disse por fim.

A maioria dos alunos já estava dentro das vãs e mentalmente eu agradeci. Diante dos olhos dos monitores e dos meus amigos, eu concordei e seguimos para o carro. Lá dentro eu não ousava olhar para nenhum dos alunos já sentados, mas sentia que me acompanhava com os olhos. James teve a delicadeza de pedir licença à garota Fortescue sentada ao sozinha ao fundo, somente para que pudéssemos nos amontoar nos últimos bancos e, durante toda a viagem, fomos em silêncio, eu com a minha cabeça deitada no ombro de Peter. Eu quase me sentia tonto por conta do caleidoscópio de pensamentos interruptos, mas eles me deixaram quieto ali. Eles entendiam.

Quando no acampamento, seguimos em silêncio igual. De relance eu via Regulus saindo da vã que estava, mas não pude olhar por muito tempo. Chegando ao quarto, eu tomava uma ducha demorada e, saindo do banho, percebia os meus três melhores amigos sentados em círculo, com dois colchões dispostos no chão. E eu, que me sentia esgotado, como quem correu uma maratona inteira, me sentava igualmente, respirando fundo uma vez. Quando comecei a falar, nenhum deles me interrompeu e eu também não ousei olhá-los naquele momento.

— Quando chegamos aqui, uma das primeiras coisas que fizemos foi instalar o Tinder para descobrir se Regulus era gay. Eu nunca excluí o aplicativo. Desde então venho conversando com Regulus sob o pseudônimo de Luci, filha de mãe solteira, irmã de mais duas garotas, garçonete num café que serve os atendentes sob rodinhas de patins. A gente conversava sobre livros. E sobre filmes e músicas e coisas aleatórias que tínhamos em comum. Ou temos. Ao menos no começo. E, mesmo sendo errado, estava tudo bem porque no começo eu não levava isso de forma maliciosa e não sei dizer quando nossas conversas se transformaram em flertes. Nem sei dizer se eram, de verdade, flertes...

“E então eu comecei a ler um livro, e no livro, o protagonista esconde a sua sexualidade. Quero dizer, ele é gay, mas não quer que as pessoas saibam. E, também, fora deste contexto, o Sirius disse que gays eram promíscuos e ninguém pareceu entender, no começo, o tamanho da merda que isso significa. Depois teve a festa. E eu juro por Deus que não beijei o Regulus no banheiro, juro pelo que é mais sagrado. Mas queria. E depois da festa eu comecei a pensar em muita coisa ao mesmo tempo. Porque eu não sou promíscuo, então não faz sentido gostar do Regulus. Mas ao mesmo tempo eu entendo que Sirius foi um babaca ao fazer um comentário, me desculpa voltar no assunto, é que tudo isso não tem nenhuma lógica se eu não voltar nele... Mas daí eu fiquei o dia inteiro pensando se gostava ou não do Regulus. E se o Sirius ficaria bravo comigo. E se o James também ficaria bravo, porque ele gosta mais do Sirius, e se o Peter faria a mesma coisa porque eu estou em menor número.

 “E McGonagall, no mesmo dia, nos deu uma bronca por causa da festa. E no mesmo dia, eu acho, não me lembro, o Regulus contou pra mim... Pra Luci... que teve uma briga na casa de vocês. E que seu pai estava muito, muito bravo. E eu também fiquei bravo porque, ainda assim, você queria comprar mais álcool então, e se seus pais viessem buscar vocês e estivessem tão, tão bravos, que machucassem vocês?

 “Daí a Lily viu meu celular. E descobriu sobre o Tinder. E disse que eu precisava contar a verdade. Fui encontrar o Regulus na roda gigante, mas então a mãe do Sirius ligou pra ele e eu fiquei apavorado, pensando que de alguma forma ela poderia saber. Os seus pais não aceitariam um filho que gosta de garoto, não é?! E não, eu não tenho esperanças de ficar com o Regulus, não depois de tudo, ele vai me odiar tanto... E tudo isso, absolutamente tudo, desde o começo até agora, até detalhes das nossas conversas, estão martelando na minha cabeça nesse exato momento e eu não sei como parar, gente.

 “Eu... Eu não consigo fazer parar.

Eu tinha consciência do meu tom de voz calmo. Tinha consciência das lágrimas quentes na minha cara, dos olhos dos meus amigos sobre mim, da aflição dentro do quarto que parecia condensar todo o ar. Mas a impressão era de que tinha lhes contado toda a história em um minuto. E, o silêncio seguinte, parecia durar uma eternidade. Mas quando James suspirou uma vez, eu ergui, enfim, os olhos para ele.

— A gente precisa ir por partes. Certo? – E assim, eu concordava uma vez com a cabeça – A gente pode falar sobre o Regulus. Você gosta dele, é isso?

A voz de James era tranqüila. Não era como quem falava com uma criança, às vezes minha mãe tinha esse comportamento, falar comigo como se eu fosse uma criança. Acho que James queria entender só. Então, balançando a cabeça uma vez, eu concordava.

— Certo. Sirius. Você quer falar alguma coisa?

Sirius Black tinha a cabeça baixa, os cabelos compridos cobrindo parte do rosto. Só ergueu um pouco o queixo para olhar para mim, tentando um sorriso de canto, mesmo que frouxo.

— Ta tudo tranquilo, cara. Eu me expressei extremamente mal naquele dia, me desculpa, eu estava meio... – respirou fundo uma vez e não concluiu a frase – Enfim. Eu não vou ficar bravo com você por ser gay, bi ou trans, Remus, eu nem tenho esse direito. Nem se você gostar do Regulus...— a última frase era quase um sussurro e, em seguida, Sirius encolhia os ombros – A gente é amigo. Né?

Concordava.

— Outro ponto importante: eu não gosto mais do Sirius do que de você ou do Peter – James voltava a falar em seguida – E não vou passar a mão na cabeça do Sirius quando ele fizer algo de errado. Assim como não vou passar na sua, ou na do Peter.

— Eu acho que entendo o seu ponto, Rems, mas entendo ele de um jeito diferente... – me voltava a Peter desta vez, os dedos entrelaçados no colo – Não é porque James goste mais do Sirius. É porque os dois têm exatamente dois neurônios e é propício que as besteiras que o Sirius faça o James apoie, porque os dois têm pensamentos iguais...

E eu quase sorria com o comentário bobo.

— Vocês chegaram a conversar? – Sirius voltava a falar então. E eu entendia que ele retomava no assunto Regulus e negava uma vez – Quer falar sobre isso com a gente?

— Eu acho que... preciso absorver primeiro que vocês não estão bravos – dizia depois de respirar de forma falha – E que ainda gostam de mim.

— Tá brincando? – Ria-se Peter – Você precisar fazer muito pra deixar de ser amado.

— Desculpa por ter mentido. Omitido, na verdade, o que não deixa de ser uma forma de mentira. Eu só não sabia como contar, deixei a história ir longe de mais e... Desculpa por não comprar cigarro, eu fumei quase tudo e não coloquei no lugar. Eu não consegui me lembrar, desculpa...

— Remus – James voltava a me chamar atenção – Uma coisa de cada vez, cara.

Uma coisa de cada vez... – repeti, fechando os olhos em seguida.

E, de novo, ficamos por um tempo em silêncio. Até que começasse a sentir o meu corpo exausto demais, porque não tinha dormido nada na noite anterior e, assim, me deitasse num dos colchões. Peter fazia o mesmo, porque o segundo colchão o pertencia. Me cobrindo dos pés a cabeça, eu senti falta do telefone celular... Seria mais fácil tê-lo desligado apenas, mas não havia ninguém comigo para me dar a ideia obvia.

Mesmo cansado, durante a noite eu não dormi de fato. Os meus amigos iam e voltavam do banho, conversavam entre si, sempre muito baixo, acendiam cigarros, Sirius e James se metiam em suas respectivas camas e Peter dormia o chão, ao meu lado. Tentava me focar naqueles primeiros fragmentos de conversas no quarto, e mesmo quando a minha cabeça desviava sempre para Regulus, para o como ele deveria ter ficado puto pelo encontro furado, era bom imaginar também que eles estavam lá, como sempre. E sabiam da verdade.

Quando consegui pregar os olhos foi, de novo, quando o sol começava a nascer. Não foi por muito tempo, tão logo eu me via virando de um lado para o outro na cama, ouvindo os meus amigos cochicharem entre deles, mais especificamente James e Sirius. Como todas as manhãs, nada demais. Busquei pelo celular embaixo do travesseiro, mas então me lembrava da grande besteira que fizera. Como se o celular pudesse resolver todos os meus problemas.

Notando que e havia despertado, os rapazes se aproximaram uma vez mais. E, quando eu imaginava que já havia decorado o roteiro – “Está tudo bem? Quer falar sobre isso”? – eles mudavam a rota. Peter, se deitando próximo ao travesseiro que eu estava, cutucou de leve a ponta do meu nariz, já sem curativo nenhum.

— Parece bem melhor – comentou com um sorriso breve – A gente vai tomar café?

O ideal seria irmos, já devia ser o horário. E, talvez depois do refeitório, eu procurasse a enfermeira que me havia feito um curativo, já que aquele era o trato. Eu não sabia se estava bem, no entanto. Assim, confiando neles, eu somente encolhia os ombros, esperando deles uma sentença para o dia.

E nenhum de nós saiu da cama, feito um bando de preguiçosos. Pensando em relaxar um pouco mais, me dirigia ao banheiro, me perdendo por alguns instantes debaixo da água quente. Era como se, junto da água, escorresse de meus ombros parte do peso que carreguei durante a noite anterior e, mesmo que tudo ainda não estivesse normal— porque a possível ideia de eu estar deveras entrando num pico maníaco do transtorno bipolar era assustadora – eu conseguia respirar mais tranquilamente, engolindo o nó em minha garganta, mentalizando que logo estaríamos bem. Quando saía do banho, por fim, já não estávamos mais sozinhos, já que toda a Grifinória parecia fazer da nossa cabana um esconderijo secreto.

No final das contas, éramos uma equipe de fato. Um bom time. Lily estava também de pijamas, recostada numa das camas enquanto organizava algumas besteiras que havíamos comprado sobre os colchões no chão, para o café da manhã; Mary se deitava na barriga de Peter; Marlene, enfim, estreava a máquina de café, distribuindo copos de papel – nenhum roubado do refeitório desta vez – para os demais ali no quarto. E, por mais que os meus olhos pesassem e a meu corpo estivesse implorando por mais umas doze horas na cama, logicamente eu sabia que o café não ajudaria em nada naquele momento, só ia piorar as coisas. Então tive de negar. Mas o cheiro era uma tortura.

Nenhum deles comentou sobre o incidente da noite passada. Ao contrário, falavam do que nos esperava no decorrer das férias, no acampamento externo que partiria em excursão para o bosque por volta das três da tarde, das barracas que não tínhamos e das expectativas de dormirmos ao ar livre, tudo isso num piquenique de café da manhã, improvisado em dois colchões bagunçados. Eu sabia que eles estavam preocupados comigo, podia sentir os olhares, mas eu realmente não queria falar nada e me deixar levar pela sensação de que a noite no parque não havia existido.

As únicas pessoas que não sabiam minimamente do meu estado eram Marlene e Mary, isso se Lily não houvesse dito nada a elas, mas Lily sabia do contexto superficial – se é que eu poderia chamar a minha queda por Regulus de algo superficial, quando eu mesmo sentia que era um tombo no abismo. Mas nenhuma das duas garotas parecia ser do tipo que se importam se você é gay, bi, trans ou hétero. E os meus amigos haviam deixado claro que estava tudo bem. Nem Sirius tinha mais a cabeça tão baixa, ria como se realmente não fossem grandes coisas.

Sai do devaneio quando acertado por uma almofada atirada por James.

— Diz a primeira coisa que vem na sua cabeça, sem pensar muito.

Pergunta difícil. Eu ainda pensava mil coisas por segundo. Mas, ainda assim, tentei ser o mais franco possível.

— Vocês são ótimos – dizia, encolhendo os ombros em seguida e me deixando sorrir por um instante – Sério. Obrigado por não me deixarem sozinho.

E, diante de uma comoção exagerada do grupo, eu ria ainda mais, abrigando a cabeça de Lily em meu ombro e respirando fundo. Eu já havia passado por um tanto de coisas... Poderia passar por mais essa.

— Não é como se você fosse se livrar da gente tão fácil – e, com a colocação de Marlene, eu soube que ela também sabia.

E não pude mesmo ficar bravo.

— Tá bem, chega de demonstrações afetivas – ria um pouco mais, porque começava a ficar sem graça – Acho que a gente precisa arrumar o quarto, que está uma bagunça. E depois, arrumarmos a mochila para o acampamento.

Pensando bem...— Marlene fazia careta.

— E de volta o bom e velho, ênfase no velho, Remus Lupin – Sirius finalizava.


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Notas finais do capítulo

Eu nem acredito que estamos no décimo quinto capítulo (?) Isso tudo é graças a vocês. Aos comentários, incentivos, a força ♥ Obrigada, mesmo. Espero que estejam gostando.



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