Legado escrita por Kayko


Capítulo 7
Capitulo 7




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Já era alta madrugada, quase amanhecendo, e Nero não parava de andar de um lado para o outro da sala. Estava preocupado com o fato da mãe não ter voltado. Vergil poderia ser seu pai e irmão do homem que foi um de seus tutores, mas ele não confiava no Sparda mais velho. Ele se debruçou no parapeito da janela estilo europeu para olhar a rua vazia onde somente o som do vento ecoava:

—Não deveria estar dormindo? 

O jovem devil hunter se virou a direção da voz e encontrou Dante segurando um copo com água:

—Minha mãe não voltou. - Nero respondeu voltando a olhar a rua.

—Suponho que ela ainda esteja com o Vergil.

—Eles não deveriam ter voltado juntos?

—Devem ter muita coisa para resolverem. Aquele idiota deixou claro pra mim que ainda gosta dela. - Dante sentou no sofá marrom escuro que ocupava a sala. - Ela provavelmente vai ajudar o Vergil a encontrar sua humanidade.

—Só que ela também esta precisando de ajuda. - Nero cerrou os punhos. - Se ele fizer qualquer besteira que a magoe, pode ser tarde demais…

—Do que esta falando?

—Ela esta sofrendo com a depressão e alcoolismo. Eu estou tentando ajudá - la, é a minha mãe, e cara, todos os dias que passamos juntos ela tem se mostrado uma pessoa incrível e eu quero muito que ela fique bem, mas...ela só dorme com remédios fortes, toma remédios para ficar bem e quando nada disso ajuda, ela bebe muito…

—Dizem que todo reino tem seu lado podre.

—Ela esta morrendo por causa disso… - Nero tinha um olhar triste.

—Olha garoto, eu não sou bom nessas coisas, mas se você quer mesmo vê - la bem, faça por onde isso ocorra. - Dante tomou a água que havia trazido consigo. - Eu vou dar um jeito de te ajudar, ou aquele idiota do Vergil vai fazer merda para piorar as coisas.

—Obrigado Dante. A Kirye também esta ajudando, mas quanto mais ajuda melhor. Agora já imagino o quanto a Scarlet vai ficar chateada quando souber que a minha mãe passou a noite fora com o Vergil…

—Scarlet?

—É a empresária e namorada da minha mãe. Se bem que acho que ela já deve estar chateada pelo que a minha mãe fez.

—Uau, que informação pesada essa! - Dante falou surpreso. - Quer dizer que a minha cantora favorita é gay?

—Assim como suas amigas Trish, Lady e Nico. - Nero respondeu como se fosse óbvio. 

—Não! Pode parar por aí! Como assim elas são…

—Apenas sendo. - O mais jovem deu de ombros. - Não quero nem imaginar o que a pobre Scarlet vai passar se souber que meus pais reataram após anos.

—Olha, se não fosse o fato de eu gostar da Lúcia, eu me habilitaria a se tornar seu padrasto.

—Nem brinque com isso. O Vergil como pai já é ruim, ter você como padrasto é pior ainda.

—Ah é? Quando vier pedir conselhos de como lidar com seu casamento vou te mandar para o seu pai, seu ingrato! - Dante fingiu estar irritado. - Logo eu que sempre te amei, tentei fazer o melhor para você...rebelde!

—Foda - se você, seu velho caloteiro. 

O telefone ao lado de Dante soou e imediatamente ele atendeu para que as visitantes não acordasse:

—Ei! Isso são horas para se ligar? - Dante atendeu reclamando.

—Desculpe...Dante? - A voz de Agnes soou do outro lado da linha.

—Agnes?

Ao ouvir o nome da mãe, Nero se aproximou correndo:

—Sim. Desculpe não ter voltado, só agora o Vergil dormiu e eu tive um tempo de sair de perto dele. - Ela tinha um tom calmo.

—Ainda estão juntos? - Dante perguntou surpreso.

—Estamos em um hotel perto do porto. 

—Pelo jeito não vão voltar tão cedo.

—Assim que ele acordar eu volto, e vou tentar convencê - lo de levá - lo junto. Dante, sei que passaram um bom tempo juntos, mas estar sozinhos é uma coisa, agora estar em meio um grupo, uma sociedade é outra. Tenha paciência com ele.

—Com você me pedindo dessa maneira, juro que até suporto ele. Quer falar com o Nero? Ele nem dormiu ainda preocupado com você. 

Nero chutou o tio e pegou o fone:

—Ei mãe, esta tudo bem?

—Oi meu filho, eu estou bem. Desculpe a falta de notícias, eu e seu pai tínhamos de conversar algumas coisas...ele não conseguia dormir e eu fiquei até ele apagar.

—Mãe, tem certeza que quer ficar aí com ele? Posso mandar o Dante pra ficar aí.

—Ei, não precisa se preocupar eu vou ficar bem.

—Ele ainda te afeta muito, não quero que sofra uma desilusão esperando algo que ele não pode oferecer. - Nero falou sério.

—Fique tranquilo, eu estou bem. Nos vemos daqui a pouco e vá dormir, não quero levar bronca da Kirye por você ter ficado fora da cama por minha causa.

—Certo, mas se eu acordar e dentro de uma hora você não estiver aqui, eu vou atrás de você.

—Fique tranquilo, eu vou estar aí para o café da manhã.

A ligação foi encerrada e Nero colocou o fone na base novamente:

—Acha mesmo que eles vão ficar bem? - Ele perguntou para Dante.

—Provavelmente bem melhor que nós dois.

 

Agnes colocou o telefone no lugar e observou a garrafa de conhaque que já estava na metade. Já havia dias que não bebia, isso a pedido do filho, que se preocupava com a saúde dela. Mas naquele dia, aquela enxurrada de emoções a estava matando e ter o homem que tanto havia amado a alguns metros de distância não ajudava a se acalmar. O passado que ela havia tentado superar tinha uma voz envolvente e exalava um cheiro inebriante.

Depois que chegaram ali, ela havia providenciado comida e que lavassem as roupas dele. O silêncio imperou e pouco se falaram, até que ela percebeu que ele não estava dormindo e com isso passaram a conversar sobre os livros que tanto gostavam. Foi então que ele colocou a cabeça no colo dela e dormiu profundamente. Depois de um bom tempo que ele se afastou sem acordar, a procura de um travesseiro fresco para continuar seu sono e ela aproveitou aquele momento para tomar coragem para ligar para o filho, que provavelmente estaria preocupado com ela.

Em pouco tempo ela pode perceber o quanto Nero tinha amor dentro de si, o quanto se importava em proteger e cuidar das pessoas ao redor. Mesmo que ela não admitisse, esse lado ele havia herdado dela, que desde cedo se importava com a melhoria do planeta e da raça humana. A morena sentia - se arrependida por ter bebido, mas sem isso ela não teria forças para mentir para o filho dizendo que estava bem, e até mesmo passar para o homem que estava no quarto que ela havia o superado:

—Agora é você que esta sem sono? 

A voz de Vergil ecoou pelo cômodo da suíte luxuosa que Agnes havia alugado:

—Avisei ao Nero que estamos aqui para ele ficar mais tranquilo. - Ela respondeu sem olhá - lo.

—Ele não deve ter uma boa visão de mim.

—Com toda certeza, não.

—Vá dormir, eu fico com o sofá se não quiser dividir a cama comigo novamente. - Só então Vergil percebeu a garrafa e o copo à frente da morena. - Estava bebendo?

—Precisava relaxar um pouco. Acho que esta sendo muita coisa para eu assimilar.

—Isso não é desculpa Agnes. Eu achei que tivesse parado com isso…

—Certos hábitos não mudam. - Ela sorriu amarga. - Mudando de assunto, para onde você vai depois que o pessoal voltar para Redgrave?

—Não sei...Dante me chamou para entrar no ramo dele e do Nero. Eu não vejo problema em ajudá - los.

—Eu comprei uma casa na cidade. Nero e Kirye não quiseram se mudar para lá e eu passo mais tempo fora do que nela, se quiser pode ficar lá até se restabelecer.

—Você não tem motivos para ser tão gentil comigo.

—Vergil. - Agnes se virou para fitá - lo. - Você vai ter que aprender a aceitar a ajuda das pessoas ao seu redor, não de todas, mas apenas aceite. Nosso filho vai ficar mais aliviado se perceber que nos damos bem.

—Isso quer dizer que nosso passado não vai se repetir, correto? - Vergil não entendia o porque, mas ao fazer aquela pergunta, algo dentro dele se incomodou.

—Não vai se repetir. - Ela voltou até onde estava a garrafa de conhaque e o copo e se serviu. - Eu não quero viver aquele inferno de novo. Fui abandonada quando eu achava que estava sendo verdadeiramente amada, sozinha, descobri estar grávida e fui extremamente julgada pela minha família por isso e pra piorar, quando achei forças para cuidar do meu filho, ele foi tirado de mim! Você acha mesmo que quero que isso se repita novamente, Vergil! - Agnes falou alterada se desmanchando em lágrimas. - Eu me tornei uma porcaria, só sirvo para enriquecer outras pessoas com a minha voz. Ninguém se importa desde que eu tenha um sorriso no rosto e cante. Ninguém se importa desde que as doações entrem em suas contas bancárias, ninguém se importa com a Agnes Shinomya, a mulher que conseguiu se casar com um bilionário e herdou tudo dele, que é a porra de uma cantora famosa e que se supõe que tem o mundo aos seus pés. E você é só mais um que não se importa. - Ela sorveu o líquido âmbar do copo. 

Ela jogou o copo longe e foi até a porta do quarto, onde a abriu e saiu apressada:

—Agnes! - Vergil gritou ao vê - la sair.

Desde que ele havia conhecido a morena, ela havia dito a ele que era apenas a máquina de fazer dinheiro da banda, era ela que mantinha a família e um monte de outras pessoas, por esse motivo ela carregava um fardo enorme nos ombros. Quando ficaram juntos, ela por diversas vezes lhe confessou que aqueles momentos eram seus momentos de liberdade. Geralmente quando ela estava mal, se embriagava de tal forma que perdia a noção de tudo. Esse era o lado obscuro dela que ninguém sabia, talvez apenas ele e seus empresários.

Sentindo - se culpado e sem poder solicitar ajuda de ninguém, ele resolveu ir atrás dela mesmo utilizando apenas o roupão que o hotel havia fornecido. Como era madrugada e o local estava praticamente deserto a não ser pelos funcionários, ele caminhou até o saguão onde pode vê - la no bar. Sem dizer nada, ele caminhou até ela e no exato momento que ela iria tomar mais um copo de conhaque, tirando o copo das mãos dela:

—Chega por hoje. - Vergil a pegou nos braços e a levou de volta para o quarto, ouvindo o choro contido pelo caminho.

Ele a levou até o banheiro onde ligou a ducha com água fria e a colocou embaixo mesmo vestida. Assim que percebeu que ela ficaria ali, ele saiu a busca de uma toalha para secá - la. Se ele tinha que começar a se redimir pelos seus erros, Agnes e Nero seriam o começo. Dante que esperasse por ele.

Logo ele voltou e a encontrou vomitando no sanitário. Pelo jeito ela ainda tinha um pouco de lucidez. Ele prendeu os cabelos dela, que agora eram menos cacheados do que eram quando ele a conheceu. Ela não imaginava o quanto reencontrá - la havia mexido com ele, o quanto o desejo de que pudessem reviver tudo o que passaram juntos havia ardido em seu peito. Sim, agora ele sabia que tinha um coração e que era metade humano, e ele queria poder aproveitar sua humanidade.

Com cuidado ele a ajudou a se despir. Ela não havia parado de chorar em nenhum instante e aquilo cortava seu coração, agora mais humano que nunca. Vergil a ajudou a tomar banho, ele pode reparar a tatuagem que ela tinha na cintura que parecia recém feita, a marca do mentor que ela tinha desde que ele a conhecera e notou o quanto o corpo que tanto amou havia mudado. Não era ruim, ela ainda era curvilínea, tinha seios grandes e firmes, mas a cintura estava mais fina, o traseiro que ele tanto adorava se lembrar quando lhe era permitido estava menor do que se lembrava, as pernas estavam mais finas e ele podia ver alguns ossos sob a pele cor de caramelo.

Imaginando o tamanho sofrimento que ela deveria ter passado, o Sparda mais velho a abraçou ali embaixo da ducha fria. Ele havia sido egoísta com seus propósitos, mas ele nutria sentimentos por aquela mulher que estava em seus braços. Ela era e sempre seria o seu diamante negro.

Vergil a ajudou a se enxugar e a colocou na cama, tomando o lado dela em seguida e a abraçando:

—Eu vou morar na sua casa, desde que me deixe cuidar de você. - Ele falou ao ouvido dela que suspirou.

—Scarlet não vai gostar disso. - Agnes sorriu sem graça.

—Quem é essa pessoa?

—Minha empresária, assistente e namorada.

—Namorada...achei que gostasse de demônios. - Ele brincou a fazendo sorrir novamente.

—Depois que meu marido morreu eu não consegui me relacionar com homens. Já era difícil me relacionar com ele, por isso não tivemos filhos. Scarlet veio gerenciar a minha carreira solo, ficamos amigas bem próximas e acabamos nesse relacionamento. Não é algo oficial, nunca poderíamos oficializar, ela é casada e tem filhos, e eu devido a minha família.

—E você aceita isso?

—Ela passa mais tempo comigo do que com eles, então eu não ligo.

—Ela sabe de mim e do Nero?

—Do Nero sim, de você não totalmente. Mas se eu contar que você é o pai do Nero é provável que ela ligue os pontos…

—O que pretende fazer? - Ele a aconchegou mais em seus braços.

—Vou lançar o disco em que eu estava trabalhando, fazer os shows de promoção e pretendo me aposentar. Quero estar por perto quando o Nero resolver me presentear com netos.

—Eu quero estar com você quando isso ocorrer.

—Isso é algum tipo de pedido ou promessa? - Ela se ergueu para fitá - lo e Vergil se perdeu nos olhos dourados dela.

—Estou deixando claro que ficarei do seu lado e não sairei mais. Vou cuidar de você e do Nero.

—E nós vamos cuidar de você, seu babaca. - Ela sorriu iluminando todo o local.

Vergil sorriu de volta e a puxou para um leve beijo. O primeiro depois de mais de vinte anos separados, tendo apenas o amanhecer como testemunha daquele reencontro.


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