Meu querido sonâmbulo 2 escrita por Cellis


Capítulo 11
Meu querido ponto final


Notas iniciais do capítulo

Apertem os cintos, pois a coisa está prestes a decolar (ladeira abaixo) nesse capítulo! A primeira parte dele é toda em itálico, mas eu não fiquei maluca de vez não, há uma explicação mais a frente sobre isso.

Boa leitura ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/785822/chapter/11

— Aigoo... eu mal posso acreditar que acabaram os exames finais! — o mais novo exclamou rua afora, finalmente aproveitando a liberdade de poder respirar sem preocupações novamente depois de uma longa semana de provas. — Hyung, o que você quer comer hoje? Pode escolher qualquer coisa, eu pago!  

Os testes de final de ano, como de costume, eram os mais difíceis e longos de todos os semestres escolares, então o recém-chegado término dos mesmos era motivo de um certo alívio para os estudantes coreanos no geral — o que não era em nada diferente para Kim Namjoon. Sentindo-se duas vezes mais leve, o adolescente, que agora já podia sentir o cheiro do seu último ano escolar se aproximando, dentro de poucos dias estaria aproveitando as suas merecidas férias como qualquer outro garoto da sua idade: dormindo grande parte do dia e comendo e jogando jogos eletrônicos na parte restante. Com o seu penúltimo ano de ensino médio devidamente terminado, menos de doze futuros meses letivos o separariam do seu maior sonho, o que fazia com que o Kim tivesse ainda mais um motivo para caminhar saltitante pelas ruas que rodeavam o seu colégio.  

— E você pretende fazer isso com que dinheiro, moleque? — o mais velho e igualmente mais baixo, o qual caminhava ao lado do Kim com o seu típico andar desleixado, zombou. — Você não é bolsista por opção, se lembra disso?  

Os dois riram, contudo, a verdade fosse dita, Min Yoongi era a única pessoa em todo o colégio onde os dois estudavam que fazia aquele tipo de brincadeira com a situação financeira do mais novo sem nenhuma conotação maldosa. O Colégio Hengarae era o mais famoso de toda aquela região e, consequentemente, um dos mais caros. Apenas a elite da vizinhança tinha condições financeiras de manter seus filhos estudando em tal instituição, uma das mais rigorosas e mais bem reconhecidas do país, com exceção dos escassos estudantes que eram capazes de conseguir uma bolsa de estudos através do rígido programa de notas do próprio colégio. Kim Namjoon era um desses bolsistas, na verdade, o único restante em todo o ensino médio. Com suas notas excepcionais, não era muito difícil para o garoto conseguir manter sua bolsa por todos aqueles meses, mas isso acabava não sendo do agrado de todos — muito menos de alguns alunos em específico.  

— Mas veja só a lógica: se eu economizo com as mensalidades, consigo guardar algum dinheirinho para gastar com os pequenos prazeres da vida. —  o garoto afirmou com a sua dicção desenvolvida, recebendo uma sobrancelha erguida na sua direção como resposta. — Como comida, claro! 

Min Yoongi não era uma pessoa de muitos sorrisos, contudo, a inocência e toda aquela vitalidade de Namjoon sempre acabavam lhe arrancando uma risada. O Kim era o seu único amigo dentro e fora do colégio, a única razão pela qual ele tinha conseguido sobreviver àquele ano tão infernal.  

— Você está certo. — o Min concordou enquanto chutava uma latinha de refrigerante que surgira no seu caminho. — Além disso, em poucos dias eu estarei oficialmente formado e nós não faremos mais esse caminho juntos, então quando eu terei outra oportunidade de comer às suas custas? 

— Não diga isso, hyung! — Namjoon choramingou. — Você diz como se estivesse planejando entrar em uma faculdade e me abandonar no Hengarae.  

— Se eu ao menos conseguir passar para alguma faculdade, já será uma surpresa. — o mais velho deu de ombros, fitando o caminho diante dos dois sem muitas expectativas.  

Enquanto Namjoon era alvo de alunos mesquinhos e de caráter falho já desde muito cedo, o Min constantemente tinha o mesmo alvo pintado em suas costas, porém devido às notas sempre muito baixas. Sendo sincero, ele não fazia ideia de como tinha sido aprovado naquele último ano de colégio — talvez os exames finais estivessem prestes a reprová-lo de vez, quem sabe.  

— Yah, você está começando a falar igual aqueles dois. — o Kim rebateu, cutucando o amigo. — Acho melhor me afastar de você antes que comece a pensar em me dar uma surra também. 

De repente, o Min parou a sua caminhada de forma brusca, obrigando Namjoon a parar também, porém já um par de passos à sua frente. Ele fitou o mais novo, sério, e ergueu um indicador na sua direção.  

— Você não ouse apanhar de novo daqueles dois, ouviu bem?  

— Mas eles também estão se formando, hyung. São da sua turma, esqueceu? — o Kim rebateu, rindo. — Felizmente, não vou mais encontrar nenhum deles pelo colégio.  

— Mas nunca se sabe o que pode acontecer aqui fora. — Yoongi emendou, ainda mantendo o tom sério e preocupado. — Aqueles dois são capazes de qualquer coisa e você sabe disso. Ainda mais depois daquele último episódio...  

Namjoon fez uma careta ao ouvir aquilo, lembrando-se de toda aquela confusão da última vez, a maior que já tinha visto ser armada entre o melhor amigo e os seus dois colegas de turma. 

— Eles ficaram bem loucos de raiva de você, não foi?  — o mais novo comentou. — Parecia que o Seokjin nunca ia soltar o seu pescoço. 

— E isso não deu em nada, no fim das contas. — o Min reforçou o seu argumento, lembrando-se como os dedos de Seokjin tinham ficado marcados na pele pálida do seu pescoço por semanas. — Aqueles dois são muito bem apoiados pelas suas famílias poderosas, por isso que nenhum deles têm limite e justamente por isso que eu estou dizendo para você se cuidar em dobro daqui para frente, Namjoon-ah.  

No fim das contas, Namjoon sabia que o mais velho estava certo. Balançando a cabeça em concordância, ele chegou a pensar consigo mesmo o quão estranho era o fato de Seokjin e Hoseok, seu parceiro de atos perversos, terem ficado calados depois de toda aquela confusão. Já fazia alguns meses, pouco mais de seis deles. Tirando o Kim mais novo, todos os outros três rapazes já tinham até se tornado maiores de idade, mas aquela situação crítica pareceu ficar perdida e esquecida no decorrer de todo aquele tempo, algo atípico tratando-se de Kim Seokjin e Jung Hoseok e dos seus tão similares instintos vingativos.  

Era como aquela calmaria que costumava anteceder uma grande tempestade... 

Namjoon fitou o chão por um momento e, só então, percebeu o cadarço do tênis direito desamarrado. Abaixou-se na direção do velho e surrado calçado e se colocou a amarrar o mesmo sem nenhuma pressa, já que os dois adolescentes não tinham nenhum destino certo em mente. 

Depois disso, tudo aconteceu muito rápido. Os dois costumavam fazer aquele mesmo caminho todos os dias na volta da escola, passando pela casa de Namjoon e indo até a de Yoongi depois, e aquela rua em específica era a menos movimentada de todas as que os dois adolescentes habitualmente percorriam. Estreita e repleta de comércios falidos pelos grandes e recém-inaugurados centros comerciais no centro da cidade, o lugar era tomado por um silêncio anormal na movimentada Daegu — o que permitiu que os amigos acabassem escutando a aceleração repentina do carro que os seguia com certa antecedência. Namjoon, ainda agachado e com ambas as mãos segurando o seu cadarço, instintivamente pensou em levar as mesmas até o peito do Min quando ele viu os faróis altos do carro se aproximando do amigo, ainda que estivessem em plena luz do dia. Com a mesma rapidez com a qual o Kim se reerguera e empurrara o amigo para longe da mira do carro em alta velocidade, o mais novo acabou entrando na frente do próprio. Logo em seguida, o som estrondoso fez alguns pássaros numa árvore próxima da cena voarem para longe, mas Kim Namjoon acabou não sentindo nada além do forte impacto lançando o seu corpo para longe. 

Assim, Namjoon, que caiu no chão já desacordado, teve toda a sua juventude roubada de si no exato instante em que os seus olhos se fecharam. Quando os mesmos voltaram a se abrir, meses depois do ocorrido, ele já não se lembrava mais de quem costumava ser. 

 

*** 

 

O coração do Kim estava fora de controle de tão acelerado e, por um momento, ele sentiu que tinha parado de respirar. Abriu os olhos desesperado por algum fôlego e, no mesmo segundo, tudo com o que tinha acabado de sonhar desapareceu das suas memórias — ele conseguiu, no máximo, capturar em sua mente traiçoeira uma única imagem de faróis redondos e de uma luz muito forte para ser encarada diretamente vindo na sua direção. Na verdade, aquela era a primeira vez na qual ele conseguia se lembrar de alguma cena de um dos seus pesadelos, por mais mísera e rápida que a mesma fosse. Antes de mais nada, fez questão de firmar bem aquele par de faróis na sua cabeça, como se quisesse entalhar a imagem no seu próprio cérebro, já que nada que vinha de sua mente tão falha e vazia de memórias poderia ser descartado.  

Em seguida, Namjoon finalmente se deu conta de que deveria, ao menos, se localizar e saber aonde tinha acordado. Olhou ao redor e, mesmo que a sua cabeça doesse e os seus olhos pesassem, ele rapidamente conseguiu reconhecer o ambiente. Só tinha estado ali uma única vez, contudo, o apartamento de Shinhye exalava uma essência inconfundível, uma mistura confusa de café com algum cheiro cítrico que tinha se fixado com uma certa facilidade na memória sensorial de Namjoon. Assim, dando uma rápida olhada ao seu redor, o Kim se viu deitado no sofá da terapeuta exatamente como da última vez. 

— Outro pesadelo? — ele ouviu a voz arrastada se fazendo presente, mas não se assustou com a mesma.  

Olhou para o lado e encontrou Shinhye sentada naquela poltrona aveludada vermelha que decorava o canto da sua sala de estar — estranhamente ou não, ele também se lembrava da pequena peça de mobília. A Kim usava a mesma roupa do dia anterior e, por um momento, Namjoon se perguntou o quão corrido tinha sido o seu dia para ela ainda vestir as roupas que tinha ido ao funeral do tal Kim Seokjin, ainda que não fizesse ideia de que horas da manhã seriam naquele momento. Seus olhos estavam fundos e circulados por um tom mais escuro, o que denunciava com nitidez o cansaço que a terapeuta sentia. Aquilo atrelado à pele mais pálida do que o normal acabou chamando a atenção de Namjoon, mas o Kim não achou que aquele fosse o melhor momento para perguntar o que tinha acontecido a ela; afinal, tinha muito o que questionar sobre si próprio.  

Bem, pelo menos Shinhye não segurava nenhuma frigideira daquela vez, o que fez daquela manhã um pouco menos bizarra do que a última na qual acordara naquele mesmo apartamento. 

— Aparentemente. — ele respondeu à primeira pergunta da Kim vagamente, colocando-se sentado no sofá. Sacudiu a cabeça, sentindo uma dor aguda atingir a parte frontal da mesma. — O que aconteceu? 

— Você não se lembra? — a mulher rebateu, descrente. Descruzou as pernas e se inclinou para frente, como se quisesse ver e analisar melhor a expressão no rosto de Namjoon. O Kim, por sua vez, encontrou uma dureza que nunca tinha visto antes dominando a face exausta da mesma. — Não se lembra de me ligar no meio da noite? De estar perdido? De acordar, de novo, coberto de sangue num beco escuro? 

As palavras cuspidas acabaram atingindo em cheio Kim Namjoon, que não conseguiu acreditar de primeira no que estava ouvindo.  

— O que? Isso não é possível... — ele murmurou em completo choque. — Por favor, me diga que isso não aconteceu de novo.  

— Eu posso fazer melhor. — Shinhye não hesitou em rebater. Fitou Namjoon uma última vez e se levantou, sumindo por um breve momento do campo de visão do mesmo em direção a algum outro cômodo da casa e retornando com algumas roupas emboladas em mãos. Aproximou-se do Kim e lançou as peças no colo do mesmo, que não entendeu o que estava acontecendo. — Toma, são suas. São as roupas que você estava vestindo ontem quando eu lhe encontrei.  

Shinhye não fazia ideia de que, um par de quadras depois de uma cena tão brutal de assassinato como a que tinha visto na noite passada, encontraria Kim Namjoon encolhido em um beco escuro, completamente perdido. Ela precisou dar a volta no quarteirão devido ao cordão de isolamento policial — o que lhe custou um bom tempo, já que ela ainda estava chocada demais com o rosto sem vida de Hoseok e com o mesmo preso em sua memória, quase sem forças suficientes para deixar aquela cena para trás sem dizer nada a ninguém — mas o GPS no seu celular não lhe levou para muito longe. Estacionou o carro diante da alfaiataria que procurava assim que a encontrou e desceu do mesmo a passos lentos, como se estivesse com medo do que estava prestes a encontrar. 

E ela estava apavorada, de fato. Depois de ter visto o cadáver de Jung Hoseok com os seus próprios olhos, ela por muito pouco não tinha entrado em colapso na própria cena do crime. 

Alguns poucos metros depois do carro, Shinhye encontrou uma figura que, distorcida pela escuridão da noite, estava sentada no chão do beco ao lado da alfaiataria e com o rosto escondido entre as próprias pernas, emanando de si soluços quase imperceptíveis de tão baixos.  

— Namjoon? — ela indagou hesitante, ainda que já soubesse a resposta para a sua pergunta. 

A cerca de dois metros de distância de onde a terapeuta tinha parado, Kim Namjoon ergueu o rosto inchado e abatido diretamente na direção daquela voz. Sua face, ainda molhada pelas próprias lágrimas, estampava o terror por ter encontrado a si mesmo naquele estado ao acordar, mas também exibiu um miserável fio de esperança quando seus olhos pousaram na Kim.  

— Shinhye... — ele murmurou, sem forças. — Por favor, me ajude... 

E, então, o corpo de Namjoon relaxou e se esparramou pelo chão quando ele retornou para o seu estado inconsciente. Vendo o Kim praticamente desmaiar diante dos seus olhos, Shinhye automaticamente deixou de lado o medo que estava sentindo e correu até o mesmo, antes de tudo se certificando de que Namjoon ainda respirava. Felizmente, a respiração do Kim estava normal, inclusive estranhamente relaxada para uma situação como aquela. 

Ele estava dormindo. 

Shinhye o fitou com mais cuidado, se perguntando como diabos Namjoon poderia ter acordado num lugar como aqueles sem sequer fazer ideia de como tinha ido parar ali, ligado para mesma implorando por socorro e esperado até que ela chegasse para se render ao seu sono novamente. Aquilo não poderia ser algo natural, Kim Namjoon não podia simplesmente apagar daquele jeito... Ele deveria estar sob o efeito de alguma coisa e aquela era a única explicação minimamente plausível que Shinhye conseguia aplicar naquela situação ocorrendo bem diante dos seus olhos.  

Contudo, aquela não deveria ser a sua prioridade naquele momento. A Kim conseguia ouvir o som das sirenes que tinha encontrado bloqueando o seu caminho há pouco tempo, isso devido à proximidade absurda que os dois estavam do local do crime. Conhecendo o protocolo da polícia de cor e salteado para situações como aquela, Shinhye se perguntou como as buscas por algum suspeito ainda não tinham sido iniciadas onde o corpo tinha sido encontrado e nas suas áreas adjacentes, sendo assim, consequentemente, o único motivo para Namjoon ainda estar livre naquele momento. No calor do momento, a Kim preferiu encarar aquilo como alguma espécie de sinal divino para que ela e Namjoon saíssem dali o mais rápido possível, então foi isso que ela decidiu fazer. Com certa dificuldade, já que o corpo desacordado pesava mais do que aparentava normalmente, ela conseguiu erguer o Kim e escorar o mesmo até que os dois alcançassem, aos tropeços, o carro que Shinhye usara para chegar até o mesmo.  

Céus, estava colocando um suspeito sólido de assassinato dentro do carro do seu assistente. 

Quando finalmente conseguiu abrir a porta traseira, Shinhye se apressou para empurrar Namjoon para dentro do veículo, deixando-o deitado sobre o banco. Pelo menos, se passassem por algum carro de polícia ou algo do tipo, ninguém conseguiria vê-lo ali atrás — e, felizmente, o carro de Haechan era grande e largo o suficiente para comportar toda a altura de Namjoon sem maiores dificuldades. Bem, a menos que fossem parados por algum oficial. Não havia nenhuma outra saída, então o melhor que podia fazer era evitar qualquer sinal de polícia feito uma perfeita fugitiva procurada.  

Foi então que, ao fechar a porta do carro, Shinhye se deparou com as suas mãos borradas de vermelho. Olhando mais atentamente para as mesmas, ela percebeu que se tratavam de manchas de sangue, o que automaticamente a apavorou. O líquido avermelhado ainda estava relativamente fresco nas roupas de Namjoon, dada a quantidade do mesmo e o frio que fazia naquela noite, e tinha passado para as mãos dela conforme ela erguera e apoiara o Kim por aquele breve caminho até o veículo.  

O sangue de Hoseok, agora, também estava nas suas mãos. Talvez, se ela tivesse tratado Namjoon de um modo mais eficiente ou, ainda, o denunciado de vez para a polícia quando o encontrara, nada daquilo estaria acontecendo. O sangue de outra pessoa, com quem tinha até trocado algumas palavras naquele mesmo dia, manchava as suas mãos tanto no sentido figurado, quanto no literal.  

— Eu deixei Jung Hoseok morrer... — sussurrou para si mesma, em choque. 

Passou alguns segundos assim, num estado completamente paralisado, até perceber que aquele era um caminho sem volta. Hoseok, assim como Seokjin, já estava morto e ela já tinha feito o que fizera, não havendo nenhuma fórmula mágica para reverter acontecimentos do passado. Sendo assim, ela sacudiu a própria cabeça e, retomando seus sentidos, voltou a focar no seu único objetivo naquele momento: escapar dali e chegar até o seu apartamento em segurança, sem ser vista por ninguém. 

E assim ela conseguiu fazer. Já era madrugada quando chegou no seu prédio e, entrando pela porta dos fundos, conseguiu subir até o seu apartamento sem ser avistada. Carregava Namjoon apoiado nos seus ombros, passando a imagem para alguém que pudesse vê-los de que estava trazendo, no máximo, um homem bêbado para dentro da sua casa. O sangue nas roupas do Kim já tinha secado e, por se tratarem de peças escuras, felizmente já quase não era mais visível.  

E então, ela repetiu a mesma rotina da última vez. Deitou Namjoon no seu sofá e o limpou — a diferença era que, daquela vez, ela sentia o estômago fortemente embrulhado conforme o fazia. Ao invés de jogar as roupas do homem fora como já tinha feito, ela as deixou jogadas em algum canto do banheiro, já que sequer conseguia fitar as peças sem se lembrar de tudo o que tinha feito e ainda estava fazendo. Passou a noite inteira em claro, sentada naquela poltrona com os olhos presos em Namjoon e, pela manhã, o fato de que cada pequena parte do seu corpo doía e clamava por um descanso decente ainda não era a sua maior prioridade.  

Precisava colocar um ponto final naquilo tudo e de uma só vez. 

— Eu estava na sua vizinhança de novo? — foi o que o Kim conseguiu perguntar, ainda amedrontado pelas roupas sujas caídas no seu colo. Da última vez, ele não tinha visto as peças que usava quando Shinhye o encontrara e, por isso, talvez a realidade não tivesse o atingido com tanta força antes. 

— Não. Na verdade, eu o encontrei do outro lado da cidade. —  Shinhye respondeu mais duramente do que Namjoon conseguiu notar, já que ele ainda fitava as roupas sujas de sangue. — E foi por muito pouco, diga-se de passagem. 

— Eu peço desculpas, de verdade. — ele disse, finalmente a fitando. A Kim estava de pé próximo ao sofá e, por isso, ele precisava erguer a cabeça para encará-la. — Céus, eu nem sei o que dizer... Eu... 

— Uma pessoa morreu, Kim Namjoon. — ela o interrompeu, calando o Kim de uma única e bruta vez. — Na verdade, duas pessoas morreram. Uma na porta do meu prédio quando eu o encontrei aqui do lado e, a outra, a poucas quadras de onde eu o encontrei ontem.  

Namjoon congelou, fitando a terapeuta com a mente completamente vazia por um breve instante. 

— O que você disse? — ele sussurrou num misto de abalo e confusão.  

— Eu disse que tem gente morrendo, Kim Namjoon! — a terapeuta exclamou. — Eu disse que você sempre aparece desacordado e coberto de sangue a poucos metros de cadáveres! O que diabos você acha que eu quis dizer com isso?! 

— Não... — o Kim murmurou, ainda perdido em pensamentos. De repente, sentiu os olhos se aquecerem por lágrimas ainda tímidas, as quais expressavam o aterrorizante medo que sentia de si próprio naquele momento. — Eu não matei ninguém! 

Em agonia, Namjoon estava dizendo aquilo, na verdade, numa tentativa de convencer a si próprio.  

— Então quem matou? — Shinhye questionou enquanto sentia a exaustão tomar conta do seu corpo. — Você estava lá, Namjoon. Tinha sangue nas suas mãos e por toda a sua roupa, então como pode não ter sido você? Se você me der um argumento minimamente válido, eu juro que estou disposta a acreditar em você. Contudo, caso contrário, eu não sei se posso continuar fazendo isso... Na verdade, eu realmente não posso. 

Shinhye sabia que, depois de tanto esforço em ajudar Namjoon em silêncio e sem deixar que o rapaz soubesse de nada do que tinha acontecido, o jeito como estava o confrontando era, possivelmente, o pior de todos. Todavia, os horrores que tinha presenciado na noite passada aliados à fadiga que já a dominava estavam falando mais alto, nublando os seus mais afiados raciocínios e sentidos. 

— Eu... — o Kim balbuciou. — Eu realmente não sei o que está acontecendo comigo...  

— Mas eu sei. — Shinhye afirmou, séria. O esgotamento começava, até mesmo, a diminuir o tom da sua voz, mas ela não se fazia menos firme por conta disso. — E, por isso, eu quero que você saia agora de dentro da minha casa. 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Quero saber dos sentimentos de vocês em relação a esse capítulo kkkk.
Caso não tenha ficado muito claro, a primeira metade inteira do capítulo (em itálico) foi o sonho do Namjoon, que na verdade, também é uma memória. Enfim, é isso.

Até breve!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Meu querido sonâmbulo 2" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.