THEON GREYJOY

Theon achava difícil explicar sua relação com a família Stark.

Sendo filho do motorista e da governanta, ele tinha tudo para ter sido criado como apenas mais um dos empregados da mansão Stark. Se fossem uma família normal, a vida de Theon teria sido limitada ao quartinho dos fundos e à escola pública no bairro vizinho.

Felizmente, o rapaz tivera sorte. Mais do que sorte, ele tivera Ned e Catelyn em sua vida.

Os patrões de seus pais jamais deixaram que Theon se sentisse inferior aos seus filhos. Sempre cuidaram do menino como se este fosse mais um dos jovens Starks, arcando com todas as suas despesas e, inclusive, fazendo questão que o jovem rapaz estudasse na mesma escola que Robb, Sansa, Arya, Bran, Rickon, e  Jon, o sobrinho do senhor Stark.

Catelyn e Ned tinham cinco filhos e um sobrinho, mas não se incomodaram em adotar mais um.

Eles até haviam tentado, logo quando Theon entrou na puberdade, dar um quarto no andar principal da casa para o jovem, mas Alannys e Balon, seus pais, não permitiram. Aquilo era extrapolar os limites e até mesmo o mais liberto dos empregados deveria saber seu lugar. Era como se ele conseguisse ouvir a voz de seu pai.

Quando crescido, Theon foi estimulado a entrar na faculdade e a ocupar um bom cargo na Westeros S/A. Ned se orgulhava em dizer que o rapaz era de sua mais alta confiança e que nunca havia sido decepcionado por Theon, em uma clara afronta a Robb. O mais velho dos filhos de Ned e Catelyn se recusava veementemente em ocupar o espaço que lhe era devido na empresa e, talvez por isso, Theon e ele não se davam tão bem.

Tendo a mesma idade que Theon, Robb o julgava abertamente por suas escolhas. Eram declaradamente desafetos, já que o mais velho dos Starks não entendia que algumas pessoas simplesmente não tem escolha. 

O jovem Greyjoy até concordava com Robb com relação à empresa. As práticas e métodos da Westeros eram mais do que questionáveis e, por conseguinte, o caráter dos seus principais acionistas também. Mas Theon acreditava, mais do que tudo, em oportunidades. E ele costumava agarrar todas as que apareciam.

No fundo, Robb Stark e seu temperamento passivo-agressivo eram os menores de seus problemas. Havia outra Stark que o atormentava muito mais.

Enquanto subia as escadas em rumo ao quarto de Sansa Stark, Theon se lembrava de como a convivência na mansão havia aproximado os dois até que, eventualmente, se tornassem o que eram agora: Melhores amigos.

O título nunca havia incomodado Theon até… Até Sansa crescer.

No andar de baixo, a festa rugia, atingindo seu ápice. Theon sabia que Sansa era a única dos Stark a se retirar tão cedo de uma festa tão animada e essa era uma das coisas que ele mais admirava na garota.

Sim, garota, ele fazia questão de se lembrar constantemente. Cinco anos de diferença separavam as idades dos dois e Theon precisava controlar seus instintos e ter em mente que Sansa era como uma irmã mais nova. Nada além disso.

Mesmo assim, se voltasse no tempo, jamais acreditaria que aquela garotinha gentil, que o seguia por todos os lugares e que o defendia de Robb, se tornaria a mulher imponente, graciosa e curvilínea que era hoje.

— Boa noite, lady Stark. - Theon disse depois de dar suaves batidas na porta de madeira maciça do quarto da menina, que, como sempre, estava entreaberta.

— Lady Stark… - A garota o fuzilou com o olhar, fazendo sinal para que ele fechasse a porta. - Será que você poderia ser menos debochado?

Sansa estava de costas para a porta e encarava Theon pelo espelho da grande penteadeira branca em que ela estava sentada. Pacientemente, a mais velha das irmãs Stark desmanchava o elaborado penteado, deixando seus cabelos ruivos caírem como cascatas em suas costas.

— Desculpe. Eu não consigo evitar. - Theon deu de ombros, se sentindo meio deslocado no meio do imenso quarto de Sansa. - Por que as pessoas te chamam assim?

— Eu não sei. - Ela continuava penteando os cabelos e, só então Theon percebeu que Sansa vestia apenas um roupão branco. - Eles são muito formais na minha presença. Acho que meu pai e Robb são um pouco intimidadores.

Tentando ignorar a falta de roupas da moça, Theon cruzou os braços, permanecendo completamente imóvel no centro do quarto de Sansa. Sua presença grosseira em meio aqueles móveis refinados e delicados fazia parecer que um elefante havia acabado de entrar em uma loja de cristais.

— Não para mim. - Ele meneou com a cabeça, sendo sincero.

— Nunca para você. - Ela abriu um pequeno sorriso, assentindo lentamente com a cabeça. 

— Então… Por que me chamou aqui? Algo aconteceu?

— Além dessa noite exaustiva? Nada. - Sansa deu de ombros, seu rosto adquirindo um semblante taciturno. - Te chamei aqui porque queria ver alguém antes de dormir. Você entende, né? Alguém… Familiar.

E por que não um de seus irmãos? No mesmo momento em que esse pensamento surgiu, Theon o afastou de sua mente. Sabia que a relação de Sansa com seus irmãos não era exatamente próxima e amistosa.

Os Starks, apesar de unidos e leais, costumavam deixar suas diferenças bem claras.

Não conseguiu deixar de pensar, também, em como o tempo de convivência com Sansa o havia colocado nessa posição. Um amigo, um irmão. Um elefante em uma loja de cristais.

— Claro, Sansa. - O rapaz assentiu, arrancando um mínimo sorriso dela. - Eu entendo.

Sansa soltou suspiro cansado e largou a escova de cabelo, fazendo um sinal com a mão para que Theon se sentasse em sua cama.

— Tive que passar a noite fugindo dos sócios do meu pai. Todos eles tentam me empurrar seus filhos. - Como em um passe de mágica, um bolo se formou na garganta de Theon. - O Robert Baratheon insiste para que eu conheça melhor seu filho Joffrey… 

Sansa não precisava ter enfatizado as palavras para que Theon compreendesse o que ela queria dizer.

— O remelento arrogante? - Sentado na cama imensa e confortável da garota, Theon não podia se sentir mais desconfortável do que se sentia. Engoliu seco, torcendo para que a raiva que instantaneamente passou a sentir pudesse descer junto com a saliva.

— Sim! O próprio! - Sansa jogou as mãos para cima, em um ato de pura frustração. - E como se não bastasse, Mace Tyrell vive tentando forçar algo entre mim e Loras. 

— Só um cego não veria do que Loras realmente gosta.

— Não seja maldoso, Theon! Loras é diferente de você… - Theon estreitou as sobrancelhas, procurando entender o que aquela frase queria dizer, mas Sansa logo se corrigiu. - Quer dizer, de vocês. Rapazes. Enfim, por último, o louco Aerys Targaryen cismou que eu deveria dançar com Viserys, seu filho. Sinceramente, não há nada no mundo que eu pudesse querer menos.

Com isso, a garota se levantou, tomando o rumo do grande closet anexado ao quarto. Theon elevou o tom de voz para que ela pudesse ouvi-lo.

— Pelo visto, todos eles descobriram que você completou 20 anos, Sansa. Você é a filha mais velha de Ned Stark. Acho que deve se acostumar a ser cortejada…

Respondeu o que considerou racional, mas, em seu estômago, algo se agitava com força. De jeito nenhum gostaria que Sansa se acostumasse a cortejos de homens mais velhos e mais ricos que ele.

— Bobagem a sua! - A ruiva respondeu, saindo do closet.

A visão que Theon teve, fez seu queixo cair. 

Sansa usava uma camisola fina e delicada, de seda preta, que criava o contraste perfeito entre seus cabelos vermelhos e sua pele alva. Além disso, a lingerie destacava seus seios. Theon se remexeu na cama, mais desconfortável do que nunca.

Ela não percebeu e continuou impassível, falando sobre a festa.

— Então, você não me disse como foi a sua noite. Ros e Jeyne Poole não tiravam os olhos de você.

— É… - O rapaz engoliu seco. - Claro. 

Tentou cortar o assunto. Não se sentia confortável para falar sobre aquilo com Sansa. Ainda mais com ela naqueles trajes.

— E… - Sansa gesticulou, estimulando Theon a continuar. - Qual é, Theon? Você não se interessa por garota nenhuma?

Sim, por você! Ele quis responder, mas se conteve.

— Claro que sim, Sansa. Eu e Ros já… Hum… 

— Transaram?

— Sansa! - Ele berrou, repreendendo a garota. Se Robb sonhasse que estavam falando sobre aquilo, com Sansa vestida daquela forma...

— O que? Eu tenho 20 anos, Theon! - Ela se jogou na cama, ficando deitada de bruços. - Eu sou virgem, mas não sou uma criança.

Uma fisgada no baixo ventre quase fez com que Theon perdesse a cabeça. O rapaz precisou desviar os olhos para o teto para manter a sanidade.

— Seu irmão me mataria se me visse aqui com você falando desse jeito..

Sansa bufou, sem se preocupar.

— Robb sabe que você é o meu melhor amigo.

Essas palavras, com a ênfase que tinham, soaram como um balde de água fria em Theon. Exatamente o que ele precisava.

— Eu acho melhor ir… - O rapaz se levantou, encarando o chão.

Antes que chegasse até a porta, Sansa o chamou.

— Theon, espera. Por que você nunca me contou sobre a Ros?

Ele suspirou. Se você soubesse a verdade, nunca mais me veria da mesma forma...

— Porque… Eu nunca pensei que você fosse se interessar em saber.

— Se fosse o contrário… Você não se interessaria em saber com quem eu ando… - Ela parecia procurar as palavras corretas. - Me relacionando?

Não.

— Claro. - Theon mentiu. - Desculpa, você tá certa. Boa noite, lady Stark.

— Boa noite, Theon.