Vida Dupla escrita por Satine


Capítulo 4
Capítulo 3




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Já fazia seis meses desde que Gustavo tinha sido adotado e ele nunca a tinha visitado, feito uma ligação, mandado uma mensagem. Elena tinha chegado a ir ao orfanato pedir um número de contato do pai adotivo do seu melhor amigo, mas a informação era confidencial, eles não podiam passar.

Algumas vezes, Elena chorava sozinha no seu quarto, mas logo depois se forçava a esquecer e seguir com sua vida.

Ela sempre se lembrava de Guto quando estava indo para a pista de skate. Arrumou o cabelo, avisou a mãe e saiu de casa.

Estava de férias da escola, depois de um ano em que quase não tivera aulas de matemática. A perspectiva de futuro era péssima. Como ela pensaria em um vestibular, se nem aula tinha?

Elena afastou esse pensamento para um melhor. Lucas. Era o nome do garoto que ia encontrar na pista de skate. Estavam juntos, mas não era nada sério. Ele tinha dito que estaria lá naquela tarde e Elena foi esperançosa.

Desde que Guto tinha ido embora, ela nunca mais andara de skate, afinal ela sempre usava o dele. Então apenas se sentou em um banco do parque e esperou Lucas aparecer.

A tarde começou a cair, o sol desaparecer no horizonte. Elena perguntou dele para os amigos e começou a se sentir envergonhada, humilhada. Todos que passavam ali olhavam para ela, como se tivesse escrito em sua testa: a idiota que levou um bolo. Guto nunca faria algo do tipo com ela.

Voltou para casa no início da noite, prometendo a si mesma que nunca voltaria naquele lugar. Não tinha mais motivo para isso.

***

O garoto jogou a mochila para o outro lado do portão. Tinha que ser ágil e rápido, pois assim que saísse, as câmeras de segurança avisariam Saulo.

Escalou o portão o mais rápido que conseguiu com a agilidade adquirida em fugas do orfanato e da escola. Estava chovendo, o que atrapalharia um pouco a visão das câmeras e também a escalada. Seu pé escorregou algumas vezes no portão, mas logo estava do outro lado. Pegou a mochila no chão, jogou-a nas costas e correu.

Todas as casas pareciam iguais, enormes e luxuosas. Ele nem parava para olhá-las. As ruas eram iluminadas como poucas no subúrbio onde vivia, o que não ajudaria muito caso ele precisasse se esconder, então ele tinha que ser rápido.

Seus pulmões e pernas doíam, a chuva atrapalhava na visão caindo em seus cílios longos, mas ele não parou de correr. A imagem de Elena em sua mente era um combustível para continuar. Gustavo parou assim que chegou na avenida. Tentou parar vários táxis, no entanto nenhum queria levar um garoto encharcado.

— Anda logo. Parem! — resmungou Gustavo, quase entrando na frente dos carros.

Decidiu pegar o celular. Único objeto dos que tinha ganhado, além da mochila, que estava levando consigo. Precisava encontrar algum ônibus que o levasse de volta para casa.

Conseguiu pegar um ônibus que o levaria até uma estação de metrô. Sentado sozinho em um banco, ele desejou que Elena tivesse um celular ou saber o telefone da casa dos pais dela. Tremeu a perna durante todo o trajeto devido a ansiedade e medo de ser pego antes de atingir seu objetivo, puxou os cabelos trás e torceu um pouco as roupas.

O ônibus diminuiu a velocidade e entrou no terminal. Assim que se aproximou da porta do ônibus, deixou a mochila cair. Saulo estava parado na porta, acompanhado por dois seguranças altos, fortes e carecas. Nem valia a pena tentar correr, embora ele tivesse avaliado a situação, teria que ter muita sorte para conseguir pegar um metrô antes que as duas montanhas o alcançassem.

— Dá próxima vez que for tentar fugir, desligue o GPS do celular — avisou Saulo, o puxando com força pelo braço. Ele se desequilibrou no último degrau e caiu no chão. Saulo o levantou pela orelha. — Moleque ingrato.

— Eu só queria visitar meus amigos — Gustavo quase gritou atraindo a atenção de algumas poucas pessoas no terminal tão tarde da noite.

— Já te disse que você não vai ter mais nenhum contato com aquela gentinha pobretona e pestilenta. — O velho o jogou para dentro de um luxuoso carro preto, entrou e deu um tapa no rosto do garoto.

Gustavo se afastou o máximo que pode, agarrou a mochila e ficou olhando para a janela.

— Você é um moleque ingrato. Te dei de tudo e você me agradece fugindo. Precisei chamar Tatiana antes da hora. Mais despesa. Vai chegar uma hora que você vai ter que me retribuir por tudo isso, garoto.

O restante da viagem foi silenciosa. Gustavo engoliu as lágrimas e assim que chegou na mansão, correu para dentro de seu quarto. Ele não tinha companhia nenhuma ali além dos seus muitos computadores e jogos de videogame. Para um garoto que sempre tivera muitos amigos aquilo era o inferno e tinha também Elena, que era de quem mais sentia falta.

Pensando estar sozinho, Guto se jogou na cama e deixou que as lágrimas antes contidas rolassem o mais silenciosamente que conseguiu. Sem nem se importar que sua roupa encharcada estivesse molhando os lençóis de seda.

— Ôh garoto — ele ouviu uma voz feminina forte e uma mão pesada lhe afagar os cabelos. — O que você foi fazer?

— Sai daqui.

— Não posso. Sou sua guarda pessoal agora. É o meu trabalho. — Gustavo levantou os olhos e encontrou Tatiana. Ela não era como os guardas comuns, não era alta, forte e musculosa, pelo contrário, era baixa e gorda, tinha um sorriso acolhedor e doce, mas uma arma na cintura.

— Por que ele me adotou? Parece que estou em uma prisão luxuosa, nunca vejo a cara de ninguém aqui, bom, pelo menos ninguém que não me trata por “senhor”.

— Vamos fazer o seguinte então, eu prometo que nunca vou te chamar de senhor. — Gustavo sorriu um pouco.

— Por que fugiu, Gustavo? Para onde estava querendo ir? — perguntou Tatiana. O garoto a olhou desconfiado. Tinha a impressão de que se contasse, ela diria tudo para Saulo, mas naquele momento, ele estava cansado de se manter arisco. Ele se sentou e tirou os tênis.

— Queria ver uma pessoa. Uma amiga.

— Uhmmm, uma amiga — ela comentou com malícia e ele riu.

— Ela é ótima, anda de skate e é inteligente, me passava as respostas na escola. Era minha melhor amiga.

— Ela parece uma ótima pessoa. Infelizmente o Sr. Saulo é um pouco preconceituoso com pessoas que não são da mesma classe que a dele.

— Me deixa ir, Tatiana. Por favor.

— Eu gostaria de poder deixar garoto, mas só vou começar a trabalhar diretamente para você depois que completar dezoito.

Gustavo fez uma careta.

— Espero um dia poder conhecer ela.

— Com certeza, você vai, Tati. Agora, quer jogar um pouco?

— Jogo de tiro. Você nunca vai me vencer, garoto — disse a segurança. — Eu jogo com você, depois que tomar um banho e tirar essas roupas molhadas.

 


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