Tô Nem Aí escrita por Youth


Capítulo 7
007. Uma Crise no Destino




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A estagiária, secretária e braço de direito de Dominic, Vivi, havia ligado bem cedo para Alexei, assustada, questionando se ele sabia de onde o chefe se encontrava, pois, aparentemente, não havia dormido no estúdio. Alex, não indiferente a situação, afirmou que não havia visto Domi desde a sessão de fotografias no dia anterior, e que ajudaria no que precisasse – ainda que o ex tivesse feito sua vida um inferno, ainda tinha empatia o suficiente para se preocupar com o seu bem-estar.

− Ah – Vivi disse ao telefone – Acabaram de tocar o interfone. Acho que ele chegou – afirmou. Alexei revirou os olhos, arrependido de ter demonstrado preocupação com Dominic, que, provavelmente, havia se enfiado na casa de algum amante e passado a noite por lá mesmo, sem sequer avisar a moça que tanto trabalhava para lhe agradar. Estava prestes a desligar o telefone quando Vivi interveio – Ei! – ela disse rapidamente – Podemos tirar um tempo para conversar? – suplicou. Alexei suspirou profundamente, alisou a nuca e se questionou se seria ou não algo que ele estava pronto para encarar.

− Vivi, eu...

− Por favor! – ela suplicou – É importante! – a voz da garota pesava em desespero. Alexei suspirou profundamente, fechou os olhos e encarou a própria insegurança, como havia prometido para si mesmo que faria, e disse.

− Tudo bem.

 

Estava diante do espelho, penteando os novos cabelos coloridos e imaginando mil e um assuntos que Vivi queria tratar consigo durante o café, que haviam marcado para o finzinho da tarde, quando bateram na porta. Alexei ajeitou a camiseta azul-marinho meio amassada, deu uma última olhada no próprio reflexo e foi até a entrada do apartamento.

− Oi... – Sehu disse, com um olhar entristecido, com lágrimas quase transbordando dos cantos dos olhos. Alexei engoliu seco, admirado.

− Sehu... O que houve? – questionou curioso. Sehu, que até o momento tinha se mantido firme e forte, despencou como uma tempestade passageira, se jogando nos braços do amigo e chorando copiosamente como uma criança birrenta. Alex não soube o que fazer além de dar leves tapinhas nas costas do amigo – Vai ficar tudo bem... – ele repetia freneticamente, com uma voz dotada de compadecimento e curiosidade.

Sehu só se acalmou quando Alexei lhe presenteou com torradas com uma pasta de batata-doce, saciando seu vício por açúcar, sem comprometer sua saúde. Ainda aos soluços, comia pequenos pedacinhos de pão com altos montes de pasta. Alex lhe encarava com um olhar preocupado, aguardando explicações.

− Ela quer um tempo, cara – ele afirmou, finalmente. Alexei admirou-se. Leia e Sehu pareciam um casal para a eternidade – Ela disse que não sou maduro o suficiente... Só porque eu levei na brincadeira ter reprovado de novo no exame de habilitação! – tecnicamente ela não estava errada, mas, para Alexei, a imaturidade de Sehu era praticamente parte de sua personalidade, junta da dificuldade de raciocinar plenamente. Alex suspirou e encarou o amigo com um olhar fraternal.

− Sinto muito, Sehu – ele disse, tocando o braço do amigo para lhe passar confiança. Sehu continuava a soluçar, mas forçou um olhar impassível, ardiloso e magoado.

− Ah, quer saber – ele disse, tentando parecer mais confiante, sendo que a voz estava dotada de insegurança e arrependimento – Não ligo mais... Nem lembro dela... – afirmou. Alexei tinha suas dúvidas quanto a isso. Sehu e Leia eram como unha e carne, clara e ovo. – Seu cabelo, cara... – Sehu disse, finalmente percebendo o novo visual do vampiro, com um olhar curioso e as lágrimas nos cantos dos globos oculares – Ficou muito maneiro – e de repente despencou a chorar novamente, como uma cascada vívida de lágrimas salgando o doce da pasta de batata – Ela tem um cabelo tão lindo... – e lá vamos nós de novo, Alexei pensou, suspirando.

Demorou muito para que Sehu se recuperasse e voltasse para o próprio apartamento, onde poderia chorar aconchegado na própria cama, como havia dito que faria. Alexei prometeu trazer ao amigo um pedaço de bolo com açúcar de verdade quando voltasse do expediente na confeitaria – o que ele não sabia se devia ou não fazer, visto que ainda tinha medo de Leia e também se preocupava com a saúde do amigo.

 

Alexei mal botou os pés na cozinha e já estava de avental, trabalhando na primeira encomenda do dia: um bolo de chocolate com amêndoas, aromatizado com baunilha e com glacê dourado, para a festa de quinze anos da filha de um médico das redondezas da rua. Day Flores e Teresa trabalhavam ininterruptamente no atendimento da confeitaria, vendendo pedaços de bolo e doces para que as pessoas comessem ali mesmo e anotando encomendas para serem entregues até o fim do mês.

O dia estava particularmente movimentado, quando Alexei lembrou-se que estavam próximos do dia dos namorados. Havia estado tão distante de tudo nos últimos dias que sequer se lembrava dessa data tão lucrativa para a Veludo Vermelho. As amigas, dando a alma para poder se organizar naquela confeitaria extremamente movimentada, agradeceram aos céus quando Alexei decidiu que ficaria também no balcão naquele dia, ajudando a servir mesas, anotar pedidos e realizar encomendas – algo que ele detestava explicitamente. Sua felicidade era botar a mão na massa e sentir toda a magia e toda alquimia de transformar quatro ou cinco ingredientes distintos num delicioso frenesi doce e viciante. Ainda assim, fazia questão de servir a todos com um sorriso simpático e agradecer a cada elogio ao novo visual ou aos bolos.

− Vocês fazem salgadinhos? – uma senhorinha perguntou quando Alexei servia sua mesa de bolo de fubá com café preto.

− Infelizmente não, senhora – Alexei respondeu entristecido. Ele amava fazer doces, mas salgados... É... Era melhor nem comentar. – Mas tem uma lanchonete aqui perto que faz alguns deliciosos! – afirmou.

− Entendo, entendo... Meu filho está precisando de alguns doces e salgados para a inauguração do centro dele aqui na rua – ela afirmou, com olhos esperançosos, enquanto provava do bolo e bebericava o café – Disse que viria aqui para encomendar alguns docinhos e talvez um bolo... Acho que logo ele vai chegar também... Você podia, sabe, passar o contato dessa lanchonete para ele? Eu mesma anotaria, mas ando péssima de memória... – ela afirmou com um olhar entristecido – Sessenta anos não é nada fácil, filho... – contou com um certo tom cômico. Alexei riu.

− Nem me fale – afirmou − Foi minha época mais confusa...– contou. A mulher olhou Alexei com um olhar confuso. O vampiro sorriu, envergonhado, pediu licença e se afastou, confirmando que passaria os dados da lanchonete para que o filho da senhora pudesse encomendar seus salgados quando ele chegasse.

Havia uma figura enorme, de quase dois metros, diante do balcão, sendo atendido por Day Flores, que tinha um semblante um pouco surpresa, ao passo que curiosa, com tamanha altivez do homem diante de si. Alexei o reconheceu pela altura: o senhor que lhe entregou uma rosa e ajudou a voltar para casa outro dia. Sorriu, se aproximou e se surpreendeu ao perceber que havia sido traído pela própria visão, deturpada pela escuridão noturna e pela emoção do momento, pois, aquele que ele alcunhou de "senhor", era um homem, até jovem, provavelmente na casa dos trinta ou quarenta. Tinha cabelos escuros num corte que se encaixava bem ao rosto, perfeitamente alinhado, com olhos castanho-mel, sorriso simpático e um corpo escultural, escondido pelo espesso sobretudo tom mogno-pastel. A camisa branca estava meio desabotoada, deixando alguns pelinhos do peito saírem pela borda. Quando se viu cara a cara com o homem, Alexei sorriu e arregalou os olhos com a surpresa da revelação.

− Ei, oi! – Alexei disse, em tom simpático e admirado. Teria estendido a mão para ele, não estando segurando uma bandeja de metal com pedaços de bolo. O homem encarou Alexei e sorriu de volta, algumas rugas surgiram no rosto e o deixaram com aparência mais agradável, mais humana e cada vez mais bonita.

− Ei! – ele disse à Alexei, se acocorando na bancada. Day Flores encarou os dois, com um olhar cheio de brilhos e paixões típico de uma fujoshi. – Você me prometeu um bolo! – ele afirmou. Alex sorriu.

− E não faço promessas em vão – disse – A propósito, Alexei. – se apresentou.

− Roman Medina – o homem disse, com um olhar confiante. – Sua confeitaria é muito bonita!

Alexei sentiu um murmurinho de timidez corroer seu estômago, mas se limitou a sorrir.

− Obrigado! – ele disse, sem saber exatamente o que falar. Em seguida, deixou a bandeja com bolos sobre o balcão e indicou à Roman uma mesa vazia – Aqui! Pode escolher o bolo que quiser! É por conta da casa! – contou. Roman se sentou, sorriu e encarou Alexei por alguns instantes, com um olhar meio bobo. Alex coraria de vergonha se sua condição de vampiro permitisse – Que foi? – questionou envergonhado. Roman sorriu novamente.

− Nada – ele disse – Só que, sabe, o bolo foi uma desculpa – ele afirmou – Queria te ver novamente. Você parecia tão perdido naquele dia... Queria saber se tinha ficado tudo bem! – contou. Alexei sentiu uma pontinha de emoção consumir seus pensamentos e esquentar o sangue em suas veias. Mal conhecia Roman e ele já demonstrava tanta preocupação e zelo... Chegava a ser estranho, mas um estranho intrigante e interessante.

− Eu estou... – ele começou a dizer, mas parou, pensou por uns instantes e respondeu – Eu estou ficando bem – corrigiu. Roman sorriu compadecido – Obrigado pela preocupação!

− Fico feliz e espero que tudo se resolva! – ele afirmou − Você tem um sorriso muito bonito para ficar apagado do rosto... – Alexei engoliu seco, envergonhado, sentindo todo labor da timidez atravessar seu ser de uma maneira frenética e dificultar todas as suas possíveis reações. Suas pernas tremiam, seu estômago revirava, cheio de borboletas, sentiu seus pelos de arrepiarem e as palavras fugirem da boca.

− Obrigado! Você também! – e foi tudo que soube dizer, antes de quase se derreter em amores pela intensidade da fofura do sorriso que Roman abriu, com um olhar compadecido e simpático. Alexei coçou a nuca, deixou o homem com o cardápio e pediu para que ele escolhesse, pois logo traria seu pedido. Antes de ir, no entanto, se desculpou por não lhe dar tanta atenção, pois a confeitaria continuava movimentada, e afirmou que guardaria alguns instantes para uma conversa depois.

− Eu espero – ele disse. E foi tudo que Alexei precisou ouvir para já começar a fazer planos do casamento dos dois, da casa que teriam, dos cachorros, dos gatos e até das samambaias que plantariam no jardim.

Alexei havia ido à cozinha buscar mais cupcakes de cenoura e chocolate para colocar na vitrine, quando finalmente teve um tempinho para poder conversar com Teresa e contar para a amiga sobre Roman, enquanto ajeitava os bolinhos em linha reta na bancada.

− Ele é bem alto – foi tudo que ela soube dizer, em um tom admirado. Alexei deu uma risadinha empolgada.

− E bem bonito – afirmou – Será que tenho alguma chance? – questionou. Teresa deu de ombros, com um olhar preocupado, enquanto anotava pedidos numa agenda. – Que foi? Que olhar foi esse?

− Nada – ela disse. Alexei parou tudo que fazia e encarou amiga, preocupado.

− Como nada, Tê? Esse foi seu olhar julgador! – afirmou. Teresa pensou em dizer algo, mas se calou. – Desembucha!

− É que... Não sei! – afirmou – Vai com calma, tá bom? Tenho medo de você se machucar de novo – contou, com um olhar maternal preocupado. Alexei sorriu, agradecido pelo compadecimento da amiga, lhe abraçou e deu um beijo em sua bochecha.

− Acho que não vai se repetir – afirmou convicto, enquanto voltou ao trabalho de ajeitar a vitrine – Dominic e Ignácio são o tipo de passados que não me machucam tanto agora.

− Não entendo o que houve entre você e o Ignácio – Teresa afirmou, ao passo que também questionou, com olhar curioso – Ele é bem bacana... – afirmou. Alexei revirou os olhos.

− Vamos deixar esse assunto pra lá... – suplicou. Teresa anuiu – Ei, aquela senhora ali na mesa – ele apontou para a senhorinha de mais cedo. Os olhos de Tê se arregalaram de surpresa – Teresa?

− Eita – ela disse. Alexei cerrou os olhos, desconfiado.

− Que eita foi esse? – questionou. Teresa engoliu seco.

− Foi só eita – afirmou, evidentemente escondendo algo.

− Foi nada – ele retrucou. Teresa suspirou profundamente, coçou os olhos e bufou.

− É a Consuela – afirmou – Consuela Cruz— Alexei encarou a amiga com um olhar confuso, se questionando se devia conhecer alguém com esse nome, quando Teresa interveio, suspirou e o encarou – Logo ela, a mãe do Ignácio – e tudo pareceu fazer sentido pela primeira vez. Alexei pôde sentir sua alma deixar o corpo e ficar mais branco que farinha de tanto medo, vergonha e ansiedade. Engoliu seco, sentiu seu coração acelerar e as palavras fugirem da boca – Ela é amiga da minha avó... Amiga de crochê.

Alexei encarou a amiga, com um olhar odioso, como se estivesse pronto para gritar e fazer um escarcéu de raiva, a pegou pelo braço e puxou para um canto afastado do balcão.

− VOCÊ CONHECIA O IGNÁCIO E NÃO ME FALOU?? – ele gritou, de maneira propositalmente abafada. Teresa se encolheu perto do amigo, com olhos surpresos e assustados.

− Não! Bem, sim... Talvez – contou. Alexei encarava a amiga com um olhar julgador extremo. Tê limpou o suor do rosto e engoliu seco – Talvez nós nos conhecemos desde criança... Mas nunca fomos tão próximos... – Alex continuava com o mesmo olhar sobre a amiga, sem nada dizer. Teresa suspirou – Ok... Ele é um primo distante. Talvez próximo... Enfim... Eu conhecia ele... Me desculpa!!! Eu não queria estragar nada entre vocês e também não queria forçar... Talvez eu tenha dito de você pra ele e tal... – Teresa tinha olhos redondos de arrependimento, com brilho tão contagiante quanto de um filhotinho esfomeado. Alexei ainda queria esganar a amiga.

− Teresa Castelhano: como você me deixou transar com um homem que tem esposa? Que tem filhos? Meu deus! – ele questionou, demonstrando toda sua raiva e todo seu arrependimento num sussurro quase psicodélico. Teresa arqueou as sobrancelhas e fechou o cenho, num olhar extremamente confuso, alisando os cabelos e sem saber o que dizer.

− Que? – foi tudo que saiu de sua boca. Alexei suspirou e limpou o suor da testa – Ignácio? Casado? Com filhos? – o nervosismo de Teresa era tanto que ela acabou rindo. Alex encarou a amiga com um olhar confuso.

− Eu vi a foto no celular dele! – contou. Teresa coçou a nunca, limpou os olhos e olhou ao redor.

− Bem, pode ser qualquer pessoa, mas não a esposa dele – ela afirmou convicta – Talvez a irmã dele, Vera... Sim! A Vera! Ela tem dois filhos... – respondeu. Alexei sentiu um alivio, bem como um arrependimento, percorrerem sua espinha e se alocarem dentro do coração. Havia se livrado do peso da consciência de ser o algoz de uma infidelidade casual, para se tornar um julgador nato, que havia perdido um homem por mera confusão do destino e por fruto das próprias conclusões precipitadas. O queixo de Alex havia ido parar no chão e todas as possíveis palavras fugiram desesperadas da ponta de sua língua, o deixando calado e com cara de bobo diante da amiga, que se limitou a olhar tudo, menos nos olhos dele.

− Meu deus – foi tudo que ele pode dizer, sentindo todo arrependimento consumir seu ser como um bando de gafanhotos desesperados consumindo uma plantação de milho. Alexei deu um leve tapa no próprio rosto, coçou os olhos e chacoalhou a cabeça. O sangue fervendo de vergonha nas veias, enquanto um tique fazia seu olho direito saltar. – O que diabos eu fiz? – ele se questionou, ainda incrédulo das próprias conclusões precipitadas. Suspirou, engoliu seco e lembrou-se que Roman ainda o aguardava para uma conversa... e também que, segundo Consuelo, Ignácio viria em breve à confeitaria provar dos doces e anotar o número da lanchonete de salgados.

Ok. Definitivamente era suma situação extremamente constrangedora e particularmente assustadora. Alexei, diante de um grande e momentâneo interesse amoroso, que aguardava esperançosamente por sua conversa e seu pedaço de bolo, estaria, provavelmente, na presença de um segundo e anterior interesse, com quem compartilhou a cama e as loucuras, e tirou conclusões erradas e extremamente constrangedoras. Meu deus!— Alexei pensou, para atear mais fogo ainda ao seu desespero – Chamei o Ignácio de Boboca.

Contemplando todos as nuances de suas desventuras amorosas, Alexei se viu diante de um dilema tentador e perigoso: ficar, e encarar os dois algozes de seu coração, ou fugir – e não encarar nada além de um belo pote de sorvete naquela tarde calorosa. É, definitivamente ele ia escolher a segunda opção.

Já havia tirado o avental e indicado para amiga à mesa de Roman para que ela pudesse entregar um pedaço de bolo e ele conseguisse escapar à francesa, enquanto ninguém dava por sua presença, quando dois fantasmas de seu passado entraram pela porta da confeitaria e pareceram perceber, simultaneamente, sua presença furtiva por detrás do balcão da confeitaria, próximo a fugir: Ignácio Cruz, o homem dos belos braços torneados, e Sehu, o melhor amigo, que parecia continuar seu drama familiar após a briga com Leia. Pela primeira vez na vida ele queria que fosse Dominic a atravessar aquelas portas.

Ignácio corou de vergonha, engoliu seco e fingiu não ter encontrado os olhos de Alexei, indo diretamente a mesa da mãe, o que deixou o vampiro levemente magoado – ainda que tivesse dado dois foras no homem, Alex ainda gostaria que ele perseverasse em sua busca. Todavia, algo no fundo de sua alma dizia que Cruz não havia desistido... Provavelmente só aguardava o melhor momento.

Sehu estava com a pele pálida, olhar extremamente vermelho e uma respiração pesada, com os olhos cheios de lágrimas e um caminhar lento como uma lesma. Se aproximou de Alexei de imediato, com um olhar preocupado e assustado.

− Por favor, liga para a Leia por mim – suplicou. Alexei revirou os olhos, desinteressado em entrar nas brigas do casal, enquanto procurava por Roman no salão da confeitaria e encontrava, novamente, os olhos negros de Ignácio.

− Sehu... Você devia respeitar o espaço dela! – Alexei afirmou, voltando-se ao amigo e procurando a melhor maneira de sair sem ser percebido. A respiração de Sehu ficava levemente mais pesada e menos anasalada, como se estivesse sendo deturpada. Alex finalmente percebeu o rosto do amigo enrubescendo de uma maneira assustadora, ficando com o mesmo tom de um pimentão. – O que...? – ele questionou, com um olhar confuso, observando a aparência do amigo ficar cada vez mais pesada e a respiração mais aflita.

− Só ela sabe onde tá meu remédio – ele disse, de maneira pausada e com enorme dificuldade de completar as frases. Alexei arregalou os olhos, assustado, diante da crise asmática do amigo. Engoliu seco, pegou o telefone e procurou pelo número de Leia.

− Merda. Teresa socorro! – ele gritou à amiga, que se aproximou rapidamente, ignorando os clientes na fila. Todos do saguão olharam para Alexei, assustados. – Acho que o Sehu tá tendo algum tipo de reação! Não sei! – exclamou. O número de Leia não estava entre os contatos de Alexei, o que era desesperador. O vampiro lembrou-se vagamente de um dia ter ouvido Sehu dizer que sofria de severas crises de asma desde que era criança.

− O que ele tem? – Teresa questionou assustada com a respiração profunda de Sehu. Os lábios do jovem estavam roxos como uvas.

− Acho que é crise de asma – Alexei tentou ligar para ambulância, observando um murmurinho se espalhar por toda confeitaria, num uníssono assustador. – Não sei o que fazer, meu deus, não consigo ligar pra ambulância!

− Tirem ele daqui, levem para um local mais ventilado e com poucas pessoas – a voz de Ignácio Cruz era inconfundível. Alexei sentiu um aperto no coração de vergonha, mas também um desabrochar de esperança. O homem se aproximou de imediato, envolveu Sehu nos braços, como se ele não passasse de um boneco extremamente leve – Por favor, eu levo ele, confiem em mim! – afirmou. Alexei engoliu seco, indicou uma direção a seguir e foi junto com Ignácio. Antes, no entanto, sentiu seu braço ser puxado.

− Mel, alho e açúcar mascavo. Urgente – Roman disse, com um olhar angustiado e desesperado, enquanto segurava Alexei pelo braço. – Também preciso de alguns panos limpos e água bem gelada! – afirmou. Alexei anuiu, confiante.

− Teresa, me ajuda a encontrar tudo que ele pediu! – suplicou. Teresa se juntou ao amigo e correram para a cozinha, atrás de Ignácio, Roman e Sehu, respirando cada vez mais dificilmente.

Teresa tirou tudo de cima de uma das mesas da cozinha para que Ignácio pudesse deitar Sehu, de maneira que nada atrapalhasse sua plena respiração. Alexei envolveu seu pescoço com panos e gazes molhados com a água gélida, enquanto Roman preparava uma mistura com os ingredientes solicitados anteriormente. Fedia, mas havia garantia de funcionamento enquanto a ambulância não chegava.

− Calmamente, Sehu, siga minha contagem... Um... Dois... Um... Dois... – Ignácio dizia com uma voz hipnotizante e calma, tentando controlar a respiração ofegante do jovem, que seguia suas indicações mesmo que com certas dificuldades. Alexei tinha olhos preocupados sobre o amigo e pensamento alternando entre a situação problemática atual e estar diante dos dois homens de quem ele queria fugir outrora. Teresa tinha juntado um terço à mão e rezava baixinho.

− Aqui, duas colheres bastam – Roman, disse, se aproximando com a mistura fedida e tirando uma colherada demasiado exagerada, com um olhar confiante e preocupado – Respire profundamente antes de beber, que vou tapar seu nariz! – afirmou, o fazendo em seguida, unindo os dedos para apertar as narinas de Sehu e fazer com que bebesse da mistura açucarada e amarga sem sentir quaisquer cheiros, mas não o livrando de uma careta de nojo.

− Vai ficar tudo bem, Sehu – foi tudo que Alexei soube dizer, diante de todo aquele frenesi desenfreado, observando a respiração do amigo ficar regular graças as indicações de Ignácio, e o congestionamento nas vias nasais parecer diminuir graças a mistura de Roman.

 

A respiração de Sehu já estava regular quando a ambulância chegou. Day Flores havia conseguido contatar Leia, que correu o mais rápido possível para chegar a confeitaria e poder acompanhar o namorado para o hospital. Teresa havia se retirado para avisar e acalmar os clientes que aguardavam notícias do rapaz que havia passado mal mais cedo e que ainda desejavam comprar algum bolo para adoçar seus momentos.

E Alexei estava ali, sozinho, com os dois algozes de seu destino. Ambos pareciam estar à espera de alguma palavra de incentivo, encorajamento, alguma desculpa ou afirmação.... Qualquer palavra poderia alegrar seus dias e dar sentido a suas esperas. Alex engoliu seco, se vendo na presença de Ignácio e Roman, e sorriu.

− Obrigado – ele disse, em um tom tímido e envergonhado – foram meus heróis por um dia... – afirmou. Tanto Ignácio quanto Roman usaram de suas melhores armas: o olhar sedutor e o sorriso extremamente fofo, alegres com a afirmação do vampiro, que se encolheu na própria pele, envergonhado.

− Já tive vários pacientes com problemas de respiração assim na minha antiga clínica – Ignácio informou, alisando os cabelos numa tentativa de flexionar os músculos do próprio braço, com um sorriso modesto.

− E minha mãe era asmática... – Roman informou, se recostando na bancada e botando as mãos no bolso, com um olhar simpático – Mel e alho eram coisas que nunca podiam faltar na cozinha de casa... Nem sempre a gente tinha bombinha de asma por perto! – afirmou, sorridente.

− Eu, ah, precisava conversar com vocês dois... – ele disse, com a timidez explícita no tom de voz, encarando tudo menos os rostos dos dois – Mas, sinceramente, ia fugir... – confessou, ambos se entreolharam, confusos – Acho que o destino quis que eu não conseguisse... Tenho razões boas para acreditar que ele tem tramado muitas artinhas... – ele disse mais para si mesmo que para os dois, que cruzaram os braços, simultaneamente, e encararam Alexei, confusos. O vampiro engoliu seco e alisou a nuca.

− Gostei do novo cabelo – Ignácio Cruz disse, com a voz dotada de confiança e interesse.

− Realmente, não tinha reparado. Combinou muito com você – Roman afirmou, com ternura e carisma.

Alexei se viu numa cama de gato. Meu deus! Os dois tinham tanto em comum e ao mesmo tempo eram tão diferentes... Ele não sabia o que fazer... Com qual falar primeiro... O que falar...

Destino... – Alexei pensou, com rancor e raiva – Você ainda se vê comigo...

Houve um silêncio constrangedor por alguns instantes, Roman e Ignácio continuavam ali, acocorados às bancadas e no aguardo de palavras de Alexei, que se sentia um palestrante diante de uma plateia voraz, quando, finalmente, um pronunciamento surgiu da boca do vampiro:

− Quem quer bolo? – questionou meio sem graça. Roman e Ignácio se entreolharam, deram de ombros e sorriram. Alexei sorriu aliviado, engoliu seco e alisou o próprio rosto.

 

Estavam sentados à mesa, provando de um delicioso bolo trufado com morangos e chantilly à vontade, num silêncio eterno e palpável. Alexei tinha todos os sentimentos aflorados, em especial a vergonha e a timidez.

− Estou na mesa com o cara com quem eu transei e o cara com quem eu quero transar— ele pensou, envergonhado – Só faltou o cara que me traiu para completar o quarteto fantástico. Eu quero morrer.

Se questionou o que Versa diria para ele fazer. Provavelmente, sugeriria que ele desse um jeito de ficar com dos dois. Teresa, com certeza, escolheria Ignácio. Dominic transaria com um e simultaneamente com o outro, mas dizendo sempre estar sendo fiel apenas à um deles. Sehu teria corrido ao mínimo reflexo das palavras "vampiro" e "gay". Ramona teria mandado os dois se foderem e ido beber alguma coisa num bar.... Mas... O que Alexei faria? Ele se questionava. Por que ele esperava tanto saber o que os outros esperavam que ele faria? Por que ele, simplesmente, não fazia a seu modo?

− Porque eu não tenho um modo – ele afirmou de maneira audível para todos naquela mesa. Roman e Ignácio encararam Alexei com confusão. O vampiro levantou os olhos da xícara de chá de laranja que tomava, olhou para cada um dos belos rostos diante de si, suspirou profundamente e disse – Vocês se importam se a gente conversasse depois? Preciso pensar em muitas coisas e minha cabeça está a mil – suplicou.

− Tome seu tempo – Ignácio disse, dando um leve tapinha no ombro de Alexei.

− Sim – Roman concordou – Acho que ainda tenho bastante tempo... E estava mesmo de saída, por agora... – afirmou. Ignácio disse do mesmo. Alexei sorriu, feliz por ter, finalmente, encarado algo com maturidade e confiança, reconhecendo as próprias limitações e a própria necessidade de deliberar sobre tudo antes de tomar uma atitude. Trocou telefones com ambos, passou o número da lanchonete para Ignácio, recebeu uma outra rosa de Roman, se despediu de ambos e correu para a cozinha...

Onde suspirou profundamente, aliviado.

 


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