Tô Nem Aí escrita por Youth


Capítulo 3
003. O Veludo Vermelho




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Alexei terminava de assar uma fornada de biscoitos de gengibre com canela e gotas de chocolate, concentrado única e exclusivamente na reprodução perfeita e saborosa dos docinhos, quando Teresa chegou à cozinha acompanhada de uma jovem baixinha de cabelos vermelhos como ferrugem. Estavam em uma espécie de tour, a amiga apresentava a moça toda a confeitaria, enquanto ela fazia algumas anotações num caderninho de bolso e observava atentamente. Teresa cerrou os olhos, desconfiada, quando percebeu a presença de Alex no recinto – o vampiro vinha evitando a amiga há algum tempo por duas razões: (1) não havia tido mais contato com Ignácio após a sessão de massagem no outro dia e ele sabia que seria pressionado por Teresa a tomar alguma atitude, e (2) ela não parava de falar que sentia que o namorado ia lhe pedir em casamento.

Estava encurralado. Não ia conseguir fugir a tempo. Teresa lhe olhou com a melhor expressão de “Te peguei!” e esboçou um sorrisinho malicioso.

− Vem aqui menina – ela chamou a garota, que usava também óculos de armação redonda e tinha a pele lisa como seda. A blusa era florida – Essa aqui é a Dayana. A amiga do meu amigo que te falei que ia contratar para ajudar na organização da confeitaria, agora que o Jacob saiu – ela contou. Dayana estendeu a mão amigavelmente para Alexei, ignorando o fato de que as mãos do vampiro estavam sujas de farinha.

− Dayana Flores – se apresentou timidamente – Mas pode me chamar de Day – pediu. Alex apertou a mão da moça com carisma e a sujou de branco por completo. Day percebeu o equívoco e limpou a mão envergonhada.

− Muito prazer – Alex disse – Bem-vinda ao Veludo Vermelho! – Day sorriu amigavelmente e Alexei fez menção a sair, mas foi interceptado pela mão irritada de Teresa agarrando seu braço e o trazendo de volta a presença das moças.

− Você podia explicar para ela sobre nosso principal produto e a diferença dos outros – Teresa pediu, mais em um tom mais de ordem que pedido. Alexei engoliu seco, assustado, e sorriu forçosamente para a moça.

− É... Sim, sim, claro... Vejamos – ele puxou as moças para a bancada onde haviam sete bolos diferentes, descansando sob o ar condicionado e sendo finalizados pelos ajudantes de cozinha da confeitaria. – Você sabe sobre nós, não?

− Que tem vampiros trabalhando aqui? – ela questionou em um tom excessivamente animado. Os olhos brilhavam involuntariamente. Alexei pareceu desconfiado.

− Você não é uma daquelas fetichistas loucas que sonha em ter o sangue chupado por um vampiro, né? – perguntou desconfiado. Day não soube esconder a timidez quando um rubor coloriu suas bochechas.

− Não... – respondeu. Alexei, sabe se lá porque, não se convenceu da verdade nessa resposta – Eu só... Sou uma leitora voraz... – corrigiu. Teresa riu baixinho.

− Como chama aquele negócio que você tinha dito pro seu pai que era? Judoca?

− Fujoshi – Day corrigiu. Alexei e Teresa trocaram olhares confusos, mas nada disseram. Day engoliu seco e alisou os cabelos – É um tipo de leitora que... Ah, deixa para lá... Sobre os bolos? – Alex deu de ombros e voltou-se a explicação.

− Bem, novamente... Quando a confeitaria surgiu ela era especializada em um único tipo de bolo: o Veludo Vermelho— a firmou. Day tinha olhos atentos.

− Aquele “red velvet”? – questionou.

− Não! E é justamente por isso que é importante prestar atenção agora – Alex afirmou – Nós temos sim o Red Velvet, que é um bolo famoso, tem até um grupo com esse nome... Mas o Veludo Vermelho (E só assim nós o chamamos) não é um tipo de bolo, mas um grupo – ele afirmou apontando para os três últimos bolos da bancada, todos sinalizados como “V. V.”. – São bolos exclusivos para vampiros pois tem...

− Sangue – ela completou admirada e estupefata. A boca aberta involuntariamente com a surpresa.

− Exato – contou – Em doses pequenas, mas suficientes para saciar a fome vampírica. Existem bolos normais e os bolos de Veludo Vermelho, cujo único diferencial é esse – Alexei pegou duas fatias de bolo da geladeira, eram absolutamente iguais, com exceção de que uma tinha uma pequena bandeirinha vermelha espetada – São o mesmo bolo, mas um tem sangue e outro não. É muito importante que você nunca venda bolos de veludo vermelho para humanos, tudo bem? – Alexei suplicou com um olhar demasiado preocupado. Teresa concordou.

− Sim, um vampiro pode comer um bolo normal tranquilamente... – ela disse – Mas um humano comendo bolo de vampiro... Pode ser...

− Desastroso – Alexei completou assustado, enquanto devolvia as fatias de bolo à geladeira e limpava as mãos no avental – Acho que isso era o principal, Day, espero que dê tudo certo. Bem-vinda novamente – disse com um sorriso amigável, quando se preparava para fugir de Teresa, que novamente agarrou seu braço e sorriu para a moça.

                − Day, por favor, pode começar anotando quais bolos estão na vitrine? Vai ser um dos seus principais trabalhos de agora em diante – ela disse, impedindo a fuga de Alexei, que bufava irritado.

                − Pode deixar – Dayane respondeu com um sorriso confiante e prestativo, quando deixou a cozinha com um bloco de anotações nas mãos. Teresa encarou Alexei sem muitas palavras, no aguardo de explicações, com um olhar desconfiado. O vampiro se encolheu e coçou a nuca.

                − Não vai rolar, tá bem? – disse de imediato, com um tom desapontado nas palavras.

                − Com o bonitão das massagens? – ela questionou surpresa – Poxa, achei que era tudo que você precisava para esquecer o Dominic. – Alexei se recostou na bancada e botou as mãos nos bolsos, entristecido, enquanto encarava os próprios pés.

                − É... Também pensei – ele disse – Foi bom, sabe? Pra mim. Acho que pra ele também, mas, enfim... – suspirou profundamente – Não teve aquela “mágica” que se tem quando você sabe que é para ser – Teresa arqueou as sobrancelhas e se encostou ombro a ombro com o amigo.

                − A mágica do Dominic, suponha – ela disse num tom irônico. Alexei bufou e revirou os olhos, enquanto escondia o rosto com as mãos.

                − Não, olha só – ele disse irritado – Eu sei o que você vai dizer: Alexei, você está querendo que todos os caras sejam uma cópia do Dominic. Alexei, você está procurando seu ex nas novas pessoas com quem você se relaciona. Alexei, você precisa entender as diferenças das pessoas – ele listou em tom entediado – Foi a mesma coisa que a Versa disse ontem – informou. Teresa coçou o pescoço.

                − E não é isso? – ela questionou – Sabe, se for não há de se envergonhar... Essas coisas levam tempo, migo, vocês passaram muitos anos juntos, sabe? É normal que no começo você compare os caras com ele... Só não pode desistir tão fácil assim... – Alexei ajeitou os próprios cabelos e mordiscou os lábios.

                − Eu não tenho mais idade para isso, de qualquer maneira – ele disse.

                − Ah... Você não vai voltar com aquele papo de “E se eu morrer amanhã?” não, né? – ela suplicou desesperada. Alexei meneou os olhos e deu de ombros, com um biquinho nos lábios. Teresa revirou os olhos, juntou as mãos ao redor da cabeça de Alex e encarou o amigo olho-a-olho – ALEXEI BOAVENTURA você não vai morrer. Deixa de ser doida menina! Você é imortal. Você tem cento e cinquenta anos e tem rostinho de trinta – afirmou convicta de si mesma – E, mesmo que fosse um humano normal, com quarenta anos, ou sei lá, oitenta, saindo de um relacionamento ruim: você ainda teria direito de ser feliz, idiota. Não existe idade para a felicidade.

                Alexei riu.

                − Meu deus como eu poderia ser um cara de quarenta anos com um relacionamento de cinquenta? – brincou.

                − Pergunta para sua avó aquela jurássica – Teresa respondeu irritada. Alexei gargalhou, pois nada mais cômico que a amiga fora do sério. Ela suspirou profundamente e de olhos fechados – Enfim, ouve o que eu te digo: Nem a sombra do Dominic, nem a merda dos anos que você tem podem impedir sua felicidade. O que foi que aquela branquela da sua terapeuta disse?

                − Faça uma loucura – respondeu. Teresa deu um tapinha na nuca do amigo, com um olhar irritado.

                − Então faça! – ordenou. Alexei sabia que, se em algum momento pensou em desistir de tudo e voltar as boas com Dominic, depois desse ultimato de Teresa havia desistido por completo. O medo da amiga vencia o medo do arrependimento. – Melhor se arrepender do que passar vontade, esse vai ser o seu lema daqui para frente. Então vai se arrepender muito e passar vontade de menos.

                − Mas não com o Ignácio, por favor – ele suplicou assustado. Teresa pareceu estar confusa, pois mesmo após aquele discurso o amigo continuava na mesma – Tenho razões bem pessoais pra querer deixar ele enterrado e descansando em paz lá na clínica dele – afirmou. Teresa engoliu seco, envergonhada, pigarreou e olhou ao redor, sem poder encarar o amigo nos olhos.

                − Bem, ele não é a única loucura possível do mundo – sentenciou, indo em direção a porta da confeitaria. Fez menção a sair, mas virou-se para o amigo no último instante – Nem pensa em fugir de mim quando estiver mal novamente. Estou de olho em você – e saiu. Alexei engoliu seco e limpou o suor da testa.

...

Talvez fosse loucura ou invasão de privacidade demais − naquele dia que Alexei já se considerava o maior e mais estranhos dos invasores de privacidade, pois havia aceitado fazer loucuras com um completo estranho em uma clínica em reforma −, mas mesmo assim ele não pode resistir a curiosidade de desbloquear o celular de seu amante, quando Ignácio Cruz deixou o quarto, envolto em uma toalha, e foi tomar um banho. O que mais assustou Alex não foi o fato dele ter aplicativos de fotografia em excesso, mas sim o papel de parede do telefone: uma linda família, ele, uma mulher e duas crianças. O coração do vampiro murchou de uma maneira inexplicável, lágrimas surgiram violentas e copiosas envolvendo seus olhos e manchando o colchão daquele que outrora demonstrou-se a maior das esperanças de um novo recomeço. Suspirou profundamente, conteve as lágrimas, devolveu o celular ao local, vestiu suas roupas e fez menção a sair...

Só que voltou, absurdamente bravo e indignado, pegou um papel, caneta e pensou no maior xingamento que podia imaginar. Definitivamente, Alexei havia se privado de fazer as mais esdrúxulas e ínfimas coisas consideradas “erradas” durante um relacionamento; privou-se tanto que, inclusive, passou a ter vergonha de falar palavrões – e, tanto se reprimiu a não falar, que os esqueceu. Ficou diante do papel por longos instantes, pensando no maior dos insultos, sem sucesso, e escreveu:

Boboca. Com uma carinha excessivamente brava ao lado.

Deixou a clínica do homem, irritado, pisando pesado no chão da rua, bufando como um touro espanhol e foi direto para uma sessão às pressas com Versa Coumarine. A vergonha de saber que havia sido o amante de um homem casado foi tanta que não conseguiu contar para ninguém – e guardou as sete chaves no cofre de seu coração. Depois, agiu como se nada demais tivesse acontecido e que simplesmente não havia gostado das loucuras de Ignácio Cruz. Excessivamente apimentado, ele diria.

Alexei, novamente, se pegou lembrando do acontecido com Ignácio na outra semana, logo após a conversa franca com Teresa – onde preferiu omitir o detalhe mais vergonhoso da melhor amiga afim de não ser julgado por seus atos. Havia terminado, finalmente, os biscoitos de gergelim e estava terminando um naked cake de abacaxi e doce de leite para a festa de aniversário de um palhaço. A equipe de confeiteiros trabalhava a seu lado, ininterruptamente, como abelhas dentro da colmeia. Teresa e Day estavam na confeitaria, fazendo vendas, anotando encomendas e conversando com clientes.

Day entrou na cozinha com um olhar confuso e excessivamente carregado de desespero – era o olhar dos novos membros da confeitaria, Alexei conhecia bem. Riu baixinho e olhou para a moça, que veio a seu encontro.

− Senhor – ela disse de uma maneira exagerado cordial, os óculos pendendo na ponta do nariz arrebitado – Fizeram um pedido de Veludo Vermelho... Mas pediram que você entregasse – Alexei engoliu seco. Sabia o que isso significava – Eu disse que você não era o entregador e que tinha gente especializada pra isso e...

− Tudo bem Day – ele cortou a garota, já tirando o avental, apressado, e guardando o bolo em construção na geladeira – Acho que sei do que se trata. Foi por telefone, correto? – ela anuiu. Alexei suspirou. Ele infelizmente sabia do que se tratava. – Obrigado por informar.

Atravessava a entrada da confeitaria com um bolo Veludo Vermelho embalado numa caixa branca nos braços, quando percebeu uma certa movimentação provocada por uma mulher baixinha e gordinha de cabelos curtos e olhos esbugalhados, parecia brigar com Teresa. Alexei conhecia muito bem a peça para passar de fininho e fingir que não viu nada.

Swanna... – ele pensou, já fora da confeitaria.

Pegou o primeiro ônibus que passou e foi direto para um bairro próximo, mais fechado e residencial, com casas pequenas e estreitas em todos os cantos das ruas. Era, visivelmente, mais humilde que o de onde vinha. Crianças brincavam nas ruas esburacadas, jovens se drogavam e pessoas trabalhavam.

Chegou, após longos minutos de caminhada depois de descer do ônibus, numa ruela mais ao final, circundada por paredes cinzentas e cheias de musgo e mofo, com um chão imundo e com papeis espalhados das lixeiras arrombadas. Adentrou a primeira porta do corredor da ruela, chegando a uma casa escura e que cheirava a fumo.

− Ramona? – ele chamou.

− Tô aqui – uma moça respondeu aos fundos. Alexei suspirou, ajeitou os cabelos e foi-se até lá, encontrando a garota debruçada numa cama, assistindo TV e bebendo suco de morango. Ramona tinha cabelos loiros frisados, olhos com uma sombra excessiva e lábios vermelhos como sangue. – Meu deus eu te amo – ela disse quando viu a imagem de Alexei, segurando a caixa de bolo.

− Bom te ver também, maninha – Ramona saltou da cama de imediato, pegou o bolo das mãos de Alexei, abriu e tirou um pedaço com a própria mão, comeu como se não houvesse amanhã, com um enorme sorriso de satisfação. Alex se sentou num banquinho de madeira e cruzou as pernas.

− Sério... As duas melhores decisões da sua vida: ser confeiteiro e terminar com o babaca do Dominic – ela afirmou, por fim. Alexei suspirou.

− Já soube? – questionou.

− Ele me ligou esses dias – afirmou – “Cunhadinha, conversa com seu irmão...” – ela imitava o sotaque e a voz de Dominic perfeitamente. Alex riu – Eu falei pra ele: vai a merda mano. E desliguei – afirmou. Ramona nunca foi grande fã de Dominic.

− Por que não foi na confeitaria? – Alexei questionou, tentando tirar Dominic do assunto. Ramona revirou os olhos e limpou a boca de glacê.

− Não quero ser uma mancha negra na sua vida, mano – ela disse. E essa era a Ramona de sempre: a garota orgulhosa demais para aceitar a ajuda do irmão para se reerguer na vida, que se enterrava de drogas pesadas e vivia em clínicas de reabilitação para vícios vampíricos. Alexei a amava mais que tudo, mais que um dia amou Dominic ou a própria confeitaria... Amava mais a irmã que a si mesmo, então sempre fazia de tudo para trazer ela de volta para sua vida... Mas ela sempre sumia... E voltava... E sumia. – Esse bolo é fantástico. É de que?

− Canela e pão de ló – Alexei respondeu, alisando os cabelos da irmã – Vai ficar por quanto tempo agora? – Ramona deu de ombros. – Você pode ficar comigo, caso se canse daqui.

− Me cansar? – Ramona riu, mas seus olhos denotavam irritação – Esse é meu lar, Alex. Não é tão glamoroso quanto sua confeitaria perfeita da Barbie, mas é o que eu consegui – respondeu amargurada. Alexei revirou os olhos.

− Não foi o que eu quis... – parou, suspirou e coçou os olhos – Eu só quero que você fique bem.

− E eu estou bem – ela disse, deixando o bolo de lado – E você também, o que para mim é mais importante que tudo. Você sempre fica bem quanto fica longe de mim... Olha só... Você passou meio século longe de problemas, mano! Quando éramos nós dois... – ela riu entristecida – Meu deus... eu te metia em cada uma...

− E você sempre me salvava – respondeu.

− Só não pude te salvar de ser o que mais te machucou – ela disse, com lágrimas já surgindo nos cantos dos olhos. Alexei não soube dizer se ela falava de sua época de açougueiro de Mônaco ou de Dominic – É isso que uma irmã mais velha faz – e sorriu forçosamente.

− Ramona – Alexei começou, com um olhar fraterno e preocupado – Fica, por favor, por mim – suplicou – Eu estou passando por umas coisas tão tensas e complicadas desde que eu e o Dominic rompemos... Não queria ter de passar por isso sozinho. Eu só tenho você – Ramona engoliu seco com a súplica do irmão, coçou os cabelos, envergonhadas, e nada disse. Alexei sorriu forçosamente, com a mágoa explodindo em seu coração como um câncer fatal. As lágrimas começavam a surgir como cascata de seus olhos, seu estômago se inquietou e suas mãos ficaram agitadas.

− Você fica melhor sem mim – e foi a última coisa que Alexei ouviu a irmã dizer, antes de sair, irritado, com um milhão de pensamentos consumindo sua mente como um vírus num computador. Ramona gritou algumas palavras, mas ele não ouviu, com os sentidos entorpecidos pela tristeza e pela mágoa. Como ele podia ser abandonado pelas duas pessoas que ele mais amava em tão pouco tempo? E o pior: ele sabia que seria assim e mesmo assim insistiu a se machucar. Alexei era um masoquista numa ópera dramática sobre a solidão e a superação.

Alexei só se deu conta que andava sem rumo pela cidade quando deu de cara com um homem de quase dois metros atravessando a rua, já escura e fria pela brisa gélida da noite.

− Me desculpe – Alexei disse, sem sequer olhar para o homem, com as lágrimas ainda encharcando suas vestes – Esses dias tenho batido de cara com tudo... – afirmou para ninguém além de si mesmo, mas o homem ouviu e riu.

− Também sou assim – ele afirmou – tenho que andar meio abaixado, se não bato a cabeça em todas as placas dessa cidade – o homem percebeu a tristeza latente no rosto de Alexei, se compadeceu e o presenteou com uma das rosas que ele trazia em um cesto – Pra perfumar seu dia...

Alexei pegou a rosa, meio receoso, sorriu amigavelmente com a demonstração de afeto do senhor, agradeceu e finalmente se deu conta de que não fazia ideia de onde estava.

− É só seguir reto por ali – o senhor indiciou – Vai ter um lugar onde os jovens vão para fazer coisas idiotas de jovens, acho que é um bar ou uma lanchonete, depois é só virar a esquina e você vai chegar na sua rua – Alexei pareceu aliviado por não estar tão longe quanto imaginava.

− Muito obrigado, de verdade – Alexei entregou um dos cartões da confeitaria para o senhor – Qualquer dia aparece lá... Te devo um pedaço de bolo! – afirmou. O homem sorriu amigavelmente, guardou o papel no bolso e se foi.

Alexei seguiu a direção indicada pelo senhor, chegando ao “lugar onde jovens vão para fazer coisas idiotas de jovens”, que nada mais era que uma balada de música eletrônica. Olhou para os lados, para o relógio, pensou, raciocinou e tentou imaginar o quanto as festas jovens tinham mudado nos anos que se afastou delas e se voltou unicamente aos chás da tarde e coquetéis adultos. A curiosidade moveu seu ser como se ele não passasse de uma marionete. Chegou à fila e se encontrou rodeado de jovens, como dito pelo homem outrora, na casa dos dezoito aos vinte e cinco anos. Alexei se sentiu estranhamente como um penetra e deixou a ansiedade dar o ar de sua graça novamente... Seu estômago revirou, seus pelos arrepiaram, seus movimentos ficaram frenéticos e seu coração acelerou. Sentia as veias ardendo em sangue.

− Meu deus o que eu tô fazendo em um lugar assim?— ele se questionou nos próprios pensamentos. – Eu devo ter o triplo da idade de qualquer um nessa fila... Até o quádruplo... – e fez menção a ir embora... Então lembrou-se de Versa e de Teresa e de como elas apoiariam sua decisão de fazer algo diferente... E voltou à fila.

Acabou esbarrando, sem querer, em um rapaz que ali já se encontrava, e virou-se para Alexei absurdamente irritado.

− Não tem olho não? – ele disse possesso. Alexei engoliu seco.

− Desculpa, foi sem querer – ele respondeu. O rapaz olhou Alexei de cima a baixo, riu e sussurrou algo no ouvido do amigo à sua frente, que olhou e riu também.

Nesse instante o coração de Alexei se acelerou mais do que já havia se acelerado antes. Sentia-se humilhado e envergonhado. A pele ardia com a coceira que sempre vinha quando os poros de abriam após uma crise severa de ansiedade. O estomago bradava initerruptamente. Ele engoliu seco, suspirou, encarou os próprios pés e deixou a fila, de cabeça baixa.

Eles devem ter me achado muito velho... Ou feio... – Alexei não fazia ideia do que os rapazes da fila falaram de si, mas a ansiedade fazia tudo parecer dez vezes mais doloroso e vergonhoso. Suspirou, entristecido, em todo caminho de volta para casa, esquecendo-se, inclusive, da desastrosa conversa com a irmã.

Quando chegou a confeitaria todos já haviam ido embora. Então, só com seus pensamentos, Alexei pegou farinha, ovos, leite, chocolate, frutas e açúcar e foi fazer o que fazia de melhor e mais aquietava seus sentimentos: bolos.

Fez bolos a noite toda, encheu as prateleiras e adiantou todas as encomendas, mas mesmo assim não se sentia mais feliz ou menos entristecido. Tinha saudades do colo de Dominic.


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