CRY BABY - The Storyfic escrita por puremelodrama


Capítulo 9
Tag, You're It




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 Pode-se imaginar que todas as pessoas tristes são tristes por um motivo muito além do que é possível compreender. Melanie possuía uma forte crença: quando uma pessoa não se sente bem-vinda no mundo e não consegue de forma alguma se adaptar a ele, deve-se ao fato de que essa pessoa foi designada ao mundo errado, ao corpo errado, à família errada e à vida errada. Melanie também acreditava fortemente que ela era um desses casos. Ela não sabia quem havia criado o universo e o quem o governava, se eram os deuses (seja lá quem fossem), ou se era o Deus de D maiúsculo (seja lá quem fosse também), ou então alguma força sobrenatural que ninguém conhecia. Apenas tinha certeza absoluta de que essa divindade não gostava dela.

 Mas todo lugar em que há trevas tem que haver uma luz, mesmo que mais improvável. Melanie, com os pensamentos e ideias muito inadequadas para alguém da sua idade, imaginava que um ser, ao ser enviado ao mundo errado, na próxima vida teria outra chance de se encontrar em seu verdadeiro mundo, e assim sucessivamente, até que sua alma achasse seu lugar. Podiam-se demorar mil vidas, mas, um dia, ela encontraria sua casa, e quando encontrasse, permaneceria outras mil vidas lá, e outras, e outras, até o fim dos tempos.

  Todavia, o mundo em que residia atualmente, cruel de natureza, fazia o possível para se provar contrárias até mesmo as suas esperanças imaginárias, o que fazia Melanie crer que aquele mundo não era o mundo de ninguém, mas sim um provável campo de punição para almas que foram más em sua vida passada. Sua recém-festa de lástimas contribuíra para que aceitasse de vez essa ideia.

 Depois do desastre ocorrido, Melanie decidiu que não ficaria mais nenhum segundo dentro daquela casa. Sem trocar de roupa e sem arrumar a bagunça, Melanie saiu sem saber para onde. Nem mesmo o ataque de drama e fúria que Murcy teria ao encontrar a casa naquele estado lhe interessava agora. Ignorou o fato de que seu vestido estava sujo, rasgado e fedorento; que o cabelo estava tão despenteado que assustaria qualquer criancinha na rua; que seus olhos estavam tão inchados e vermelhos quanto o nariz de um palhaço. Saiu pisando forte para longe de casa, não importava aonde ia, nem à que horas iria voltar, seu desejo, na verdade, era não voltar. Não aceitava o fato de que fora tão ingênua e inocente para acreditar em Johnny. Uma festa? Sério? Tão idiota fora de prepará-la com tanto prazer, justamente para ele.

 Alexandre. Sua primeira paixão. Atraíra-se por seus olhos claros e seus sonhos bonitos. Jamais poderia imaginar que ele era como uma das mulheres feiticeiras de suas desejadas aventuras. Jamais poderia imaginar que havia um monstro por trás daquela alma. Jamais imaginou que Johnny pudesse ser igual a ele. Os dois garotos pareciam tão gentis, cavalheiros e dispostos a fazer Melanie descobrir o lado bom da vida; mas a sua perdição a fizera ignorar completamente o fato de que não havia lado bom na vida. Melanie era como uma isca. Uma isca burrinha e ingênua para os devoradores de almas. Sozinha e acabada.

 Imaginou se Johnny tivera ao menos a decência de contar a Beth Anne sobre a festa. Beth Anne não poderia ter faltado se soubesse da festa. Beth Anne era sua amiga, fora ela mesma quem se aproximara primeiro, sem que ninguém a pedisse ou a desafiasse. A garota até mesmo tentou fazer algo divertido com ela, levou-a ao parque para se enturmar, mesmo que não tenha dado certo. E havia lhe apresentado a Johnny. Ela não poderia mesmo ser uma má pessoa, se soubesse o quão ruim era Johnny, nunca deixaria que ele se aproximasse também. Mesmo assim, a última coisa que Melanie queria era ter que encarar aqueles dois agora. Tinha tanta raiva dentro de si que nem mesmo sabia do que seria capaz de fazer se os visse.

 Andou e andou até que se viu na mesma praça em que estava dias atrás com a pessoa que mais odiava no mundo naquele momento. Claro, o que mais devia esperar do destino? O destino existia para apenas uma razão, fazê-la lembrar-se de coisas que não queria lembrar, obrigá-la a enfrentar o que mais a aterrorizava. Surpreendeu-se que Johnny não estivesse ali também, rindo enquanto jogava coisas nela. Se estivesse, ao menos serviria para lembrá-la mais uma vez de nunca mais ser tão burra a ponto de confiar em estranhos. Johnny era uma pessoa que havia conhecido há pouco mais de uma semana, como esperara que pudesse se importar com ela de verdade? Convivia com sua família há onze miseráveis anos, nem mesmo eles se importavam, quem diria um completo desconhecido.

 Sentou-se em um dos banquinhos próximos e não fez mais nada. Que belo jeito de passar o seu aniversário de onze anos. “Ao menos não há ninguém conhecido por aqui que possa debochar ainda mais da minha cara”. Fitou o céu, estava escurecendo, deviam ser quase sete horas. Não sabia se era seguro estar fora de casa àquela hora, mas, de qualquer forma, era melhor que estar na própria casa. Não havia ninguém por perto. Tudo estava silencioso. Melanie não sabia dizer se era algo bom ou ruim. Algumas poucas lojas ainda estavam abertas, mas não havia qualquer movimento. Bem, com ou sem movimento, a única coisa que Melanie queria fazer até o resto de sua vida era chorar, queria chorar até desidratar, queria chorar até que tudo acabasse e todos desaparecessem. “Os seres humanos me assombram tanto quanto os monstros de meus sonhos. Talvez porque sejam a mesma coisa”. Talvez porque passasse a maior parte do tempo em seu quarto, em seu próprio mundo. E, por causa disso, não possuía qualquer conhecimento do mundo do lado de fora, não sabia do que ele era capaz de fazer, até onde ele poderia chegar.

 E então pensou em seu pai. Pensou em seu corpo morto deitado ao lado do corpo morto de Jane Thomson. Pensou se aquelas escapadas, aquelas mulheres, eram a sua fantasia. Seu país das maravilhas. E pensou em onde ele poderia estar agora. Será que já havia ido para outro mundo? Será que estava no seu mundo? Ou teria que viver outra vida de escapadas esperando a próxima? Era evidente que Jose não era feliz, assim como ela não era feliz. Pensou na morte. Será que Jose havia sofrido quando sentiu a lâmina prateada atravessar seu corpo? Até parece. Melanie poderia jurar que sentira alívio, até mesmo gratidão, uma sensação de liberdade. Para qualquer um naquela família, a morte seria uma benção. “Será que deve doer muito?”. Talvez não doa. “Não, eu não faria isso. Eu não poderia fazer isso”. Mas talvez não doa. “Mas...”. Faça. “Mas eu...”. Faça.

 — Então agora você sai de casa? — uma voz conhecida à sua esquerda a fez erguer a cabeça.

 De pé, parado bem próximo, numa expressão que variava do tédio até o desprezo, estava ele. Alexandre. Melanie gelou. O que ele estaria fazendo ali? Por que ele tinha de estar ali?! Por que justo ali? Por que justo naquele dia? A presença de Alexandre ao seu lado despertou seu medo, lembrando-a do comportamento bizarro do menino quando ele tentara levá-la para o carrossel. Talvez ele ainda guardasse rancor devido aos acontecimentos do festival e tivesse voltado para se vingar de alguma maneira. Mel tinha certeza de que não sairia impune pelo soco que dera no rosto do garoto.

 Melanie encarou Alexandre sem coragem de dizer uma só palavra. Seu coração batia rápido, como se fosse explodir a qualquer momento. Corra.

 — E agora não fala também, é? — disse Alexandre. — Quando mal te conhecia, você dizia até palavrões. Finalmente tomou consciência do quão patética é e resolveu fechar a boca de uma vez por todas?

 Alexandre se aproximava lentamente. Melanie ainda não dissera nada.

 — Se bem que, vendo esse seu estado, dá para pensar em palavras piores do que “patética”.

 Alexandre olhou-a de cima a baixo, realçando seu olhar de desprezo. O rosto de Melanie tomou uma cor avermelhada imediatamente, vermelha de vergonha, mas também vermelha de raiva. Alexandre sentou-se ao seu lado. Melanie tomou o mínimo de coragem para dizer algo.

 — Vai embora — disse baixinho.

 — Ah, claro — a voz de Alexandre não demonstrava sarcasmo nem irritação, pelo contrário, estava estranhamente calma. — Eu vou embora correndo e te deixo aqui parada que nem uma idiota, sozinha. Pelo menos aqui não tem outras cem pessoas para te envergonhar ainda mais, ao contrário do festival, não é?

 Melanie tinha a certeza de que ele ficara louco. O carrossel estava numa área isolada e distante, nem uma única alma passava por aquele lugar, o que Melanie tentava entender havia semanas. A única pessoa junto deles era aquele estranho homem da bilheteria, que parecia materializar-se aonde quer que eles estivessem. Melanie, algumas vezes, pensava se o que acontecera fora mesmo real, talvez ela tivesse ficado louca. Tudo fora tão surreal e assustador.

 Melanie quis dizer algo, mas ele não permitiu e continuou falando.

 — Por que estou surpreso? — seu tom indicava que não fora uma pergunta retórica. — Agora eu posso ver que essa loucura é toda de família.

 Melanie fitou o menino. O que ele queria dizer? Alexandre percebeu o interesse repentino da menina e mostrou um sorriso sarcástico.

 — Ah, Melanie, não sou idiota como você. Acha que eu não sei o que acontece na minha própria família?

 Melanie sentiu seu coração palpitar. Suas mãos tremiam de repente. Alexandre sabia sobre Jane Thomson? Mas como? Desde quando?

 — Eu não costumo dormir cedo — continuou Alexandre, fitando o horizonte com a voz bem calma, como se fosse o dia mais relaxante que já havia tido. — Acha que eu não poderia escutar minha mãe saindo de fininho de casa à noite? Bem, era óbvio que ela fugia para se encontrar com outros homens, que outro motivo teria para ela sair de casa àquela hora? Eu sempre soube, porém nunca disse nada, resolvi manter em segredo. O que as pessoas diriam se soubesse que minha mãe saia à noite para trepar com uns vagabundos por aí?

 Apesar da história que contava, Alex permanecia indiferente, como se aquilo não o afetasse de maneira alguma. Melanie imaginou se ele alguma vez nutrira qualquer bom sentimento pela mãe, ou se todos eles foram embora junto com as escapadas de Jane Thomson. Aparentemente não, nada mais importava para ele do que a sua imagem intacta e perfeita. Melanie não se deixava mais chocar-se por aquilo, apesar de já estar doente da superficialidade.

 — Eu não podia permitir que ela manchasse a imagem da família Thomson — continuou o garoto. — Eu apenas continuei fingindo que não sabia de nada, mesmo que tenha ficado um pouco atordoado quando descobri. Nunca pensei que ela poderia pôr o nome da nossa família em risco desse jeito, mas é claro, mulheres como sempre fazendo besteiras. Irrita-me como vocês conseguem ser tão desequilibradas e irritantes, nunca estão satisfeitas com nada. Inúteis.

 A cada palavra de Alexandre, Melanie ficava ainda mais nervosa. A vontade de fugir naquele instante era imensa, mas seu corpo não conseguia se mover. A tensão a deixara estática. Suas mãos transbordavam suor. Aonde ele chegaria com aquela história? Melanie temia o final.

 — E então, Jane sumiu. Eu a vi saindo na noite em que ela desaparecera. Não sabia com que homem poderia estar daquela vez, menos ainda porquê ele iria querer matá-la. Sinceramente, se um dia eu o encontrasse, ia apertar-lhe a mão. Guardar esse segredo já estava me dando dor de cabeça, e agora que Jane não tem mais como nos envergonhar, não tenho que me preocupar. Continuei minha vida normalmente enquanto meu pai saía desesperado pelas ruas com a polícia, procurando por pistas. Eu mesmo não estava nem um pouco interessado, até que encontraram o corpo, ou melhor, os corpos.

 Melanie não sabia se aguentaria até o final, uma sensação de desespero dominava seu corpo. Àquela altura, faltava-lhe ar.

 — Ver o corpo de minha mãe junto ao de seu pai no mesmo lugar e dentro de um mesmo saco me despertou curiosidade, então, fui com meu pai até a sua casa, quando ele se preparava para dar-lhes a notícia. — Alexandre deixou-se estirar no banco, como se aproveitasse um dia de férias qualquer. — Jane e Jose não podiam estar mortos juntos por coincidência, comecei a pensar na possiblidade de também estarem juntos na hora do assassinato. Eu tinha minhas dúvidas, mas tudo pareceu fazer sentido no dia em que fui à sua casa.

 Alexandre fitou Melanie de relance, provavelmente verificando quando tempo levaria para a garota atingir seu nível máximo de estresse e ansiedade. Mel desviou seu próprio olhar.

 — Devo lhe dizer que a atuação da família Martinez não é das melhores. Você e sua mãe praticamente se entregaram no momento em que abriram a porta. Sinceramente, qualquer um teria percebido o quão falso foi aquele teatrinho da sua mãe. Infelizmente meu pai foi estúpido o suficiente para não notar nada de errado, mas eu não. Você realmente precisa aprender a mentir melhor, Melanie, a expressão do seu rosto e sua inquietude me possibilitou formular algumas hipóteses. Bem, o fingimento fajuto de Murcy bem que poderia ter passado batido, isto se eu já não tivesse algum conhecimento de como a sua família funciona. Quando fui jantar na sua casa, Murcy não abriu a boca para falar uma única vez, mal olhava para qualquer coisa que não fosse seu próprio prato e procurou sentar o mais afastada que pôde de todos nós. Bem, desde aí já era possível notar que Murcy não é do tipo de gente que gosta da própria família.

 Melanie estava completamente chocada, sem reação, sem fala. Ele sabia. Ele sabia de tudo, desde sempre. Então era assim que tudo acabava, tudo estava perdido. Alexandre entregaria sua mãe e ela iria para a cadeia. Vários pensamentos de si própria aprisionada em uma instituição passaram pela sua mente enquanto tentava, sem sucesso, mover algum músculo do corpo.

 — Deve imaginar o porquê eu não denunciei vocês duas. Depois da vergonha que você me fez passar no festival, pensei que em alguns dias você perceberia o quanto foi ridícula, e então voltaria para mim, concordaria em ficarmos juntos e se casaria comigo como nossos pais haviam planejado. Mas isso nunca aconteceu. Em um dia desses, eu andava por essa mesma praça e até te vi conversando com um menino boboca qualquer. Então decidi que poderia me aproveitar da situação.

 Melanie ainda não entendia porquê ele não havia entregado Murcy. E mesmo dizendo o que estava dizendo, Alexandre continuava a não alterar o seu tom sereno de voz. Era quase como se debochasse dela.

 — Eu te trago duas opções. Primeira, você pode ir agora correndo para casa e contar toda a história à sua mãe, ela se entrega por vontade própria à polícia e nada de tão grave acontecerá a ela, vou me assegurar disso. Você e seu irmão serão mandados para um bom lugar onde cuidam de criancinhas malcriadas que nem você. E eu os deixo em paz pelo resto da vida.

 Era uma péssima opção. Porém, era evidente que, mesmo em mil opções, nenhuma delas acabaria num final feliz.

 — Segunda. Você não diz nada, ninguém se entrega e em cinco dias eu apareço na sua casa com meu pai e as autoridades. Direi a eles que Murcy matou Jane e Jose e que você ajudou a esconder os corpos, e eu te garanto que o lugar para onde vocês duas irão será muito pior do que qualquer prisão que já tenha visto.

 Nenhuma reação. Melanie não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Alexandre usava chantagem, e em todas as suas condições Melanie acabava sendo levada embora. A garota continuava petrificada, sem a mínima ideia do quê responder a Alexandre.

 — Oh, está sem palavras? — Alex riu, finalmente se levantando. — Isso mesmo, guarde para quando meus guardas arrombarem a sua porta. Está com você, Melanie. Como eu disse, você tem cinco dias.

 E então se foi, simplesmente se foi.

 Oficialmente, o pior dia de sua vida miserável. O pior dia, a pior vida, o pior tudo. Quando morresse, a primeira coisa que faria seria encontrar seja lá quem a tivesse jogado naquele mundo de merda e chutá-lo com toda a sua força. Queria gritar, gritar até que perdesse a voz, até que seus pulmões explodissem, até que seu coração parasse. Definitivamente, tudo estava perdido, não havia mais saída, não havia escapatória, só havia o destino, cruel como o diabo.

 Não havia o que fazer. Não podia contar à mãe, Murcy nunca se entregaria, provavelmente arrumaria as malas e fugiria num piscar de olhos, deixando os filhos para trás. Joseph nem mesmo entenderia, era o único que não sabia o que se passava, já parecia ter aceitado há um bom tempo o fato de seu pai ter sumido sem explicação alguma, como ele reagiria se soubesse que, na verdade, estava morto? Será que choraria pela sua morte? Ou sentiria o mesmo que Melanie sentira? Não, Joseph era um Martinez, e os Martinez não choravam uns pelos outros, os Martinez matavam uns aos outros, fisicamente e psicologicamente.

 Claro que Melanie poderia entregar a própria mãe, Murcy não teria um destino muito piedoso, mas ela nunca se renderia por vontade própria. Porém, de qualquer forma, Melanie acabaria em um orfanato. Já havia ouvido falar de lugares como aquele, não eram muito agradáveis pela forma como diziam. Por outro lado, dentre as opções que possuía, ela também poderia parar em uma prisão para menores, ou até mesmo em um manicômio! O pensamento dessa possibilidade lhe causava falta de ar.

 Um assobio repentino lhe chamou a atenção. Do outro lado da praça estava o mesmo caminhão de sorvete que havia visto no dia em que saíra com Johnny e Beth Anne. O homem cachorro estava encostado no carro, lançando a Melanie um sorriso amigável. Ele lhe chamou com a mão. Melanie ergueu uma sobrancelha, perguntando-se o que aquele homem poderia querer com ela. A garota não possuía um só centavo, então esperava que ele não tentasse convencê-la a comprar um sorvete. Mas parecia que não seria o caso, a abertura na lateral do carro estava fechada, o que significava que o homem não estava trabalhando no momento. Melanie, receosa, andou até o homem, que a recebeu com um sorriso de orelha a orelha.

 — Olá, criança! — a felicidade daquele homem estava além dos sentimentos de qualquer pessoa que vivesse em Baldwin. — Você não parece bem, o que houve?

 Melanie o encarou. Não demonstraria estar tão desesperada a ponto de desabafar com o cara estranho do caminhão de sorvete. Porém, tentando afastar todo o seu mau humor, respondeu da melhor forma possível:

 — Só alguns problemas.

 — Ah, não fique assim, se você fica triste, eu fico triste também — o vendedor de sorvete pôs as mãos no rosto e fez uma expressão tristonha. O ser era uma perfeita mistura de engraçadinho e estranho, inclinando-se mais para o segundo aspecto. — Sabe o que resolve todos os problemas? Sorvete!

 O homem saiu saltitante para a traseira de seu carro, mantendo aquele seu jeito de cachorro hiperativo. Melanie o seguiu, constrangida em recusar.

 — Desculpe, moço. É que não tenho dinheiro.

 — Oh! Não tem problema, querida. Você está triste e isso não posso ignorar, por isso lhe ofereço um sorvete sem nada em troca.

 Melanie admirou a gentileza do homem. “Quem diria que o cara estranho do caminhão de sorvete seria a pessoa a me consolar no momento mais fodido da minha vida.” Esse sentimento durou por um mísero segundo, pois o homem cachorro escancarou as portas traseiras e abriu passagem para ela.

 — Pode entrar e escolher o que quiser, meu bem.

 Ele então sorriu novamente, um sorriso que, infelizmente, Melanie teve que desconfiar.

 — Hã... Você não poderia pegar para mim? — perguntou Melanie, com dúvidas de suas reais intenções.

 A voz dele adquiriu um tom mais calmo.

 — Ah, é melhor que você entre, eu não sei do que você gosta.

 Definitivamente havia algo errado ali. Então um homem estranho com temperamento canino simplesmente aparece e lhe chama, oferece um sorvete de graça e a induz a entrar em seu carro. O coração de Melanie palpitou. Imediatamente sentiu-se nervosa, mas tentou não demonstrar. Controlando a voz o máximo que pôde, respondeu:

 — Sinto muito, mas acho que preciso ir, está escuro e minha mãe deve estar me procurando.

 O homem imediatamente pôs-se a falar:

 — Não! Será bem rápido, só escolha um e depois pode ir — ele sorriu novamente.

 Melanie olhou em volta. Algumas das lojas que antes estavam abertas já haviam fechado, a rua estava deserta, envolta numa atmosfera fantasmagórica e sombria, a aparência quase habitual de Baldwin. Melanie se afastou lentamente, não deixando que o homem percebesse que sua intenção era fugir.

 — Me desculpe, eu realmente preciso ir — disse Melanie.

 O homem se aproximava à medida que ela se afastava.

 — Não posso deixá-la ir embora triste. O que foi? Está com medo de mim? Não precisa se preocupar, jovem, sou só um bom homem querendo lhe oferecer um sorvete grátis.

 “Nada a se preocupar, não é?”. Ela não sabia mais o que poderia dizer a ele, sua única saída era correr sem olhar para trás.

 — Eu...Eu...Eu preciso ir.

 E foi o que fez. Melanie virou-se com rapidez e correu, correu sem parar. O medo de ser pega pelo homem sem ter ideia do que poderia acontecer a ela alimentava seu desespero em chegar a sua casa.

 Ouviu passos atrás dela. O homem a estava perseguindo. Não ousou parar para olhar o quão longe ele se encontrava, continuou correndo, mas não foi muito longe. Ela sentiu-se sendo levantada no ar e carregada de volta para o caminhão de sorvete. Antes que ela pudesse gritar, o sorveteiro a prendeu com os braços e tampou sua boca com força. Melanie tentou mordê-lo, mas era quase impossível se mexer. À medida que se debatia, seu desespero ia crescendo mais a cada segundo que se aproximavam do carro. Imediatamente, lágrimas começaram a correr de seus olhos como cachoeiras.

 O homem cachorro entrou na parte de trás do carro, fechando as portas traseiras enquanto segurava a menina com força. Ele já tinha destampado sua boca, ela conseguia gritar, mas o som era abafado pela lataria do carro. O homem agarrou um pano próximo e forçou-o contra o rosto da garota. Melanie pôde sentir um cheiro desconhecido para ela, mas surpreendentemente quase agradável, considerando a situação. Clorofórmio. Os olhos de Melanie ficaram pesados e a força se esvaiu de todos os seus membros. E então desmaiou antes que pudesse pensar em qualquer outra coisa.


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