Depois da conversa esclarecedora – até demais – que teve com Nino, Adrien estava tão imerso em pensamentos, que Tikki não sabia se falar alguma coisa melhoraria ou pioraria a situação. Com Marinette, a kwami sempre dava conselhos que a sua portadora parecia ouvir e estar agradecida por eles. Mas agora, ela não sabia se isso surtiria o mesmo efeito em Adrien, ou até o efeito contrário. Então por via das dúvidas, ela preferiu não arriscar. De qualquer maneira, estaria bem ali se ele precisasse dela.

— Adrien? – ouviram batidas na porta. A kwami se escondeu, enquanto o loiro ficava de pé.

— Pode entrar. – Nathalie adentrou o cômodo e parou na frente dele.

— Sua mãe pediu que eu avisasse que ela está se preparando para dormir e não pode vê-lo agora. Ela disse para você fazer o mesmo, pois tem esgrima amanhã de manhã. – Adrien suspirou derrotado. Queria ver a sua mãe, queria olhar nos olhos dela e se convencer da verdade. No entanto, pelo visto não seria possível.

— Obrigado, Nathalie. Já estou indo dormir. – a assistente assentiu e fez menção de sair, todavia antes que o fizesse, começou a tossir. Adrien desviou o olhar para ela, tendo praticamente um déjà vu. Talvez sua mãe, caso ela realmente fosse Hawk Moth, não estivesse usando a fusão dos Miraculous da borboleta e do pavão. Talvez ela tivesse ajuda, como seu pai teve. Era possível Nathalie ser Mayura nessa linha do tempo também?

— Está tudo bem? – indagou indo até ela. A mulher se recompôs e confirmou com um aceno de cabeça.

— Está, é claro. Boa noite, Adrien.

— Nathalie? – chamou antes que ela saísse do cômodo.

— Sim? Precisa de mais alguma coisa?

— Não, eu só... Quero te fazer uma pergunta. – ela virou na direção de Adrien, esperando – Por que você ajuda tanto a minha mãe?

— Bem, eu sou a funcionária dela. É o meu dever...

— Eu sei, eu sei. Mas você é quase como se fosse da família, você faz coisas além do que é pedido e que não são necessariamente seu dever como funcionária. Por quê? – Nathalie ponderou por alguns instantes e em seguida deu um meio sorriso.

— Sua mãe me deu uma oportunidade quando ninguém mais deu. Sou muito grata à ela e acho que um a maneira de agradecê-la, é com a minha lealdade. Nunca vou deixar a família Graham de Vanily na mão. – Adrien sentiu um arrepio ao ouvir essas palavras, as mesmas palavras que tinha dito na outra linha do tempo, só que sobre a família Agreste. – Mais alguma coisa?

Uma das coisas que aprendeu com o fato de Gabriel Agreste ser Hawk Moth, era que lealdade também poderia ser algo perigoso. Principalmente quando excessiva.

— Não. Era só isso. Boa noite, Nathalie. – ela assentiu e saiu, deixando um Adrien ainda mais pensativo para trás.

Se tinha certeza que a sua família estaria envolvida com os Miraculous de qualquer maneira, em qualquer linha do tempo, também poderia ter certeza de que Nathalie estaria ali, sendo leal à ela e fazendo o que fosse preciso. De qualquer maneira e em qualquer linha do tempo.

***

Chloé jantava com a sua família, enquanto Audrey falava sem parar sobre o seu novo trabalho. E ao contrário de André, a garota sequer prestava atenção na fala da mãe. Tudo que ela queria era ficar no seu quarto sem fazer nada com Pollen.

Desde as mudanças na linha do tempo, era assim que Chloé passava os seus dias. Trancada no quarto, participando das refeições com a família reunida e lutando contra akumas e amoks quando eles apareciam. Só via Sabrina de vez em quando e só via o resto dos seus amigos quando estavam lutando juntos. Até mesmo quase não via Adrien, visto que a mãe dele tinha ficado muito mais rigorosa sobre as visitas.  

A verdade é que Marinette e Adrien estavam focados nas mudanças da linha do tempo que afetaram a família Agreste/Graham de Vanily. Mas a família Bourgeois também tinha sido afetada e eles não estavam tão atentos a isso. Tudo bem que o fato de Hawk Moth estar de volta, era uma questão muito mais importante e que as mudanças as quais a família de Chloé sofreu, não foram exatamente ruins – como as de Adrien.

Talvez seja seu lado egoísta falando. Ou talvez ela só quisesse um pouco de atenção, de uma maneira positiva. Pois ela se sentia desanimada, era estranho estar ali com sua mãe tão presente. Parecia estar vivendo a vida da Chloé de outra Terra, não a dela mesma. Era esquisito.

— Está tudo bem, docinho? – André interrompeu o assunto e questionou, notando a expressão levemente abatida de Chloé. A verdade é que ele já havia notado que os hábitos da filha não eram mais os mesmos, embora ele não soubesse ao certo como abordar o assunto. Apesar disso, ele tentava seu melhor do jeito que podia. – Você quase não comeu nada.

— Nossa Chloé sempre foi um pouco dramática, André. – Audrey balançou a mão – Deve estar querendo a nova bolsa da Gucci. Amanhã o Jean Pascal vai comprar uma pra você.

— Não, não é isso. – Chloé suspirou. Sua mãe era um pouco menos... Um pouco menos Audrey Bourgeois nessa linha do tempo, mas mesmo assim suas palavras machucavam de vez em quando. Chloé sabia como lidar com sua mãe durante as poucas vezes em que ela estava em Paris na outra linha do tempo, todavia, agora era diferente. Precisava encarar sua personalidade todos os dias – Eu só estou um pouco cansada. Acho que vou dormir, se me derem licença. – ela levantou e virou na direção da porta para sair, no entanto foi parada por uma mão no seu ombro. Era seu pai.

— Boa noite, filhinha. Mais tarde vou levar um cházinho para você. – beijou a testa dela.

— Obrigada, pai. Boa noite. – disse e saiu com um sorriso. Nessa confusão toda, pelo menos o seu pai não tinha mudado.

***

Marinette encarava a vista da cidade, sentada na sua espreguiçadeira na sacada. Plagg estava ao lado dela, degustando algumas variedades de queijo.

— Enquanto você conversava com a Marinette da outra Terra, eu estava falando com o Plagg de lá. – o kwami disse de boca cheia – Acontece que ele não é tão legal quanto eu. – Marinette riu.

— Eu imagino que não. – brincou. Era estranho não ter Tikki, mas sabia que ela estava segura com Adrien e que era melhor assim por enquanto. E bem, ter Plagg ali com ela não era ruim. O kwami era muito engraçado e rabugento, no entanto, ele não tinha medo de dizer o que pensava. Quase que como os conselhos que Tikki dava, só que sem muita graciosidade.

— Mas ao menos a Marinette da Terra-65 não vai retirar os Miraculous da linha do tempo. – disse com uma certa tristeza.

— Não se preocupe, Plagg, não é tão ruim quanto parece. – explicou, passando a segurar o kwami com as duas mãos. – Nós ainda teremos contato com vocês, não vamos destruir os Miraculous ou algo do tipo. Lady Noire me explicou o que fazer e honestamente, a parte difícil vai ser lutar sem eles. Mas não vamos deixar você, ou Tikki, ou Trixx, ou Wayzz, ou os demais kwamis. – Plagg sorriu.

— Sendo assim eu fico mais tranquilo. – Marinette o colocou de volta dentro do prato onde ele comia sua refeição – Sabe, esse queijo todo me deixou com sono. – bocejou – Boa noite, Marinette.

— Boa noite. – o kwami voou para dentro do quarto, enquanto sua portadora ficava ali por mais um tempo.

Marinette queria só mais uma noite de calmaria, antes que precisasse lidar com as questões difíceis. Tinha marcado uma reunião com a equipe e queria falar a sós com Adrien também. Amanhã seria o dia em que ela colocaria as cartas na mesa e por fim, juntos, os heróis decidiriam o que fazer quanto à situação.

A garota bocejou e escorou suas costas na cadeira, sentindo o vento bater no seu rosto. As estrelas estavam lindas naquela noite. Ela fechou os olhos. Só mais uma noite de calmaria era o suficiente.