Raphael escrita por sherllttozierr


Capítulo 3
Uriel




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Uriel

 

 

O grito de dor de Aziraphale infestou todo o Céu. Uriel sabia que chegar até ele seria um trabalho árduo. Mesmo com os clamores desesperados do anjo, sua mãe não o respondeu. Ela não respondeu ninguém. Seus filhos, assustados, temiam o futuro. Uriel se levantou com dificuldade, observando Michael abraçar Gabriel, que chorava tão alto que chegava a ser doloroso. Seu irmão caçula era o mais fragilizado e ela entendia que ele não seria mais o mesmo.

 

 

Ninguém seria.

 

 

Uriel sempre foi a mais rígida e paciente deles. Era boa com conselhos e calma como a brisa quente de um jardim. Apesar de não participar ativamente das travessuras de Raphael, era a primeira a encobrí-lo. Sentia um vazio em seu peito. O ouro que remendava seu rosto não parecia tão brilhante e ela apenas pensava o que faria dali para frente.

 

 

Outro grito inundou o ambiente. Uriel estreitou os olhos, notando um espectro rodear seu irmão. Era negro como...

 

 

"Ele está morrendo." disse para si mesma. Pensou em Raphael. Ele iria querer que Aziraphale morresse? Iria querer um destino tão doloroso para seu amado?

 

 

Anos mais tarde, um anjo diria que Uriel foi egoísta. Talvez tenha sido mas, era Aziraphale ali. Era o pequeno raio-de-Sol de seu irmão. A única lembrança que teriam de Raphael junto com eles. Uriel se adiantou, tampando os ouvidos. O ar tremia, os anjos clamavam. Seus irmãos choravam uns nos braços dos outros. Uriel tinha que resolver isso. Tinha que parar o Principado.

 

 

"Azirapha-" o anjo ergueu o punho e uma rajada de energia derrubou Uriel com tudo. O Arcanjo sentiu-se ser jogado para trás. Se levantou tão rápido quanto. "Aziraphale, se controle!"

 

 

"Eu o quero aqui! Mãe, traga-o de volta! Mãe! Senhor!" as lágrimas fundiam-se a voz quebrada.

 

 

"Está morrendo!" Uriel disse com um grito.

 

 

"Que eu morra!" retrucou, os olhos brilhando num azul assustador revistido pelas lágrimas doloridas. O espectro o abraçava cada vez mais. "Se eu não posso tê-lo aqui, então que a morte me abrace!"

 

 

Aziraphale seria o primeiro anjo a morrer de fato. A morte de um anjo representava um desequilíbrio enorme para o universo. Uriel respirou tão fundo, mesmo não necessitando, e correu. Correu na direção do Principado e o derrubou. Aziraphale se contorceu debaixo do Arcanjo, tentando em vão se soltar, contudo, as mãos de Uriel o capturaram a cabeça. Seus olhos se arregalaram quando, de fato, o Principado teve um destino pior do que a morte.

 

 

As lembranças de um tempo feliz foram sugadas. Uriel virou os olhos, sentindo uma dor imensa. Ele caiu para o lado e notou Aziraphale, de olhos fechados, ressonar em um sono com absolutamente nada.

 

 

Uriel sufocou um soluço e se sentou. Encarou Michael e Gabriel, que olhando para ela de modo catatônicos, entenderam que foi o melhor a se fazer. Os outros anjos iam se levantando. O Céu estava em silêncio. Em luto.

 

 

Gabriel se levantou e caminhou mecanicamente para perto do Arcanjo e do Principado. Sorriu, mas não era mais tão verdadeiro quanto os sorrisos antigos. Era mecânico e monótomo. Não se podia tocar ou sentir. Os olhos roxos pareciam vazios, apenas um espelho impossibilitado de emitir um reflexo. Ele pegou Aziraphale no colo e se afastou, parando diante de Michael, que ergueu os olhos e silenciosamente, também se levantou.

 

 

Uriel assistiu seus irmãos se afastarem.

 

 

As lembranças de Raphael assolaram sua mente, mas ela prontamente as arquivou. Não poderia chorar, deveria ser forte. Ajudou um dos seus irmãos a se levantar e seguiu, notando o silêncio de sua mãe. Talvez Ela também estivesse em luto.

 

 

Aziraphale era o lembrete da ignorância e ingenuidade de todos os anjos. Pouco tempo depois, ele acordou, sem qualquer lembrança nítida o bastante que o fizesse ter uma nova crise. Sorriu para seus irmãos, aquele sorriso brilhante que era sempre destinado a Raphael. Uriel sentiu dor em assistir o Principado caminhar pelo Céu, falando com todos como se fosse um dia ensolarado. Sentiu a culpa de ter retirado a memória do que um dia fora dias felizes para ele.

 

 

O fez esquecer de Raphael. Um ato de egoísmo necessário.

 

 

Foi entregue à ele a espada flamejante que Michael nunca mais quis olhar ou tocar. E foi-lhe dado uma tarefa: Guardar o Jardim do Éden. Afastaram-no, com medo do pobre anjo ter o mesmo destino que os outros numerosos caídos. Gabriel, Michael e Uriel haviam sido egoístas ao permitirem tal ato de crueldade, mas o que eles poderiam fazer se não retirar todo aquele defeituoso sentimento que corromperia o Principado até sua morte?

 

 

Uriel achara que havia feito a coisa certa. Mesmo que toda que vez que olhava para Aziraphale doía-lhe, ela achara que havia feito a coisa certa.

 

 

E foi em apenas um mês quando tudo deu errado novamente.

 

 

Os três Arcanjos restantes desceram ao Éden silenciosos. Seus olhos observavam a Árvore do Bem e do Mal, magestosa e inespressiva. Faltava dois frutos nela. Michael fez uma careta, não gostando daquilo. Pronto para criticar a falta de controle do Céu com os humanos e o Jardim, fora interrompido por Gabriel, que com um olhar surpreso e um ruído sufocado em sua garganta, apontou para o muro onde Aziraphale deveria estar em seu posto, solitário.

 

 

Mas havia asas negras e cabelos ruivos. Michael se adiantou, sua pele brilhando em alegria. Era Raphael. Ele estava bem ali, conversando com seu Principado. Queria falar com ele, queria se aconchegar em seu abraço.

 

 

"Michael." Uriel o chamou. Michael parou e encarou a irmã. Esta, negou com a cabeça, entristecida. "Ele não é mais o Raphael."

 

 

Gabriel parecia ter retornado ao princípio. Se encolheu sob as palavras da irmã e mais se assemelhava a um filhote de cachorro confuso. Uriel segurou os dois irmãos e suspirou. Ela era o pilar deles agora. Era a que os manteria na linha e não deixaria cair em tristeza. Raphael teria orgulho de sua força e alto-controle. Ele sempre admirou isso nela.

 

 

Os três observaram com saudades seu irmão perguntar coisas nada educadas para o anjo. Este, parecia nervoso, mas sorria como podia. Era como voltar a assistir os dois amantes novamente. Gabriel quase poderia ouvir a risada de Raphael sempre que seu anjo dizia algo bondoso e fofo. Michael podia ver Aziraphale voltar a brilhar como antes, seu vazio sendo preenchido pela estranha presença do inimigo.

 

 

Uriel olhou para cima. A primeira nuvem que Raphael soprou no princípio estava sob suas cabeças, intacta. Nela, uma gota de água caiu sobre seu rosto. Ela fechou os olhos, sentindo outras molharem-lhe.

 

 

A primeira tempestade estava acontecendo. Os três Arcanjos continuaram ali, observando o anjo e o demônio interagirem.

 


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