Light and Shadow escrita por Eternal Dreams


Capítulo 7
Julgamento


Notas iniciais do capítulo

Uau, já é o útimo capítulo do ano! Por causa deste período de fim de ano, haverá um intervalo maior deste para o próximo capítulo, então este está um pouco mas longo do que o normal. Como sempre, espero que gostem. Beijos e boas Festas!



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A caminhada até a Cidadela do Alvorecer, palácio do Imperador Demaxiano, não era longa. Enquanto andava acompanhado de sua guarda real e de seus visitantes, Jarvan sentia uma sensação desagradável. Refletia sobre o recém reencontro com seu amigo de longa data, que no momento o seguia silenciosamente pelas largas ruas de Armada Locus. No entanto, quanto mais pensava no assunto, mais estranho tudo lhe parecia.  

Recebera a poucos dias atrás um comunicado vindo da nave do Ordinal, no qual fora informado sobre os crimes cometidos pelo capitão do Estrela da Manhã, Yasuo. O assassinato do irmão, massacre de prisioneiros em aguardo de julgamento, rapto de uma portadora de informações valiosas. Todos classificados como crimes de alto grau segundo as leis do império, sujeitos às mais severas punições. Porém, algo parecia estar faltando ali.  Aquilo que juntaria todas as peças do quebra cabeça, ligaria todos os fatos: Por que? 

Por que ele mataria os fiéis de templários, poupando e raptando apenas uma? Por que assassinou o próprio irmão? Pelo poder do Ora? Pra isso, não teria por que acabar com o irmão ou com os prisioneiros. Ou talvez por ter decidido seguir a ordem dos templários? Não justificaria o assassinato de seus próprios irmãos de ordem. Por mais que tentasse entender, nada ali parecia se encaixar. 

Jarvan esperara que o encontro com Kayn lhe viesse a esclarecer um pouco sobre os acontecimentos, mas tudo havia ficado ainda mais confuso. O amigo parecia mais sério e nervoso do que o normal, com olheiras fundas e o rosto pálido, muito diferente do que se lembrava. Quando mencionado os ocorridos, ele apenas repetiu as mesmas palavras ditas anteriormente no comunicado, sem informações mais específicas ou melhores explicadas. A etiqueta e a amizade o impediram de abordar o assunto logo de início, porém, esperava conseguir perguntar sobre a saúde do amigo em breve, com a esperança de poder o ajudar da melhor forma possível. 

Apesar de tudo, Jarvan sabia que não podia se preocupar com isso agora. Sua atual obrigação no momento era interrogar a garota dos Templários e cuidar de seus desdobramentos, mesmo que aquilo o incomodasse profundamente. Desde que assumiu o posto de seu pai, o fardo de controlar a manipulação do Ora era, de longe, seu trabalho mais árduo. Não apenas pela enorme quantidade de situações envolvendo o assunto, mas, principalmente, por não concordar com a visão do império como sendo uma força inflexível, autoritária e opressiva para muitos, especialmente para os Templários. Quando mais jovem, sonhava com o dia em que assumiria a coroa e revolucionaria o sistema para sempre, mas, ao invés disso, foi forçado a continuar com as rigorosas restrições de seus antepassados. 

Antes mesmo que percebesse, o majestoso palácio Cidadela do Alvorecer já estava a sua frente, ostentando duas enormes estátuas aladas de pedra construídas ao redor da entrada principal, que abria agora lentamente suas pesadas portas. Com exceção de Kayn, por ser um Ordinal, os visitantes entregaram suas armas antes de atravessarem o interior do palácio até chegarem ao Grande Salão, onde fez sinal para que Kayn e Sona o acompanhassem até o outro lado do aposento, onde uma pequena escadaria levava ao elegante trono Demaxiano. 

Os demais acompanhantes se espalharam pelo salão, que já se encontrava com uma considerável quantidade de pessoas aguardando o início do julgamento, onde cochichavam entre si e olhavam curiosamente para os recém-chegados, enquanto reverenciavam a chegada do imperador. A presença de um Ordinal ali entre eles os deixava ansiosos e excitados, e era possível escutar alguns suspiros e exclamações enquanto Shieda Kayn atravessava o salão com a prisioneira para posicioná-la em frente ao trono e, logo após, se posicionava ao lado da base da escadaria. Jarvan não conseguiu conter o sorriso ao ver que ao menos quanto a isso, nada havia mudado. 

Finalmente, olhou para a garota a sua frente. Não tinha mais como fugir, precisava engolir seus próprios princípios e assumir, uma vez mais, sua obrigação como regente. Levantou o olhar para o público que o observava e deu um profundo suspiro antes de começar. 

— Povo Demaxiano. Estamos aqui hoje, uma vez mais, para o julgamento de uma fiel seguidora da ordem templária, para decidirmos o seu futuro e o de sua sagrada ordem. - desceu o olhar novamente para a mulher – Diga o seu nome em voz alta, por favor. 

— Sona é muda. Não lhe dirá nada em voz alta. - a voz viera de baixo, do seu lado direito, e Jarvan pôde ver que era Kayn quem falara. 

A informação lhe pegara de surpresa. Não esperava ter que conseguir informações confidenciais de uma pessoa que não podia falar. 

— Oh! Entendo. Deixe-me reformular então. Me informaram que a senhorita se chamava Sona. Estou certo? - sua voz saiu suave e gentil. 

Sona o olhava ainda desconfiada, mas parecia um pouco menos tensa do que antes. Depois de alguns segundos, deu um pequeno aceno com a cabeça. 

— Ótimo! Eu sou Jarvan, também conhecido como o atual imperador. Muito prazer. - a mulher franziu a testa, mas continuou observando atentamente. - A informação que tive dizia que você era uma seguidora da organização Templária. Estava em Ionan, junto com os outros fiéis, acompanhados de dois Templários. É verdade? 

O salão esperava silenciosamente pela reação de resposta, enquanto Sona fitava o chão imóvel. Nenhum movimento. 

— Porém - continuou o imperador - nosso Ordinal parece suspeitar que você é algo mais. Não apenas uma fiel, mas uma Templária de verdade, com conhecimento pleno sobre o Ora. Ele está certo em achar isso? 

Sona agora olhava com um medo aparente em direção a Kayn, mas continuava sem demonstrar intenção de responder à pergunta. 

Ver aquela mulher acuada fazia Jarvan lembrar de cada um que já passara ali naquele salão. Lembrava de suas expressões tristes, algumas assustadas e outras enfurecidas. Lembrava também do destino de cada um, o que lhes custara o silêncio ou as respostas raivosas, fazendo-o sentir nojo de si mesmo, do que fora capaz de fazer. 

— Sei que está assustada, mas não precisa mais estar. Tenho uma proposta a lhe fazer. - sentiu a olhada de relance que Shieda lhe deu, mas já havia se decidido. Já havia passado da hora de resolver isso de uma vez por todas – Sei, melhor do que ninguém, do que o Império já fez contra o seu povo. Do que eu, até o dia de hoje, vim fazendo durante todo esse tempo, por pura covardia e conveniência. Por medo de acreditar que até mesmo uma política secular pode ser mudada. Medo de jogar fora a paz instaurada, sem se dar conta de que essa paz é restrita a poucos. E é por isso que, para alcançar a verdadeira paz, venho aqui humildemente oferecer uma aliança entre nossos povos. Cessarei todas as operações de caça, libertarei todos os prisioneiros e criemos uma associação entre o Império e templários, na qual forneceremos ambos todos os recursos necessários para a extração, manipulação e distribuição do Ora na galáxia, afim de contribuir para a evolução de nossos povos de forma única e igualitária. 

O silêncio que se seguiu após Jarvan terminar de falar durou apenas alguns segundos, até que uma explosão de vozes falando ao mesmo tempo tomou conta do salão. Olhou a sua direita e Kayn o fitava com uma expressão de horror, com a boca aberta e os olhos arregalados, como se tivesse acabado de assistir à maior tragédia de sua vida.  

— Além disso – Jarvan esperou enquanto as pessoas iam aos poucos diminuindo as vozes para escutá-lo. Levantou-se do seu trono e começou a descer lentamente as escadas – Sona. Sei que é muita informação de uma só vez, mas permita-me propor uma última coisa. Para manter esta união, para guiarmos nossos povos para um futuro onde todos  podemos ser iguais e como símbolo de nossa aliança - o imperador agora ajoelhara-se em frente à mulher, que o olhava paralisada – aceita se casar comigo? 

Antes mesmo de Sona poder expressar algo, Jarvan sentiu um forte aperto em seu braço direito. Se virou para o lado e já sabia perfeitamente quem estava ali. 

— Venha, preciso falar com você - a voz de Kayn era baixa e cortante enquanto ainda segurava seu braço com uma das mãos. 

— Isso é uma ordem, Shieda? - Jarvan podia ver no rosto do amigo que algo se contorcia ali por dentro, algo que ele fazia um grande esforço para esconder. Mesmo possuindo o poder supremo de Imperador, pensar nisso deu-lhe arrepios. 

Shieda Kayn o soltou e, aos poucos, seu rosto começou a voltar ao normal. 

— É claro que não. Mas como um Ordinal, como seu conselheiro e como seu amigo, precisamos conversar.  

Jarvan sabia que ele nunca concordaria com sua decisão. Apesar de ser uma boa pessoa, Shieda sempre fora extremamente inflexível. Lembrava-se dos conselhos duros e pragmáticos que ele lhe dera a um tempo atrás e de como aquilo o deixara horrorizado. Porém, o fato é que ele era o Imperador e Shieda um Ordinal. Por mais que lhe doesse contrariar o amigo, sua decisão estava tomada e nada mais o faria voltar atrás. 

Mesmo assim, o seguiu para fora do salão pela pequena porta localizada atrás do trono. Devia-lhe ao menos um esclarecimento sobre suas decisões, por todos os anos que trabalharam juntos pela paz, ordem e progresso. 

Fechou a porta atrás de si, abafando as vozes exaltadas vindas do Grande Salão. Um pesado silêncio caiu sobre os dois homens ali parados, até que Kayn pareceu encontrar as palavras. 

— O que foi aquilo? — sua voz ainda trazia aquele toque frio e assustador de antes, enquanto o encarava com os olhos amarelos em chamas. 

— Sei o que você pensa, Shieda. Mas eu precisava fazer isso. O nosso povo precisa disso. 

— O nosso povo precisa disso? Quando se tornou tão estúpido? Por que o nosso povo precisaria do apoio uma seita ridícula, que a gerações rouba o nosso Ora para uso próprio? 

Jarvan fechou os olhos enquanto fazia força pra não se deixar provocar pelos insultos. Não sairia do controle, não agora que dera um passo tão importante a caminho do futuro que sempre sonhara. 

— Não seja tão mente fechada. Essa “seita” já se mostrou ter um vasto conhecimento sobre o Ora, mais do que qualquer um de nós. Por mais que tentemos ignorar, os Templários foram os primeiros a descobrir sobre a substância. E além disso... conseguem enxergar nela algo que não conseguimos ver. - Jarvan se lembrava dos boatos, fofocas que eram passadas entre risos dentro do Império, sobre a relação espiritual que os Templários diziam ter com o Ora. Sendo verdade ou não, não podia negar que havia algo diferente ali, que os permitiu resistir durante tanto tempo às contínuas ações de repressão. - Nossa união será de benefício para ambas as partes e acabará com a violência desnecessária que já perdurou por tempo demais. 

— Não me diga que você acredita nesse conto de fadas. Também acha que o Ora possui um segredo de uma verdade existencial? Uma manifestação dos Deuses? Ridículo. A única coisa que o Ora representa é poder. Poder que você quer entregar de mãos beijadas para o inimigo! - sua mão esquerda, que segurava uma grande foice, agora estava retraída e Jarvan podia ver que apertava o cabo com mais força do que o normal. 

— Chega! Não discutirei isso agora. Preciso voltar ao Salão. Ainda tenho assuntos a resolver com Sona. - sabia que não conseguiria o convencer a nada por agora, não enquanto o amigo não se acalmasse. Virou-se para sair pela porta, quando escutou um riso baixo. Shieda olhava para baixo, mas podia ver seus lábios repuxados de uma forma bizarra por entre os fios de cabelo azul que lhe cobriam o rosto. 

— Que bom que você lembrou. Sona. Que cena encantadora. Mas me diga, você quer foder com ela porque gosta dos Templários ou gosta dos Templários por querer fodê-la? 

O golpe que lhe deu com as costas da mão foi o suficiente para lançar Kayn em encontro à parede mais próxima, que, após um estrondo, foi parar no chão. A raiva que subira por dentro de Jarvan era mais forte do que esperava e arfava pesadamente enquanto tentava recuperar a ordem de suas emoções. 

O homem caído começava a se levantar e, enquanto apoiava as mãos no chão, uma risada histérica voltou a sair de seus lábios, agora mais alta e mais assustadora. Seu corpo tremia vigorosamente, como se estivesse em meio a uma convulsão. Jarvan olhava a cena horrorizado, sua raiva começando a dar lugar a uma nova sensação de medo e terror. Não conhecia aquela pessoa a sua frente. Precisava voltar ao Salão para chamar por seus guardas, mas antes que pudesse alcançar a porta, a última coisa que sentiu foi uma dor repentina em sua cabeça antes de tudo se apagar. 

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Jarvan podia escutar vozes ao longe. Não sabia de quem eram nem o que diziam, mas pouco a pouco foram se tornando cada vez mais audíveis. Abriu os olhos lentamente e viu uma dezena de rostos o fitando, aparentemente aliviados pelo seu despertar. Sua cabeça doía e latejava na parte de trás e pôde sentir uma pegajosa umidade ao levar a mão até a área.  

As memórias começavam a voltar. Levantou-se de repente, procurando pelo homem que estivera ali com ele, mas tudo o que podia ver em volta de si eram os rostos de seus guardas e súditos. Perguntava-se por quanto tempo estivera apagado quando viu, separada do restante de pessoas, uma mulher cabisbaixa e contraída, sentada em um dos degraus do Grande Salão. 

Sabia que aquele rosto lhe era vagamente familiar, quando se lembrou: aquela mulher estava na equipe que Shieda Kayn trouxera consigo de sua nave. Passou às pressas por entre as pessoas que o rodeavam, ignorante às infindáveis perguntas que lhe faziam e parou em frente a mulher, que agora se levantara para encará-lo. 

— Senhor. - enquanto o reverenciava, pôde ver que seus pequenos olhos castanhos estavam molhados e ela agora passava as costas das mãos para secá-los. 

— Seu nome. 

— Vassur, senhor. 

— Vassur, onde ele está? - a mulher agora desviara o olhar e seus olhos voltavam a encher-se de lágrimas. Não tinha tempo para isso - Diga-me! 

— Ele foi embora. Pegou a garota e foi embora. E nós... nós ficamos aqui. - ela olhara de relance para um pequeno grupo de quatro homens uniformizados, parados ali perto. 

— Como? Por que ninguém o impediu?  

— Eles tentaram! Mas ele é rápido, senhor, muito rápido. Seus guardas não chegaram nem perto. - mesmo abandonada, deixada para trás, Jarvan podia sentir um toque de orgulho na voz da mulher enquanto falava sobre seu antigo chefe. 

— Sim, ele é. - respirou fundo e se sentou pesadamente ao lado de Vassur. Não sabia o que fazer agora. Shieda não apenas violara suas ordens, como fora embora e levara com ele o seu sonho. Seu plano com os templários dependia de Sona, precisava de um intermédio entre ambos os povos, e Sona era a melhor opção que tinham. Se arrependia de ter cedido às provocações e o acertado, mas alcançara o seu limite. Podiam ser amigos, mas isso não mudava o fato de ainda ser o Imperador. Respeito era tudo que lhe pedia e Shieda o jogara no lixo. 

— Senhor... tem mais uma coisa. Mas por favor, não conte a ele que eu lhe falei, ele me mataria. Mas eu preciso, não consigo mais segurar isso. 

Vassur estava agitada, com bolhas de suor brotando por todo seu rosto. Segurava uma mão na outra enquanto sua respiração se tornava cada vez mais rápida e audível. 

— Diga. Você está protegida, eu lhe prometo. - o tom amedrontado da garota o deixava receoso. Sabia que dali não viriam boas notícias. 

— Eu... algo aconteceu. Não sei o que foi, mas algo, naquele planeta, o mudou. O escutei falando sozinho mais de uma vez. O seu humor mudava repentinamente, sem explicações. É como se... é como se algo... ou alguém... o estivesse incitando a fazer aquelas coisas terríveis.  

— Quais coisas terríveis? Do que você está falando? 

A mulher agora tremia. Movia os lábios como se tentasse encontrar as palavras, mas nada coerente saía de lá. Ela precisou de um tempo até conseguir começar a falar. 

— Aquela história, aquilo não foi o que aconteceu de verdade. Yone, os prisioneiros... foi ele, senhor. Não Yasuo. Foi ele. Eu disse que aquilo não estava certo, mas não adiantou. Ele os matou, bem na frente dos meus olhos. 

Jarvan tentava processar o que ouvira. Estava paralisado, sem acreditar que aquilo era possível de acontecer. Porém, quanto mais tentava negar, mais vívidas ficavam as lembranças do som daquela risada macabra que escutara na sala atrás do Grande Salão. Era como se tudo estivesse se encaixando. 

Não tinha mais escolha. Aquilo ia muito além do que imaginara. Levantou-se rapidamente do degrau que estava sentado e virou-se para sua guarda real, que aguardava seus comandos. Foi com o coração despedaçado e uma voz triste que se dirigiu a eles. 

— Convoque os demais Ordinais. Quero um grupo partindo amanhã em busca de Shieda Kayn, para ser julgado por seus crimes contra o Império. 


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