Uma Canção de Sakura e Tomoyo: Finalmente Juntas escrita por Braunjakga


Capítulo 79
Agora é a minha hora de fazer alguma coisa




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Capítulo 79

Agora é minha hora de fazer alguma coisa

 

I

Deltebre, Catalunya, Espanha

Manhã de 2 de agosto de 2017

 

Tomoyo Daidouji depositou cravos em frente à lápide onde se lia “Larissa Ciuró Subirá i Lewis”. A morte da jovem agente dos Mossos d’esquadra, filha de pai catalão e mãe inglesa, leitora voraz dos livros de CS Lewis, seu xará de sobrenome, há quase um ano ainda não foi um fato digerido totalmente pela roxinha.   

Ao lado dela, estava o companheiro e amigo de sempre, filho de pai alemão e mãe catalã, o agente dos mossos, Albert Braun i Sant.

— Sabe que eu não entendo? Eu podia ter evitado tudo isso, mas eu era fraca, eu sempre fui fraca. 

— Não se culpe, Tomoyo. A gente tinha planos juntos, sabe? Me considero culpado por a gente não ter realizado esses planos hoje… — disse o policial de pele morena. 

— Eu podia ter invocado a armadura… 

— Você não tem culpa. Você nunca usou magia…

— Eu tentei uma vez… Eu tentei usar umas luvas mecânicas da finada fábrica da minha mãe pra lutar com os magos, eu te contei, né? — perguntou Tomoyo. O policial fez sim com a cabeça. — Foi tudo pro buraco. Agora que eu tenho o “poder” nas minhas mãos, eu não consegui usar na hora… 

— Você não pode usar na época, Tomoyo, mas isso não quer dizer que você não possa usar agora… — disse Albert, dando um pálido sorriso.

— Você não me trouxe aqui à toa, né?

— Não mesmo. O Ignacio Diaz tá em Sevilha, agora, nesse instante… 

— Agora? 

— Ele foi pra Gijón, mas logo, logo, ele volta. Eu estive observando uns movimentos suspeitos e descobri onde ele estava. Acho que depois da surra que o Marcos deu nele, ele não consegue ser o mesmo… — disse Albert, entregando uma pasta para ela. Tomoyo analisou as fotos e identificou o homem que investigava fazia mais de um ano. Ela devolveu a pasta para o amigo assim que terminou.  

— Albert… Você acha que em quanto tempo demora pra gente chegar em Sevilha? 

— Agora são oito da manhã… Com sorte, quatro da tarde, a gente chega lá.

— Ótimo! Então vamos! Agora é a minha hora de fazer alguma coisa… — disse Tomoyo, pegando a maleta onde estava a manopla da rainha, que era da armadura debaixo do palácio real de Madrid. Gotzone lhe mostrara há um ano.

 

II

 

Sevilha, Espanha

Tarde do dia 2 de agosto de 2017

 

Era um galpão escuro e empoeirado de mais uma indústria falida da Andaluzia. Uma fraca luz do sol da tarde entrava naquele lugar pelas altas janelas da construção. Aquela era a única fonte de contato com o mundo exterior. Sentado em um banquinho, ele gritava de agonia. Estava seminu, apenas com a calça. Metade do corpo dele estava negra como carvão. Já nem enxergava mais com os olhos postiços que tinha. Ao lado dele estava a armadura da Ordem da Andaluzia. Havia também uma mesinha com uma bandeja repleta de instrumentos hospitalares.  

— Fernando… Você sempre foi o meu leal servidor em Jaén… Mas não consegue colocar minha armadura de volta no lugar… — disse Ignácio, suando, trincando os dentes de agonia.

— Você bem disse, meu senhor. Só sou um sargento da Ordem, nem um Major de Comarca eu sou pra falar que sou alguma coisa na Ordem… — disse um homem negro, pegando um bisturi elétrico para fazer uma sutura na pele dele.  

— O maldito Interventor da Catalunha que fez isso com a Ordem! Vou acabar com ele assim que tiver meus poderes de volta! — disse Ignácio, aos prantos. 

— Hum… Não sei não, meu senhor! Tão dizendo que as armaduras foram passadas de geração em geração depois da proibição de 1940… Cá eu estou! Recebi a minha armadura da velha Sara… Boa alma ela era… Melhor que esses caras da Torre Negra que o senhor se juntou…   

— Não faça piadas, Fernando! Vai dar pra colocar a armadura ou não? 

— Eu nem sei como o senhor continua de pé ainda! Tá saindo pus de dentro do corpo do senhor! — disse Fernando, fazendo uma incisão no muque dele. Um líquido amarelo escorreu pelo braço, para desespero de Ignácio.

— Mas que merda! Fernando! — disse Ignácio, derrubando a bandeja com aparelhos hospitalares. — Você não consegue fazer um feitiço direito? 

— Já disse senhor: não sou um mago muito experiente. Nem muito menos sou esses cabeças da Ordem que são poderosos demais! Acho que não dá pra voltar mais! O senhor renunciou a armadura e renunciar a armadura do Dragão é morte na certa. Acho que o senhor podia procurar a Dona Gotzone e pedir a ajuda dela… — disse Fernando. Ignacio riu de nervoso. 

— Procurar a Gotzone… Eu vou procurar ela, depois de sequestrar os filhos dela? Você ficou louco? — disse Ignacio, agarrando o subordinado pela gola da armadura vermelha. 

 

A porta do galpão se abriu. Era Tomoyo e o Agente Albert, empunhando uma pistola na mão. A costureira já estava vestida com sua armadura dourada de rainha.

— Parado, Ignacio! Aqui é o Agente Albert, dos Mossos d’Esquadra! Mãos para o alto! — disse ele. Fernando obedeceu, para surpresa de Ignacio.

— O que você tá fazendo? Ele é só um comum, seu idiota! Eu não tô vendo, mas eu tô sentindo! 

— A rainha tá do lado dele! Ela tá usando a lendária armadura dourada da rainha! — disse Fernando, correndo até Tomoyo. Albert continuou a apontar a pistola e o soldado da Ordem se ajoelhou aos pés dela. 

— Majestade, por favor, poupe a vida desse homem infeliz! — disse Fernando, de joelhos para Tomoyo. A roxinha analisou a atitude dos dois e viu o corpo detonado do homem que tentou matá-la há mais de um ano.

— Você é um soldado da Ordem, não é? O que está fazendo do lado dele? — perguntou Tomoyo.

— Eu sou o Fernando Simon da cidade de Jaén, sou filho de equatorianos e sou gente honesta! O Ignacio Diaz é meu superior hierárquico na Andaluzia! Ele tava todo machucado e eu fui ajudar, como bom católico! — disse Fernando, mostrando um terço para Tomoyo. Ela ficou sentida com o gesto dele. 

— Você sabia que esse homem matou os outros Interventores das províncias? — disse Tomoyo para espanto de Fernando. Ele se levantou na hora.

— Não sabia não… 

Albert apontou com mais intensidade a arma para ele.

— Olha aqui, bom samaritano! Se não quiser ir em cana, circulando! — disse Albert, apontando para a saída. Fernando se aproximou de Ignacio e disse:

— Uma pena mesmo, senhor! Do muito valor ao meu xará, o velho Fernando Ortiz de Jaen! Sabia que ele morreu há quase um ano, mas não esperava que fosse o senhor! Acho que a sua vida de crimes o levou a esse estado! 

— Fernando… Cai fora daqui! — disse Ignacio, com os dentes trincando de raiva. O homem negro correu apressado.

— E traga reforços, por favor! — gritou Albert, enquanto Fernando dava o fora com pressa.

 

A

 

Dentro do galpão abandonado, só ficou Tomoyo, Ignacio e Albert.

— É um fim triste pra você, Ignácio! — disse Tomoyo. — Você tão altivo com seu poder, pensando que podia continuar com esse legado de terror… Eu quase morri, a Larissa morreu, mas eu não vou permitir que você mate mais gente… Meu Krav Magá ainda não envelheceu… — disse Tomoyo, fazendo pose de combate. Ignacio deu um sorriso melancólico.   

— Eu vejo… Foi essa armadura que te permitiu lutar contra o comandante da Ordem uma vez… Ela tem poder de cura infinito, mas é cansativa pra uma comum como você, não é? Então… É só eu aguentar por mais um pouco… — disse Ignacio. — Aparezca, Dragón! — A armadura da Ordem da Andaluzia montou no corpo dele.

— Oras… Eu pensei que tinha renunciado à armadura! Isso não tem lógica! — disse Albert. 

— Meu poder… Meu poder tá colando ela no meu corpo. Enquanto a Andaluzia não tiver um Interventor, eu fico com ela…  

— Você… Com essa armadura… Não tem nenhum respeito pela sua rainha? — perguntou Albert.

— Eu renunciei à essa armadura uma vez… E me arrependo… Mas não me arrependo do que eu penso, que os comuns como vocês são criaturas que precisam ser reeducadas! — disse Ignácio, arremessando alguns canos do armazém contra eles. Tomoyo e Albert desviaram. — Se eu não tive respeito pela Ordem, quem dirá da rainha comum que nós temos? — finalizou Ignacio. Albert disparou alguns tiros contra ele. As balas atravessaram a armadura, mas não foram o bastante para parar o ex-interventor. 

— Vamos ver o que vocês conseguem fazer… — disse Ignacio. Asas negras apareceram em suas costas e, com um salto, deu um chute em Tomoyo. Ela se defendeu, dando outro chute em seguida. Albert continuava a atirar, sem sucesso.

— Esse corpo está podre por dentro. Suas balas de comuns não vão funcionar comigo… — disse Ignacio. Seu braço virou borracha e, com um movimento rápido, agarrou o pescoço do policial.

— Albert! — gritou Tomoyo. Ela agarrou o outro braço dele, em vão. O membro apodrecido se desprendeu do corpo dele assim que ela o puxou. — Mas… O que é isso? 

— Eu disse que esse corpo estava podre. Tinha a esperança de recuperar meu corpo de volta com o poder da Ordem, mas eu renunciei à esse poder. Tudo porque eu odeio ver gente comum que pensa que é mago como eu! — disse Ignacio, arrogante.

— Então… Só fazer assim que a gente… Se desprende, né? — disse Albert, apertando a mão que o agarrava. Um líquido amarelo saía dos pontos onde fazia pressão com os dedos. A mão de borracha se rompeu na hora, liberando o policial. Albert pegou sua pistola do chão e apontou para ele. Mais duas mãos cresceram no lugar onde o braço havia se rompido. 

— O que você vai fazer, comun? Meu corpo está frágil, mas aqui circula um grande poder da Torre… Contra a minha vontade, mas circula… — disse Ignacio, apontando as mãos para ele. Os dedos da mão de botrracha dele estouraram, disparando como balas de borracha no policial. 

Tomoyo correu e chutou a cabeça de Ignacio. Ela se desprendeu do corpo como plástico derretido, mas um tentáculo puxou-a de volta para o lugar. O membro ficou suspensa no ar, balançando. 

— Os truques de vocês não vão funcionar contra o poder da Torre Negra! — disse Ignacio. De repente, a cabeça de plástico dele estourou como bexiga. Era Albert. A pistola dele estava diferente. Ele apertou o gatilho e ela se abriu, soltando um pulso de energia.

— Eu acho que esse funciona sim! Sou um comum, mas sou um agente da Autoridade Mágica Espanhola! — disse Albert. Os pedaços da cabeça-bexiga de Ignacio voltaram a se aglomerar novamente, dessa vez, os pedaços se juntam não de forma perfeita. Era tudo uma massa distorcida, com um olho em cima do outro e a boca torta…   

— Eu sou um monstro agora… Tudo o que eu queria… Tudo o que eu queria era… Acabar com os comuns! Recuperar nossas Cartas Clow, nossas por direito! — disse Ignacio, com a voz e a boca distorcidas.

— Você matou e arruinou a vida de um monte de gente por conta de ideias que não eram suas e implantaram na sua cabeça! Isso é errado! — disse Tomoyo. Ela correu até ele e chutou o peito dele. Estourou na hora, mas tornou a se aglomerar. O corpo de Ignacio estava tão disforme, tão irregular que Albert e a roxinha não sabiam o que era tentáculo e o que era membro. De repente, aqueles apêndices começaram a ficar mais agressivas. Albert disparava com a pistola de pulso mágico, mas quanto mais disparava, mais os tentáculos cresciam e se multiplicavam.

— Mas que droga! — berrou o agente. 

— Isso é como a hidra! — disse Tomoyo. Alguns tentáculos agarraram o pé dela e arremessaram-na contra as paredes de metal da construção. Outros tentáculos agarraram o pé de Albert e o arremessaram também. O agente caiu inconsciente. 

— Albert! — disse Tomoyo, preocupada. A massa disforme que era o corpo de Ignacio voltou a se aglomerar em um ponto só, voltando a ser o Ignacio de sempre, agora vestido com a armadura vermelha como sangue da Ordem.

— Mas… 

— Não tem explicação. Eu só tenho dez minutos antes que eu volte a ser o monstro que eu era. Eu não tenho controle sobre isso… — explicou o Interventor. — Mas eu posso adiar mais e mais o momento que eu vou voltar a ser um monstro. — disse Ignacio. Um círculo mágico preto apareceu debaixo dos pés dele. Raios saíam de lá. O galpão industrial começou a se distorcer. Placas de ferro se desprenderam das paredes e se fundiram ao corpo de Ignacio. As telhas e as vigas também se desprenderam e voaram em direção ao Interventor. Ele parecia um buraco negro vivo. O processo se acelerou e, em um minuto, toda a estrutura do galpão foi assimilada pelo corpo dele.

— Eu ganhei esse poder bizarro, só sei que ele me mantém com a forma do corpo enquanto eu tiver consciência intacta. Agora é o seu fim, Tomoyo! — disse Ignacio. Havia metal saindo do pescoço dele. Provavelmente era assim que ele mantinha a forma humana no lugar, pensou Tomoyo. Ele revestiu seu corpo com metal para manter a forma de gente, como um manequim, e usou o resto do material como fonte de energia. Uma viga de ferro saiu de um círculo mágico na mão dele. A costureira trincava os dentes.

 

B

 

Nas colinas ao redor de Sevilha, um assustado Fernando corria sem parar. Em meio à árvores, uma espada atravessou o pescoço dele. Quase que a cabeça dele foi decepada, se não fosse o fato de ele ter parado antes. Ele tombou para trás e viu que uma outra espada estava na sua orelha.

— Calminha aí… — disse uma voz vinda de trás das árvores. Eram dois homens de armadura vermelha como sangue.

— Zigor… Zigor Iñigitz? O lendário Zigor Iñigitz! Puxa vida, que sorte! — disse Fernando. 

— Você tinha que tá condenado, cara! Ajudando um ex-interventor traidor da Ordem! — disse Zigor. Ele arrancou a longa espada do chão e apontou para o pescoço do homem negro.

— Me desculpe, senhor Zigor, me desculpe! O respeito me moveu a ajudar Dom Ignacio. 

— Respeito? — indagou-se Zigor. O outro homem tocou no ombro de Zigor e fez um não com a cabeça.

— Deixe ele, Zigor. As pessoas fazem os atos mais absurdos por pura obediência cega à uma liderança, sem nem pensar se a coisa tem cabimento ou não. Isso é fato na China, isso não seria diferente aqui. — disse o homem.

— Syaoran? Syaoran do Real Madrid! Nunca pensei vê-lo aqui! Olha que você deu uma surra no meu Almeria outro dia! Você também faz parte da Ordem? — perguntou Fernando. 

Syaoran e Zigor se entreolharam confusos.

— Diga pra gente o que tá acontecendo no galpão! — disse Syaoran, assertivo. O homem negro engoliu em seco.   

 

III

 

A morena desviou da barra de ferro, mas não conseguiu desviar da chapa de aço que se aproximou sem ela perceber. Tomou uma rasteira e bateu de cara no chão de concreto. Se não fosse pela caneleira dourada da armadura, teria o pé cortado. Levantou-se e as asas brancas de anjo, que surgiram da primeira vez que usou a armadura há seis anos, apareceram nas costas dela. Tomoyo ofegava.

— Você não pode usar magia por muito tempo… Eu vejo… — disse Ignacio. — Você não tá acostumada com esse poder. Nem nunca estará! Não sei como tem gente entre os magos que pensa que a gente vem de gente como vocês.

Em um segundo, Tomoyo desferiu um soco na cara dele. O corpo gelatinoso e cheio de tentáculos não se desfez. Pelo contrário, uma rachadura surgiu na bochecha por conta do metal que ele usou para revestir seu corpo.

— Eu não pretendo usar a armadura durante muito tempo… O tempo que eu vou usar pra acabar com você! — disse Tomoyo, dando um outro soco. Ignacio arrastou-se no chão com o golpe. Ele levantou-se e sacou uma cimitarra vermelha, a arma lendária da Andaluzia. 

— Eu não sou bom com luta, sabe? Eu não tenho treinamento com o exército de Israel, não tem como ganhar de você no mano a mano, mas com isso… — Tomoyo puxou a palma da mão e um cetro saiu de lá. O moreno sorriu.

— Incrível isso. Você não tem medo? 

— Eu já passei do momento de sentir medo… — disse Tomoyo, apontando o cetro para ele. — Armadura, saia! Em nome de Tomoyo! — disse a roxinha. A armadura se desprendeu do corpo dele imediatamente, para choque de Ignacio.

— Mas…

— Eu sou a rainha da Ordem, não sou? Uma comum que você tanto odeia… — disse Tomoyo. Ignácio trincou os dentes de raiva. A armadura negra montou no corpo dele de imediato.    

— Eu odeio essa armadura de todo o meu coração. Mas quando a Ordem tomou o rumo de aceitar comuns no meio dela, eu não tive escolhas… Pena que foi uma escolha equivocada… — disse Ignacio, avançando contra ela. Tomoyo apontou o cetro contra ele e uma luz apareceu em cima da cabeça dele. Do nada, a luz explodiu e Ignacio voou pelos ares. 

— Miserável! Tá usando a energia da armadura! — disse o Interventor. Ele pegou a “arma” da Torre e levantou contra ela. Tomoyo ergueu o cetro e feixes de luz saíram da extremidade dele, como sabres de luz. 

— Não pense que eu nunca enfrentei vocês antes! — disse a morena. Os dois correram um contra o outro. Nessa hora, duas espadas cruzaram os caminhos dos dois. A arquiteta reconheceu a arma de imediato. 

— Syaoran? Zigor? — perguntou ela. Os dois estavam andando atrás dela. 

— Tomoyo… Eu sei que você já enfrentou eles antes e ganhou de todos eles. Deixa um pouco pra mim, vai? Esse cara sequestrou os meus filhos! — disse o chinês, sorrindo.

— Syaoran… — disse Ignacio, dando um sorriso nervoso. — Você não passa de um traidor de sangue que traiu o próprio sangue mágico de onde veio… 

— E você não passa de um sequestradorzinho barato que acha que pode intimidar a minha família com esse fascismo barato! Pensou mesmo que eu ia deixar seus crimes sem punição? — disse o chinês, apontando a espada para ele. 

— Eu quero mais que você se dane! Que a Gotzone se dane! Que o resto dessa Torre Negra se dane! Eu acreditei que teria um mundo melhor ! Eu lutei por um mundo melhor! E você lutou pelo o quê? Pela coisa que a Gotzone tem no meio das pernas? — disse Ignacio, transformando a “arma” na sua habitual cimitarra. 

— Eu lutei pra que a desgraça das Cartas Clow não chegasse na Terra! Coisa que vocês ‘tão tentando causar! — disse Syaoran, voando em direção à ele. As asas transparentes vermelhas apareceram nas costas dele. Ignácio fez a mesma coisa. Golpes rápidos de espada foram trocados pelos dois no ar. Em terra, Zigor e Tomoyo observavam a luta. 

— O senhor não vai ajudar, Senhor Zigor? 

— Tem horas que um homem tem que lutar sozinho pela sua família e pelos seus filhos. E outra: esse cara já tá acabado mesmo! Fica vendo só! — disse o homem grisalho, pegando uma garrafa de uísque de dentro da armadura. Ele deu um longo gole nela. Tomoyo olhou curiosa para aquilo. No céu, Syaoran deu um golpe forte o bastante para afastá-lo. Ignacio avançou contra ele, mas o jogador foi mais rápido.

— Katei Shourai! — disse ele. Uma explosão de chamas cercou o corpo do ex-interventor. Ele caiu do céu se contorcendo. Syaoran pousou assim que ele caiu no concreto. — Tá bom pra você? Esse poder é da mesma classe dos poderes do mago Clow, pelo que vejo… Ele criou uma magia capaz de enfrentar vocês antes de morrer… — disse o Chinês.

— Isso… Não acaba aqui! — disse Ignacio. Essas foram suas últimas palavras. O corpo dele brilhou e explodiu, soltando raios e fumaça.

 

IV     

 

No terreno da fábrica abandonada, Syaoran, Tomoyo, Albert e Zigor conversaram.

— Eu fico abismada com um negócio desses… Como é que ele pode ter morrido assim tão fácil? — perguntou-se Tomoyo. 

— Ele já tava fraco. Deve ter tentado de tudo pra recuperar o corpo, mas só deu errado. Roubar a armadura da Andaluzia deve ter sido a última cartada dele… — explicou Zigor. 

— Apesar de parecer que não, o sangue de dragão derramado pelo Marcos não foi em vão. Ele deve ter atuado como um veneno dentro do corpo dele e funcionou. Ordem e Torre são inimigos de séculos e o sangue dos outros interventores andaluzes deve ter sido transmitido pela armadura, o mesmo sangue das lutas passadas e desse ódio represado por tanto tempo… — sugeriu Albert. Zigor o olhou com admiração.

— Impressionante! Você podia se juntar com a gente depois que esse inferno todo acabar. O que acha? — perguntou Zigor. O policial ficou corado.

— Seria uma honra, mas agora tenho que voltar pra Catalunha. Uma longa viagem… — disse Albert, se retirando. Todos acenaram para ele. 

 

Z

 

— Bem… Acho que com isso, provamos que esses caras não são invencíveis… — disse Syaoran.

— Obrigada, Syaoran. Obrigada pelas palavras… — disse Tomoyo, corando. 

— Não são palavras, são fatos. Você é uma pessoa forte, Tomoyo, com magia ou não… Não é um poder o que faz da gente ser o que é. É o que a gente faz com ele que torna a gente especial… 

— Isso é tão autoajuda, Syaoran, isso não combina com você! — disse Tomoyo, com os olhos fechados, sorrindo. Os rapazes gargalharam. 

— É… Tô ficando meio mole com o tempo… 

— Todo mundo tá preocupado com esses caras, muitos bons interventores morreram nas mãos deles… — refletiu Zigor, pensando em Maitê e no Interventor comandante. — Ainda não usamos tudo o que nós temos, ainda não enfrentamos a cabeça da Serpente… — Ele esmagou a mão de tanta raiva que sentiu, quebrando a garrafa de uísque em suas mãos.

— Eu tenho medo até de imaginar como vai ser essa luta… — pensou Tomoyo.

— Vai ser ruim, muito ruim mesmo… — disse Zigor, olhando para o céu. — Bem, Tomoyo, você é a Rainha de Espanha agora… 

— Que isso! Uma japonesa como eu? Eu nem sou casada com o Felipe direito, como vocês falam isso? — disse a roxinha, espantada.

— Você usa a armadura da Helena com perfeição, você é digna dela… — disse Zigor, sorrindo. — Esse velho aqui já viveu demais, sabe? Quatrocentos anos nas costas não é fácil… Eu só gostaria de poder envelhecer e morrer como todo mundo… — disse Zigor, tentando chorar, mas não conseguindo. Tomoyo sentiu uma profunda empatia por ele. Syaoran também.

— Como assim? 

— Os reis e rainhas tem um dom de curar apenas com um passe de mãos… Não sei se você é capaz de devolver o meu corpo pra um último sopro de vida. — disse Zigor. 

— Tudo pra enfrentar o Interventor da Catalunha, não é? — disse Syaoran, sério. 

— Sim. Eu preciso tirar uma dúvida que tá me matando faz oitenta anos… Pra isso, eu não posso ser um zumbi… Eu preciso ganhar um corpo de carne e osso, sabe? E também, queria saber se essa armadura poder curar tudo mesmo, entende? Nenhum rei de Espanha usou a armadura até agora. Se ela está sendo usada, pode ter certeza que estamos numa crise braba mesmo… — explicou Zigor. Syaoran e Tomoyo se olharam. O chinês fez um sim para ela. A roxinha voltou-se séria para Zigor e levantou a palma da mão para ele. 

— Eu não sei bem como fazer isso… Eu não tenho magia dentro de mim. 

— Faça o que o seu coração mandar… A magia vai vir de dentro da armadura — disse Zigor. Ele se ajoelhou e fincou a espada no chão, como se Tomoyo uma rainha plena fosse. A morena fechou os olhos e disse.       

— Se é isso que você quer, Zigor Iñigitz de Donostia, então, pelo poder real de rainha da armadura, eu te curo de todos os males. Está perdoado. — disse ela, fazendo um passe no ar. Um círculo mágico apareceu debaixo dos pés de todos, uma circunferência capaz de caber todo mundo. A águia de São João estava lá, junto com a canga de prender bois da rainha Isabel de Castela e as flechas do rei Fernando de Aragão. Tomoyo ficou de olhos arregalados, Syaoran também. Uma energia subiu do círculo mágico e, então, ele desapareceu. Zigor se levantou de lá, diferente. Seus cabelos grisalhos ficaram loiros e seus olhos cinzas mudaram para azul. Sua pele branca fantasmagórica estava rosada. Ele abriu os olhos e apertou os dedos nas palmas das mãos.

— A doce sensação de estar vivo… Sentir o sangue circulando, perceber o cheiro do ar… Como eu ansiei por isso…

— Você é uma pessoa que transcendeu o tempo e não podia estar nessa era. Acho que nem os seus poderes de Interventor você tem mais, a Gotzone me explicou uma vez isso… — disse Syaoran. 

— Interventor ou não, esse velho aqui não ia morrer sem lutar pelo futuro de vocês! Ha! Vou indo — disse Zigo.. Tomoyo colocou a mão no peito, preocupada.

— Senhor Zigor… O jeito que o senhor fala é de quem vai morrer mesmo… 

— Eu já morri uma vez. Naquela vez, eu não sabia pelo que eu estava morrendo. Morri pra proteger um rei fraco. Agora, eu pretendo dar a minha vida para que vocês continuem a ver um novo amanhã, a cada dia que se passar… Agora é a minha hora de fazer alguma coisa — respondeu Zigor, com um sorriso nos lábios. A morena olhou-o espantada. As asas transparentes vermelhas surgiram em suas costas e o velho flutuou pelo ar, sob os olhares de Tomoyo e Syaoran. 

 

Continua…   

    


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