Mamãe Capítulo Bônus escrita por Beykatze


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Mais uma vez: Obrigada a todo mundo :D
Espero que gostem desse bônus bem especial que eu preparei pra vocês ♥
Boa leitura ♥



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O sol bate nas janelas e entra na cozinha, aquecendo meu rosto. Mordo uma bolacha entre um gole de chá e outro. Minha mãe é muito ruim. Depois de eu ter conseguido me mudar, tanto de casa quanto de cidade, essa bruxa resolveu me visitar.

Não quero sua visita.

Não quero ouvir sua voz.

Não quero ouvir sua respiração.

Não quero sentir seu cheiro familiar ou ouvi-la cantarolar enquanto cozinha.

Não quero.

Entretanto, não é de hoje que minhas vontades não são válidas nesse relacionamento.

Ela me ligou a alguns dias, como eu não sabia que era ela, atendi e ouvi a voz que permeava meus pesadelos.

—Cássia?

Eu perguntei quem falava, mesmo já sabendo e ela me contou uma ladainha sobre sentir saudade e querer me ver. Eu queria dizer não, mas meu peito gritava por aquilo. Quem sabe ela estivesse vindo para me pedir desculpas? Quem sabe, a partir daquele momento nós virássemos amigas e ela conseguiria me explicar as razões deturpadas de cada uma daquelas violências.

E agora aqui estou eu: ansiosa na cadeira da cozinha, bebendo minha décima xícara de chá. Ela chegará a qualquer hora e eu já não sei o que estou sentindo.

Será que ela vai me abraçar quando chegar?

Vamos nos cumprimentar só com beijinhos no rosto?

Ou sequer vamos nos tocar?

Mordo mais um pedaço do doce e quase me engasgo quando meu celular toca. Desta vez o número está salvo.

"Mamãe" ele avisa. Pego o aparelho mais rápido do que gostaria e atendo.

—Acho que estou na frente da sua casa.

Meus dedos estão tremendo e não sei bem o motivo. Engulo a bolacha, bebo o resto do meu chá, limpo a boca com as costas da mão e vou para a porta.

Meus cabelos estão bem presos? Espero não ter deixado nenhuma mecha fora do lugar, ela odeia.

E minha roupa? Não perguntei à senhorinha da casa ao lado se essa roupa estava boa e sem manchas. Espero que esteja.

Abro a porta relutante, o sino instalado para me avisar quando a maçaneta gira soa e o bafo quente do exterior invade minha casa.

—Bom dia, flor do dia- Ela fala. Pelo tom percebo que está sorrindo.

—B-bom dia- Gaguejo como uma idiota.

Minha mãe entra, abraçando meu corpo meio inerte e depositando um beijo em minha testa. Ela já está mais baixa que eu, e o toque de seu rosto no meu é o suficiente para sentir as rugas profundas que cortam sua pele.

—Que casa bonita, hum?

—Obrigada- Dou um sorriso tímido.

Saio da frente e ela entra, seu cheiro familiar invade minha casa imaculada, envenenando-a.

—Onde posso deixar minhas coisas?

—No meu quarto- Falo e vou na direção do cômodo, sendo seguida por ela. Mamãe larga as coisas em cima da cama e pergunta:

—Tem algo pra comer aqui? Estou faminta depois dessa viagem.

—Claro- A conduzo até a cozinha onde antes eu comia bolachas e tomava chá- Como foi de viagem?

Ela puxa uma cadeira e se senta.

—Ah, cansativa. Uma criança sentou ao meu lado.

—O que ela fez?- Busco duas xícaras limpas no armário e deixo sobre a mesa.

—Coisas de criança. Cantou, pulou...

—Nossa- Encho a chaleira de água e ligo o fogão.

—Pois é. Não pude nem dormir durante o passeio.

Pego dois saquinhos de chá de camomila, porque sei que é o preferido dela. Do forno, tiro um bolo de laranja assado pela manhã, pensado para esse momento.

—Você que fez?

—É de pacote- Dou de ombros- Mas eu que fiz.

Ela corta um pedaço e faz um som alegre.

—Que delícia, parabéns.

A vontade de chorar é tão grande que preciso me virar rapidamente para a chaleira e fingir que estou conferindo a água. Minha mãe elogiou meu bolo de pacotinho.

Sem "inútil" ou "não sabe nem bater um bolo". Nada. Só "que delícia".

Penso que ela realmente pode ter mudado nesses anos todos longe.

—Ainda gosta de chá de camomila?- Pergunto depois de engolir as lágrimas.

—É meu preferido.

Com um sorriso, preparo as bebidas.

—Então, o que deu que resolveu me visitar?

—Já fazia tempo que eu estava com saudades.

Mesmo com a possibilidade de uma mudança da parte dela isso ainda me dá vontade de rir.

—Mas porque agora?- Minha boca está cheia de bolo.

—Bem, a filha da vizinha estava cuidando de mim e engravidou. Lembrei logo de você na minha barriga, tão pequeninha e indefesa. A saudade bateu tão forte que eu precisei vir.

Sim, indefesa. Então porque fez tudo aquilo comigo? Mas sorrio ao invés de falar o que penso.

—Porque ela estava cuidando de você?

—Ah, depois das minhas dores fortíssimas no peito elas ficaram preocupadas.

—Mamãe! Que dores?

—Sabe como é, não quis te preocupar. Mas eu sinto pontadas muito fortes, já fui no médico e ele me deu um remedinho pra isso. Eu tomo e já passa.

—Como você está agora?

—Bem. Tomando remédio direitinho.

—Que bom- Sorrio para ela.

Terminamos de comer conversando sobre bobagens agradáveis, mas não deixo de me sentir nervosa. Não seria a primeira vez que isso aconteceria: minha mãe sendo gentil e então me apunhalando pelas costas (em sentido figurado, mas nem tanto).

—Posso tomar um banho?- Pede- A viagem me cansou mesmo.

—Claro. Se quiser tirar um cochilo depois fique à vontade.

Mostro a ela o banheiro e alcanço uma toalha. Cantarolo animada caminhando até o quarto para buscar uma muda de roupas para ela. Talvez não seja tão ruim, eu estava estressada por nada. Não sou mais criança, mamãe não pode mais me machucar.

—CÁSSIA!- O grito desesperado vem dela e corro desengonçada até o banheiro.

—MAMÃE?

—MEU REMÉDIO! MEU CORAÇÃO!

De onde o som vem acredito que ela esteja caída no Box. O som da água morna caindo abafa seus gemidos.

—Seu remédio? Onde está?

—NA BOLSA!

O fato de ela estar gritando me deixa muito nervosa. Não porque ela pode morrer a qualquer momento, mas por ela estar gritando. Nada de bom vinha depois disso.

—ME AJUDA!

Corro de volta para o quarto, me batendo no batente da porta com a aflição.

—POR FAVOR ME AJUDA! DÓI TANTO.

Encontro suas malas sobre a minha cama, abro a bolsa e vasculho lá dentro afobada. Sei que vai ser difícil encontrar qualquer coisa assim agitada, mas não consigo controlar.

—DÓI. CÁSSIA!

Tiro as peças de roupas e jogo para o outro lado do quarto ferozmente.

—CÁSSIA!

Encontro uma bolsinha, tento controlar meus dedos nervosos para pegar um objeto de cada vez.

—CÁSSIA!

Uma escova de dente, pasta, fio dental, absorvente, perfume.

—DÓI TANTO.

Ela se engasga e eu lanço a bolsinha longe também, correndo de volta ao banheiro.

—O que está fazendo aqui? MEU REMÉDIO GAROTA INÚTIL.

Ai está. Era o que faltava hoje.

Volto ao quarto, desta vez com menos velocidade, busco na outra mala, também mais devagar.

—GAROTA BURRA! NEM PRA ME AJUDAR SERVE!

Minha mão toca um frasco que, sacudindo, noto estar cheio de comprimidos.

—VINTE E SETE ANOS NA CARA E NÃO CONSEGUE NEM BUSCAR UM REMÉDIO DE MERDA.

Ouço-a tentar se levantar e voltar a tombar no chão liso.

Meus movimentos pararam por completo. Primeiro fico nervosa achando que ela vai sair de lá e eu estarei perdida. Mas então percebo: eu estou no comando. Eu. Não ela. Eu.

Com um sorriso de orelha a orelha largo o frasco de volta na mala.

—EU DEVIA TER TE DEIXADO MORRER DE FOME! NÃO VALE NEM O AR QUE RESPIRA! CEGA BURRA!

Calmamente busco meu canivete na gaveta do criado mudo, ele fica ali com medo dela. Com o medo que cultivo durante a noite, mas não de um bicho papão, dela.

Mamãe engasga mais uma vez e uiva de dor.

Ela agonia solitária enquanto ando até o banheiro com minha arma em riste.

Puxo a cortina e imagino que ela me olha esperançosa.

—Onde está... Meu remédio?- A dor parece ser tão intensa que lhe rouba o ar. Mas não ligo, me abaixo para ficar vis-à-vis com ela.

—Cássia, por favor! Não faça isso.

Ela murmura sem muitas forças. Ela não acredita que eu realmente vá fazer isso.

—Me perdoa, filha.

Mamãe pede meu perdão, mas não é verdadeiro. Ela está em uma situação muito ruim e só eu posso ajudá-la nesse momento.

Esse momento é meu triunfo. A vida inteira busquei minha mãe, mesmo nos piores momentos, mesmo quando ela me machucava. Agora é ela quem precisa de mim e vou mostrar como é ser traída pela pessoa que deveria te proteger.

Abro meu canivete, aproximando minha mão livre de seu pescoço e, em meio a súplicas sem forças, corto sua garganta com um movimento só.

Seu sangue inunda meu chão e suja minhas roupas, mas está tudo bem porque o chuveiro está ligado e ele varre o líquido escuro para dentro do ralo à medida que sai de dentro dela.

Com apenas um movimento eu livrei minha vida do meu pior pesadelo.

Lamento não ter feito antes.


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Notas finais do capítulo

E ai, gostaram?
Confesso que eu estava com medo de escrever essa e de não ficar tão boa quanto ficou Mamãe, então me mandem comentários, telegramas ou telefonemas com feedbacks, please ♥
Qualquer erro me avisem também, por favor. Tava tão ansiosa pra postar que nem corrigi direito :p hahah
Até a próxima ♥
Beijinhos ♥



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