High School Blindspot escrita por blindrepata


Capítulo 29
Capítulo Final


Notas iniciais do capítulo

Então pessoal, foi um ano navegando pela vida desses garotos e está chegando a hora de dizer adeus a eles, deixar que sigam seus caminhos e desenhem seu futuro.
Foi muito bom estar com vocês nessa jornada. Gostaria de agradecer a cada incentivo e comentário, a cada leitura, a cada tempo dedicado.
Valeu demais!
Carla fez muito por essa história, principalmente nos últimos capítulos que foram praticamente dela! Muito bom estar com você nessa jornada.



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Natasha

 

Eu acordo pela manhã e ouço Ed conversando. Sinto um toque leve em minha barriga e levanto a cabeça. Ele está tocando e conversando com minha barriga. Não consigo evitar o sorriso. Uma cena tão linda e pura como essa. Ele está muito empolgado com a gravidez e não esconde de ninguém.

— Ei! – O chamo docemente.

— Oi meu amor. – Ele me olha com carinho. – Estava aqui levando um papo com o baby.

Faz alguns dias que me mudei para o apartamento dele. Depois de tudo o que aconteceu com Jane e Roman, e também a gravidez, decidimos que não perderemos mais tempo. Eu quero estar com ele. O tempo todo. O que sentimos não parecia apenas uma paixão adolescente. É bem mais forte que isso. A nossa conexão se faz nas nossas diferenças. A beleza do nosso relacionamento se dá quando conseguimos entender que não somos iguais, e essa diferença nos completa.

Entreguei minha parte do aluguel para uma amiga das meninas com quem eu morava, e trouxe todas as minhas coisas para o apartamento de Reade. Ainda falta organizar algumas coisas e também decidir ondem ficarão os móveis do bebê. Ed sugeriu que contratássemos uma empresa para dividir melhor os cômodos, pois por enquanto não poderemos nos mudar para um apartamento maior.

Estávamos bem, muito bem. Edgar está sempre muito atencioso e preocupado comigo e com o bebê. Eu estou com pouco mais de doze semanas e minha barriga quase não aparece, mas ele está lá, pudemos ouvir o coraçãozinho e ver a pequena forma no ultrassom quando fomos ao obstetra. Não era nossa intenção ter um bebê agora, mas aconteceu e estamos muito felizes com o que vinha no pacote. Uma vida junto com Ed. É estranho que fomos amigos durante tanto tempo e quando éramos adolescentes eu nunca havia pensando nele nesse sentido até começarmos a namorar. E hoje, depois que nos reencontramos eu não consigo mais me ver longe dele.

— Ed... – Falei docemente me sentando na cama. – E ele te disse alguma coisa?

— Sim. – Ele aproxima seu rosto do meu. – Me disse que tem a mãe mais linda do mundo.

Sorrio sem graça e Ed coloca seus lábios nos meus e eu me derreto com o contato. Eu o amo demais, e toda vez que estamos juntos isso fica muito evidente. Eu nem tento mais disfarçar. Quando ele se aproxima de mim eu sinto um frio na barriga. É bom, mas eu tenho medo desse sentimento me fazer sofrer. Eu tenho medo de perdê-lo. Ele é tudo o que eu tenho. E agora nós dois teremos um filho.

— Casa comigo? – Ouço Ed falar e me assusto.

— O que você falou? – Me engasgo com as palavras.

— Eu e você, casados. – Ele aponta o dedo em minha direção e depois aponta pra si mesmo.

— Ed... – Ainda estou em choque. – Eu nem sei... Nem sei o que dizer.

— Só diz que sim. – Ed sorri encabulado.

— Sim! – Respondo me atirando em seus braços. – Mas com uma condição.

— Qual? – Ele me pergunta esperando uma resposta absurda.

— Depois que o bebê nascer. – Digo olhando no fundo dos seus olhos.

— Tá bom. – O vejo sorrir de orelha a orelha. – Mas não muito depois.

Ele me beija e me deixo levar à medida que o beijo se torna mais voraz e nossas mãos exploram nossos corpos. Sinto o toque dele em meu seio sob minha camisola e meu corpo reage. Ele tem esse poder de trazer reação instantânea ao meu corpo, mas depois da gravidez tudo parece mais intenso, com certeza são os hormônios.

— Ed... – Murmuro entre beijos e toques.

— Hum... – Ele responde igualmente excitado.

— Não podemos nos atrasar. – Explico. – Temos a reunião com a Mayfair e o diretor Pellington.

— Acho que podemos tentar um tempo recorde. – Ele toma minha boca e continua me tocando.

Eu concordo correspondendo a seus atos até nos consumirmos um no outro.

 

Patty

 

— Ah, você acordou!

Eu cheguei bem cedo ao quarto de hospital para vê-lo. Roman estava sem memória nenhuma desde que fora infectado. Mas de alguma forma ele se mostrava bem calmo. Nós estávamos fazendo o possível para lhe dizer toda a verdade, pois não queríamos que ele tivesse nenhum choque caso descobrisse algo porque não lhe contamos.

De alguma forma minha conexão com ele estava muito intensa. Eu vinha todos os dias conversar com ele e conversávamos por horas e eu lia pra ele, contava sobre meus aprendizados na área da ciência, falávamos sobre arte, tecnologia e muitas outras coisas. Entre nossas conversas sempre nos tocávamos e minha pele parecia que iria se queimar sob a mão dele.

 

Parei e respirei fundo antes de entrar na antessala da cela fazendo uma prevê recapitulação.

As últimas horas mais pareceram um jogo eletrônico insano do que vida real. A cada fase que superávamos, a próxima parecia mais difícil. Conseguimos desmontar o plano da Sandstorm e Ellen está presa. Entretanto, a bomba difusora de ZIP foi disparada dentro da van, atingindo Jane e Roman. Os dois perderam totalmente a memória oblitural, mas a memória processual ficou intacta. “Zipados”, usamos essa palavra para nos referir ao que aconteceu a eles. Talvez um dia eu transforme tudo isso num app de sucesso.

A novidade é que Jane estava coberta de tatuagens. Achei isso muito estranho. Com a autorização de Mayfair, passei ela por um scanner total. Agora tenho imagens em 3D de todas aquelas tattoos. Também precisamos colher uma vasta bateria de exames para tentar entender o que o ZIP e os efeitos que terá sobre nossos amigos zipados. Jane cooperou, apesar de estar bem grogue. Roman, por outro lado, deu bastante trabalho. Está muito agressivo. Nas acabou determinando que o colocasse nessa cela da Divisão Zero.

E aqui estou eu para acalmar a fera. Se me dessem autonomia de decisão, a primeira coisa que faria era arrancá-lo dali. Mas, me querem segura fora da cela.

“Coragem, Patterson! E segura esse crush pelo irmão gostoso da Jane.” Digo pra mim mesma e entro na sala.

Roman estava inquieto, andando de um lado para o outro da cela, músculos tensos, punhos cerrados, olhos vermelhos. Fera enjaulada. Nas tem ótimas qualidades, mas falha ao entender esses irmãos. Um pouco de empatia pode trazer resultados bem melhores que a força.

— Olá, Roman. – O cumprimento com meu melhor sorriso.

Ele vira lentamente a cabeça em minha direção. Seu olhar é sombrio, bem diferente do Roman doce e assustado que conheci na High School.

— Você não se lembra de mim, mas nos conhecemos na adolescência...

— Eu – quero – sair – daqui. – Ele diz devagar ainda me olhando daquela forma assustadora.

— Bem, isso não é possível no momento... – E sou interrompida pela imagem dele se projetando contra a parede de vidro que nos separava.

— EU QUERO SAIR DAQUI! – Ele urra descontrolado enquanto seus punhos atingem o vidro com força.

Eu tremi inteira. É, esse cara sempre desperta fortes emoções em mim. Mas me mantive firme e resolvi apelar para a sinceridade:

— Eu também quero que você saia da daí. É por isso que estou aqui. – E o olhar cético dele me quebrou. Parecia não ter qualquer esperança em outro ser humano. E como ter depois de tudo que passaram nas mãos de Ellen? É por isso mesmo que não quero desistir. – Olha, sei que é muito difícil pra você confiar em mim, mas fomos amigos um dia. – Então resolvo usar uma estratégia totalmente fora do convencional e começo a cantar sua canção favorita dos Back Street Boys.

Ao ouvir a música, ele vai se acalmando. E eu me aproximando. Ousei me sentar recostada ao vidro. Se queria ser aceita, precisava demonstrar confiança nele. Falei sobre jogos e enigmas. Funcionou. Ele se sentou e começou a ouvir. Vez ou outra voltava a ficar agitado. Pedi para que trouxessem muffins e sorvete de pistache, seus favoritos.

A confiança entre nós foi se firmando. Ele escutou com atenção tudo que eu contei e parecia aflito querendo lembrar de algo que pudesse ajudar. Descobri que sua memória estava excelente para as estratégias de jogos tanto de tabuleiros quanto eletrônicos, ele também se lembrava de princípios científicos até avançados. Wow!

Algumas horas depois, a forma como ele olhava pra mim era totalmente diferente do início, tão compassivo e carente. Sem medir as consequências, abri a porta e entrei na cela. Só lá dentro me dei conta do perigo. Mas o que vi foi Roman se atirando nos meus braços, como um menino indefeso que procura abrigo. Tentei oferecer a segurança que ele precisava, o aconchegando no meu abraço e murmurando promessas de que tudo ficaria bem.

O medo da fera se foi, mas passei a ter medo de mim mesma. Ter Roman assim tão vulnerável e quente e com aquele cheiro deliciosos que só ele tinha nos meus braços me fez sentir coisas bem inapropriadas para a situação.

Depois de bem mais calma, ele continuou deitado no meu colo, me olhando atentamente. De repente, sua mão subiu até meu rosto, seus dedos roçando meus lábios:

— Você é linda. Muito obrigada por ter vindo e por ficar comigo.

Sinto meu rosto corar.

— É o mínimo que eu podia fazer. Somos... amigos. Obrigada pelo elogio. E você também é lindo.

Sorrimos meio sem graça e mais desajeitados do que na adolescência. Droga, eu quero muito você fora daqui, Roman. Será que algum dia vou ter um “primeiro encontro” normal?

 

 

Kurt

 

A palavra pesadelo define meus últimos dias. Ver Jane se despedindo e reafirmando que me amava enquanto a névoa de ZIP tomava conta da van foi experimentar uma espécie de morte em vida. Nem me dei conta do quanto gritei o nome dela, nem do quanto lutei pra me aproximar do veículo e arrancá-la de lá. Só agora a rouquidão e as marcas roxas nos meus braços provocadas pelo excesso de força dos agente que me seguraram me contam esse lado da história.

Pensei que finalmente tinha encontrado meu final feliz quando me disseram que ela tinha sobrevivido. Quanto engano. Minha angústia estava só começando.

Primeiro tive que acompanhá-la por horas do lado de fora daquela sala de isolamento, desacordada. Seu corpo estava coberto de tatuagens, mal dava pra visualizar qualquer resquício da pele alva que me envolveu tantas vezes. Depois fui arrastado de volta ao SIOC, empurrado para preencher papéis e mais papéis. E o último deles me mostrou que tudo poderia ficar ainda pior: uma ordem de prisão colocava Jane e Roman sob custódia da ASN. A fúria pareceu sobrepujar toda a dor que eu sentia.

Invadi a sala de Nas na Divisão Zero disposto a tudo para garantir a liberdade da mulher que eu amava. Joguei o papel sobre a mesa dela e não escondi minha ira enquanto apontava para as palavras que resumiam o jogo sujo que ela fazia:

— O que significa isso?

— Você sabe o que significa, Kurt. Prometeu que ficaria fora disso se eu liberasse a busca pela criança. Cumpri minha parte no trato, agora cumpra a sua.

— Nosso acordo estava baseado no fato de Jane estar definitivamente do lado de Ellen e não foi isso que aconteceu.

— Jane e Roman são filhos de Ellen e cumplices em tudo que ela fez. Logo, são terroristas.

— Não é verdade e você sabe disso! Jane não tinha escolha. Ellen estava com Avery e a chantageava com isso. Mesmo assim, arriscaram tudo nos mandando as informações necessárias. Sem eles, nunca teríamos conseguido impedir os planos da Sandstorm! – falo quase gritando.

— Eles plantaram uma bomba de ZIP na Times Square, Weller, colocando em risco milhares de pessoas. O nome disso é terrorismo. – a mulher continuava inabalável atrás daquela mesa, não havia qualquer tipo de comoção em seu rosto.

— Inferno, Nas, eles se trancaram naquela van para impedir a propagação do gás. Nenhum deles é o vilão dessa história.

— Suicídio é comum entre terroristas. As agencias de segurança não negociam com terroristas, Weller, lembra-se? É a lei. E precisamos respeitar isso, não é mesmo? Você sempre foi um homem honesto e leal ao seu país.

— Estou falando de Justiça, Nas. Fazer justiça é mais do que simplesmente aplicar a lei. É preciso analisar a singularidade de cada caso. E eu não vou desistir de Jane.

Ela se levantou calmamente e deu a volta na mesa se colocando ao meu lado.

— Existem coisas que estão acima de mim e de você, Kurt. – ouvi-la colocar um tom carinhoso na voz me deixou ainda mais enojado. – Jane e Roman cometeram um crime e precisam pagar por ele. Você precisa parar de olhar tudo pelo prisma sentimental. Além disso, eles foram zipados, toda a sua memória foi apagada. Ela não terá qualquer tipo de sentimento por você. Provavelmente nenhum dos dois será capaz de ter sentimentos por mais ninguém.

— Não há nada comprovado. – argumentei. – E, se eles foram zerados, merecem uma segundo chance, é mais um motivo para inocentá-los.

— Está vendo? Você mesmo reconhece que eles foram zerados. Não há mais nada lá. Kurt, para o seu bem e o bem de sua filha, afaste-se de Jane. Coloque uma pedra em tudo isso. E durma tranquilo com sua consciência: ela não se recorda dos horrores do orfanato nem de nada mais que viveu. Não sentirá falta de você.

— Por tudo que ela fez, Jane merece a chance de reconstruir sua vida, ser uma pessoa normal, criar Avery.

— Ela nunca será normal, Kurt. Muito menos agora com o corpo coberto de tatuagens. Ela deixou esse sinal pra você, as tatuagens são a marca que torna visível a vastidão do dano interno que ela sofreu. – então ela parou e respirou antes de continuar – Eu vou jogar limpo com você Kurt por tudo que já tivemos. Se a ASN não ficar com a custódia de Jane, a CIA o fará e o destino dela será muito pior. E eu estarei lá, acompanhando os dois irmãos de perto. Não posso prometer nada, mas com a projeção que a derrota da Sandstorm me dará, talvez eu consiga convencer a diretoria a usar a memória processual deles, os transformando em soldados ultra secretos que realizem operações que nossos agentes não podem realizar.

— Então é isso... Você sempre dá um jeito de usar as pessoas para atingir seus objetivos. Não é a piedade ou a justiça por eles que te move. Você só quer usá-los para fazer o trabalho sujo por sua agência. Isso não vai acontecer, Nas. Eu não vou deixar.

E, quando pensei que aquilo não poderia ficar pior, a porta se abriu e Mayfair entrou acompanhada de um homem branco, alto e calvo.

— Weller, que bom que está aqui. Esse é Tom Carter, diretor da CIA. Ele está aqui para decidirmos sobre o destino de Jane e Roman. – Mayfair disse calma, mas me lançou um olhar que pedia cautela.- Carter, essa é Nas, de quem lhe falei.

— Não há nada a decidir, Mayfair. Eu vou levá-los. Tudo sobre Ellen Briggs e a Sandstorm precisa desaparecer sem deixar rastros. – Carter falou seco.

— A ASN foi fundamental para trazer a Sandstorm abaixo, Diretor Carter. Nossa agência não abre mão de ficar com os irmãos. Após os interrogatórios necessários podemos ceder Ellen para a CIA.

— Desde o início, esse foi um caso do FBI. Todos os planos de Shepherd foram executados em solo nacional. Logo, o caso estava sob nossa jurisdição. Por isso, acho que a custódia de Jane e Roman deve permanecer conosco. – Mayfair insistiu.

Antes que discussão se aprofundasse, Patterson entrou aflita:

— Mayfair, você precisa ver isso!

Eu e Mayfair a acompanhamos até seu laboratório. Reade e Zapata se juntaram a nós no caminho. Boston e Rich já nos aguardavam lá. As telas de led que nos cercavam exibiam as tatuagens de Jane fazendo diferentes conexões.

— Elas interagem umas com as outras. É o conjunto de enigmas mais fantásticos com o qual já trabalhei: números, letras, desenhos, referências. Essa aqui, atrás da orelha de Jane– disse apontando para uma das tatuagens – tem o dialeto do diabo, um idioma raro da China Antiga. E, adivinha quem conhece bem essa língua? Jane! Ela murmurava palavras nesse dialeto quando as patricinhas da escola passavam por nós e caçoavam. Pedi e ela traduziu: A cada traço, a justiça se fará para a mãe dos exilados.

— “Mãe dos Exilados” é uma referência à estátua da liberdade, caso vocês não saibam. – Boston frisou.

— E, a Estátua da Liberdade é uma referência pra todo o país e seu ideal de justiça. Logo, cada tatuagem solucionada nos ajudará a impedir um crime ou revelará os verdadeiros culpados! Isso é irado! – Rich estava empolgado.

— Jane e Roman quiseram nos dar tudo que sabiam para o caso de serem zipados ou morrerem na missão. – Kurt reafirmou. – Mas tiveram que fazer na forma de enigmas para escapar da vigilância de Ellen.

— Tudo começou debaixo do nariz de Shepherd. E atrás da orelha para nós. – Reade diz tomando um gole do chá em sua caneca.

— Mesmo com as memórias apagadas, a ajuda de Jane e Roman é fundamental. Sem a tradução de Jane teríamos demorado dias só para decifrar essa tatuagem inicial. Eles são parte desse team, Mayfair. – Tasha insistiu.

Mayfair ouviu tudo de cabeça baixa, refletindo.

— Weller, me acompanhe.

Obedeci e caminhei em silêncio ao seu lado na direção da Divisão Zero. Confiava em Mayfair mais que tudo, tinha certeza que ela não falharia conosco.

— Agente Nas e Diretor Carter, o caso Sandstorm está sob jurisdição do FBI. Gentilmente vamos ceder a custódia de Ellen Briggs a vocês. Mas os irmãos Jane e Roman ficam conosco. Acabei de transformá-los em ativos do FBI para um novo caso que estamos investigando e que mostrou que os dois podem ser bem úteis. Sendo assim, vocês já podem se retirar do NYO. A força tarefa que unia nossas agências está encerrada, Nas. Foi muito bom trabalhar com você. Mas daqui pra frente, seguiremos sozinhos. Mais uma vez, obrigada, senhores.

Segurei o sorriso até alcançarmos a segurança do corredor.

— Estou extremamente grato, senhora. Prometo que não irá se arrepender. – agradeci.

— Deixe de cerimônia, Weller. Sei o quanto Jane significa pra você. Estaremos mexendo com fogo. Lembre-se disso quando as coisas esquentarem. Agora, vá logo se encontrar com ela antes que eu me arrependa de tê-lo dispensado sem terminar aquela papelada!

— Sim, senhora. Muito obrigada.

Ultrapassei os corredores voando. Meu instinto me mandava invadir a sala de interrogatórios onde Jane estava deixando o meu amor explodir em ações. Mas me detive diante dos monitores. Tinha sido um dia muito mais difícil pra ela do que foi pra mim. Os agentes me atualizaram quanto a situação. Peguei o prontuário dela de cima da mesa, respirei fundo e entrei.

JANE

Era como estar em queda livre num abismo sem fim. Não havia nada lá sobre o meu passado no qual eu pudesse me agarrar. Eles me despiram, fotografaram, scanearam, furaram, rasparam. Permiti porque minha confusão era tão grande que não deu espaço para reações. A tristeza me dominava e sufocava.

Como se não bastasse tudo aquilo, mais tarde me ligaram numa máquina e passaram a fazer pergunta atrás de pergunta. Eu já estava mais lúcida e disposta a impor limites ao que faziam já que ninguém parecia interessado em me dar respostas.

— Escuta, isso aqui vai demorar muito. – questiono.

— Senhorita, apenas respondas as perguntas. – o agente à minha frente insistiu.

— Senhorita o quê? Senhorita quem? A resposta vai ser sempre a mesma: “eu não sei!”. Não sei meu nome, não sei quem sou. Eu deixei você me furarem, fotografarem. Mas já chega. Eu quero falar com quem manda aqui!

Eles me deixaram sozinha e descobri que a solidão era ainda pior do que as perguntas repetitivas do tal agente. O vazio na minha cabeça parecia produzia ecos para qualquer coisa que eu pensasse.

De repente, a porta se abriu e ele entrou devagar. Terno alinhado, cabelo em corte baixo, barba por fazer, postura austera. Parecia cansado. E a forma como ele olhou pra mim...

— Olá. Sou Kurt Weller, o agente responsável pelo seu caso. – ele puxou a cadeira se sentou de forma perpendicular, numa proximidade muito maior do que os agentes anteriores.

— Eu... eu preciso de ajuda... – droga, nem sei por que expus minha vulnerabilidade dessa forma, era arriscado, eu sabia. Mas meus instintos me impeliam a me abrir.

— Eu sei. Estou aqui para ajudá-la. Sei que sua memória foi quimicamente apagada, mas mesmo assim, preciso te fazer uma pergunta: você se lembra de mim?

Havia uma certa súplica no olhar dele e isso me assustou mais do que todas as outras coisas que fizeram comigo desde que acordei. Resolvi recuar e me fechar na defensiva:

— Não! – disse firme apesar da familiaridade com relação àquele homem me incomodar muito nesse momento. – E por que eu deveria?

Ele abriu a pasta em sua mão, pegou uma fotografia e colocou sobre a mesa:

— Meu nome, Kurt Weller, está tatuado em suas costas.

Tudo aquilo estava cada vez mais confuso, então insisti:

— Eu não me lembro.

— Eu sei. Também sei que foi um dia difícil. Sei que isso tudo deve ser assustador. Mas eu preciso que tente. Por favor, faça um esforço.

Algo gritava que eu devia confiar nele. Devagar coloquei uma de minhas mãos sobre a dele e levei a outra até seu rosto esperando que o toque dissesse o que meu olhar não foi capaz de revelar.

A textura da barba dele entre meus dedos, seu cheiro agora que estávamos mais próximos, os lábios, os olhos, a sobrancelha, o cabelo. No limite para conter minhas emoções, confessei:

— Eu... eu não sei quem você é. Mas os detalhes, a sensação, é muito... familiar. – e soltei um soluço sem conseguir conter as emoções que fervilhavam no meu peito. – Você é alguém muito especial pra mim...

Os lábios dele se curvaram num sorriso torto e uma lágrima escapou de seus olhos me mostrando que ele estava tão emocionado quanto eu. Então, ele pegou minha mão e colocou em seu peito para que eu sentisse as batidas violentas de seu coração.

— Nós somos muito especiais um para o outro. Eu estou aqui com você, Jane. E vou te levar pra casa.

É muito difícil explicar em palavras por que foge da racionalidade o que senti e o que fiz, mas era o que eu mais precisava naquele momento. Colei meus lábios aos dele e nos beijamos. Por vários minutos emergi daquele mar de incertezas e deixei que o carinho trocado com ele comandasse. A medida que as mãos dele envolveram meu rosto, depois deslizaram por meus braços, a familiaridade e segurança foram aumentando. Eu sabia que podia confiar minha vida à Kurt Weller.

E depois ele me tirou dali, me lavando para uma sala bem mais confortável onde me contou toda a minha história. Conheci Mayfair e ouvi atentamente suas orientações. Ela parecia uma mulher muito honesta e competente. Reencontrei Roman e o amor por meu irmão continuava ali mesmo sem memória. Conheci o laboratório de Patterson e todas as suas teorias e algoritmos para desvendar minhas tatuagens. Kurt segurou a minha mão o tempo todo. Logo depois disseram que poderíamos ir pra casa.

— Ah, eu levo o Roman pra minha casa. – a loura disse rápido. – Ele fica mais tranquilo só comigo... – e logo depois ficou bem sem graça. Acho que ela gosta dele. Isso é bom. Então concordei.

A latina balançou a cabeça inconformada com a forma como a amiga escancarou suas intenções. Depois riu e abraçou o negro alto e sério, enfiando a cabeço no pescoço dele. Ele a envolveu retribuindo o carinho. Parece que se amam. Os outros dois nerd também saíram de mãos dadas. É bom saber que estou entre pessoa que se amam. Isso me deixa segura e feliz.

Enquanto Kurt dirigia pelas ruas de NYC, cruzei os braços na frente de meu corpo, tentando afastar a onda de insegurança que me varria.

— Vocês duas são muito parecidas. – Kurt disse sorrindo pra tentar me acalmar. – Rich a chama de Jane Junior. E também têm muita coisa em comum. Avery sempre fica na defensiva com pessoas nova, mas depois de um tempo se solta. É só irmos devagar que logo vocês duas se entenderão.

— Espero que sim. Ela nunca me viu e as tatuagens podem assustá-la. Também não deve gostar muito de mim se eu a abandonei.

— Você não a abandonou, Jane. Ellen disse que ela tinha morrido. Você só soube que Avery estava viva recentemente. Desde então tem feito de tudo para consegui-la de volta. Ela só tem 5 anos, mas disseram coisas horríveis sobre você pra ela. Tentei desmentir e contar a verdadeira história sobre você, mas tem poucos dias que ela está comigo. Por isso temos que ir devagar.

Chegamos ao apartamento e logo Kurt dispensou a babá. Tentei sorrir ao dizer “olá”, mas a verdade é que a tensão mantinha minha postura rígida e um tanto quanto intimidadora. Avery se negou a responder o cumprimento. Buscou o colo do pai e ficou me olhando desconfiada, afinal eu era uma estranha.

— Essa é a mamãe. O papai disse que ia buscá-la, lembra-se? – Kurt disse tentando nos aproximar.

— Eu não gostei dela. – Avery respondeu cochichando no ouvido do pai.

Após várias tentativas, Kurt desistiu de intermediar nossa aproximação e foi para a cozinha preparar o jantar. Acho que ele pensou que talvez a comida fosse capaz de fazer o que ele não conseguiu. Isso me entristecia. Sei que não estava agindo do jeito certo, mas eu não sabia como era o jeito certo. Eram tantos sentimentos dentro de mim. A garotinha era tão linda e o amor que eu sentia por ela tão forte que me paralisava. Acabei me sentando rigidamente no sofá observando Avery ajoelhada na mesa de centro, desenhando com giz de cera e olhando rapidamente em minha direção vez ou outra. Cada detalhe do rostinho dela me encantava. Aquela distância me incomodava.

— Você desenha bem. – disse tentando me aproximar, mas fui ignorada. Respirei e decidi não desistir. – Eu não me lembro se já desenhei algum dia...

Ela parou e olhou pra mim com cara de poucos amigos:

— Você já foi criança, então já desenhou.

Era uma conclusão bem lógica. E eu não queria entrar em detalhes sobre a minha infância nada comum.

— Parece divertido. – voltei a insistir.

Meio irritada, Avery pegou uma folha colocou ao seu lado na mesa de centro, depois estendeu um giz de cera na minha direção:

— Vem tentar. – disse ainda séria.

Sentei-me ao lado dela, sentindo-me privilegiada por estar ali.

— O que eu desenho? – sei que foi uma pergunta tola, mas minha cabeça estava tão vazia e confusa que nada me ocorria.

— Eu porque eu sou sua filha. – ela disse sem olha pra mim.

Ok, pensei e comecei. Descobri que desenhar era uma habilidade que tinha e isso me acalmava muito. Foram longos minutos de silencio entre nós. Eu só a observava e reproduzia no papel a minha frente.

Algum tempo depois, Avery olhou para meu trabalho. Parou e me encarou:

— Ei, você é boa. – pegou a folha e correu para a cozinha. – Papai, papai, olha isso! A mamãe sabe em desenhar.

Fiquei ali tentando respirar para conter as lágrimas por ouvi-la me chamar de mamãe. Era o som mais doce de toda a Terra. Logo ela voltou galopante e perguntou:

— E esse desenho no seu pescoço?

— É uma tatuagem. – disse meio encabulada. – eu tenho muitas. – e mostrei minhas mãos. Boa parte do meu corpo estava coberto pela blusa de mangas longas e calça.

Avery era esperta e logo percebeu que os traços se prolongavam pra debaixo do tecido e foi empurrando minhas mangas para descobrir a pele. As expressões que ela fazia eram a coisa mais fofa que eu já tinha visto. Então começou uma chuva de perguntas que deixaria os agentes do FBI parecendo amadores em interrogatório:

— Não sai? Quem desenhou? Qual sua favorita? Quantas são? O papai já viu? Sua professora não brigava por causa dessas tatuagens? Doeu pra fazer esses desenhos? Por que você desenhou?

Eu respondia tudo que podia e pedia a ajuda dela algumas vezes. Ao contrário do que senti no interrogatório do FBI, aquilo aquecia meu coração, eu só queria mais.

— Por que você fez tantas tatuagens?

— Acho que foi para ajudar as pessoas.

— Um desenho pode ajudar pessoas?

— Sim, o desenho certo pode fazer maravilhas pelas pessoas. O desenho que você fez me ajudou. Eu estava assustava e ver você desenhando algo tão lindo me acalmou e me fez ter coragem de começar a conversar com você.

— Minha professora sempre diz que eu sou boa no desenho. Acho que eu sou como você. É assim mãe e filha, não é?

— Eu acho que é sim.

E, de repente, ela estava empoleirada no meu colo, comodamente ocupando todo o lugar que era seu por direito, deixando seu cheirinho de paz me acalmar ainda bem e o som do seu riso transformar aquele dia que começou tão terrível pra mim.

— Você me ensina a desenhar um pássaro como o seu?

— Podemos fazer todos os pássaros que você quiser.

— Espera, eu estou tendo uma ideia... – ela disse batendo o dedinho indicador na bochecha. – Papai, a mamãe pode desenhar uma tatuagem em mim?

Deus, meu coração parecia que ia explodir ao ouvi-la se referindo a mim como mamãe novamente e desejando uma tatuagem coma minha.

— Claro que pode. – a voz suave de Kurt só tudo ainda mais perfeito.

É claro que a escolha foi o pássaro no pescoço, tarefa difícil que fiz com todo amor e cuidado. Kurt logo se juntou a nós para acompanhar o momento. Acho que ri mais naqueles momentos do que tinha rido na minha vida toda.

Trabalho finalizado, fizemos fotos e ganhei um beijo. Os lanches do jantar foram servidos no chão da sala para lembrar um piquenique, afinal aquele dia era muito especial para nossa família.

Foi a primeira de muitas tatuagens que reproduzi na pele de Avery a cada dia que se seguiu. Foi o primeiro dos muito beijos que passamos a trocar todos os dias. Nós três tínhamos sintonia total.

Dali em diante, no final do dia, após cada caso complicado que enfrentávamos para trazer abaixo crimes e corrupção no nosso país, encontrávamos o refúgio no amor que compartilhávamos. O apartamento ganhou novas cores e uma parede inteira para desenho a giz no quarto de Avery. Nossa vida também ganhou muito mais cor e sabor. E, após a longa lista de brincadeiras e lições de casa, eu ainda tenho o aconchego do corpo de Kurt me envolvendo e me mostrando o quanto o amor é maravilhoso.

Minha memória foi voltando aos poucos, pequenos flashbacks que foram se aglutinando uma trama complexa. Foi uma jornada de muita ação e paz. Nossa equipe se tornou uma verdadeira família.

Kurt e Avery me trouxeram algo que eu nunca tinha vivido na minha vida: felicidade.


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Notas finais do capítulo

Beijos!!!



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