Horizonte Nuclear escrita por P B Souza


Capítulo 1
Apocalipse


Notas iniciais do capítulo

A história segue uma ordem inversa. O prólogo se chamará apocalipse. O epílogo será Gênese.
Isso não significa que a história acaba com tudo bem! Boa leitura filhos da radiação



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/783315/chapter/1

Mais de quinze milhões de pessoas iam e vinham nas suas rotinas comuns no dia Dez de Dezembro de 2023 às 14 horas e 37 minutos.

Ninguém pode se preparar, ou sequer fugir do que aconteceria no próximo segundo.

O centro histórico da cidade foi subitamente engolido por uma bola de plasma se expandindo imensuravelmente em um milésimo de segundo, momentaneamente mais quente que a superfície do sol, em um milésimo de segundo, em um raio de dois quilômetros, o plasma se expandiu em uma enorme bolha de destruição massiva, vista por fora seria como uma grande bolha branca, mas ninguém conseguiu realmente ver isso. Por dentro da bolha de plasma absolutamente tudo se foi.

Como água pingando em uma chapa quente de um restaurante, desaparece. Água, plantas, árvores, animais, pessoas, casas, prédios, carros... Tudo! Em um raio de dois quilômetros simplesmente obliterado em menos de um segundo. Quase quinhentos anos de história, arquitetura, arte, cultura, dinheiro, resumido ao vazio da inexistência completa!

E então no fim do primeiro segundo, o plasma gera um clarão tão intenso que a cidade inteira é coberta por uma explosão luminosa tão imensuravelmente potente que qualquer ser vivo olhando diretamente para a luz se tornará cego tendo sua pupila queimada instantaneamente, mas esse não é de longe o problema, já que o clarão resultante do plasma gera uma onda de calor chamada de pulso-termal tão igualmente intensa que se espalha até 13 quilômetros além do epicentro.

Pulso-termais são o resultado subsequente de toda e qualquer explosão, até mesmo de fogueiras em festas-juninas, é aquele calor que sentimos sentados ao lado da fogueira. Mas nesse caso o calor é insuportável até mesmo para o concreto. Absolutamente todas as coisas passiveis de pegar fogo, pegam fogo no 2° segundo da explosão. Centenas de milhares de pessoas estavam indo e vindo, andando nas calçadas ou sentadas almoçando, conversando... Em um segundo elas faziam suas rotinas, no outro viram um clarão e estavam em chamas, incapazes de se defenderem ou preverem, não podendo se quer erguer os braços para proteger o rosto. Subitamente tudo queima, o asfalto mais próximo ao epicentro fora do plasma, é derretido como se fosse lava.

As cidades ao redor ainda tiveram tempo o bastante para se perguntar o que acontecia, algo entre cinco ou dez segundos. Enquanto o plasma terminava sua expansão o ar comprimido na zona de explosão agora se expande descontroladamente ultrapassando a velocidade do som. A cidade afetada pelo pulso-termal se encontra em chamas no 3° segundo, quando o ar se expande, apagando toda a qualquer fagulha. Isso poderia ser considerado salvação, mas a violência dos ventos que ultrapassam 1.400 quilômetros por horas é tão destrutiva que traz apenas destruição, varrendo todas as coisas da terra. Apenas construções de concreto e aço reforçado conseguem sobreviver a destruição, mas o vento perde velocidade com excepcional facilidade, parando de destruir construções, mas ainda forte o bastante para quebrar árvores, arrastar carros e despedaçar humanos em chamas por quilômetros.

A onda de choque pode ter enfraquecido, mas mesmo fraca destruiu toda a infraestrutura da cidade em um raio de 10 quilômetros do seu epicentro. É o 4° segundo após a explosão e o plasma se desfez, deixando para trás vácuo. A cidade não está mais em chamas, mas isso não é nada bom.

Todas as construções movidas a gás se tornam bombas espalhadas, e cada canto de São Paulo tem postos de gasolina com tanques por baixo. Esses tanques entram em erupção enquanto uma nuvem-cogumelo gigante se forma, e o vácuo por baixo dessa é preenchido com ar!

Há pouco todo o ar fora expelido em uma onda de choque-termal, aonde o plasma expulsou o calor de sua explosão, criando assim um vácuo, aonde a energia resultante consumiu a si mesma, agora o espaço vazio é preenchido novamente pelo mesmo ar que fora expelido. A primeira onda de destruição empurrou tudo para fora da cidade, agora com o cogumelo superaquecido no topo, o ar frio revolve ao seu redor e retorna para a cidade enchendo as ruas destruídas de oxigênio puro, empurrando os escombros por cima dos escombros, e causando com que tudo que é capaz de explodir, tenha um suprimento infinito de ar para queimar. A cidade se torna o próprio inferno no 5° segundo. O ar acelerado a quase 500 Quilômetros por hora faz com que a cidade se torne uma malha de chamas, cobrindo as ruas em algo que poderia se descrevido como um cobertor de fogo vivo abraçando São Paulo e arredores.

Nas cidades mais distantes há 20 quilômetros, olhos curiosos vão para as janelas, apressados com seus celulares para filmar ou fotografar a grande nuvem cogumelo pairando sobre São Paulo. Inocentes, não sabem que a onda de choque chegará agora aonde eles estão. 6° segundo, tudo ao redor do epicentro sofre o impacto da explosão sonora, todos parados nas janelas ou perto de qualquer coisa como vidro, sofre com os estilhaços e ficam surdos por horas, é experimentado sangramento nasal e dos ouvidos, o calor causa queimaduras de segundo e terceiro grau em todos que estiverem nas ruas, a vegetação morre em minutos, enquanto as construções mais antigas ou frágeis vão ruir sob o próprio peso com o chão tremendo como se fosse um terremoto.

Em menos de 10 segundos, São Paulo vai de centro financeiro do país, cidade mais populosa da américa latina, uma das maiores cidades do mundo... Para absolutamente nada.

É uma certeza mais que absoluta que no coração da cidade não há nada a se procurar, até porque não sobrou nada além de uma cratera repleta de lixo radioativo resultante da explosão,

Mas ainda há sobreviventes, centenas deles. Soterrados debaixo de prédios e casas, ou vagueando com hemorragias severas pelas ruas cobertas de entulho, cegos ou surdos, espalhados em mais de mil e duzentos metros quadrados, de Osasco até Mauá, de Taboão da Serra até Guarulhos. Abandonados em suas miseráveis existências, vagueando pelo sítio radioativo que tornara-se a cidade, a cada segundo expostos aos átomos que a cada segundo lhes matavam um pouco.

Acidentes como esses, quando são acidentes, são incontestavelmente difíceis de reparar, e a ajuda humanitária é de forma simples; impossível de ser executada com eficiência. Toda ajuda humanitária depende da disponibilidade de uma infraestrutura capaz de suportar demanda. São Paulo perdera em sua essência toda sua estrutura, o que abre necessidade impar para auxílio externo, que leva tempo e requer comunicação, mas estas linhas também foram destruídas o que aumenta a demora para socorro.

Nos primeiros dias a cidade se encontra mergulhada no completo abandono, mergulhada nas trevas de sua explosão, o sol não conseguiu ultrapassar a densa nuvem de resíduo nuclear pairando estática sob a cidade. Apenas no 3° dia que, impossível de saber o horário, raios romperam pela nuvem negra, e do céu gordas gotas negras caíram, apagando os incêndios que ainda queimavam, em uma chuva que durou horas, até que todos os detritos sólidos flutuando nas nuvens fossem trazidos para o chão.

E assim, nos escombros com as mãos ensanguentadas e os braços em carne-viva, Gabriel se puxava para fora das colunas gemendo com o esforço que lhe era de certa forma desconhecido, nunca fora um homem de proeza física, na verdade passara boa parte da vida doente. Passando por blocos, porcelanato, ferro e pedaços de corpos ele se elevava das trevas de seu confinamento mortuário, sentindo-se enclausurado, questionava a cada pedra que passava o motivo de estar vivo, amaldiçoando o feitor daquela desgraça, ele escapava como um zumbi foge de seu tumulo. Como eu estou vivo? Se perguntava enquanto seu corpo não sentia absolutamente nada, ele sabia que deveria estar em inimaginável dor, mas não sentia nada, e só podia agradecer por isso, e o fazia, agradecia a cada segundo que respirava pois sabia que sua salvação era uma obra superior a sua própria vontade.

Deitou em cima dos escombros e olhou para o céu começando a mostrar seus tons azuis por cima das nuvens negras que aos poucos se dissipavam. Gabriel olhava para o céu e pensava em como poderia estar vivo, ainda mais porque quando olhava para os lados via apenas desolação, mas começava a entender. Haviam corpos ali, de pessoas mortas e vivas, as vivas assim como ele estavam caídas em cima dos escombros, sangrando pelos orifícios e pelas fraturas expostas, gritando em agonia enquanto seus corpos repletos de queimaduras se deterioravam na frente de seus olhos, haviam membros perdidos, pernas ou braços lá ou cá em manchas sanguinolentas, e moribundos desnudos ou com roupas derretidas contra a própria pele andavam para lá e para cá gritando por nomes talvez de filhos ou de esposas. Ovelhas perdidas, desgarrados ou simplesmente almas além da salvação. Mas eu não.

Na pilha de concreto destroçado aonde estava, Gabriel se levantou recuperando suas forças, olhando suas próprias mãos, dedos fortes, pulsos firmes, braços inteiros. Puxou sua camisa esfacelada, suja e ensanguenta e o tecido rasgou de seu peito revelando sua carne nua, já sequer ferido estava, olhava para o próprio peito vendo os fios de cabelo crescerem como se nada tivesse acontecido, enquanto os raios de luz do sol atingiam-no. Gabriel abriu os braços sentindo o ar, o cheiro podre de uma cidade dizimada enchendo seus pulmões não era reconfortante, sua pele refeita e seu corpo indolor, sua mente afiada lhe fazia questionar os motivos de sua recuperação milagrosa, pois era, sem dúvida alguma, um milagre. Se agachou encostando a mão nas pedras de onde sairá, olhando os escombros da igreja que frequentava todos os dias desde pequeno. ­Oh, Pai me escolheste para guiar seu rebanho. Ergueu os olhos para o céu vendo o sol brilhar sobre si, sentindo o calor acalentador dos dedos de Deus contra seu rosto.

— Me escolheu, Pai! — Bradou se pondo em pé, sentindo dentro de seu corpo a radiação, sentindo a mudança que deveria ter lhe matado, mas por algum motivo lhe fizera mais forte, por um motivo que sabia bem.

E naquele momento Gabriel deixou de existir, renascido das cinzas da perdição do apocalipse seria chamado em todas as terras do Novo Éden até Gomorra, por todos os que vivessem em nome do Senhor, ele seria chamado de Arcanjo Gabriel, o Arauto da Verdade!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Horizonte Nuclear" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.