Ahn Mi Cha;

Se eu tivesse um controle remoto como o personagem de Adam Sandler no filme “Click”, eu voltaria no tempo e ficaria de boca fechada quando escutasse Yoongi murmurar sozinho para a tela do computador.

Algum tempo atrás:

— Quem? – eu perguntei, curiosa como sempre fui, olhando para a postura relaxada de sua coluna. Yoongi girou na sua cadeira e me olhou por um momento. Eu pensei que ele finalmente fosse desculpar-se por ter me deixado de molho a tarde inteira, mas em vez disso, Yoongi virou-se de novo e começou a digitar.

— Quem o quê? – ele respondeu em um delay de cinco segundos.

— Você perguntou: “Onde você está?”. – reformulei, indo até ele — Quem?

Observei a trajetória que Yoongi fez com o cursor do mouse sob algumas fotos da chegada do Bangtan no aeroporto de Incheon. Resolvi não comentar sobre aquilo, por hora.

— Ahm... Estou compondo. – Yoongi falou, minimizando as páginas.

Descontente, expirei pela boca. Eu sei que Yoongi tem muitas responsabilidades e trabalhos pendentes a serem feitos. Também entendo que ele passou por momentos difíceis ao decorrer de sua vida, mas eu pensei que desta vez seria diferente. Ele havia me prometido que hoje, no seu dia de folga, eu seria sua prioridade.

Mas aconteceu que a “prioridade” dele passou o dia plantada no sofá, e o único diálogo que tivemos foi quando eu perguntei se ele estava com fome... (ele não estava). Eu teria almoçado sozinha se meu melhor amigo, Namjoon, não tivesse me acompanhado.  

Tentando alguma outra interação, sentei-me em suas coxas, de frente para o computador. — Posso ouvir?

— Não. – ajeitou-se na cadeira — Ainda não está pronta.

Virei-me de lado e fiz um biquinho para persuadi-lo — Só um pedacinho, huh?

— Eu disse que ainda não está pronta. – ele não soou rude, apenas incomodado. Sei como Yoongi se sente envergonhado quando o assunto é mostrar suas composições para mim.

Sabendo que pressioná-lo seria uma má ideia, peguei sua mão. — Venha comigo.

Yoongi continuou na cadeira, olhando-me curioso — Aonde?

— Para a cama. – dei um sorrisinho fraco — Você está trabalhando desde ás oito da manhã, não saiu desse estúdio nem mesmo para comer. Sei que está cansado, com fome e também sei do que você precisa: uma boa massagem.

Yoongi meneou a cabeça — Não, eu estou bem. Eu posso te levar embora se estiver muito cansada. Preciso terminar essa.. – eu o interrompi.

— Meu amor, você prometeu que hoje seria especial, que comeríamos muita besteira juntos e que iríamos maratonar One Punch Man. Mas tudo o que eu fiz foi ficar sentada nesse sofá esperando por você.

De olhos fechados, Yoongi passou a mãos nos cabelos — Me desculpe por isso, eu só... – deu uma pausa para bocejar — eu preciso terminar isso hoje.

Fiz um muxoxo — Uma pequena pausa não vai te matar. — puxei-o novamente e desta vez, Yoongi não resistiu. Seu corpo veio de encontro com o meu e assim que ele ficou em pé, um objeto caiu do meio de suas pernas. Olhei para Yoongi, depois para o retrato. Ele esticou o braço na intenção de pegá-lo, mas eu fui mais rápida.

— O que é isto? – minha pergunta foi retórica e automática, eu sabia exatamente o que era e de quem se tratava. Yoongi ficou mudo, seu semblante pálido encarando-me com angústia. — Por que ainda tem isso? – interroguei, lembrando-me de quando o fiz prometer que se livraria de tudo que o fizesse lembrar de Emma.

Sentindo-me enganada de repente, andei até sua escrivaninha e abri a primeira gaveta.

— Micha. – Yoongi alertou, segurando o meu braço direito. Desvencilhei-me conforme fuçava em seus pertences e, assim que abri a última gaveta, mais fotos de Emma surgiram.

Senti meus olhos umedecerem quando encontrei uma foto de Emma beijando o rosto de Yoongi. Seu sorriso era cativante, sorriso este que eu nunca, em um ano de relacionamento, presenciei. Ergui meu olhar até alcançar o dele. Seus olhos estavam fechados, como se discutisse internamente consigo mesmo sobre aquele ter sido um péssimo lugar para esconder suas preciosidades. — Você disse que tinha se livrado disso.

— Me desculpe, Micha. Eu..

— Você me disse que tinha superado. 

Yoongi demorou um pouco para responder  — E eu superei.

Eu me perguntei se ele estava tentando convencer a mim ou a ele mesmo. — Superou? – sentindo-me como uma mulher traída, peguei o máximo de fotos que pude e corri para o outro lado do estúdio.

— Micha. – Yoongi chamou, temendo minhas ações.

— Se você superou mesmo, não terá problemas se eu der fim nisso para você. Será um favor, certo? – rasguei a foto pela qual mais me senti atingida. Logo em seguida destruí uma outra, onde Emma sorria feliz para a câmera.

— Micha... por favor, não faça isso. – a voz de Yoongi estava carregada de sofrimento, e aquilo fez tudo ficar ainda mais doloroso para mim.  

Quando peguei outra foto do casal, Yoongi correu até mim para tentar me impedir, mas antes que ele me alcançasse, em um ato de rancor, atirei o porta-retrato em sua direção. Por sorte, Yoongi desviou e o objeto estilhaçou-se contra a parede.

— Você disse que tinha superado!!!! – vociferei, sentindo meu coração tão rasgado quanto aquelas malditas fotos.

Em silêncio, Yoongi agachou-se ao lado dos cacos de vidro e os limpou para o lado. Pegou a foto de Emma nas mãos e ficou olhando-a por um tempo. Seus olhos estavam marejados e com aquela cena, outra parte de mim se partiu ao perceber que aquele homem nunca me amaria.

— Você disse que me amava – sussurrei, meus braços caídos na lateral do meu corpo.

— Eu amo. – ele respondeu baixo, fitando as fotos rasgadas diante dos meus pés.

— Não como eu te amo. – falei, limpando uma lágrima solitária da minha bochecha. — Você não pode me amar porquê ainda está preso a Emma. 

— Não, não! – por algum motivo, Yoongi insistiu em negar — Isso não tem nada a ver, eu... – interrompi sua fala.  

— É por isso que você estava olhando as fotos do aeroporto no computador. Você está procurando por ela, acha que Emma está viva e quer encontrá-la.

Yoongi paralisou. — Quem te contou sobre isso? 

— Namjoon. Quando eu sai para almoçar sozinha hoje, ele me acompanhou. Fiz perguntas sobre você, ele ficou nervoso e me contou tudo. – solucei.

— Micha... – Yoongi aproximou-se de mim no mesmo instante em que eu dei um passo para trás. Ele franziu o cenho para a minha reação, e então secou uma lágrima — É complicado. 

— Sabe o que é complicado? É você estar me usando para esquecê-la. E o pior de tudo é saber que eu estou competindo com uma garota morta e mesmo assim estou te perdendo.

Dito isto, peguei minha bolsa em cima do sofá e abri a porta. Quando virei-me para fechá-la e dar uma última olhada em Yoongi, pude vê-lo jogar o seu piano digital para longe.

Ainda no corredor para a saída do dormitório dos meninos, desabei a chorar. Minha visão estava tão embaçada por conta das lágrimas que eu mal vi aquelas seis pessoas em meu caminho.

— Micha?!