Sonhos escrita por Subject 17


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Inicialmente era pra essa história ter no máximo 900 palavras, e de alguma forma acabou assim, então espero que eu não tenha me alongado mais do que devia.



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—Você também tem tido problemas pra dormir? –Foi o único assunto que ele conseguiu imaginar.  Se socializar sem acabar se aborrecendo, ou muitas vezes aborrecendo os demais, era algo inacreditavelmente difícil para ele. A situação em que se encontrava já era estranha o suficiente, com sua postura constantemente gritando que estava desconfortável com o constante silêncio que perpetuava entre os dois.  –Já passei algumas noites em claro por causa dessa ansiedade, sabe? Em breve nós vamos nos graduar afinal.

—Durmo feito uma pedra. –Respondeu brevemente com uma risada nasalada, quebrando qualquer expectativa do garoto tinha de melhorar a atmosfera ruim. Chegou a se divertir com a frustração repentina que ficou estampada no rosto de Eren. De qualquer forma, a presença dele ali com ela era mais reconfortante que o vento frio que não parecia querer dar trégua, então se divertiria pelo tempo que pudesse. E diferente do que era para o Jaeger, a situação não era incômoda de nenhuma forma para ela. Talvez porque depois de tanto tempo em silêncio ela quisesse poder conversas com alguém, então por que não com ele? Já o conhecia bem o suficiente para não o ver da mesma forma que a maioria dos demais cadetes de qualquer forma. –Eu gosto de sonhar, mas acho que ficar acordada pra essa realidade é importante pra mim, me mantem consciente do que eu preciso fazer. Então eu quis fugir um pouco dos dormitórios hoje.

—E sobre o que você sonha? –Agora que havia reparado, eram raras as ocasiões em que conversavam por muito tempo sem tocar no assunto do treinamento corpo-a-corpo, mais raro ainda era o assunto da conversa ser algo tão pessoal. E com esse pensamento reparou também que mesmo convivendo com Annie por quase três anos, Eren ainda não sabia muito de sua vida. O que era estranho, saber mais sobre ela sempre lhe pareceu algo interessante.

—Com meu pai, na maioria das vezes. –Ela ainda se mantinha distante dele, como se sua mente sempre estivesse vagando por outro lugar, mas não passava uma imagem de alguém inalcançável como antes. A garota não viu nenhum problema em compartilhar essa informação com ele, mesmo que nunca tivesse falado sobre isso com mais ninguém. –Na minha terra natal, em como ele deve estar sentindo minha falta agora. Caramba, eu como eu sinto falta dele agora. –Por mais bobo que pudesse parecer, ainda era bem difícil para Annie deixar emoções transparecerem. Mas diferente de como foi com sua infância, o treinamento de recrutas a fez passar por um bom tempo com outras pessoas de sua idade, ela querendo ou não, o que as vezes a obrigava a passar por isso.  Também era difícil admitir que sentia tanta a falta do seu pai, mas era algo inevitável. Mesmo que tivessem um relacionamento complicado, ele ainda é o homem que a criou e a ensinou tudo o que sabe.

—Como ele é? –Perguntou sem se dar conta de que poderia estar remoendo uma ferida antiga. Porém quando os orbes azulados lhe fitaram intrigados pela sua curiosidade, Annie felizmente parecia não ter enxergado a pergunta dessa forma. O que era ótimo para ele, que não queria outra “lição” dela por se meter onde não era chamado.

—Casca grossa. –Se limitou a dizer isso, já que era a primeira coisa que passava pela sua cabeça sempre que lembrava do pai, e também por não precisar dizer muito além daquilo. O que foi estranho para Eren, que por um momento pensou que ela falava de si mesma. –E quanto a você, sobre o que você sonha?

Era uma pergunta bem fácil de se responder para Eren. Desde que seu lar foi destruído pelos titãs, o maior objetivo de sua vida era poder exterminar a raça de monstros que subjugavam a humanidade. Mas ele não a respondeu de imediato, afinal de contas havia percebido que ela não se referia somente a isso. Depois de que conseguisse se graduar, e caso conseguisse mesmo exterminar os titãs, o que ele iria fazer de sua vida? Essa por sua vez, era uma pergunta bem mais difícil de ser respondida, e que passava ao mesmo tempo empolgação e medo no cadete.

—Com o mundo.  –Respondeu finalmente, fitando a distante lua que era a única fonte de luz para iluminar os dois na noite escura. Haviam ainda algumas tochas distantes que indicavam onde estavam os dormitórios, mas nada que pudesse clarear o seu arredor. –Com tudo que possa existir além dessas muralhas.

Annie perdurou nessas palavras por um tempo. Era algo ótimo para se sonhar ela queria poder dizer ao Jaeger, e que estaria torcendo por ele. Mas seria mentira, ela já sabia sobre o mundo que estava muito além das muralhas, e inconscientemente torcia para que Eren nunca descobrisse sobre isso também. Torcia para que os sonhos inocentes deles continuassem para sempre. Por mais que doesse admitir, ela já havia causado sofrimento demais a ele. Ver a desolação em seu rosto ao descobrir a verdade seria o estopim que levaria ao fim do seu disfarce.

—E se não for o que você espera? –O questionou tentando quebrar as expectativas. Não sabia bem o porquê disso, afinal ele provavelmente nunca conseguiria realizar esse sonho. O povo das muralhas já havia perdido muito do seu território, e eventualmente não haveriam mais soldados dispostos a se jogar para morte certa ao atravessar as muralhas. Na verdade, Annie não conseguia entender como ou porque algumas pessoas ainda faziam isso. Mas lá estava ela falando frente a frente com uma dessas pessoas, e ela ainda não conseguia entende-lo. –E se o mundo não for bonito como você imagina? E se depois dessas muralhas existir algo pior do que os titãs?

Não era algo que ele gostava de admitir, mas por mais que sonhasse em ver o mundo com seus próprios olhos ao invés de se limitar a imaginação que um livro lhe proporcionava, Eren sabia que existia uma chance de Annie estar certa. A raça humana fora confinada a aquele pedaço de terra cem anos atrás, e o mundo podia ter se transformado em algo muito diferente do que diziam os livros. Porém, essa possibilidade era algo que ele conseguia ignorar a maior parte do tempo. Poderia estar se desiludindo por todos esses anos, mas isso não lhe importava. Independente de como o mundo seja na realidade, ele descobriria isso e o veria com seus próprios olhos.

—Acho que minha única opção é descobrir por mim mesmo. –Foi a resposta mais sincera que conseguiu. Não era a mais atrativa para Annie, mas ela sabia que era a única opção para ele. –E mesmo que você vá se juntar a Brigada da Polícia Militar, você ainda não gostaria de saber o que nos espera do outro do lado? Todas as expedições que já foram feitas, todas as pessoas que deram suas vidas até hoje, tudo isso vai ter valido a pena quando conquistarmos de volta os territórios que os titãs nos tomaram! –Acabou por se empolgar no assunto, o que em uma situação diferente teria divertido a Leonhart.

Annie tentou manter um semblante tão neutro quanto podia, mas realmente não sabia como continuar com a conversa depois de ouvir isso, ou se ela ainda conseguiria fazer isso. Era difícil até de olhar o sobrevivente de Shinganshina nos olhos agora. Todo terror que o garoto havia presenciado, e ainda por cima tão novo: ter sua cidade destruída de um dia para o outro, perder seu lar e ver sua mãe se tornar outra das muitas vítimas do massacre para sempre marcado para o povo das muralhas. Tendo por quase três anos convivendo lado a lado numa relação de professora e aluno, Annie ainda se perguntava qual seria a reação de Eren ao saber que ela carregava a culpa por tudo isso.

—Você não precisa morrer também pra fazer isso tudo valer a pena, seu maníaco suicida! Já existem pessoas que fazem isso no seu lugar, não é como se um único soldado fosse fazer diferença. –Ela insistia em o fazer mudar de ideia. –Com o seu desempenho até agora você com certeza vai estar entre os dez melhores graduados, você também poderia se juntar a Brigada da Polícia Militar!

 Mesmo que já tivesse se acostumado a essa altura, aquele apelido ainda o irritava bastante. Não entendia do porquê os outros cadetes confundiam sua vontade de exterminar os titãs como uma tentativa de deliberadamente se jogar para a morte. Claro, era perigoso, mas enquanto os monstros gigantes ainda vagassem pela terra, todas as pessoas, estejam elas dentro ou fora das muralhas, corriam o risco de serem mortas por eles.  Suspirou cansado, já tinha conversado tantas vezes sobre o mesmo assunto com Armin e Mikasa que só de se explicar o deixava exaustado.

Ele sentou no chão próximo de Annie, sentindo suas pernas ficarem dormentes por tanto tempo parado de pé ao lado dela. Não podia culpa-la pensar desse jeito, até concordava com ela na verdade, mesmo que não quisesse admitir. Por mais que se dedicasse a isso, um único soldado não seria capaz de eliminar a ameaça titã sozinho, e o Corpo de Investigação certamente seguiria inalterado com ou sem a presença dele. Mas mesmo assim, ainda que ele morresse muito antes de conseguirem exterminar a ameaça titã, isso era algo que ele simplesmente não podia deixar de lado.

Não mais. Não depois de Shinganshina.

—Eu sei disso, mas nada vai mudar minha escolha de me juntar a Tropa de Exploração. –Afirmou decidido querendo encerrar esse assunto o mais breve possível. Discutir sobre isso realmente acabava com sua paciência. –E além do mais, a Polícia Militar é pra...-Ele parou quando se deu conta do que estava prestes a dizer, recebendo um olhar curioso de Annie que finalmente se virou para ele.

Anos atrás, quando Annie havia lhe falado sobre contradição que a Polícia Militar apresentava, sua visão sobre eles foi muito alterada. Aqueles mais aptos para combater os titãs eram aqueles que podiam se manter o mais distante possível dos mesmos, na momentânea segurança que a parte mais interna das muralhas proporcionava. Desde então, Eren passou a ver eles como recrutas covardes que se esforçavam ao máximo para se graduar entre os dez melhores de seu esquadrão apenas para poderem se esconder assustados dos titãs.

Mas vendo a forte garota que estava ao seu lado, sua garganta travou com essas palavras. De forma alguma Eren conseguia ver Annie Leonhart como alguém que fugia com medo. Ela nunca fez questão de esconder seu objetivo em entrar para a polícia militar, tão pouco se importava em explicar o porquê disso. Mas era evidente para Eren que Annie não tinha medo dos titãs.

—Essa sua ambição ainda vai lhe matar. –Comentou vendo o rosto ainda paralisado, cansada de esperar por uma resposta. –Ele é sempre tão cruel. –Por um momento o rapaz a fitou intrigado. –Esse mundo, eu digo. Ainda mais com pessoas tão sonhadoras.

Concordou em silêncio, não se importando muito em fazê-la enxergar a situação da mesma forma que ele. Por mais que a Brigada da Polícia Militar oferece ótimas vantagens, Eren nunca conseguiu ver a mesma como uma opção para ele. Mas saber que Annie estaria tão distante de si por essa decisão fez sua escolha pesar muito mais do que imaginava. Com certeza ela era a cadete que mais sentiria falta, provavelmente a única levando em conta que Armin e Mikasa iriam se juntar a ele no Corpo de Investigação caso não conseguissem o fazer desistir da ideia. Não se referia apenas aos treinos diários que eram a parte favorita de sua rotina, mas a ausência da mera companhia dela certamente seria causaria um grande impacto nele.

—Talvez um dia, quando a tropa erradicar os titãs, então não vamos mais precisar viver nessas muralhas. Então eu poderia te levar pra conhecer o mundo comigo. –Ofertou, querendo mais do que tudo poder estar junto dela quando se libertassem das enorme gaiolas. –Nós dois poderíamos ser livres.

Remoendo seu coração sem parar, o inocente sonho de Eren era a coisa mais tentadora do mundo para Annie. Não ter que viver sobre as amarras que o destino decidiu colocar nela. Sem ter que carregar o fardo da missão de ser uma guerreira. Não precisaria mentir para ele, tampouco ter que vê-lo como um inimigo quando tudo o que mais queria era poder estar verdadeiramente ao lado dele, sem se preocupar de alguém do outro lado do oceano a matasse por isso quando ela enfim tivesse que voltar para casa.

—Eu adoraria.

A voz fanha e rouca não passou despercebida pelo garoto, que se surpreendeu também ao ver ela escorar a cabeça em seu ombro. Muitas coisas passavam pela sua mente no momento, no que poderia ter dito para ter a deixado em um estado tão fragilizado quanto esse. Mas era óbvio, até para Eren, que Annie não queria falar sobre. E ele respeitaria essa decisão.

—Então está combinado. –Afirmou também pendendo sua cabeça na direção da dela, encostando o queixo em seu topo. – Eu vou te levar pra conhecer o mundo.


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Notas finais do capítulo

Caramba que saudade que eu senti de escrever sobre esse dois



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