The Bifröst escrita por Luana Almeida


Capítulo 3
3




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—Thor - Muriel abriu os olhos levantando o corpo em reflexo. A compressa gelada em sua testa voou longe junto com a erva em seu ferimento.

 

Ela olhou em volta e não havia ninguém. O quarto estava iluminado pelo sol da manhã que entrava pelas muitas janelas. Levantou com dificuldade sentindo a testa doer e tentando não colocar a mão onde doía. Verificou onde poderia estar a porta naquele aposento tão grande. 

 

—Thor? - abriu a porta. Dava para um corredor largo que não parecia ter fim.

 

Colocou o pé para fora da porta e viu que seu corpo agora estava coberto não por suas roupas habituais e sim por uma toga rosa que ia até os pés. Muriel deu mais alguns passos à frente da porta tentando ver o que teria nas extremidades do corredor. 

 

—Muriel? - Uma voz grossa invadiu o corredor, quase a matou de susto.

—Sim - ela se virou dando de cara com Odin, Pai de Todos. 

—Sou Odin - se apresentou, vestia uma armadura semelhante a de Thor e Loki.

—Sou Muriel - ela engoliu em seco - Mas você já sabe disso, onde está o Thor?

—Thor está em seu descanso - Odin falava de forma serena - Você também deveria estar.

—Eu não consegui ficar na cama - Muriel se sentiu inferior, afinal falava com um Deus. 

—Vamos aproveitar que você está aqui e vamos conversar - Odin agora usou seu tom paternal. 

—Sobre? - ela sentia seus pés gelarem no chão de pedra. 

—Sobre Heimdall, seu pai - Odin anunciou com um breve sorriso.

 

Muriel não fazia ideia de quem poderia ser Heimdall, mas ficara excitada com a ideia de ter um pai e torcia para que ele não estivesse morto. Um sorriso cruzou seus lábios sem mesmo que ela percebesse. Seu sonho era poder conhecer alguém que fizera verdadeiramente parte de sua vida, de sangue, não só presença. 

 

Esqueceu-se por um bom tempo de todas as palavras da canção qual a fizera acordar e não se recordaria a tempo de ligar uma coisa à outra. 

 

Caminhou com Odin pelos corredores do castelo subindo grandes escadas. Odin apresentava cada peça de decoração com orgulho. Algumas faziam parte de suas conquistas e outra eram presentes dos Deuses de outros reinos. 

 

—Temos nove reinos - começou Odin - Além de Asgard, Miögarö, Jötunhein, Muspelhein, Niflheim, Vanaheim, Álflheim, Svartalfheim, Helheim - ele citou todos calmamente.

—Todos importam? - Muriel olhava em volta, tudo era reluzente e bonito. 

—Ah sim - Odin ignorou a ignorância - Estão todos ligados. Alguns tentam dominar outros, mas Asgard sempre está em prontidão para garantir a paz. 

—Porque necessariamente Asgard? - Muriel perguntou passando por um portal que dava para a sala do trono.

—Pois sou Odin, Pai de todos - Odin andava ao seu lado. 

—Claro - ela não se importou de verdade - E meu pai?

—Esteve no Bifröst, não esteve? - Odin sentou-se ao trono.

—A entrada para Asgard? - Muriel sentou em um dos degraus que antecediam o trono.

—Exatamente - Odin relaxou - No bifröst temos um guardião, o nome dele é Heimdall - Muriel estremeceu - Heimdall cuida da entrada de Asgard assim como a de outros mundos. A parte de trás do Bifröst, a qual saiu com Thor para voltar para a casa - ela pensou se Thor contara tudo o que havia acontecido - Esta saída só é aberta quando há um pedido. 

—E onde está Heimdall? Ele não estava lá quando chegamos.

—Morto - Odin se serviu de uvas colocadas ao lado de seu assento. 

—Que ótimo - Muriel sorriu para si mesma. Alguém vivo de sua linhagem? - E por que estou aqui? 

—Não podíamos deixá-la na Terra - Odin não parecia se importar tanto com o assunto, as uvas pareciam mil vezes mais interessantes - Você faz parte de nossa profecia querida. 

 

Muriel olhou Odin com curiosidade, nunca fora nada importante e na verdade tinha medo de ser.

 

—Quando poderei ver Thor? - ela perguntou.

—Estou aqui - O Deus do trovão entrou no grande salão dessa vez sem sua capa.

—Thor - Muriel levantou e foi em sua direção - Por que me trouxe de volta? - ela marchava em direção a ele com o mesmo ódio que sentira quando o obrigou que a levasse para a casa. 

—Escute Muriel - Odin gemeu ao longe.

—Me leve para casa - Muriel continuava atravessando a sala em direção a Thor.

—Não posso.

—Agora! 

—ESCUTE MURIEL - Odin gritou e com isso um trovão estrondou do céu estremecendo o ambiente. 

 

Alguns metais tilintaram ao fundo e o chão trêmulo fez Muriel tropeçar em seu próprio pé e cair de joelhos ao chão. Sentia medo e quando levantou seu rosto uma lágrima escorreu pela bochecha. 

 

—Pai assim vai assustá-la - Thor estendeu a mão para que Muriel pudesse levantar. Assim ela fez. 

—Você faz parte de nossa profecia - Odin caminhou até onde seu filho e a garota estavam - Não pode fugir. 

 

Muriel o fitou. Odin era velho e sua barba branca o fazia parecer o papai noel, se não fosse aquele semblante de preocupação. Ao fitar Odin, a garota pode ver ao longe, uma mulher ao lado de Loki, esta era Frigga esposa de Odin, mãe de Thor e madrasta de Loki. 

 

—Não tinha ideia sobre o seu mundo até o seu filho maluco junto aos amigos dele aparecerem no meu quarto e me trazerem para cá - Muriel rangia os dentes. Chamar Thor de maluco o ofendera mais do que poderia pensar - Quero ir para a minha casa agora - ela passou os olhos de Odin para Frigga e Loki - Não vou fazer parte disso. 

—Não tem opção - Odin engoliu qualquer coisa parada em sua garganta. 

—Ela deve ter opção - Frigga aproximou-se de Odin calmamente, parecia flutuar. 

—Não se meta em meus assuntos - Odin foi rude. 

 

Frigga era uma mulher bonita. Não aparentava ter a mesma idade de Odin, se é que tinha. Seu cabelo loiro como ouro não apresentava tantas mechas brancas como o de seu esposo, branco como a neve. Os lábios de Frigga, parte qual Muriel costumava notar nas pessoas, eram de um rosa claríssimo que davam vida ao rosto quase transparente. 

—Não pode aprisioná-la aqui - Frigga tocou no braço de Odin.

—Mãe, como filha de Heimdall ela está destinada - Loki interrompeu a continuação das palavras de Frigga. 

—Cale-se Loki - foi o que Thor pode dizer. 

 

Odin pareceu ponderar. O silêncio na sala era quebrado apenas por cantos longínquos dos passáros. Muriel não conseguia entender toda aquela situação, era esquisita e surreal demais. 

 

—Vou levá-la para casa - Thor sugeriu quebrando o silêncio. 

 

Odin respirou fundo dando as costas para todos. Frigga sorriu para Thor assentindo e Loki soltou um muxoxo em reprovação. Sabia que não poderia fazer nada para mudar a situação. 

 

—*-

 

Muriel não pode dizer nada ao sair do castelo em direção ao Bifröst. Ainda estava encantada com a beleza de Frigga e o sentimento de calma que ela emanava. 

 

—Seu pai não terminou de me contar tudo - Muriel caminhava ao lado de Thor na passagem. 

—Heimdall era nosso protetor, e meu melhor amigo - Thor olhava o céu azul claríssimo - A porta de trás, qual saímos ontem é acesso de todos os reinos a Asgard ou entre eles. Quando aberta, sem o protetor para virar a chave qualquer um pode entrar e sair dos lugares sem que sejamos avisados. 

—E o que exatamente eu teria a ver com isso - Muriel olhou Thor, mais uma vez seus olhos se tornaram dourados, mas dessa vez não o assustou. 

—Sendo assim, após a morte de Heimdall você o substituiria. É o que diz a profecia ‘’Quando o mór vier a sucumbir, a nascida se tornará aquilo que ele já fora’’ - Thor decorara aquilo desde que se tornara o braço direito de seu pai. 

—Entende o quanto tudo isso soa estranho? - Muriel adentrou novamente o lugar onde seu pai passara a vida.

—Para você soa estranho - Thor apontou a saída do Bifröst, mas Muriel o ignorou. 

—Desculpe não poder ajudar -agora fitava a espada fincada ao chão, imaginava como poderia ser seu pai. 

—Você pode - Thor recolheu o braço estendido - Mas seria um egoísmo. 

 

Muriel caminhou até o altar dessa vez tentada. Analisava tudo o que acontecera e pensava se realmente aquilo era importante. Rodeou a espada olhando todos seus detalhes, era tão brilhante quanto as outras partes do Bifröst. Passou a mão sobre o guarda-mão e sentiu os entalhes nas pontas dos dedos. Olhou Thor com curiosidade.

—Gire - Thor sugeriu.

 

Com as duas mãos ela segurou o cabo e fez um movimento de giro, preferiu apoiar os pés com segurança pois imaginou que não seria fácil. Thor se aproximou com os olhos brilhando dividido entre Muriel e a saída do Bifröst. A espada não se moveu. 

 

—Hm - ela gemeu e Thor riu.

—Precisa de força - ele subiu ao altar em um passo.

 

Thor se posicionou ao lado de Muriel colocando a mão esquerda em cima das da garota, era impressionante como sua mão cobria as duas com facilidade, ali, com as pernas flexionadas ela parecia muito menor que ele. 

 

O Deus girou junto a Muriel a espada de Heimdall. Devagar com um som zunindo baixo da saída do Bifröst a luz começou a se apagar ficando somente o céu azul que cobria Asgard naquele dia. 

 

—Ah é isso? - um sentimento de decepção tomou conta dela.

—É isso? - Thor riu incomodado - Isso fecha a porta de Asgard e de qualquer outro mundo onde eu ou você não podemos sair nem entrar.

—Eu não posso voltar para casa com isso fechado? - ela perguntou se dando conta.

—Exato, e se deixarmos abertos corremos risco, assim como a Terra ou outro lugar - Thor deixou pintar seu ar de persuasão.

—Não funciona se tentar me fazer sentir culpada - eles ainda estavam muito perto um do outro, e Muriel precisava olhar para cima para ver o rosto de Thor.

—Queria que não fosse tão egoísta - Thor desabafou.

 

Muriel girou a espada dessa vez sozinha e novamente o bifröst brilhou. 

 

—Até mais Thor - Muriel entrou no Bifröst sem mesmo esperar alguma resposta. 

 

Seu corpo foi arremessado entre luzes coloridas. Sentiu a cabeça doer e quando tocou ao chão estava na frente de seu prédio. 

 

Muriel entrou no apartamento notando que tudo estava como fora deixado. Não notara até o momento, mas seu celular havia sido deixado no quarto de hotel e o único telefone fixo que conhecia era o da casa de Dolores. Precisava contar aos seus pais o que havia acontecido. 

 

O apartamento dela ficava localizado ao sul do centro da cidade, perto dos centros comerciais onde trabalhava. Ali era barato, e por mais que os pais oferececem qualquer tipo de ajuda nunca aceitou. Seus pais moravam ao norte em uma área verde da cidade. 

 

Sem pensar muito e com todo o medo que corria agora em seu corpo Muriel desceu até a garagem e pegou uma bicicleta velha qual era usualmente seu meio de transporte para o trabalho. Subiu no ferro velho e pedalou incessantemente pela avenida que levaria direto a casa de seus pais. Dobrou algumas esquinas tentando evitar o trânsito e as pessoas que corriam no horário de almoço. O vento batia em seu rosto cortando as bochechas vermelhas. Naquela época do ano Sol não era sinônimo de calor 

 

Sol, pensou Muriel, quem era o Deus do Sol? Um homem ou uma mulher? Sabia que na mitologia grega era Apolo e na romana Hélio. Tentava se lembrar de ter visto algo sobre mitologia nórdica, mas a única coisa qual realmente vira foi na seleção de livros na biblioteca que trabalhava. 

 

O bairro onde Stephen e Patrícia moravam era cheio de casas de bonecas como Muriel chamava. Ali não haviam prédios e tudo era muito verde. Um ótimo e caro lugar para se morar.

 

—Pai - Muriel jogou a bicicleta para o lado quando viu o velho Stephen no jardim.

—Querida - ele segurou a garota que se jogou em seus braços - O que houve? 

—Senti saudades - Muriel riu e Stephen a acompanhou.

 

Patrícia viu a cena da janela da cozinha e caminhou a passos rápidos ao quintal. 

 

—Oi mãe - Stephen soltou Muriel de seus braços e Patrícia os abriu para receber a filha adotiva - Vim vê-los.

 

Patrícia olhou Stephen que também aparentava estar preocupado. Não era algo comum de Muriel. 

 

—Vamos entrar? - Patrícia sugeriu. Stephen recolhia a bicicleta do quintal.

—Já sei o que te dar de natal querida - ele sugeriu vendo o estado da bicicleta.

—Os meninos não estão em casa? - Muriel perguntou ansiosa, gostaria que estivesse ali.

—Foram à aula - Patrícia sorriu sentando em sua poltrona preferida, era mais baixa que a de seu marido. 

—Eu preciso contar uma coisa - Muriel falou impaciente. Stephen ergueu os olhos para ela enquanto se sentava. 

—Imaginamos - ele sorriu.

 

Muriel sorriu com ar de alívio. Por mais que se sentisse, às vezes, deslocada na família, sentia que podia contar qualquer coisa a eles. Ela abriu a boca e pôs se a contar o que se passara nas últimas horas. Não deixou que Stephen ou Patrícia a interromperem até que falasse a última palavra. Quando avisou que acabou, como de costume em uma conversa longa na família seus pais se olharam e novamente a olharam.

 

—Não me diga que está usando drogas - Stephen foi direto.

—Pai! - Muriel protestou batendo com a mão na perna - Não sei por que contei isso a vocês. 

—Acreditamos em você - Patrícia olhou Stephen duramente - É que entende o quanto é estranho o que conta?

—Mãe eu estive lá, sei como é surreal - ela riu nervosa.

—E? - Stephen perguntou alisando o pescoço, fazia isso quando se sentia impotente e normalmente era Patrícia quem causava essa sensação. 

—E eu to aqui - Muriel bateu os pés impaciente - Mas não sei se deveria estar - seu riso nervoso lhe atacou novamente - Estou com medo. 

—Entendo - Patrícia caminhou até a filha e a abraçou - Fique conosco hoje. Logo os meninos estarão em casa.

 

Muriel sorriu. Levantou-se da poltrona indo para o quarto que agora era somente de Leonard e Arthur. O quarto ao invés de uma beliche abrigava duas camas de solteiros a cada extremidade do quarto. Preferiu sentar na cama de Leonard, pois sabia que Arthur se incomodaria com os germes que ela poderia ter trago em sua velha bicicleta. 

 

Ela olhou todas as coisas novas do quarto do lado de Leonard claro, sabia que ele não se importaria. Em cima de uma prateleira centralizada na parede onde as cabeceiras das camas ficavam havia um porta retrato. Ela e os irmãos rindo de alguma situação e Stephen aproveitara para registrar a situação. 

 

Era boa a sensação de estar em casa e ver aquela foto fez Muriel recordar da primeira noite na casa dos Walkers. Era uma noite abafada de verão. Stephen e Patrícia aproveitaram as férias de verão para transferir Muriel da escola que frequentava na época e não prejudicar seus estudos.

 

Quando Muriel decidiu que gostaria de morar com aquela família, seu tutor em Orange Country conseguiu agilizar os papéis de forma rápida e eficiente. Acrescentou a eles todos os seus boletins que informavam boas notas para que conseguisse uma bolsa em uma escola indicada por amigos. Tompson era o sobrenome dele, o primeiro ela nunca soube. Gostava muito de seu tutor, qual escondido de qualquer pessoa pensava nele lá no fundo como um pai.

 

Ouviu as vozes de Leonard e Arthur lá de cima depois de lembrar muitas coisas deitada na cama do irmão. Apesar da maturidade adquirida na responsabilidade de ser adulta deixou sua criança interior pensar na ideia de se esconder no armário para assustar os irmãos e assim o fez.

 


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