Sangue do Meu Sangue escrita por Ginty Mcfeatherfluffy


Capítulo 1
Capítulo 1




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Paris, 1854

 

                             Gustave

 

                                   Não recordo-me do mês, porém o dia, certamente era vinte e três e o horário, dez e quinze da noite. Criança alguma deveria estar fora de sua cama macia, aliás, nenhum ser humano decente deveria. Confesso que no momento eu nem sequer pensei nisto, uma mulher loira caminhava atrás de mim e sua fragrância forte era trazida a mim pelo vento, aquilo abria meu apetite – mesmo possuindo um gosto mais apurado, para a ocasião já estava de bom tamanho. Um sorriso lateral desenhava-se em meus lábios naturalmente avermelhados e dei alguns passos para trás; notei que a jovem recuava, porém, eu a alcançaria nem que levasse a noite toda.

                               - Francamente, mademoiselle, não há necessidade disto. – Eis então que minha paciência findou-se e eu simplesmente surgi diante dela, puro desprezo havia em meus olhos e nenhuma palavra mais proferi, apenas a segurei pelos ombros e, depois de aspirar uma última vez seu perfume, perfurei a pele um tanto quanto pegajosa e já sem calor, sorvendo o líquido espesso em seguida.

                                 Após minha rápida refeição, limpo minha boca e queixo, jogo o corpo flácido na lixeira mais próxima e desapareço de lá. Sou surpreendido por um lamento baixo, que pude ouvir graças a audição privilegiada que possuo. Segui em direção ao ruído, deparando-me com uma menininha de... 1 ano? Não sei, mas o que chamou-me a atenção foi o que ela vestia: algo completamente inadequado para aquele tempo. Alguma coisa acendeu-se dentro de mim e não resisti ao impulso de tomá-la em meus braços e cobri-la com minha capa; depois de alguns instantes finalmente ela acalmou-se e pude ver melhor seu rostinho. Não tenho coragem de ferir uma criança, vê? Talvez os vampiros ingleses ou americanos tenham.

                                - Você é tão linda, garotinha... Vamos para teu novo lar.

Alguns anos depois

 

                          Nomeei minha pequena com o nome de meu pequeno amor: Christine. Seu nome agora era Christine Daae, soa bem, não é? Ela é minha felicidade, realmente encontrei satisfação que sangue algum proporcionou. Apenas deparar-me com aqueles olhos cheios de vida e ternura era o suficiente para fazer-me esquecer até mesmo... O que sou.

                                 Em uma noite tão comum quanto qualquer outra, ela perguntou-me o que será dela quando eu partir. Céus, o chão desapareceu de meus pés, jamais poderia dizer-lhe que sou um amaldiçoado, condenado a viver eternamente, capaz de todas as coisas mais atrozes contra pessoas tão inocentes e... Sem sentir apenas uma ponta de remorso. Recordei-me, neste instante, daquilo que ouvi durante toda minha trajetória como músico: “Aqueles que foram visitados pelo Anjo da Música produzem um som que envergonharia qualquer outro artista.” Sim! Esta lenda que sempre considerei tola servirá enfim para alguma coisa. Guiará os passos de minha garota, viverá em sua imaginação, fortalecerá ainda mais nossos vínculos.

                               - Quando eu partir, minha criança, enviarei o Anjo da Música a você.

 

Erik

 

                              Desde criança tenho a necessidade de usar uma máscara. De fato, isto nunca agradou-me, ninguém quer viver nas sombras, a natureza força os monstros a esconderem-se. Vivi maior parte de minha infância em um circo, e eu era a atração principal, “O Filho do Diabo”, como chamavam-me; Enfiaram-me um saco de batatas na cabeça e forçam-me a receber destratos enquanto um bando de imbecis riem feito hienas. Contudo, eu nada dizia ou fazia quanto a isto; brincava com meu macaquinho de jornal, cantava baixinho e não queria abespinhar ninguém. Certo dia, no entanto, um grupo de meninas veio ao circo, somente para escarnecer de minha tortura; nunca havia visto garotas até aquele dia, e senti-me na mais cruel vergonha e desamparo. Entretanto, relanceei uma única criatura que manifestava compaixão; naquele momento, desejei sair daquele lugar, talvez para aproximar-me da mocinha, perguntá-la porque demorou tanto, dividir nossas dores, e então eu poderia ter razões e forças para seguir em frente. Assim, muni-me de coragem imprudente, apanhei uma corda e a lancei no pescoço daquele que feriu-me por tanto tempo: O desprezível Popelin. Iniciava-se então minha jornada para a liberdade, quem sabe? O que posso dizer é que aquela jovem ajudou-me imensamente, acabou por esconder-me na Ópera de Paris, onde estou até hoje.

Christine

 

                              Após sofrer o maior golpe de minha jovem vida, fui trazida até este local magnífico, o Palais Garnier, onde podia dançar e, dormir no alojamento das bailarinas. Recordo-me que, no segundo dia da estada, uma pequena loira havia pisado em meu pé esquerdo, e disto nasceu uma grande amizade! Tínhamos várias coisas em comum. Mais tarde naquele mesmo dia, uma voz chamou por mim; uma voz diferente de tudo o que eu já ouvi, era angelical, acolhedora, e ao mesmo tempo, trovejante, ardente. Ensinou-me a aperfeiçoar meu canto, dava-me aulas todas as noites – pontualmente às nove horas – certamente tratava-se do Anjo que meu pai tanto citou. Cada vez que a música saía de meus lábios, tudo em mim se transformava, minha alma alcançava o paraíso, a perfeição suprema, já não era dona de mim, a ele pertencia tudo, pensamentos, sonhos, e até desejos.  


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