Bergamota escrita por gaby


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Mais uma da série: ideias que não pude conter. Sem enrolação, tenha uma boa leitura!

Não seja um leitor fantasma, comente, por favor :)



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Sabíamos que era assim que iria acabar. Em chamas.

Sentia a magia subindo pela minha pele, toda a intensidade do poder se acumulando na superfície... mas não era tudo. Tinha uma coisa diferente, uma sensação nova, e não era o fato de eu estar brilhando em dourado, nem as minhas bordas borradas.

Tentei não pensar nisso. Na guerra. Na guerra final. Tentei não imaginar o dia em que tudo desabaria, quando o Mundo dos Bruxos iria lutar por causa do Insípidum, por causa do Mago. Tentei não pensar sobre o fato de que eu teria que lutar contra ele.

Lutar de verdade, não como das outras vezes. Não como quando lhe joguei um livro e minha mão congelou, ou quando brigamos e ele me empurrou da escada, nem como na ocasião em que brandi a espada para ele nas Catacumbas ou em qualquer outro momento. Não. Esse era o fim.

O Insípidum já era; o Mago e eu acabamos com ele, e aí as Famílias Antigas – que antes só estavam lá paradas, assistindo – se voltaram contra nós. Já era de se esperar. Digo, era o que todos imaginavam que aconteceria: os Grimm e os Pitches aguardariam terminarmos com o verdadeiro vilão, esperariam o Mago enfraquecer para então ataca-lo. Eu ainda cogitei que eles desistiriam de se opor depois que o Insípidum Insidioso fosse destruído, mas estávamos todos lançando feitiços uns contra os outros no Grande Gramado.

Eu queria gritar pedindo que parassem. Por que ainda precisávamos fazer aquilo? O Insípidum se foi, nada está ameaçando a magia! Não precisamos agir assim! Eu não quero agir assim! Eu não quero ter que guerrear com ele!

Seu cabelo está uma bagunça, caindo nos olhos, suas roupas chiques estão sujas e rasgadas, e ainda assim, mesmo completamente fodido, ele continua perfeito, porra. Ele vai ser perfeito até nosso último segundo...

Baz acende mais uma chama em sua mão – ele já incendiou a grama ao nosso redor –, a outra empunhando a varinha com firmeza na minha frente. Aperto com força o punho da Espada dos Magos; a essa altura ela está envolta em fogo. Tudo sempre é fogo.

— Não temos para onde correr, Snow – ele sorri, acabado, cansado... triste? – Vamos, salve o dia, Escolhido, antes que eu faça alguma coisa horrível.

— Não... parem... temos que parar... – digo baixo.

— Pare de rosnar e use suas palavras, Simon.

Simon.

Minha magia está transbordando através do meu corpo, cintilando em nosso entorno, e então, de repente, ela vem com tudo. Me sinto vibrar, superaquecer.

Simon.

— Parem de se machucar! – eu grito, empurrando magia em cada sílaba, mesmo que não fosse a intenção.

Ele me chamou de Simon.

A última coisa que vejo é um clarão.

xxx

Não abro os olhos logo que acordo. Minha cabeça dói um pouco. Todo meu corpo dói. Primeiro, sinto o típico cheiro de fumaça: meu próprio cheiro. E então aquele aroma... eu o conheço tão bem quanto o meu. Cedro e bergamota. É aí que eu abro os olhos; tão rapidamente que me arrependo. A luz quase me cega.

Estou na enfermaria de Watford, deitado numa das camas.

— Baz? – resmungo, ainda me acostumando com a claridade.

— Bom dia, Bela adormecida! – é a voz de Penélope. A localizo na cadeira ao meu lado em alguns segundos.

— Cadê ele? Onde...? – flashes invadem minha memória: feitiços, fogo, magia e então... nada. – O que aconteceu? Eu me descontrolei... e depois?

— Uma pergunta de cada vez, Simon – Agatha está de pé do outro lado.

— Você não tá com fome? – Penny questiona, mostrando uma sacola.

Eu estava. Comi e comi e comi. E não falamos nada por um tempo. Aquele perfume parecia impregnado em minhas narinas, não me deixava pensar em mais nada além dele. Eu não tinha o explodido, tinha? Não. Penny e Agatha também se encontravam no Grande Gramado quando me descontrolei e nada ruim ocorreu a elas, aparentemente. Mas ele estava mais perto... talvez...

— Certo... alguém vai me dizer o que aconteceu? As Famílias Antigas? O Mago? Eu destruí muita coisa? Há quanto tempo estou aqui?

— Você dormiu por dois dias, Simon. E estão todos bem. Digo, depois que você explodiu todo mundo ficou bem. E você não destruiu nada dessa vez – explica Penny.

— Como assim...? – sempre que me descontrolo acabo detonando um tanto de coisas ao meu redor e acordando nalguma cratera chamuscada. – Ninguém se machucou? Eu não... botei Watford a baixo, nem nada? – Agatha faz que não com a cabeça.

— Fomos atirados alguns metros no ar? Sim. Todas as vidraças estouraram? Sim. Mas ninguém terminou carbonizado, se é o que você teme. Na verdade, você nos encheu, Simon – encaro Penélope com o cenho contraído. – Com uma sensação. Seu poder nos encheu com uma sensação.

— Eu... não... Eu acho que não entendi...

— Ninguém entendeu direito, Si. Ninguém nunca lançou um feitiço desse jeito antes...

— E vamos querer saber exatamente como foi que você fez – Agatha olha feio para a garota, que acrescenta: – Depois que você sair daqui, é lógico...

— Assim que sua magia nos atingiu, simplesmente sentimos que precisávamos parar – Agatha continua.

— É. Fomos tomados por um sentimento de... paz, eu diria. Todos nós. Foi como se algo dissesse que estava tudo resolvido e então estava. Não fazia sentido lutar, o Insípidum não estava mais lá – completa Penny, e eu lembro que era exatamente aquilo que eu queria. Observo meu último scone contrabandeado por uma eternidade.

— Está tudo bem agora, Si – Agatha afirma.

— Mas o que é isso?! Ninguém avisa que ele acordou? Aleister Crowley! Me deem licença, preciso checar como ele está. Fora, fora – a enfermeira as enxota, depois me examina com alguns feitiços. – Vamos esperar até a noite para ter certeza se o senhor está bem mesmo, então posso te liberar.

Eu fiquei ali o resto da tarde, com mil e uma dúvidas rodeando minha cabeça e aquele maldito perfume caro preenchendo meus pulmões.

Ele esteve aqui? Ele veio me ver? Eu queria saber em que pé estávamos, agora que tudo acabou, agora que ninguém precisava ser derrotado. Não havia necessidade de sermos inimigos, ele não tinha mais que tramar contra mim. O que aconteceria a partir de agora? Pensei e pensei – e talvez tenha cochilado um pouco.

A enfermeira dá mais uma conferida em mim e então autoriza minha saída.

Eu tenho a opção de ir direto para o refeitório – já é a hora do jantar –, mas eu olho na direção da Casa dos Mímicos e quando me dou conta já estou convocando a espada e fazendo o corte no meu dedo, pressionando-o contra a pedra, como pedido de passagem.

Uma vez que estou em nosso quarto, sinto-me nervoso, meus batimentos aceleram e preciso me concentrar para que a magia não se acumule nas pontas dos meus dedos. Mas ele não está lá. Sua cama está vazia, o banheiro está vazio. Eu o procuro dentro dos armários de roupa como um idiota. Então pego uma toalha e logo me enfio sob a água.

Ele devia estar no refeitório, com Dev e Niall – óbvio que sim. Por mais que ele tivesse aquela mania esquisita de não comer na frente das pessoas, ele sempre estava lá durante todas as refeições. Tudo bem, penso, tudo bem. Vamos acabar sozinhos aqui de qualquer jeito. Vamos ter tempo pra conversar... se é que sabemos conversar... e então vou descobrir o que fazer. Porque eu não sei o que fazer.

Eu não queria lutar com ele, no fim das contas. Não de verdade. Eu fiquei com medo! Jesus! Eu fiquei com medo do que pudesse acontecer. Porque eu não queria acabar com ele. Porque eu não queria que ele acabasse comigo.

Termino o banho e penso que talvez seja melhor só cair na cama e dormir mais um pouco, mas quando eu saio ele está lá, de pé, olhando pela janela que há entre a cama dele e a minha. Quando ele se vira para mim, sua expressão é a mesma de sempre, o que me faz achar que nada mudou. Isso me deixa irritado, porque eu não quero mais brigar. Honestamente, eu já quis?

— Você recebeu alta...

— Você enxerga. Que benção, huh? – me aproximo da minha própria cama (o que significa me aproximar dele também) e largo a toalha molhada sobre a colcha.

Quando o fito outra vez, os olhos dele cintilam e seu maxilar está travado. Por um momento eu penso que Baz vai me atacar, me socar ou colocar as presas para fora e me morder; ele só respira fundo, soltando o ar devagar. Seu perfume já está se alastrando por meu interior outra vez.

— Olha, Snow, eu não estou afim, ok? – ele diz e faz menção de sair dali. Dou um passo para o lado, prendendo-o no pequeno espaço que há entre nossas camas.

— Eu também não, Baz.

— O que quer dizer? – ele fala, depois de um tempo me encarando. Eu junto as sobrancelhas.

— Hum... o que você quis dizer?

— Que eu não estou afim de fazer isso.

— Isso? Isso o que?

— Por Aleister Crowley, Snow! Isso! Discutir, brigar, perder o controle, sei lá o que está pensando em fazer.

— Conversar! Eu quero conversar, Baz...

— Essa é nova – ele arqueia uma sobrancelha e ri com deboche.

— Mas que porra! Eu estou falando sério, Baz! Acabou, a guerra acabou, não somos mais inimigos...

— Sim, e daí? Não somos amigos também, não é? Eu não vou ser seu amigo, Snow.

— Por que não?!

— Porque nós dois nos odiamos! – estamos tão próximos que eu sinto o hálito dele no meu rosto.

— É mesmo?! Então por que eu simplesmente não acabei com isso quando tive a oportunidade?

— Acho que você tentou, não é? Se transformando na porra do sol bem na minha frente!

— Certo, eu realmente queria perder o controle e correr o risco de explodir a escola toda – digo, com ironia. – Se você me odeia tanto, por que foi me ver na enfermaria então?! – vejo suas bochechas adotarem uma coloração vermelha. Baz Pitch conseguia ser adorável pra cacete quando isso acontecia.

— Você acha que eu fui te visitar, Snow?

— Eu sei que foi! Seu perfume estava grudado em tudo: lençóis, travesseiro... até em mim! Você borrifou perfume na minha cama ou quê? Deitou nela e se enrolou nos cobertores, por acaso? – nessa hora eu acho que o rosto dele vai pegar fogo. – Baz...? Você deitou na minha cama? Céus... você... dormiu lá... comigo?

— Pelo amor de Crowley, Snow! – eu espero ele negar. Não acontece.

— Porra, você dormiu lá! – eu sorrio, não sei bem o motivo. – Você dormiu comigo! Por que você dormiu comigo?

— Cala a boca, Snow – ele murmura e tenta sair novamente, mas eu não permito. Se ele acha que vou deixa-lo ir agora, está enganado. Eu finalmente o tenho onde eu queria.

Por que Basil tinha ido me ver? Por que havia dormido comigo? Por que essa ideia me agrada tanto? O que isso tudo significa? Ele... gosta de mim? Essa possibilidade ao menos existe? Eu gostaria disso? Eu gosto dele de volta?

Acabo percebendo que nada disso importa muito no momento, estou acostumado ao fato de ele não gostar de mim. Podemos ajeitar isso depois... porque agora Baz está na minha frente, a centímetros de mim, e tudo em que eu consigo pensar é se ele tem o mesmo gosto daquele maldito cheiro.

Então eu o beijo.

Por um instante penso que ele vai me empurrar, me jogar da janela, talvez. Mas não. Ele me puxa. Basilton agarra meu pescoço e contorna minhas costas – estou sem camisa, suas mãos geladas fazem minha pele arrepiar. Ele cola nossos corpos, junta nossas línguas. E aquilo é tão bom.

Eu entendo que eu não preciso fazer nada a não ser me agarrar a ele, enquanto ele se agarra a mim. E, pode ser só meu cérebro bêbado alucinando pela quantidade de perfume que já absorvi, mas tenho quase certeza que a boca dele tem mesmo o gosto cítrico-adocicado de bergamota.

Talvez eu esteja viciado...

Então, tão subitamente quanto comecei a beija-lo, eu abro meus olhos. E Baz já não está lá. No escuro, tudo o que vejo é uma parede de pedra à minha frente. Meu cérebro dá um nó, em confusão. Sinto meu corpo grudento de suor e, quando me movimento, noto que estou deitado sobre meu colchão velho de plumas.

Viro para o outro lado e assim posso enxerga-lo, enfiado debaixo das cobertas até o pescoço, seu rosto branco refletindo a luz da lua – a brisa que entra pela janela aberta não alivia meu calor. Ele dorme tranquilamente na cama em frente à minha, alheio a qualquer coisa.

Eu não demoro para entender que tudo não passou de uma fantasia. Não me recordo de muitos detalhes. Foi um sonho definitivamente louco e bastante longo. Mas o beijo... disso eu lembro. O hálito, os lábios macios, a língua morna e convidativa. Eu consigo me lembrar com perfeição daquele sabor, do gosto da sua saliva frutada.

Fecho os olhos e inspiro profundamente.

Eu ainda devo estar meio adormecido. É. Só pode ser essa a explicação. Por isso eu continuo visualizando aquela cena em loop infinito, por isso continuo imaginando aquela boca na minha, aquelas mãos, o cabelo dele entre meus dedos... por isso eu quero beijar meu inimigo, um vampiro... de novo, eu quero beija-lo de novo... só mais um pouco... de verdade, dessa vez...

Estou a um fio de cair no sono novamente.

Respiro fundo e seu cheiro de bergamota ainda está ali.

E eu só quero saber se ele tem o mesmo gosto que tinha no meu sonho...


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Notas finais do capítulo

Muito obrigada por ter lido! Espero que tenha gostado :)

Agradecimentos especiais à minha beta lindíssima, Srta Prongs ♡



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