A Última Chance escrita por Caroline Oliveira


Capítulo 32
O que é o amor? - Parte 1


Notas iniciais do capítulo

Oii pessoal!!
Desculpem a demora, sei que acabei me atrasando um pouco, mas sabe quando a ideia parece perfeita na sua cabeça, porém nada que vc "põe no papel" parece bom? Foi o que aconteceu comigo e então precisei escrever com mais calma, contudo espero que gostem do capítulo!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/780685/chapter/32

Caspian X

O vento fazia um ruído estranho ao se chocar contras as rochas. Os sons de gotas caindo sobre as pedras no chão e sobre as poças da gruta inundada davam um ar fantasmagórico ao local, somado ao reflexo sibilante das águas nas paredes, as sombras dançando nelas com a pouca luz que entrava.

 

— A lanterna de Edmundo seria bem útil uma hora dessas - Susana murmurou.

Não pude discordar dela. O nível do solo começava a baixar e a água fazia o caminho inverso. A ideia de estar submerso novamente não me parecia boa.

À medida que avançávamos, a água subia dos pés, passando por tornozelos, panturrilhas, coxas, cintura, até chegar à metade do tronco. Ficava mais difícil avançar, a água deixando nossos movimentos mais lentos.

Foi quando me concentrei no caminho diante de nós. Não sabia se a profundidade continuaria se acentuando, porém vi que à diante as rochas se elevavam até um nível plano, em que um caminho estreito entre as rochas laterais nos levariam a um ponto de luz lá no fundo.

— Tem algo lá atrás - Indiquei. Susana olhou para mim e seguiu meu olhar, piscando para visualizar o que eu falara.

O destino aparentemente próximo nos estimulou a avançar mais rapidamente pela água, esforçando-nos contra a força que nos impelia a ficar parados, até que o nível do solo voltou a subir e conseguimos nos ver livre da água até os tornozelos ao menos.

Subi na rocha, apoiando os braços nela para impulsionar o corpo e me sentar. Ajudei Susana a fazer o mesmo, puxando-a para cima. Ofegamos um pouco e nos viramos para nos levantar e seguir adiante.

— Vou passar uma semana dormindo depois dessa empreitada - Ergueu as sobrancelhas. Permiti-me sorrir com sua queixa - E pensar que ainda tem a guerra…

— Talvez não precisemos tomar parte ativa nela, se é que isso serve de consolo - Ponderei - Precisamos da lança para matar Cietriz, acho que Aslam quer que nos concentremos nisso.

— É, mas ainda tem Jadis - Lembrou - A queda de Cietriz é um ponto chave, mas não garante nossa vitória. Os calormanos são obstinados, Ahadash não vai perder a oportunidade de nos obliterar.

Ela tinha razão, embora eu não quisesse ser tão pessimista. Aslam estava de volta, lutaria conosco. Ele derrotaria Jadis de uma vez por todas, nos prometeu isso. Pedro lideraria os narnianos a vitória, sabe coordenar uma batalha como ninguém, sem falar em Glenstorm ao seu lado. Apesar de temer por todos, confiava em sua força e coragem. Venceríamos. Precisávamos vencer.

O caminho a seguir deixava a água rasa se acumular em pequenas poças no terreno acidentado, porém minimamente plano. As paredes ásperas da caverna se estreitavam, forçando-nos a andar um atrás do outro. Susana foi na frente e tirou uma flecha da aljava, uma das poucas que não haviam caído no rio. Ela a utilizava como arma para qualquer ameaça que viesse à frente. Eu observava a retaguarda, porém não acreditava que alguém viesse atrás de nós, Cisne Branco não permitiria.

As rochas nos espremeram até termos que passar de lado pelo corredor pontiagudo que arrancava pequenos rastros de pele e tecido das roupas enquanto tentávamos percorrê-lo. Ouvi Susana grunhir algumas vezes, arranhando as costas das mãos.

Finalmente fomos libertos do espaço reduzido e um pequeno pátio se ergueu diante de nós. Era uma área rústica como todo o restante da gruta, que por algum motivo me lembrava o monte de Aslam, o pátio em que a Mesa de Pedra quebrada estava acomodada.

Perdi o fôlego ao ver a lança erguida diante de nós, fincada em uma espécie de pedestal curto. Ela em si não emanava luz, porém uma fresta lateral entre as rochas parecia recair intencionalmente sobre ela para iluminá-la. Senti alívio; os músculos das costas relaxaram de tal forma que só naquele momento me dei conta do quanto estavam tensos. O objetivo dos nossos esforços estava bem diante de nós.

— Certo, o que fazemos agora? - Susana indagou.

— O que é aquilo? - Perguntei, olhando mais atentamente. Em frente à lança havia uma pedra colunar que mimetizava uma mesa, sobre a qual havia uma taça grande de prata intocada pelo tempo.

Susana percebeu para o que eu olhava e me seguiu ao me aproximar da pedra. A rocha bruta estava incrustada de pontos brilhantes que julguei ser quartzo e era de uma coloração cinzenta a esverdeada. Havia uma mensagem gravada na pedra e Susana passou os dedos delicados sobre ela. 

 

Para a lança recuperar

E a serpente matar

Beba a poção da taça

E prove o quanto pode amar

 

— Nárnia e suas rimas - Lamentou ela, o cansaço e o tédio denotados em sua observação. Não pude discordar dela, as rimas eram péssimas.

— Segundo está escrito, temos que beber da taça - Constatei o óbvio.

— E se for um veneno? - Alertou.

— É uma possibilidade - Ergui uma sobrancelha - Porém, não temos escolha, temos? - Ela fechou os olhos com uma expressão derrotada. - Deixe-me beber primeiro. Se nada acontecer, você bebe a segunda parte.

— É melhor que eu beba primeiro - Discordou - Ou nunca ouviu falar na expressão “primeiro as damas”? - O argumento era ridículo e ela sabia, rindo antes até mesmo de mim - Sério, deixe-me fazer isso por nós dois. Você passou a noite cuidando de mim depois da avalanche. Deixe-me retribuir.

— Não fiz nada para receber algo em troca - Retruquei.

— Por favor - Insistiu, os lábios se encolhendo em quase um biquinho de criança, as sobrancelhas erguidas em súplica. Eu quase não podia resistir. Quase. - Teimosia é um traço da família Pevensie, Caspian X, não da sua!

— Você não conheceu muitos membros da minha família para saber, conheceu? - Ressaltei.

— Eu vou beber primeiro! - Declarou, tomando a taça do pedestal. Estiquei a mão em sua direção em protesto, porém a taça já estava em seus lábios.

Arfei, derrotado. Apoiei a mão no cabo da espada de Pedro e esperei que ela tomasse sua parte da poção misterioso. Meu coração acelerou observando-a ingerir o líquido estranho e esperar que fizesse algum tipo de efeito.

— Não é nada mal - Comentou - É até doce.

— Não estou tão certo de que o sabor doce é indicativo de segurança - Retruquei, tomando a taça das mãos dela - Aí vamos nós.

De início, o líquido era realmente adocicado, mas não sei se conseguiria assemelhar seu sabor a qualquer outra coisa que havia tomado na vida. A doçura não parecia… natural. Quando terminei, o sabor travou na minha garganta, semelhante à sensação de um vinho seco.

— Realmente não é tão ruim - Concordei, porém Susana não pareceu estar ouvindo. - Susana? - Chamei, franzindo o cenho.

Ela fitava um ponto qualquer na câmara da lança na gruta, não parecia estar ali. Fiz menção de tocar seu braço, porém quando o fiz, ela sumiu do meu campo de visão.

 

Susana Pevensie

Enquanto Caspian bebericava o conteúdo da taça, minha visão escureceu de uma maneira que realmente achei que a luz que entrava pelas frestas entre as rochas da gruta estivesse se apagando, tal qual uma nuvem ao passar na frente do sol.

Quando as luzes voltaram, entretanto, Caspian já não estava ao meu lado. Girei em torno de mim e o ambiente ao meu redor começou a se alterar. Aquela bebida devia ter algum tipo de efeito alucinógeno.

Respirei fundo, passado o susto de não ter Caspian comigo. Provavelmente ele ainda estava ao meu lado, sofrendo o mesmo tipo de visão que eu. Esperava apenas que não fosse uma armadilha para nos matar enquanto estávamos inconscientes.

As paredes da gruta escura deram origem a cristais que se assemelhavam a espelhos. Sua superfície era esbranquiçada, com um fundo cinza-azulado e me permitia ver meu reflexo de várias maneiras. O maior deles me chamou a atenção, então caminhei até ele para me ver melhor.

O corte do rosto foi completamente, graças aos poderes de Cisne Branco. Meu aspecto, porém, estava melhor no reflexo do que provavelmente estava na realidade. Eu estava bonita, as maçãs do rosto rosadas, os olhos livres de olheiras e cansaço, os lábios delineados com um batom rosa-queimado que eu amava usar em meu mundo quando descartava o vermelho.

Olá, Susana— Cumprimentou o reflexo e eu arregalei os olhos da mesma forma de quando ouvi os castores falarem pela primeira vez quando viemos à Nárnia. Esse ato, porém, não se refletiu no eu do reflexo e ela até sorriu - Não se assuste. Vou auxiliá-la nessa missão.

— Q-Quem é você? - A pergunta era estúpida, porém saiu de entre meus lábios mesmo assim. Temia que alguém estivesse usando minha forma para me enganar.

Eu sou você— Constatou o óbvio - Um você… diferente. Mas sou você— Ela tinha um sorriso complacente no rosto, como de uma professora que faz uma pergunta já conhecendo a resposta, mas que almeja esperançosa que algum aluno a responda corretamente. - Está pronta?

— Adianta dizer que não? - Dei de ombros, ainda confusa.

 

Edmundo Pevensie

— Pense, Liliandil, pense! - Liliandil andava de um lado para o outro com as mãos na cintura e a cabeça baixa. Era engraçado vê-la se comportando como uma humana, embora convivesse efetivamente entre os mortais havia apenas dois anos.

Meu plano era simples e tinha grande probabilidade de dar errado, porém eu tentaria mesmo assim: logo os soldados calormanos viriam me levar ao pátio do castelo de Anvard para o sacrifício a Tash. Minhas roupas sujas de sangue e veneno camuflam bem a minha cura, portanto não perceberão que algo mudou se eu continuar parecendo zonzo e gemer de dor. Liliandil assumiria a forma de estrela e tentaria se esconder, abandonando a cela logo atrás de nós. Antes de sairmos das masmorras, ela emanaria luz o bastante para cegar os soldados e eu me livraria de suas mãos, pronto para fugir. Se corrêssemos o bastante para alcançar a passagem secreta indicada por Neriah, estávamos salvos.

Liliandil odiou a ideia. Ela insistia que Aslam a havia enviado por um motivo: abrir a cela por dentro; por isso ela teve de recuperar seus poderes antes de ser enviada para me salvar. Não estava nos planos dela me colocar em risco novamente.

— Lilian, você já exauriu demais as suas forças tentando passar pela barreira - Lembrei a ela - Daqui a pouco, quem vai ficar à beira da morte é você! De novo! E duvido que o elixir de Lúcia vá restaurar a sua magia!

Ela soltou o ar, irritada, os olhos azuis escuros me fulminando. Mas não me assustava, me fazia ter vontade de rir, ela era muito fofa. Eu sabia, porém, que para manter minha cabeça sobre o pescoço, era mais seguro evitar o riso.

— Eu sei que não posso exigir muito mais de mim! - Retrucou, cruzando os braços - Contudo, não há sentido em Aslam ter me enviado para ficarmos presos nessa cela! Eu não entendo como fui capaz de entrar tão rápido e agora sequer consigo sair! - Eu a ouvi com paciência, habilidade que adquiri nos longos anos que ouvi Susana reclamar de tudo e de qualquer coisa - O que a serpente do deserto disse?

Franzi o cenho, forçando-me a lembrar. Estava atordoado e com muita dor, meus sentidos estavam anestesiados pela peçonha cruel da serpente.

— Algo como “ninguém ouvirá o seu clamor” - Relatei, uma pontada na nuca denunciando o esforço - “A cela só abrirá para quem… “. “Quem desse segredo saberá”.

— É, não ajuda muito - A sinceridade delicada de Liliandil era uma qualidade inestimável, a não ser pela culpa por não ter prestado tanta atenção nos dizeres da serpente.

— Bom, pelo menos a parte do “segredo” caiu por terra, já que Aslam sabe de tudo - Constatei o menos mal - Mas como você vai conseguir passar e nos tirar daqui?

Liliandil se pôs a pensar. Ela pareceu analisar os fragmentos de memória que eu a havia ofertado e seus olhos corriam de um lado para o outro, como se ela revirasse a própria mente em busca de lembranças.

— Ele disse que eu precisava abrir a cela - Ponderou - Não disse que era para passarmos pelo encanto e sim para…

— Quebrá-lo! - Completei, sentindo a irritação pela vergonha de não ter percebido o óbvio. - Certo, mas isso vai demandar ainda mais magia, não?

— Talvez, porém, se for direcionada para o ponto certo… - Deixou o restante subentendido.

 

Caspian X

O meu eu de algum tempo que eu sequer poderia dizer se era passado, presente, futuro ou de alguma linha temporal paralela que não vivi caminhou um pouco à minha frente pela escuridão. Parecia um sonho, pois apesar de estar no completo escuro, eu poderia distingui-lo sem tocha, ou qualquer ponto de luz.

Ainda me recuperava do susto de encontrar a mim mesmo refletido em cristais ao redor de mim. Aquilo realmente se assemelhava a um sonho, um pesadelo, aliás, ao me ver em uma verdadeira sala de espelhos me rondando. Ele, se é que posso chamá-lo assim, disse que me guiaria na missão que me havia sido dada.

A lança de água foi forjada pela força de um grande amor— Falou após alguns passos em silêncio - Porém, para você, Caspian X… o que é o amor?

Eu iria responder se a mudança de figura dele não houvesse me tirado o fôlego. Ele tinha a mesma aparência que eu, parecia que eu estava me vendo num espelho. Naquele instante, porém, sua barba regrediu até dar lugar a pele lisa que eu conservava a anos atrás. As feições tornaram-se mais jovens, menos maduras e o cabelo um pouco mais curto. As roupas em tons de marrom e bordô que eu costumava usar atualmente deram lugar à calça ocre, à camisa branca encardida e ao uniforme do exército telmarino que roubei antes de fugir do castelo de Miraz.

O ambiente completamente escuro e vazio ao nosso redor deu lugar à câmara da Mesa de Pedra no Monte de Aslam. O paredão de gelo azulado em que a Feiticeira Branca estivera presa tentando nos seduzir para libertá-la estava quebrado ao chão, Edmundo no vão em que ele ficava.

Pedro e eu estávamos um do lado do outro, evitando nos entreolhar, envergonhados por quase termos piorado ainda mais a situação de Nárnia. Envergonhados por quase termos sucumbido à tentação.

A pontada no meu coração veio logo em seguida, quando encontrei o olhar de Susana me encarando com decepção, raiva e até um pouco de desprezo. Em um sinal com a cabeça, ela indicou a mesa de Aslam, perguntando se o valor de seu sacrifício não significava nada para nós, para mim.

Vê-la sair da câmara com passos firmes, deixando-me para trás fez ainda mais vergonha cair sobre os meus ombros, tristeza por ter me deixado levar pelo ódio.

E então? O que é o amor?— O Caspian que me guiava naquela viagem pelas minhas lembranças e sensações me aguardava responder a pergunta que fez anteriormente.

A resposta que ele desejava ouvir devia ter algo a ver com a cena que ele me mostrou, do contrário não havia razão para reviver aquelas emoções. Meus sentimentos por Susana naquela época eram turvos, nebulosos por causa de todas as tensões se reaver o meu trono. Ela mexia comigo: cada vez que ela se aproximava, ou que eu a ouvia falar, ou que conversávamos, meu coração batia forte, a atração por sua beleza ímpar me hipnotizava. Não tinha ideia do quanto a amaria a partir de então, sentimento esse que perduraria anos de separação.

Ela tinha razão por estar zangada comigo. Eu estive prestes a ressuscitar o mal que ela e os irmãos, e até o próprio Aslam deram tudo de si para derrotar. Além da raiva, ela estava… decepcionada. Eu não fazia ideia da época, mas apesar da resistência de Pedro em confiar em mim, tanto Susana quanto Edmundo e Lúcia me viam como a esperança de uma Nárnia melhor. Assim como Pedro viu em Hiandra uma calormana de coração bom e de boa índole, Susana viu justiça em meus atos, viu bondade em minhas palavras. Me ver prestes a cometer um erro tão lamentável a decepcionou profundamente.

— O amor é justiça - Respondi por fim - Não é cego como a paixão. É incapaz de se alegrar ao ver a pessoa amada cometer um erro. É sincero para demonstrar o caminho correto.

O meu guia quase não esboçou reação diante da minha resposta, exceto por um sorriso de canto bastante discreto. Algo me dizia que aquela reação positiva significava que eu havia acertado o que quer que ele, ou a lança esperavam de mim. Obviamente, eu sabia que o desafio estava longe de acabar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E então? Gostaram??
O Edmundo e a Liliandil precisarão se esforçar ainda mais para conseguir sair das garras das feiticeiras e o Caspian e a Su terão mais desafios pela frente para provar o que aprenderam em sua caminhada pelo amor um do outro!
Vejo vocês nos comentários! Beijos!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Última Chance" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.