A Última Chance escrita por Caroline Oliveira


Capítulo 22
Sequestro


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal!! Como prometido, mais um capítulo postado! Terceira semana seguida, hein? Espero que eu continue assim!
Sobre o cap, muita coisa rolando ao mesmo tempo! As peças começam a se encaixar e o destino dos nossos personagens em suas jornadas pessoais começarão a serem traçados! Espero que gostem!



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Sul do Passo para Nárnia, Arquelândia

Susana Pevensie

A Rhindon estrondou nos meus ouvidos quando Caspian entrou em combate com dois calormanos que vieram agressivos para a nossa direção. Os outros narnianos entraram no confronto também e logo a área estreita na frente da caverna estava tomada por duplas e trios de soldados se enfrentando.

— Eu preciso do meu arco! - Avisei a Caspian. Peguei uma faca que trazia presa à perna, pronta para me defender, apesar de não julgar que aquele fosse o meio mais eficaz.

Em um movimento preciso, Caspian forçou sua espada contra a cimitarra do inimigo, deslizou por ela, abaixando-se para se colocar atrás do calormano e desferindo um golpe cortante por suas costas, vencendo-o.

— É muito arriscado! - Gritou ele, partindo para cima do segundo calormano.

Não lhe dei ouvidos. Apesar de nos quinze anos de governo em Nárnia eu ter seguido a risca o conselho do Papai Noel de me manter afastada do fronte de batalha e colocar em prática meu lado mais diplomático, passei a me interessar em ser mais ativa nas lutas, prova disso foi a Segunda Batalha de Beruna contra os telmarinos.

Sorien, o fauno que fazia parte da guarda, passou a dar-me cobertura de volta à caverna, mas um dos inimigos o interceptou, forçando-o a lutar com ele. Não demorou muito para que outro viesse atrás de mim.

— Ora se não é a rainha maldita que desprezou Rabadash! - Acusou. Estava tão farta daquela história que nem discuti e fui para cima dele.

Desviando de sua cimitarra, tentei me aproximar para cortá-lo, mas o infeliz era rápido. Quando lançou sua espada contra mim, desviei para a esquerda, cortando seu braço, porém parei perto o bastante para que ele acertasse um soco, a parte metálica da armadura que cobria sua mão cortando meu rosto.

O breve momento que passei atordoada foi o suficiente para que ele me chutasse ao chão. Ao cair, ele pegou a espada com as duas mãos e estava pronto para me trucidar, mas rolei pelo solo arenoso e me deparei com uma pedra. Era minha chance.

Ele avançou de novo e quando rolei para o lado, bati a pedra com toda a força em sua cabeça. Sua espada rasgou minha pele na lateral direita do abdômen e eu rangi os dentes enquanto sangue minava da sua cabeça, que foi lançada para trás. Chutei suas panturrilhas e quando ele caiu, cravei a espada em seu peito.

Nessa de rolar pelo chão, o sangue do corte havia se espalhado pelo rosto, mas não era momento de pensar na aparência, tampouco na dor.

— Susana! - Edmundo gritou. A uma distância segura, ele terminava de lidar com um soldado calormano e quando o derrotou, jogou minha aljava com o arco.

— Obrigada! - Joguei a alça da aljava no corpo de qualquer jeito e armei o arco com a primeira flecha.

Os calormanos eram numerosos, vieram ao nosso encontro com o objetivo de nos massacrar quase sem chance de defesa. Atirei contra um dos dois soldados que lutavam contra Trumpkin, encurralando o anão covardemente num combate dois contra um. Também usei meu arco para atingir os inimigos no rosto e desferir um golpe mortal com as flechas tal qual fosse uma espada.

 

Edmundo Pevensie

Ahadash havia destacado um grande grupo de soldados para nos combater, parecia ter adivinhado que estaríamos na caverna. No meio da batalha, no entanto, não tinha tempo para pensar em quem poderia tê-lo alertado e consequentemente nos traído.

Eu lutava contra um brutamontes, o calormano de pele dourada e cabelos raspados devia ter dois metros de altura e parecia um armário de tão musculoso. Ele investia contra mim com sua cimitarra usando muita força e eu estava me esforçando para não titubear.

— Você é o rei Edmundo, não é?! - Inquiriu num misto de escárnio e desprezo.

— Saber disso é importante para você? - Retruquei - O meu título não fará diferença quando eu te matar! - E voltei a atacá-lo.

Eu tentava a todo custo me manter firme na luta, pois as investidas do calormano me pressionavam a andar para trás. Os tilintares das espadas estavam cada vez mais fortes e eu segurava o cabo da arma com tanta força que o atrito rasgava minha pele. Se a espada do fidalgo telmarino não tivesse sido dada pelo próprio Aslam, já teria sucumbido e eu já estaria morto.

Quando dei por mim, a pouca luz do lado de fora da caverna diminui porque o calormano me encurralou para dentro.

 De repente, senti uma pancada na nuca que me derrubou. 

— Rei Edmundo! - Ouvi a voz de Sorien ressoar na caverna e um novo tilintar das espadas.

As últimas coisas que senti antes de desmaiar foi o sangue do golpe escorrer e mãos agarrarem meus pulsos e me arrastarem para a escuridão.

 

Caspian X

A batalha contra os calormanos devia ter durado mais de duas horas, pois quando nos vimos livre deles, já era noite. O céu estava a ponto de escurecer completamente, o que indicava um horário próximo às sete.

Havia muitos mortos naquela curta faixa de terra. A região à frente da caverna estava tomada por corpos. A maioria calormanos, se é que posso dizer “felizmente”. Havíamos perdido arquelandeses e soldados e guardas de Nárnia também. Sabíamos que seria uma viagem perigosa, então trouxemos homens e narnianos em quantidade suficiente para não sofrermos uma chacina e também não chamarmos tanta atenção. Não esperávamos, porém, um ataque tão covarde.

— Alguns covardes fugiram montanha abaixo, senhor! - Trumpkin contou, referindo-se a soldados calormanos - Aos poucos foram se espalhando de um por um dentre as árvores, enquanto os demais lutavam contra nós!

— Pegaram algo importante? - Indaguei. - Chegaram a entrar na caverna?

— Não vasculharam as coisas, majestade - Garvis respondeu - Nossos suprimentos, água, mapas, armas, todos permaneceram intocados.

— Isso é suspeito - Constatei - De certo queriam nos matar, mas porque fugir se estavam em vantagem?

A ameaça deles era clara, o ataque não foi um blefe. Havia soldados mortos demais e feridos que eu sequer sabia se conseguiriam continuar a viagem. Mas se não foi por acaso, por que alguns fugiram?

— Fizemos as contas dos soldados mortos, feridos e hígidos, meu rei - Garvis comunicou. Ele estava sentado em uma rocha enquanto Susana improvisava uma tipoia com um pedaço de tecido para seu braço - Apenas Sorien não foi encontrado.

— Alguém viu Edmundo? - A voz de Susana ecoou.  Seus olhos se encontraram com os meus e a dúvida percorreu meus pensamentos. Não, eu não havia visto Edmundo.

— A última vez que o vi, ele estava defendendo a senhora, majestade - Um soldado arquelandês se pronunciou.

Susana deu um jeito de finalizar rapidamente o curativo do chefe da guarda e se levantou para se aproximar de mim.

— Ele não iria a lugar algum sem falar conosco - Susana alertou e eu tive que concordar. Não fazia sentido ele ter ido embora.

— Não o viram na caverna? - Questionei a todos que estavam reunidos. O medo percorreu os olhos azuis de Susana. Não houve resposta dos soldados.

— Há sangue na caverna! - Um centauro alertou, com uma tocha na mão - Ninguém deve ter percebido, afinal está tudo escuro!

Susana e eu nos entreolhamos e tivemos a mesma ideia. Andamos em passos apressados até a caverna e o centauro nos guiou até o local onde ele havia achado sangue. Não ficava tão longe da entrada.

— Me deem uma tocha - Pedi. Um soldado arquelandês me fez esse favor e eu me aproximei do trecho.

Havia duas manchas de sangue no solo arenoso. Parte dele devia ter sido absorvido pela areia, mas era evidente dois diferentes tipos de ferimentos ali. Um deles era maior, grave o bastante para ter sido um golpe de espada no peito ou no abdômen, no máximo ter atingido uma grande artéria da perna. A outra era uma quantidade menor, mas eu não saberia dizer de que parte do corpo teria vindo.

Pela incompatibilidade, pela distância e pela falta de rastro entre uma mancha e outra, com certeza eram de diferentes donos.

— Caspian, me diga que meu irmão não está morto! - Implorou em voz baixa - Não me diga que ele foi levado por aqueles cretinos!

— Calma, Susana, precisamos procurá-lo - Eu estava igualmente preocupado, ainda mais agora com a possibilidade de ele estar ferido, mas eu precisava manter a calma - Garvis! - Levantei e chamei o chefe da guarda - Traga todos os feridos para dentro. Entre os mais dispostos, separe alguns para vasculhar a floresta atrás de Edmundo e Sorien. Há sangue de dois indivíduos aqui e a falta de corpos indica sequestro. Nós ficaremos aqui e procuraremos no interior da caverna. Volte em duas horas se não os encontrarem.

 

Castelo telmarino

Liliandil, a estrela

Em meio às tensões dos últimos dias, decidi me recolher um pouco para não acabar preocupando os reis do passado com minhas questões. Eles eram amáveis demais para me fazerem sentir culpada por não poder ajudar, mas a verdade é que sem meus poderes, eu não tinha muita utilidade.

Ramandu havia me devolvido parte do meu poder para que eu não sucumbisse. Eu estava viva, sem dores, sem queimar, porém não estava completa.

Eu passara os últimos dois anos acreditando que meu destino estava traçado: auxiliar o Peregrino da Alvorada em sua jornada até o fim do mundo, casar-me com Caspian e ajudá-lo a reinar sobre Nárnia. E de repente, Nárnia está afundando em uma seca terrível, prestes a entrar em guerra, meu noivado foi rompido e… os reis do passado retornaram.

Era confuso pensar sobre meus sentimentos em relação ao rei Edmundo. Eu não havia me dado conta até que ele partiu. Sentia sua falta, suas palavras de estímulo, suas atitudes gentis. Apesar de não acreditar que seríamos capazes de recuperar minha magia, sua promessa acalentou meu coração.

— Liliandil? - A rainha Lúcia me chamou. Estava numa das sacadas solitárias do castelo - Eu estava te procurando.

— Aconteceu algo? - Preparei-me pelo pior, sentindo os músculos contraírem e os nervos se agitarem.

— Graças a Aslam, não! - Assegurou sorrindo. Permiti-me relaxar - Estive conversando com Pedro e chegamos a conclusão que mais do que nunca precisamos estar unidos. Ele decidiu convidar todos os nossos amigos para um jantar informal e eu vim chamá-la.

— É muita gentileza, majestade - Assenti - Será uma honra.

Ela caminhou até mim para se aproximar, os olhos gentis e atenciosos da rainha destemida. Desde os oito anos Lúcia demonstra a coragem e a compaixão cujo nível poucos seres humanos alcançaram. Prova disso foi a atitude com Rilian, mesmo depois de ele ter tentado matar sua irmã.

— Tem estado tão distante - Ela ofereceu as mãos para que eu as pegasse. Era um gesto de fraternidade. Aceitei a oferta - Sei que a situação com seu pai é difícil e a falta de seus poderes a fazem se sentir inútil - Baixei a cabeça, ciente de que meus sentimentos haviam transparecido - Mas a sua sabedoria tem nos ajudado dia após dia. Sua amizade também é de grande ajuda, sabia? - Sorri - É serio! É quase impossível passar por situações difíceis sem o apoio das pessoas queridas e, se você quer saber, é muito querida para nós!

— Eu fico feliz em saber disso - Me emocionei. Para mim era estranho chorar. Sentir os olhos embaçarem com as lágrimas, depois senti-las caírem como orvalho sobre as folhas. - Sabe… mais do que ter os meus poderes de volta, eu gostaria de ter o perdão do meu pai - A voz embargou e eu tentei pigarrear para normalizá-la, mas não adiantou muito - Queria que ele deixasse a ambição e o orgulho de lado e preferisse me ver feliz ao invés de me ver com uma coroa na cabeça!

— Tenho fé de que ele entenderá - Falou ela - Aslam amoleceu o coração de Edmundo, do meu primo Eustáquio! Os dois eram rebeldes, orgulhosos e se tornaram heróis! Ele vai fazer seu pai te entender. - Ela comprimiu os lábios com um olhar travesso de uma criança prestes a fazer uma brincadeira - Além do mais… você ainda pode ter uma coroa na cabeça… caso decida casar-se com um rei.

Pisquei um par de vezes antes de compreender de quem ela falava. Senti as bochechas formigarem de tão ruborizadas.

— Creio que não seja o momento para… para pensar em casamento - Foi só o que consegui dizer.

— Tudo bem, é verdade - Lúcia fez um sinal para que eu a acompanhasse para o jantar - Mas saiba que quando quiser conversar, estarei aqui.

Só consegui assentir. O silêncio perdurou por nosso caminho, sendo interrompido apenas quando cumprimentávamos os guardas, ou pelo farfalhar dos vestidos.

Eu sequer tinha noção quando cheguei ao continente de que poderia desenvolver os mesmos sentimentos dos humanos. Sentia falta de Edmundo, queria estar com ele, estava preocupada com sua segurança na jornada na qual embarcou. Lembrar sua risada me fazia sorrir, lembrar de seus olhos me dava uma sensação de aconchego.

Eu gostaria mais do que nunca de vê-lo de novo. Gostaria pelo menos de saber se ele estava bem… Aslam, por favor, o proteja!

 

Caverna nas montanhas da Arquelândia

Susana Pevensie

Não havia pista alguma relativa ao sumiço de Edmundo na parte mais interior da caverna, onde nos abrigamos. Como Garvis havia assegurado, tudo permaneceu intocado.

Pelo grande número de feridos que tínhamos, era inviável viajar durante a noite, mas precisávamos sair dali assim que o sol nascesse, afinal os calormanos que fugiram poderiam retornar com reforços e nos aniquilar aproveitando-se de nossa vulnerabilidade.

Após auxiliar alguns feridos, recolhi-me em um canto para colocar os pensamentos em ordem e limpar meus ferimentos. A adrenalina não permitiu que eu sentisse a dor na lateral do corpo, mas agora ardia mais do que qualquer coisa. Tratei de limpá-la e passei um pedaço de tecido com um unguento que Trumpkin preparou com ervas ao redor da parte superior do abdômen, quase fazendo uma cintura império no vestido. O soco no rosto fizera um corte bem feio na bochecha, já estava inchando. Peguei um pouco de água e limpei o sangue seco delicadamente, evitando ao máximo provocar mais dor do que já estava sentindo.

Não consegui evitar que lágrimas caíssem dos meus olhos, então aparei as que caíam do olho esquerdo com o pedaço de pano antes que fizessem o ferimento arder. Temia por Edmundo. A angústia só aumentava em meu peito à medida que o tempo passava. Se ele realmente havia sido sequestrado pelos calormanos, qual o propósito? Pretendiam nos chantagear? E se Edmundo estava gravemente ferido, o que fariam com ele? Certamente precisava de cuidados!

Massageei as têmporas com uma mão, a dor de cabeça se pronunciando devido ao estresse. Eu não podia perder meu irmão. Já havia sido duro demais perder meus pais de maneira tão trágica, eu sequer sabia se havia superado isso. Perder Edmundo seria o fim da picada para nós, Pedro, Lúcia e eu.

— O grupo de busca retornou - Caspian anunciou, aproximando-se do canto em que eu estava retraída. Sua expressão já conotava as más notícias - Não encontraram ele, mas acharam Sorien.

— Como ele está? Ele sabe de algo? - Perguntei, agarrando-me a um fio de esperança sobre alguma notícia.

— Sorien morreu assim que os soldados o encontraram - Caspian lamentou, sentando-se ao meu lado com dificuldade. Foi quando percebi que sua perna sangrava.

— Caspian, sua perna! - Exclamei. Ele sequer parou para cuidar dos ferimentos, auxiliando na guarda da caverna e esperando as notícias do grupo de busca. - Precisa cuidar disso!

— Sorien confirmou o sequestro de Edmundo pelos calormanos -  Me ignorou, noticiando o que eu mais temia. Meus ombros caíram e a angústia se multiplicou em meu peito - Largaram Sorien nas matas quando perceberam que ele não sobreviveria ao caminho.

— Então o ferimento mais grave era dele. - Constatei com pesar. Embora estivesse feliz por Edmundo aparentemente ter sofrido um golpe menos fatal, senti a perda de um narniano tão fiel quanto o fauno Sorien.

Larguei o pano que eu usei no rosto e peguei um outro para limpar o ferimento na coxa de Caspian. Fiz menção de rasgar o pano de sua calça e troquei um olhar com ele meio que para pedir permissão. Ele assentiu e eu rasguei, conseguindo ver a extensão.

— Você deveria ter parado para descansar e tratar isso - Falei ao visualizar a vermelhidão em volta do ferimento. O corte parecia de profundidade média. As extremidades estavam estancando, mas a região central ainda minava sangue, encharcando o tecido da calça escura que ele usava. - Vou precisar fazer um torniquete, mas vou ter que limpar primeiro.

— Agora vejo que teria sido útil pedir o elixir de Lúcia - Ergueu a sobrancelha, comentando com certo ar de riso.

— Tem razão, eu deveria ter pensado nisso - Culpei-me. Ela não teria feito questão alguma de emprestar e mais do que nunca precisávamos de forças para resgatar Edmundo e seguir com a missão.

Pensar em meu irmão fez meus olhos marejarem novamente, então me concentrei em cuidar de Caspian para não chorar.

— Hey - Ele esticou o braço para levantar meu rosto para si. Sua mão apoiou meu queixo enquanto seu polegar afagava minha bochecha ferida com delicadeza - Nós vamos encontrá-lo vivo e bem, eu prometo. Eu não deveria ter nos dividido, acho que isso pode ter contribuído para nos enfraquecer.

— Você queria manter Nárnia segura.

— É, mas querendo ou não, a fortaleza está mais segura do que nós aqui num território desconhecido - Deu de ombros - E aparentemente as coisas estão bem mais sérias do que eu imaginava.

Eu sabia o que ele queria dizer.

— Calormanos em Arquelândia não é um bom sinal - Constatei. Terminei de limpar o ferimento e agora aplicava o unguento. Caspian grunhiu com o contato do unguento gelado contra a chaga aberta - Acha que conquistaram Anvard?

— É o que estou me perguntando - Respondeu - Cogitei irmos a Anvard pedir reforços do rei Naim para encontrar Edmundo e avisar que calormanos tem invadido seu país, mas se a fortaleza estiver tomada por Ahadash, estaríamos indo direto para suas mãos. - Respirou fundo. Passei o pedaço de tecido por sua coxa e amarrei bem, arrancando um outro grunhido dele. Não pude evitar sorrir, mas ele me ignorou - Precisamos sair daqui pela manhã, mas não sei para onde ainda.

— Vou pedir a Aslam que nos oriente - Contei - Ele precisa nos dizer o que fazer agora que Edmundo corre perigo.

— Apesar de estar um pouco perdido agora, eu confio que ele nos ajudará - Concordou - Tenho fé que vamos conseguir.

Após terminar com sua perna, ele me ofereceu um espaço entre seus braços para que eu o abraçasse. Recostar a cabeça em seu peito acalmou meu coração aflito, sentindo verdadeiramente que de alguma forma tudo ficaria bem. Caspian beijou o topo da minha cabeça, expressando através do gesto singelo seu companheirismo e cuidado.

 

Horas mais tarde...

Castelo telmarino

Lúcia Pevensie

O jantar entre amigos foi sem dúvidas a experiência mais reconfortante dos últimos dias. Caça-Trufas e doutor Cornelius contaram histórias antigas que nos deram esperança e provavelmente era possível ouvir nossas gargalhadas pelos corredores do castelo.

Hiandra provou ser verdadeiro o dom de contar histórias do povo calormano e até recitou algumas poesias. Apesar de termos mil motivos para odiar seu povo, a cultura calormana tinha seus encantos e de certo os súditos de Ahadash não eram culpados por sua tirania.

Quando os outros se recolheram, Pedro e eu decidimos nos sentar próximos à lareira para continuar nossa conversa e Liliandil e Hiandra nos acompanharam. Montamos um pequeno acampamento, afastando os móveis. Jogamos cobertores mais grossos no chão para nos servir de colchão e enchemos com almofadas. Após mais conversas e risadas, logo caímos no sono.

Eu estava em uma ampla e escura sala. O cômodo estava abarrotado de coisas; livros envelhecidos, frascos embaçados, instrumentos musicais desgastados pelo tempo, relógios antigos, baús trancados.

De repente, uma luz azul gélida surgiu dos fundos da sala e um enorme paredão de gelo se ergueu à minha frente, o frio percorreu minha pele sem delicadeza e eu me escolhi.

Ao olhar para meu lado esquerdo, para o chão, Edmundo agonizava. Seu pulso estava rasgado, caído ao lado direito do corpo e ele implorava com gemidos e lágrimas por ajuda. Quando o desespero da situação de meu irmão tomou conta de mim, tive o ímpeto de ir até ele, mas correntes me prenderam. Estávamos ambos acorrentados. 

— Não! Ed! - Gritei, sentindo a vista embaçar com o choro de aflição - Aguente firme, Ed! - Ele não me ouvia, os olhos mergulhados na própria dor, a consciência se esvaindo a cada segundo. - Edmundo! Eu vou te curar! Por favor não morra!

— Se eu fosse você, não contaria com isso - A voz de Jadis reverberou em meus ouvidos como um brado, apesar de seu tom ser calmo e sarcástico. Ela descia do paredão de gelo como se estivesse entrando em um salão de baile, o vestido branco como a neve deslizando no solo árido que sustentava a sala - Seu irmão nos servirá de sacrifício. Seu sangue finalmente será meu, como sempre deveria ter sido!

— Aslam não irá permitir! - Retruquei firme.

— Acha que ele irá salvá-lo outra vez? - Ela perguntou com um tom de falsa piedade, como se eu fosse inocente demais. Jadis se aproximou e segurou meu rosto, apertando minhas bochechas entre seus dedos e unhas pontudas. - Não foi ele que disse: “nada acontece duas vezes da mesma maneira”?

Ela riu com escárnio e sua voz se dissipou junto com o restante do ambiente. Edmundo sumiu, o paredão de gelo, Jadis, a sala escura, tudo se tornou um breu total. Eu estava sozinha, fazia frio e o desespero assolou meu coração.

Edmundo seria morto, Tash daria poder a Jadis e à serpente do deserto, todos seremos dizimados, Nárnia cairia em desgraça. Eu chorava copiosamente, ainda sentindo as correntes me prenderem para longe do meu irmão.

Não, isso não poderia acontecer. Aslam nos ajudaria, nos orientaria. Em todas as vezes, até quando ele não estava por perto, ele nos guiou rumo à vitória. Não seria diferente. Ele não teria salvado Edmundo na Mesa de Pedra para que mais tarde ele viesse a morrer pelas mãos de Jadis. Mas onde ele estava? Onde estava Aslam?

— Não caia em desespero, minha querida - Uma luz dourada, quente e aconchegante, diferente da luz gélida da feiticeira, surgiu junto a uma brisa suave, tal qual o hálito de um rugido do Grande Leão, secando minhas lágrimas e acalmando meu coração - Alguma vez deixei um justo de Nárnia desamparado? Diga-me: alguma vez permiti que falhassem em alguma missão que lhes dei?

— Então vai nos ajudar dessa vez? - Indaguei, a voz ainda embargada.

— Edmundo foi capturado e infelizmente será instrumento para trazer Jadis de volta - Aslam avisou, surgindo através da luz e aproximando-se de mim. Eu o ouvia com atenção, sentada sobre as pernas, olhando em seus olhos dourados - Da primeira vez que a derrotei, seu corpo foi destruído, mas a alma continuou pairando através dos mundos, esperando por vingança. Dessa vez, aniquilaremos sua existência de vez.

— E quanto a Edmundo? - Perguntei, ainda não compreendendo como meu irmão seria salvo.

— Vá com Liliandil ao local de luz concentrada na escuridão absoluta - Explicou ele - Leve Rilian e alguns soldados com vocês. Ela é quem salvará Edmundo, pois o local onde ele está preso só pode ser acessado por dentro, por magia. Ela precisa recuperar os poderes. - Assenti - Diga a Pedro que prepare o exército para a minha chegada em alguns dias. A batalha contra a feiticeira e a serpente do deserto será na fronteira com a Arquelândia.

 

— Aslam! - Despertei com os olhos arregalados. Pedro e Liliandil acordaram assustados e Hiandra ergueu a cabeça para mim confusa.

— Está tudo bem, Lúcia? - Liliandil indagou preocupada.

— Aslam falou com você? - Pedro compreendeu de imediato.

Ofegante, sentei-me piscando os olhos ao tentar me lembrar de tudo o que ele havia dito. Repassei mentalmente o que precisávamos fazer.

— Jadis vai voltar - Contei por fim. Os olhos azuis de Pedro, anteriormente inebriados pelo sono, despertaram no mesmo instante. Ele balançou a cabeça em negativa, contrariado a acreditar naquilo - Exatamente como a profecia previu. Mas Aslam disse que vai nos ajudar.

— E ele disse como devemos proceder? - Hiandra perguntou. Apesar da tensão que nos cercava, fiquei feliz por ela falar como parte de nosso povo, tomando para si parte da luta contra seu próprio povo.

— Edmundo foi capturado - Pedro caiu de volta sobre os travesseiros com o braço na testa ao me ouvir - Mas Aslam disse que vamos salvá-lo!

— Como? - A preocupação era mais que visível nos olhos de Liliandil.

— Vou com você até o “local de luz concentrada na escuridão absoluta”, seja lá o que isso quer dizer - Dei de ombros no final - Você vai recuperar os seus poderes, só assim poderemos ter acesso ao cativeiro de Edmundo. - Olhei para Pedro - Aslam disse que Rilian deverá vir conosco.


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Notas finais do capítulo

Apesar dos capítulos ficarem maiores, eu gosto muito de incluir cenas como a da Liliandil e a do Caspian e da Su, acho que trazem maior desenvolvimento aos personagens em meio à trama acelerada, vocês também gostam?
E sobre o recado do Aslam? Com certeza o ponto alto do capítulo, ne? O que acham que vai acontecer? E o que acharam da ordem expressa de levar o Rilian para a missão da Liliandil?
Vejo vocês nos comentários! Beijos!



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