Guerra escrita por Saaimee


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Primeiro eu pensei, “não, acho que não é uma boa ideia”. Depois falei, “na verdade, não é tão ruim assim”. E, por fim, decidi fazer acabando com um “ainda bem que não desisti”.
Boa leitura soft ^^



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Um pouco de esperança é tudo o que queremos, a jovem Inquisidora pensou enquanto olhava da janela de seu quarto as nuvens espessas flutuando lentamente ao redor de sua fortaleza. Era esse o tipo de pensamento que normalmente vinha ao seu encontro quando estava sozinha depois de passar horas ouvindo sobre os agendamentos de Josephine e as informações que Leliana gostaria que fossem checadas.

Tudo o que faziam todos os dias era buscar por contatos que favorecessem a Inquisição e pessoas dispostas a enfrentar nessa guerra que nem sabiam se realmente poderiam vencer. Era essa constante luta para trazer de volta dias que nem todos se lembravam que consumia sua calma naquele momento.

Um longo suspiro saiu por seus lábios delicados permitindo que o peso fizesse seus ombros caírem bruscamente. Era sempre nesse silêncio que se questionava o quão certo suas decisões afetavam os outros assim como a si mesma.

Podia ver claramente o invisível muro de tijolos vermelhos se formando ao seu redor tentando sufoca-la em duvidas, sentia seu odor úmido que gelava sua espinha e sabia, melhor do que ninguém, que se ficasse parada o encarando acabaria permitindo que seu corpo ficasse preso ali. A jovem não era do tipo que se deixava abater pelo cansaço e nem seria agora.

Calmamente se afastou da sacada forçando seu corpo de volta para o vazio do quarto. Ela sabia que poderia se deitar por alguns minutos em sua cama macia e afastar o frio daquele inverno de seu corpo, mas, mesmo assim, optou por seguir para as escadas em busca do chão de grama que hoje deveria estar coberto pela neve. E, quem sabe, relembrar mais uma vez o motivo que a fez chegar ali.

• • •

Levou tempo para descer todas as escadas e ainda mais tempo para cumprimentar todos aqueles que passavam por seu caminho com sorrisos gratos oferecendo seus sentimentos e graças em nome do Criador. Para cada rosto ela devolveu o mesmo olhar gentil que os prometia dias melhores enquanto o frio que dominava seu corpo no quarto se derretia para longe dela.

Ao passar pela entrada principal o vento gélido da tarde de inverno a recebeu com um toque carinhoso em seus curtos cabelos brancos a lembrando de que o ar era muito mais leve quando podia ver a luz.

Seus pés calmamente desceram os degraus de pedra dizendo “olá” a mais algumas faces até finalmente chegar ao local onde a grama se escondia embaixo do cobertor de neve. Os olhos percorreram a área a sua frente encontrando pessoas cobertas por pelos e luvas. Era diferente pisar nesse terreno, entretanto, mesmo assim, ainda parecia como estar em casa.

Sentindo o frio entrar em seus pulmões ela seguiu com a caminhada pelas trilhas apagadas afundando suas botas lentamente sobre a superfície macia.

A cada passo o sorriso em seu rosto encontrava mais motivos para ficar ali, fosse por ver os novos aliados se ajudando ou pelas pessoas que conversavam tranquilamente esquecendo do mal que os perseguia. A Fortaleza do Céu não era mais um abrigo para os esquecidos do Criador, era a casa que os lembrava de que ainda estavam ali para que nada mais fosse tomado deles.

Ela sentia seus espíritos determinados em cada fogueira, via a força de seus sonhos a cada faísca das espadas colidindo e sabia, mais do que tudo, que em seus olhares aquilo era a esperança. Mais um suspiro lhe escapou e dessa vez foi o alivio que fez seus ombros caírem.

Estava pronta para voltar à mesa de guerra quando ouviu vozes altas chamarem sua atenção do outro lado do campo. Por um instante decidiu ficar parada tentando entender do que se tratava. Não era uma discussão e também não parecia o pessoal da taverna comemorando a morte de outro dragão. Era diferente suficiente para fazê-la se mover curiosa na direção.

Distante do silêncio do centro e próximo aos grandes portões na entrada da fortaleza a Inquisidora viu os mais jovens da Inquisição correndo de um lado a outro guiados por Sera enquanto riam e provocavam aqueles que estavam mais distantes. Ouviu nomes serem chamados e corpos que se escondiam atrás de trincheiras improvisadas.

Surpresa com a cena inesperada e quase impossível, a jovem se aproximou um pouco mais em busca de tentar saber o que os motivou a começar essa brincadeira. Entretanto seu plano foi interrompido quando antes de conseguir dar cinco passos sentiu algo pesado acertar seu rosto em cheio.

Seus olhos se fecharam por reflexo entendendo melhor a sensação fria que dominava sua bochecha após o golpe firme que não a fez perder o equilíbrio, aquilo tinha explodido fragmentos por seus cabelos e até atingido seu ouvido. Não havia dúvidas, era uma bola de neve.

Maker’s breath!

O grito alto foi a primeira coisa que ouviu seguida do impacto. Não demorou para reconhecer o tom assustado de Cullen assim como também conseguiu perceber que a risada se sobressaindo no silêncio amedrontado dos soldados era de Sera.

Com uma das mãos limpou a bochecha vendo o restante da neve derreter por entre seus dedos. Depois esfregou a orelha enquanto inclinava a cabeça para o lado com uma expressão desentendida vendo o loiro de olhos arregalados correndo desajeitado entre os buracos em sua direção.

Era incrivelmente fofo ver a preocupação desnecessária naquele rosto avermelhado, por isso, precisou morder os lábios para evitar que o riso lhe escapasse.

— Inquisidora! – Chamou sentindo o ar lhe faltar ainda há alguns passos de distância. Ela por fim se virou limpando a umidade das palmas em sua calça o assistindo dar o último passo parando a sua frente com os lábios secos. — Você está bem? Eu lamento muito por isso.

— Sim, um pouco molhada talvez. – Respondeu sorrindo mostrando sobrancelhas que o condenava enquanto se divertia com os movimentos desajeitados das mãos passando pela nuca como se quisesse se esconder. — O que estão fazendo?

— Os soldados estavam cansados e... – o loiro tentava o melhor que podia para explicar a situação no meio do embaraço. Em sua voz era notável a mistura de culpa pelo ocorrido com desejo de fazer as coisas melhores atraindo os olhos da jovem que não sabia esconder o contentamento. — Sera começou a guerra de neve e todos seguiram.

— Até você?

— Não, eu- – Rapidamente tentou se defender, porém se interrompeu assim que voltou o rosto para encara-la e viu o sorriso que o instigava a tentar dizer o contrário. Limpando a garganta tentou retomar a postura confiante antes de continuar. — Eu tentei parar.

— Mas?

Mais perguntas para encurrala-lo. Ele não podia dizer que ninguém ouviu suas ordens quando Sera insistia em incentivar todos a continuar. E menos ainda podia assumir que acabou participando da brincadeira por não aguentar mais ouvir as provocações da garota.

— Mas... – Repetiu virando a face para o lado como se procurasse por uma saída escondida nos demais olhos apreensivos dos soldados. Ele sabia que não conseguiria omitir a resposta e mesmo que fizesse era claro que Sera iria entrega-lo. Sem escapatória suspirou pesadamente aceitando sua derrota. — Ah, eu peço desculpas, Inquisi-

Novamente sua fala foi interrompida, porém, dessa vez, por um golpe pesado contra a armadura em seu ombro. O som do acerto foi abafado pelo material macio que se despedaçou espalhando gotículas por seu rosto. Ele se virou intrigado encontrando a mulher com uma mão na cintura e um olhar que desafiava o seu confuso.

— O que? Não me diga que o jogo já acabou. – Falou sorridente o vendo piscar sem saber o que dizer. — O que estão esperando?

— O que...

— Finalmente! – Sera gritou ao fundo pegando uma das bolas de neve e acertando fortemente um soldado descuidado. — Cullen estava perdendo mesmo.

— Eu não estava! – Bradou de volta e logo se virou para questionar a Inquisidora, porém se impediu quando a viu juntando o monte de neve com um largo sorriso no rosto.

Seus olhos irritados logo se tornaram serenos a assistindo se levantar com a expressão infantil que dizia estar pronta para acertar todos que passassem por seu caminho com força. Ele não fazia ideia de como reagir, mas tinha certeza que não queria para-la.

Sem dizer nada a observou correr firme pela neve fofa esbanjando provocações bobas aos soldados enquanto os incentivava a não temer sua presença e fingir por um momento que essa era a única guerra que precisavam lidar.

Ela se agachava nos cantos desviando dos ataques, corria para cima deles comemorando os acertos junto dos risos ao redor e rolava no chão molhando a roupa toda vez que a chuva de neve inimiga a atingia. Assistir a felicidade em seu rosto aquecia o peito do homem mesmo sentindo as mãos esfriarem cada vez mais. Ele se perguntava quantas vezes pôde desfrutar disso sem a culpa os assombrando e nesse instante quis correr em sua direção.

Queria abraça-la sem deixar um único sorriso escapar de seu alcance. Queria a cobrir em seu amor até que não existisse mais nenhuma dúvida, nenhuma dor.

Seu punho forçadamente fechado ajudou a segura-lo ali e o suspiro apaixonado fez seu corpo finalmente relaxar com a realização de que a amava mais do que conseguia entender.

Uma bola de neve o acertou o lembrando que também estava participando disso e mesmo que não pudesse correr para ela agora, ainda poderia compartilhar sua felicidade. Rindo de si mesmo abaixou-se agarrando um punhado de neve antes de voltar para o campo de batalha mais uma vez.

A tarde estava fria e quase não tinha sol entre as nuvens cinzentas, entretanto o calor das gargalhadas e das brincadeiras era o suficiente para os deixar aquecidos por quantas horas precisassem ou até alguém aparecer procurando pela Inquisidora.

Do outro lado do campo se recuperando dos ataques, a jovem assistiu os demais continuarem a brincadeira pensando que essa ocasião não deveria ser uma raridade naquele local. Precisava agora mais do nunca ajudar a consertar as coisas e garantir que esses risos fossem ouvidos todos os dias.

Seus olhos dançavam pelo campo quando viu Cullen tropeçar bruscamente em um monte quase sendo levado a queda e a única coisa que conseguiu fazer foi explodir em risos altos o suficiente para chamar sua atenção. Ele, sem jeito, tentou se recompor a vendo acenar como se pedisse desculpas.

O loiro até pensou em assentir e voltar para os ataques, mas desistiu quando notou que essa era a oportunidade perfeita para retribuir o golpe que recebeu mais cedo.

Sem tirar os olhos dela, se abaixou fazendo uma bola de neve grande o suficiente para preencher sua mão. Ela, perspicaz como era, notou os movimentos duvidosos e com a sobrancelha levantada o assistiu caminhar lentamente em sua direção.

— Não me diga que-

— Isso é uma guerra, Inquisidora. – Sorriu de canto a vendo se levantar. — E eu não quero perder.

Balançando a cabeça como se estivesse descrente de seus motivos a jovem se virou correndo pela neve escutando os passos pesados junto do som da armadura se debatendo logo atrás. Um riso escapou de seus lábios naturalmente o incentivando a fazer o mesmo.

Sem preocupações e como duas crianças eles continuaram para longe daquele campo, desviando das pessoas com alguns pedidos de desculpas e tentando não perder o equilíbrio pela gama escorregadia ou pisar dolorosamente nas pilhas de neve que os levariam a derrota.

Quem os via correndo notava o brilho caloroso em seus sorrisos e os olhares carregados de carinho que trocavam junto as provocações bobas. Naquele momento não tiveram medo do que iriam falar ou de como estavam sendo vistos.

Demorou para o loiro diminuir a distância entre eles e logo que conseguiu se esticou ao máximo para alcança-la sem tirar os olhos do alvo. A neve ainda estava em sua mão — apesar de parcialmente destruída — pronta para acerta-la, contudo seu intuito agora era faze-la parar.

Ele avançou cego pelo alcance e acabou sendo surpreendido pelo desvio rápido que a jovem fez, entretanto o que o fez arregalar os olhos foi o escorregão que ela tomou na grama.

Rápido como pôde e ignorando seu objetivo, Cullen virou na direção conseguindo apenas se agarrar ao corpo dela a puxando para perto fazendo os dois caírem juntos.

A queda foi brusca — mais para ele que amorteceu o corpo dela com o seu — tirando alguns gemidos dolorosos de ambos. E logo que se recuperaram puderam abrir os olhos vendo estarem abraçados embaixo de uma árvore que os cobria com flocos deixando seus risos aliviados saírem.

— Criador... – suspirou deitando a cabeça na neve antes de ter força para se ajeitar melhor e vê-la deitada em seu peitoral. — Você está bem? – A jovem assentiu positivamente ainda inconformada com seus movimentos atrapalhados. — O que estamos fazendo?

— Eu não sei, mas foi divertido. – Respondeu gentilmente esticando o braço e com carinho passou a mão pelo rosto dele afastando a neve da testa. — Obrigada.

Cullen não tinha entendido o motivo para o agradecimento. Foi culpa dele que os dois estavam com machucados pelos corpo e neve por dentro da roupa agora. Porém, decidiu assentir confessando com o olhar que estava contente por estar com ela.

— Mas eu ganhei. – Antes que ele pudesse se aproximar mais, a jovem falou alto o fazendo se lembrar o porquê estavam correndo.

— Tem certeza? – A pergunta veio seguida de uma sobrancelha erguida e um olhar confiante apontando por cima do ombro dela.

Curiosa, ela o seguiu, sem sair de cima dele, olhando na mesma direção vendo a mão larga dele segurando o que era a bola de neve um pouco abaixo de sua cintura. A Inquisidora se calou por instantes com os lábios entreabertos tentando se lembrar quando foi que teve tempo para fazer isso e logo se virou para olha-lo.

— Você-

— Ha! Eu sou um comandante, Inquisidora. – Falou orgulhoso de si mesmo como se estivesse esperando por esse momento o dia todo. — Sei quando atacar.

— Ah... E como atacar. – Erguendo a sobrancelha completou com um sorriso de canto o fazendo fita-la sem muito entender.

Seus olhos a encararam por instantes buscando pela resposta e só então notou onde sua mão estava esse tempo todo. O engasgo foi imediato tirando o sorriso confiante daquele rosto avermelhado.

— Não! Eu não quis dizer isso. Ah, Criador...

— Oh... – enquanto ele se enrolava subindo a mão para suas costas, ela suspirou o observando com olhos tristes fingidos. — Sério?

Sua voz o fez parar de gaguejar trazendo a atenção para seu rosto. Por instantes apenas observou os olhos claros que intensamente fitavam os seus e os lábios vermelhos do frio esbanjando um curto sorriso.

Sabia que não precisava dizer mais nada e entre suspiros derrotados ele se aproximou. Com as mãos segurou suas bochechas e com cuidado tocou seus lábios.

• • •

Com cuidado a mulher subiu as escadas com uma das mãos enquanto a outra segurava uma bandeja. Ao chegar no topo foi recebida pelos sons repetitivos e fortes de tosses vindas da cama a frente.

Devagar se aproximou colocando o metal sobre a mesa no canto assistindo o loiro assoar o nariz enquanto se ajeitava embaixo das cobertas.

— Eu lamento, Inquisidora.

Sua voz soava engraçada por conta do resfriado, mas ela não pôde rir quando viu seu olhar abandonado fitando o seu.

— Está tudo bem.

Com cuidado lhe estendeu uma xícara a qual ele tentou inalar a fumaça sem sucesso para sentir seu cheiro. Se sentando ao seu lado o viu assoprar o liquido antes de tomar um curto gole.

Seu olhar se voltou para ela novamente e ao ver seu sorriso gentil balançou a cabeça sem acreditar na situação. Ela entendia perfeitamente o que estava pensando e acariciando seu cabelo se aproximou um pouco mais sabendo que deveria assegura-lo de suas preocupações.

— Não se preocupe com as coisas, tá bem? – Seu aceno positivo foi automático deixando claro que, de fato, estava preocupado. — Eu vou ficar aqui com você então... – se aproximando beijou sua bochecha com carinho. — Fica bem logo.

Por mais que fosse teimoso ele ainda sabia quando deveria recuar e aceitar ajuda, por isso apenas assentiu. E apesar de se sentir culpado pelos problemas que esse curto resfriado traria também estava feliz de poder ter a jovem só para ele pelo menos dessa vez.


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Notas finais do capítulo

Eu passaria o resto dos meus dias comendo só fígado se pudesse ter o Cullen na minha vida. Juro.
Casais fazendo coisas bobas de casais é a cara deles. Eu realmente quis fazer algo docinho para esses dois porque o Comandante aqui é um algodão de fofura ♥
Jogar a rota do Cullen é o mesmo que ter que lidar com pequenos ataques cardíacos e gritinhos histéricos desejando abraçar ele, por isso quis que minha fic passasse o mínimo desse sentimento. Espero ter alcançado ^^
Obrigada por ler!

Detalhe: deixei a expressão “Maker’s breath” porque não consegui me decidir se deveria adaptar para o português ou simplesmente traduzir no literal. Desculpa se ficou meio inconveniente.



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