Nascida nas trevas - Born in the dark escrita por Letícia Pontes


Capítulo 10
Veneno




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Depois que terminei de comer o peixe com uma espécie de areia estranhamente saborosa, coloquei em cima da cama o prato feito de pedra e observei o rapaz que não havia parado de me encarar nenhum segundo. Ele havia ficado em pé na ponta da cama me apontando uma lança enquanto eu comia. Ele claramente estava com medo, mas tentava não demonstrar. Eu calculei diversas rotas, e tive várias oportunidades de fugir, já que ele era péssimo naquilo, mas preferi me manter ali e quem sabe fazer um aliado.

—Me chamo Tamryn e você?

Ele hesitou por ainda longos segundos antes e me responder.

— Rudá.

—Rudá era um deus do amor, na mitologia indígena brasileira.

—Eu sei. - Falou sério.

— O significado do meu nome é tosco. Significa "nome feito". - Eu tentei puxar assunto, mas ele só em olhava confuso.

—Não, esse significado é do nome Taryn e não Tamryn.

—Mas Tamryn é uma variação.

—Como sabe?

—Eu leio muito. Harvery sempre me levava livros.

—Quem é Harvery?

—Um nômade amigo meu.

Ele continuou sério me encarando.

—Escuta, porque eu estou presa aqui com você?  Eu não fiz nada de errado, eu só quero voltar para a minha família. - Fiz drama com cara de choro. Se eu continuasse fazendo papel de frágil talvez ele me ajudasse, mas se isso não funcionasse, eu teria que mata-lo.

—Algo matou quase todo o meu povo, e de repente vocês estavam aqui. - Ele parecia realmente bravo. - Não vou me dar ao luxo de acreditar que isso  foi apenas coincidência. O governador está vindo e ele vai julgar você.

—O que?  - Assustei.

O rapaz se aproximou com a lança na mão esquerda e com a mão direita veio pegar o prato de pedra em minha mão. Aproveitei os segundos que ele estava concentrado e quando sua mão tocou o prato, com minha mão livre eu apunhalei-o na garganta com um soco. Ele cambaleou para trás tossindo e derrubou o objeto que caiu intacto no chão. Levantei rapidamente da cama e avancei para cima dele que ainda estava atordoado. Tentei puxar a lança de sua mão, mas ele à segurava firme. Então apenas chutei seu joelho e acertei um soco com a  maior força que pude, no meio de sua cara. Puxei o molho de chaves que eu já havia identificado penduradas em sua calça e corri até a porta pegando uma das três e enfiando na fechadura, acertando de primeira. 

Rudá estava se levantando atordoado e com nariz escorrendo sangue então por via das dúvidas eu decidi trancar o portão que nos separava. Como se eu tivesse calculado o tempo, assim que tirei minhas mão da fechadura deixando-o preso do lado de dentro, ele alcançou o portão sacudindo-o.

—Vai se arrepender por isso.

—Me arrepender por ter me livrado do meu sequestrador? Acho que não.

Sai deixando-o gritando ofensas e segui pelo único corredor que havia, que me levou diretamente para outra porta. Dessa vez também de ferro e completamente fechada. Testei a chave que mais parecia se encaixar naquilo e funcionou. Liberdade. Então eu percebi que não fazia ideia e para onde deveria ir.

Do lado de fora o terreno era irreconhecível. O que antes era areia branca, árvores e mar dava lugar à uma areia pouco mais escura, mas só isso. Era como eu havia visto imagens de desertos, pelo menos parecia muito com um. A porta de ferro era só isso. Uma porta de ferro no meio de um deserto de areia que levava aquela pequena casa/presídio no subsolo. Corri cerca de um quilômetro antes de parar ofegante sem saber para onde eu deveria ir. Voei o mais alto que pude antes de me sentir muito cansada, e em volta de mim só havia areia. Pousei em desespero. Olhei a posição do sol no céu, já deveria passar do meio dia. Só então percebi que minha pele e meus olhos estavam sensíveis demais ao sol. Então corri de volta para a porta de ferro.

Eu estava suada, ofegante e me sentindo muito quente. Parei do lado de dentro do local e sentei no chão para descansar. Eu tinha duas opções, sair por aí sem rumo e correr o risco de ser morta ou pedir ajuda ao hospitaleiro Rudá. Engoli o meu orgulho e me levantei indo em direção à onde Rudá estava preso. Assim que ele ouviu meus passos se aproximando, riu.

—Parece que alguém precisa da minha ajuda.

Parei de frente para o porta de ferro em forma de grade onde eu podia ver Rudá e sabia que ele estava com os olhos brilhando sentindo o gostinho doce da vitória. Ele estava sentado de costas para mim apoiado nas barras de ferro da grade. A vitória ainda não era dele. Aproximei-me lentamente e segurei o seu braço torcendo-o e puxando para fora da grade. Em questão de segundos ele estava com o rosto pressionado no ferro à pouquíssimos centímetros do meu. Ele lutava para que eu soltasse seu braço, mas eu não o fiz. Abri minha boca mostrando meus dentes pontiagudos para ele e então cravei-os em seu pulso vulnerável. Rudá primeiro gritou, depois quando soltei ele me olhou confuso. Ele recolheu o braço até perto de seu rosto observando a ferida e se afastou da grade.

—O que é isso? Você me mordeu? - Ele parecia confuso.

—Você quer viver?

—O que? Demônio!

—Meu veneno está circulando em você e agora você deve ter por volta de 24h antes de morrer. Lenta e dolorosamente, devo lembrar.

—O que fez? O que fez? - Ele repetia em desespero.

—Temos remédio próprio em meu povo, mas é óbvio que para você sobreviver, você teria que me ajudar a sair daqui. Me levar para casa e só então obter a cura.

—Você...Você me mordeu!

—Ei, eu te mordi. Okay - Perdi a paciência. - Já sabemos. Mordi, você esta envenenado e a cura só você pode me levar até ela, então decida se quer viver ou não.

— O governador está vindo, ele vai te matar. - Ele falava com voz trêmula.

—Te dou dez minutos para pensar.

 

 

 


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