Adão e Eva no berço dos anjos. Primeira parte. escrita por Paloma Her


Capítulo 6
Uma cultura perdida


Notas iniciais do capítulo

Apenas Belzier com sua manada de filhotes estavam tristes. Parecia que nunca mais se veriam. Adão tinha esse pressentimento, e Belzier lia seus pensamentos desde sempre. Haviam chegado ao fim da evolução, e ninguém sabia se no planeta dos anjos havia bestas peludas.
Eva chorou abraçada a sua pantera mãe, e do fundo do coração pediu a “00” que as enviasse junto na eternidade de sua existência. Se não houvesse panteras nessas vidas eternas do futuro, que as enviasse como lagartas, ou baratas, pois as amaria da mesma forma.



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A despedida de Amon-rá foi muito bem comportada.

Os avôs cantaram, os tios atacaram os batuques, os pais rebolaram ao redor do fogo, e se saboreou durante toda a noite uma bebida estranha de “B de ALPHA”. Amon-rá explicava que se fazia misturando álcool com frutas, mas não sabia a receita. Ela era doce, gostosa e todo mundo ria com cara de bobo, levemente embriagados.

Ao raiar do Sol, um raio branco desceu inundando a selva de brilhos.  

Toda a família começou a chorar. Eva, Ludmila e Dina pareciam crianças de tanto assoarem o nariz. Sergei e João davam-se conforto uns aos outros abraçados, mas mesmo assim as lágrimas rolavam pelo rosto sem controle. Principalmente João que adorava seu neto. Afinal o guri era igual a ele em tudo. Só gostava da vida mansa, e ambos eram morenos de olhos verdes. Mas, quem chorou qual bebezinho foi Amon-rá. Adão o consolava prometendo que seria seu primeiro filho na próxima reencarnação.  Depois o viu subir como um anjo verdadeiro, com sua capa branca flutuando no ar.

A despedida de Adão, Eva, Ênio, Mirim, Madalena e Viktor, foi uns trinta dias após a viagem de Amon-rá, na aldeia de Adão.

Foi à vez da bagunça.

Os irmãos de Eva lhes pintaram nos rostos e corpos desenhos geométricos, como índios de mundos primitivos. Com as mulheres só de calcinha e sutiã, e os homens apenas cuecas. Depois chegou a hora de uma pequena peleja, como quando eram crianças. Todos juntos. Rolavam no chão, caiam com tombos ridículos, pois desta vez era para se divertirem.

Fins do dia foram nadar para tirar a sujeira. Viktor esfregava a pele com uma esponja e ria, pois ficava ainda mais sujo com a tinta escorregando. Parecia um troglodita. Ficou mais ou menos limpo, mas de uma cor preta misturada com tons marrom, que  grudaram na pele por muitos dias.

Mas Viktor nunca se divertiu tanto.

Rebolaram noite adentro, cantaram, contaram piadas, e não houve choradeira, pois o raio de luz levitou os familiares e amigos dos viajantes desta vez. Afinal, na Universidade haveria uma última festa com a presença dos mestres e dos colegas Espiões.

Apenas Belzier com sua manada de filhotes estavam tristes. Parecia que nunca mais se veriam. Adão tinha esse pressentimento, e Belzier lia seus pensamentos desde sempre. Haviam chegado ao fim da evolução, e ninguém sabia se no planeta dos anjos havia bestas peludas.

Eva chorou abraçada a sua pantera mãe, e do fundo do coração pediu a “00” que as enviasse junto na eternidade de sua existência. Se não houvesse panteras nessas vidas eternas do futuro, que as enviasse como lagartas, ou baratas, pois as amaria da mesma forma.

Madalena, porém, fora mais afortunada. Seu cachorrinho peludo não ultrapassava os 50 cm de largura, então teve a permissão de ser incluído no mini zoológico da horta, junto as galinhas, patos, rás, ratos, cobras, que faziam parte da fauna dessa selva em miniatura. Para que o bicho fosse feliz, lhe foi incluída uma namorada. E para que sobrevivessem aos milênios dessa viagem foram congelados quais picolés.

E as irmãs foram às últimas a serem içadas para as alturas, mãos dadas com os maridos, rosto molhado, acenando aos bichanos. Adão deixava cair às lágrimas em silêncio. Homens e bestas afinal, eram uma família do coração. Irmãos menores que alegravam a vida e eram fieis em tempo integral. Alguns até dormiam junto nas camas, como o peludo de Madalena.

 Depois da tristeza, veio o dia de festim na Lua.

 Adão e Eva vestiram seu lindo uniforme, com uma capa nas costas, que os fazia parecer morcegos prontos para voar. Eva fez um rabo de cavalo na cabeça de Adão, e Adão ajudou-a a enrolar uma trança como uma coroa por cima da cabeça. Eva pendurou dois brincos de esmeraldas, um pingente com um rubi gigante ao pescoço, três pulseiras, e nos pés a última moda em sapatos, um tênis dourado, antiderrapante, que grudaria no chão da nave para ela jamais perder o equilíbrio.

De mãos dadas entraram no salão, onde a família vestia também elegantemente. Elas haviam assaltado às lojas da cidade como piratas primitivos a um navio. As irmãs menores de Eva estavam belíssimas, iluminadas de joias, perfumadas, trajes longos, mais pareciam fadas encantadas de historinhas infantis. Os namorados, os dois homens mais lindos do Universo, só tinham olhos para elas. E essas irmãs, Tathiane e Mariuska, só queriam ter um filho atrás de outro e desfrutar de uma lua de mel eterna. Afinal, junto aos namorados haviam conseguido a façanha de enganar todo mundo na Escola. Seguiram a risca os conselhos de Madalena. Fez-se de ignorante tempo integral para amigos, espiões, colegas de curso, e foram enviaram de volta em menos de um ano. Apenas Dina, entre ambas, tentava conter as lágrimas pela partida de Eva e Madalena. João desta vez estava calmo. Sabia que Eva partiria mais cedo ou mais tarde, e Madalena, que fora sua  filha pela primeira vez, era uma aventureira. E ele sempre soubera disso.

Já Oscar tentava imitar o irmão em tudo, era o melhor aluno do ensino superior, e campeão de lutas. E agora, tentava consolar Sergei, que sorria para disfarçar que estava sofrendo com a partida de seu filho herói. Mas, junto com João tinham tudo planejado. Pediriam a “00” no espelho falante pela graça de serem pais de todos pela eternidade. E  “00” nunca negava um pedido aos homens que amavam a família de verdade.

E essa festa foi apoteótica.

Uma orquestra alegrou o ambiente, Eva e Madalena rebolaram com os irmãos, e a tristeza começou a se alastrar quando um novo dia iluminou a cidade com seus raios luminosos, anunciando a todos que a partida era iminente. E partir era sempre arrasador. Entre todos os irmãos à separação doía como faca que dilacera o peito.

Os que partiam, abraçaram amigos, família, mestres, colegas, e aguentaram as lágrimas, pois chorariam em meio da solidão cósmica que os esperava. Em seguida entraram numa nave minúscula, que subiu no interior de um tubo translúcido até chegar ao espaço. Voaram em direção à nave preta, gigante, que mais parecia uma linguiça aérea com 20 módulos acoplados.

Como chefe dessa expedição, Adão revistou sua tripulação de robôs.

Para pilotar existia uns 50 deles, para desintegrar pedregulhos no espaço mais uns 100, e para trabalhos futuros uns 30.000. Estes últimos encontravam-se engavetados dentro de capsulas de vidro, esperando por futuras missões. Como todos os robôs funcionavam com telepatia, Adão distribuiu serviços, e sentou na cadeira central, ao lado de Madalena, que acionou o volante como um capitão de navio, enquanto a nave começava sua rota entre as estrelas. Circundaram esse mundo, para que todas as aldeias os vissem partir. Passaram por sobre a Lua, num voo rasante, onde a família estava nos jardins para acenar o último adeus.

E subitamente, despareceram na escuridão.

Adão colocou três robôs na pilotagem, cinco em cada janela para desintegrar pedregulhos, enquanto Ênio vasculhava o negrume estelar em busca da passagem densa. Uma fenda que os levaria direto até a Oitava dimensão.

Quando o túnel ficou nítido, com uma aureola em redor de cor amarela e um centro azul marinho, Ênio calculou o tempo, e deu um grito forte: - 200 batidas do coração  para congelamento, pessoal! Imediatamente todos começaram a contar: - um, dois, enquanto se davam os últimos beijos entre todos. Entraram em cabines verticais onde braços metálicos os abraçaram na cabeça, cintura, pernas e tornozelos. Em seguida uma cúpula de cristal os cobriu como um casulo, enquanto a nave era tragada pela passagem misteriosa.

Quando uma luz os acordou, estavam na Oitava dimensão. Haviam atravessado o Cosmos desde o centro até os confins universais, encurtando a viagem em milhões de anos luz.

As cabines congeladas estavam deitadas desta vez, enquanto um arco íris de luzes recuperava os corpos. Energias incandescentes que devolveriam aos homens toda sua potencialidade, e faria os órgãos funcionarem. Primeiro o cérebro. Depois o coração. Em seguida o resto.  Enquanto dormiam, os robôs introduziram- lhes no baço um soro nutritivo para recuperar as forças. Haviam feito uma viagem de milênios. E, embora congelados, o tempo é o tempo. Massacra qualquer um.

E, um dia, saíram das cápsulas meio atordoados a caminho da cozinha, pois a fome fazia doer o estomago. Eva preparou maisena com leite em pó, água e mel, pois o estomago tinha que acordar aos poucos. Madalena bateu claras em neve com açúcar, creme vegetal, gelatina, e fez uma sobremesa suave. Mirim bateu frutas com mel e água, e levou numa jarra para mesa. Sentaram a conversar na espera da fraqueza ir embora. Mirim deu-lhes umas cápsulas com nutrientes, vitaminas, minerais, e disse que em breve recuperariam as forças. Melhor era dormir de novo, e tomar as três capsulas cada vez que acordassem, com um suco de limão.

E todos foram para as suítes arrastando os pés. Nossa! Esse túnel os havia esmagado. Os únicos que corriam como loucos pelos corredores dessa nave era o cão peludo de Madalena com sua namorada. Eles esbarravam no chão de forma engraçada, e lambiam as pernas de todos, como para dar uma força. Felizes.

Adão caiu de costas na cama e dormiu como tronco. Até roncou. Ao abrir os olhos, um robô bem comportado estava cravado ao lado da cama com uma mesinha para o desjejum. Engoliram pílulas com um suco espumante de limão, e em seguida beberam uma sopa de lentilhas e como sobremesa um pudim de maisena com bolachinhas miudinhas. Comidinha de bebê. Entraram na banheira, esfregaram o corpo com sabão perfumado, rindo, pois o cansaço não passava. Os machos pareciam velhinhos de mundos primitivos. Mirim lhes gritava com telepatia que tivessem paciência, pois o corpo estava ressuscitando aos poucos.

E pouco a pouco, os corpos voltaram a ser o que sempre foram. Peles de aço e uma energia maravilhosa, para fazer amor eterno dentro dos dormitórios. E a rotina entrou nessas suítes de vez. Assim que o sono os abatia, dormiam abraçados, se beijando, deitados na cama. Assim que se recobravam do cansaço e acordavam, repetiam o ritual do namoro sem fim.  O robô sempre lhes deixava mais um banquete, chocolate com leite numa garrafa térmica, frutas em caldas, claras em neve, cremes e geleias para passar sobre o pão, uma torta de legumes, ovos crus que Adão bebia num copo com limão, e sucos. Uns 5 litros de sucos variados.

Depois de um longo e delicioso tempo de namoro, eles fizeram reversão de trabalhos com os robôs. Madalena tomava os controles, Ênio olhava no telescópio, Eva desintegrava asteroides e pedregulhos do espaço, e Mirim preparava compostos medicinais. Já Viktor recolhia ovos, mel, verduras e frutas e preparava um jantar na cozinha.  Chamava Mirim com telepatia e jantavam entremeados de beijos. Também havia ocasiões em que todos se juntavam a cozinhar e compartilhar um banquete. Depois de comer até dar dor de estômago, pois os machos eram gulosos, estendiam-se na beira de uma piscina, onde contavam piadas, ou, jogavam um carteado. Em outras ocasiões Ênio colocava um filme, e ficavam todos olhando para o telão abraçado a suas mulheres.

Um dia, Ênio descobriu um planeta em meio do nada. No lugar onde só há mundos com as primeiras bactérias iniciando a vida. Um gigante com uma órbita imensa.

E todos olharam através dos telescópios com curiosidade.  Esse mundo estava assinalado como silvícola no mapa estelar, mas olhando-o mais de perto, denunciava uma civilização avançada. Começando pelos satélites. Giravam em redor do planeta estações metálicas com antenas de televisão, centrais de pesquisas, e alguns robôs cuidavam de tudo num trabalho eterno.

E sem resistir, Adão pediu para Madalena atracar numa estação de telecomunicações. Madalena esticou uma passagem tubular, que aderiu numa porta redonda daquela estação primitiva. Um robô cruzou a passarela, girou a maçaneta, e uma antecâmara se abriu. Imediatamente Madalena enviou uma corrente de ar, pois ali dentro o oxigênio não existia mais. Eram gases venenosos, que já haviam matado a tripulação em tempos passados.

Vestiram macacão impermeável, com máscara respiratória, e Adão partiu na frente.

E assim entrando nessa estação encontraram um computador piscando, que transmitia infinitamente uma mensagem repetitiva: - somos os últimos sobreviventes e estamos deixando um zoológico congelado. Se existirem condições de vida no planeta, por favor, os levem de regresso para casa. Obrigado. Quando nosso oxigênio terminar, morreremos.

Ênio foi abrindo a passagem seguinte desse lugar, e milhares de criaturas ficaram a vista. Cada tubo gigante possuía uma dupla de cada espécie, um macho e uma fêmea. Todos feitos picolé. Nenhum ser humano, nem morto nem vivente, nem congelado. Nos outros satélites adjuntos a essa estação havia de tudo. Bibliotecas, armazéns de sementes, mudas congeladas de inúmeras árvores, esculturas, e obras de arte.  Parecia que tentaram se salvar com uma vida no espaço, mas alguma coisa lhes saíra errado! Falta de conhecimento, talvez. Pois esse mundo não tinha sinais de guerras de extermínio. E, ainda curiosos, desceram ao planeta num voo rasante, contemplando tudo através das vidraças da nave.

Seis bilhões de corpos falecidos os receberam.

Muitos já transformados em esqueletos brancos calcinados pelo calor. Desde o ar a terra estava seca e rachada ao redor das cidades, onde o branco do cimento refletia e multiplicava o calor do ar. O mato, porém, estava se recuperando e exalando um vapor que subia pelo ar como uma nevoa. Nos campos, as vacas, porcos e cavalos eram esqueletos brancos. Apenas a bicharada miúda deambulava, seres que se adaptaram a viver no calor extremo, e que viviam soterrados em tocaias. Ratinhos, baratas, pequenas cobras, escorpiões, pulgas, carrapatos e seres que abriam o chão em tuneis a cada minuto. Parecia que tinham a missão de arejar a terra. Refrescá-la. Mas, tudo assinalava que o calor não conseguia diminuir. Estava num nível acima da suportável pelas espécies maiores.

Mas, o que é que teria acontecido na verdade? Nenhum vestígio de armamentos.  

Regressaram para Mirim fazer o analise do ar, da temperatura, da humidade, das emanações tóxicas, apinhados num laboratório em redor dela. Mas Mirim só encontrou calor acima da média. O ar estava limpo, e se podia respirar sem perigo.

Vestiram roupa isolante para o calor, e desceram mais curiosos do que antes.

Caminhando por uma avenida, Eva foi desintegrando os cadáveres em redor.  Além dos homens, animais apodreciam da mesma forma. Assim que encontravam livrarias, ou bancas de revistas, liam tudo com facilidade, pois interpretar, ou entender, era fácil para homens como eles. Idioma primitivo seguia uma lógica universal. Além disso, estava a coleção de fotos. Os jornalistas registraram a decadência dessa civilização nos mais escabrosos detalhes até o fim.

E regressaram para a nave a trocar ideias, cheios de revistas, livros, jornais, alguns documentários em Cds gravados, já outros em Pent drives. Um robô mecânico adaptou os dispositivos primitivos para o computador central, e em seguida ligou as imagens ao cinema da nave. E essa antiga civilização ficou nítida: - Um mundo de nuvens negras, asfixiantes, ocasionadas pela tecnologia a base de energias como carvão, petróleo, e afins.

 Ainda sem entender muito das causas, eles carregaram as revistas para as suítes para estudo em detalhes. Mas, sem guerra, não conseguiram encontrar um motivo para a extinção. Conforme os registros encontrados, o calor estava aumentando desde fazia uns 200 anos, e nenhum geólogo descobrira a verdadeira causa. Nunca chegaram a conhecer do porque a natureza os matara.

Numa reunião entre todos Madalena falou:

— Aquecimento global! Eu já vivi isso! Eu já passei por isso, só não me lembro em qual vida anterior...

Adão respondeu-lhe:

— Na Terra! Nós estávamos lá! Tu, Eva, eu, meus filhos, todos nós lutamos contra o aquecimento como leões...

Mirim interrogou:

— Mas, Adão, não se lembra do que é que fizeram?

— Não! Eu morri! Nunca soube o que se passou depois. Mas, eu sei que a Terra hoje está com saúde, vivíssima, e convertida em Mundo em transição! Mas, Madalena, tu deves saber! Tenta lembrar.

— Hum... Parece-me que uns caras inventaram o petróleo sintético. Isso! Foi assim mesmo! E depois fecharam os poços de petróleo no mundo todo. O ar ficou mais puro, e teve plantação em grande escala. Acho que foi isso, aí.

Viktor interveio:

— E com certeza colocaram o produto de volta. Ele é isolante! Separa o calor do magma do calor do Sol! Preencheram os poços vazios com massa preta, fabricada por alguma mente brilhante. E eu sei fabricar petróleo. Se recuperarmos os buracos negros, que devem estar vazio cheios de água, este mundo viraria um paraíso para essas bestas congeladas.

Eva perguntou:

— Tu? Afinal, qual é tua profissão?

— Geólogo! Fotografias eu uso para conquistar mulher... O acharam que eu estava lá para fazer álbuns de paisagens?

Mirim, com uma pitada de ciúmes perguntou:

— Afinal, quantas mulheres peladas o malandro fotografou?

— Não vai saber, pois apaguei de minha memória. Nem eu sei. Assim fico desculpado... Né, meu amor?

Todos riram em coro, pois Mirim estava com vontades de arrebentar a cara de Viktor, e ele fazia de tudo para que ela o perdoasse. Mirim tinha vontades de dar um soco de vez, mas Viktor abraçou-a com firmeza tentando dar um beijo.

E depois de muitas piadas, risadas, os planos para fabricar o petróleo sintético começaram a ser planejados durante um jantar. Adão falava que podiam ficar um tempo sem prejudicar essa missão e deixar para trás um planeta verde. E todos distribuíam responsabilidades e serviços sem pressa, ao comando do geólogo Viktor. Embora Adão se graduasse em Geologia, igual a ele, fabricar petróleo era uma novidade para todos. E Viktor prometia também fotografar tudo. E davam gargalhadas em coro, pois Mirim continuava tomada pelo ciúme.

E com ajuda de uns 1000 robôs desceram a trabalhar.

Metade desses homens artificiais correu a semear o mato, pois o chão possuía frutas mínimas. Faltava o que era essencial, milhos, abóboras, melancias, melões, jacas, jabuticabeiras, tomates, e todos os legumes que fazem parte de um paraíso de verdade. Outra metade dispersou-se a desintegrar os cadáveres.

Em aterros sanitários, onde as montanhas de lixo apodreciam em meio de um fedor dos infernos, Viktor fez a massa gigantesca de detritos se mexerem como um bolo monstruoso. 100 robôs espertos em levitação ajudavam a mexer a sujeira que se liquidificava aos poucos. Viktor levantava terra do fundo e a fazia se misturar ao lixo, aumentando a velocidade dos giros. Enquanto isso, Mirim e Madalena, cada uma numa nave pequena,  lançavam desde o ar sacolinhas de papelão com um fungo que aceleraria a putrefação, mas que também combateria os venenos do lixão. Sobraria uma massa negra inócua, muito similar ao petróleo que a mãe terra demorava milênios em fabricar.

Enquanto isso, Ênio procurava pelas usinas petrolíferas envelhecidas. Instalações gigantescas, apodrecendo pelo tempo e o abandono. E elas estavam em todo lugar. Inclusive em meio do mar, suportando ondas gigantes que se erguiam por sobre as plataformas.

E o trabalho inverso aconteceu como mágica.

Em várias cidades desse planeta, jorros de água subiram como chafariz desocupando os buracos. Água que se perdeu serpenteando entre as ruas, refrescando o chão árido e escaldante.  Quando outro rio, negro como breu chegou ao lugar, através de outro canal, ele foi descendo, se expandindo, preenchendo a cavidade, regressando aonde nunca deveria ter saído.

Depois de incontáveis dias de trabalhos, trinta poços estavam cheios de massa negra, e havia duas selvas com arroz selvagem, milhos, morangos, melancias e melões, que se alastravam em toda parte. Brotariam sozinhas no futuro, pois as sementes sairiam junto ao estrume da bicharada, pronta para fazer brotar novas mudas.

E finalmente, foi à vez de trazer os donos desse planeta de regresso para casa.

Animais que a civilização imortalizara como um pedido de perdão a mãe natureza. Eles se reproduziriam e o planeta se recuperaria como um Éden. Desta vez com ajuda de uns 50 robôs que cuidariam dessa bicharada, dia após dia, através de 50.000 dias de vida. Tempo que terminariam de preencher todos os poços desse mundo, e quando eles mesmos ficariam obsoletos.


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Notas finais do capítulo

Seis bilhões de corpos falecidos os receberam.
Muitos já transformados em esqueletos brancos calcinados pelo calor. Desde o ar a terra estava seca e rachada ao redor das cidades, onde o branco do cimento refletia e multiplicava o calor do ar. O mato, porém, estava se recuperando e exalando um vapor que subia pelo ar como uma nevoa. Nos campos, as vacas, porcos e cavalos eram esqueletos brancos. Apenas a bicharada miúda deambulava, seres que se adaptaram a viver no calor extremo, e que viviam soterrados em tocaias. Ratinhos, baratas, pequenas cobras, escorpiões, pulgas, carrapatos e seres que abriam o chão em tuneis a cada minuto.



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