Incapaz escrita por Lux Noctis


Capítulo 1
Hurts like hell




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“Não há descanso para os bons.”

— Good Omens




Sentiu o ardor na garganta quando o grito não se fez audível. Engasgado em meio às cinzas que jaziam em fuligem na boca, trazendo a sensação ruim ao paladar. Curvou o corpo sobre o volante quando sentou no banco de seu carro, sentindo os nós dos dedos tremerem pela força imposta ao se segurar no volante. Gritava em completo silêncio, a voz havia rompido antes enquanto ainda na livraria em chamas de Aziraphale. 

Naquele carro era o grito mudo e agoniado de quem nada pôde fazer para salvar o melhor amigo. O grito que ecoaria em sua mente, em sua essência como um ser. 

Incapaz de proteger aquele que esteve ao seu lado ao longe… milênios. Havia perdido seu melhor amigo em todo o universo, e nem mesmo se agora fosse para Alfa Centauri conseguiria existir em paz. Então apertou ainda mais forte o volante, como se alguma dor fosse trazê-lo ao momento onde precisaria aprender a realmente estar só. Sem Aziraphale, sem o seu anjo. 

Teria ficado ali, puramente consternado demais para se mover, se (e apenas se!) não fosse por aquela coisinha que escorria pelo canto de seus olhos, por sob o óculos escuro e lhe fazia uma leve cócega ao deslizar pela tez. Tocou-a com a canhota, levando frente ao rosto depois, aferindo aquela coisinha translúcida na ponta de seus dedos, levantando o óculos com a outra mão. Não notando que outras lágrimas seguiam o fluxo da primeira, rolando pelo rosto sujo de cinzas. 

Era dor. Como não sabia ser capaz de sentir, era o desespero. Era o silêncio que encobria tudo o que parecia soterrá-lo por dentro. A frase: enterrado vivo, nunca antes fez tanto sentido. Ao menos não para Crowley, que sentia-se enterrado em sentimentos que não saberia explicar, quiçá entender em meio à suas lágrimas. 

O óculos jazia agora sobre o livro, o único que resgatou de ser totalmente queimado. Haviam matado seu melhor amigo, haviam tirado-o de seu eixo, como se Deus movesse a terra apenas para testar os efeitos colaterais em suas criações. E este, bem, Crowley poderia dizer que era desnorteante. E lhe trazia uma sensação de vazio tão grande. 

—  Deveria tê-lo protegido. —  sussurrou, a pouca voz não permitia altos tons. E não precisaria dizer em voz alta, quando sozinho em seu Bentley. —  Eu perdi… Essa é a recompensa para os Seus? — olhou para o teto do carro, os olhos de serpente quase ferindo o metal para alcançar os céus, e além. 

Deveria tê-lo mantido próximo, sob suas asas negras, porque ele era importante, e infelizmente nunca tinha dito à Aziraphale. Se no plano inefável de Deus ele tivesse uma segunda chance, nem mesmo ele, um demônio, a rejeitaria. 

Suspirou cansado, pegando de novo o óculos, o livro e saiu do carro. Não precisaria ir muito longe para fazer o que queria; beber. Precisaria, entretanto de uma intercessão divina para livrar-se das amarras daquele mundo, porque não tinha graça estar ali sem o seu anjo. 


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