Hanahaki Satsujin escrita por Dama Magno


Capítulo 1
Higanbana


Notas iniciais do capítulo

Atenção! Essa fanfic contêm cenas de morte, homicídio e suicídio. Se é sensível ao tema, por favor, não prossiga.

Eu não acredito que consegui!! Gente, essa fanfic começou a ser escrita hoje, cês tem ideia de como eu to morrida??

Bem, outro aviso, para essa fanfic foi utilizado o Proto!Katsuki, então não estranhem a personalidade.

Boa leitura.



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— Ei, cara, levanta que nós já estamos fechando. — Uma voz grave soou pelo bar quase vazio, o homem no balcão resmungou sem levantar a cabeça dos braços. — É sério, acorda logo. — O funcionário insistiu cutucando o homem que estava dormindo no balcão.

 

— Tá, tá. Já tô saindo — respondeu erguendo o corpo, as sobrancelhas claras se contraíram em sinal de desagrado quando o homem sentiu todos seus membros queimarem. O rapaz do outro lado do balcão revirou os olhos e se afastou enquanto o cliente lentamente se preparava para ir embora.

 

Com os sons de cadeiras sendo puxadas e postas sobre as mesas de madeira, o freguês estralou o pescoço e passou os dedos pelos fios loiros. Olhou para o copo que segurava antes mesmo de adormecer e ponderou. O líquido âmbar já estava quente e com certeza seu gosto era melhor gelado, poderia deixá-lo ali e dar a noite por terminado ou dar o último gole com a esperança que o amargor o fizesse esquecer dos problemas que o levaram até aquele bar, a princípio. 

 

Retirou algumas notas da carteira, jogou-as sobre o balcão e se levantou. Pegou o blazer que estava pendurado no encosto da cadeira e se virou para sair. Parou, encarou pela última vez o copo.

 

— Foda-se. — Jogou o conteúdo para dentro da boca, sentiu a garganta arder e todo seu corpo pegou fogo. Tornou a se virar e dessa vez seguiu em direção a saída.

 

Quando o frio da rua o atingiu, o homem esqueceu o calor que sentia dentro do bar alguns segundos atrás. Vestiu o blazer, enfiou as mãos nos bolsos da calça social e desceu a rua deserta. A madrugada estava em seu início, mas era meio da semana e poucas pessoas ficavam fora de casa até tão tarde; apenas vagabundos e prostitutas estavam nas ruas àquela hora. Ele não era nenhum dos dois, apenas mais um cidadão comum que sofria com as mazelas de um emprego medíocre e um casamento infeliz.

 

— Mas que merda… — Resmungou esfregando uma das mãos sobre a testa suada, a queimação havia retornado. Tirou o blazer e passou a segurar a peça com o braço esquerdo, continuou a andar.

 

O ardor aumentou, o deixando tonto e obrigando que se encostasse em uma parede qualquer para não cair. Colocou a mão sobre o peito, sentindo o coração acelerar ao mesmo tempo em que os pulmões se contraiam. Um infarto? Poderia ser, todo o estresse que vivia nos últimos meses explicariam a situação.

 

— Ei, tudo bem ai? Precisa de ajuda? — Alguém falou ao seu lado, ergueu a mão e negou com a cabeça sem olhar quem era.

 

— Não, está tudo bem, eu só preciso ligar para minha esposa — disse enquanto retirava o celular do bolso, a mão trêmula o fez derrubar o aparelho no chão ao tentar desbloquear a tela. — Porra!

 

— Não se preocupe, eu vou te ajudar. — A pessoa ao lado insistiu. Antes que pudesse recusar novamente, sentiu o próprio corpo ser estabilizado pelo outro. — Vai ficar tudo bem. — A voz tentou tranquilizá-lo.

 

Abriu a boca para protestar, mas apenas um resmungo incoerente saiu por seus lábios. Sentia os pés se arrastando pela calçada, os olhos pesavam mais e mais a cada segundo. Queria gritar e se afastar daquela pessoa o mais rápido possível. Ele não sabia exatamente qual detalhe o alertou primeiro, mas dentro de si uma voz assustadora dizia que nada ficaria bem.

 

***

 

Segurou um bocejo ao passar pela porta, pois não queria passar a imagem de alguém que não leva o trabalho a sério. As ligações que havia ignorado naquela manhã já não diziam coisas boas sobre sua profissionalidade, menos ainda o atraso de duas horas; não precisava acrescentar preguiçoso à lista. Com a garrafa térmica, escondeu o segundo bocejo e aproveitou para dar um gole no café que aquecia sua mão.

 

— Bom dia — disse algumas vezes ao passar pelos colegas, até chegar em sua mesa e se deparar com uma pasta bege. Suspirou e se deixou cair sobre a cadeira, uma má ideia visto que deslizou para trás com força e acertou alguém que passava por ali no momento. — Desculpe — pediu e se puxou para frente segurando na mesa.

 

Colocou a garrafa ao lado do teclado, onde o porta copos ficava para que a madeira não fosse danificada pela temperatura, e pegou o arquivo com as duas mãos. Abriu-o e leu com cuidado cada informação.

 

Smith Andrew.

 

Homem americano. Branco. Loiro. Um metro e setenta. Vinte e oito anos. 

 

Encontrado morto nesta manhã, em um beco. 

 

Causa da morte ainda desconhecida.

 

Correu os olhos pelo relatório da cena encontrada, porcamente detalhado e decidiu pular a parte escrita para as fotos. Franziu o cenho, pegou a garrafa térmica, deu um gole no café e colocou o objeto no lugar. Se levantou e foi até a única sala do andar, onde seu superior resolvia as burocracias do departamento. Bateu três vezes e esperou a permissão para entrar.

 

 — Iida, finalmente resolveu criar vergonha na cara e aparecer para trabalhar. — O homem atrás da mesa disse ao vê-lo atravessar a porta. — Onde esteve a manhã toda, quando precisamos de você?

 

— Bom, senhor... — Umedeceu os lábios com a ponta da língua, os olhos turquesa o encararam com repreensão. — O relatório desse caso não está muito claro — respondeu por fim, erguendo a pasta na direção de Endeavor, como era conhecido. — E as fotos...

 

— Se estivesse aqui quando solicitado, não teria que ler as merdas o Shoda escreve. Pergunte para ele sobre isso e saia da minha sala — retrucou impedindo o mais jovem de continuar a falar.

 

Sem dizer mais nada, Iida deixou a sala e foi atrás do colega responsável pelo relatório. Nirengeki Shoda era um dos responsáveis pelas investigações de homicídio, como ele, no entanto era quase inútil, pois não conseguia olhar para a maioria das cenas sem se sentir enjoado. Não era à toa que casos como aquele geralmente ficavam sob sua responsabilidade.

 

— Shoda! — chamou o colega assim que o avistou saindo da cozinha. — Sobre o caso do homem encontrado nesta manhã…

 

— Insano, não é mesmo? — O homem de cabelos platinados respondeu. — Quando cheguei na cena não sabia se vomitava ou... — Tenya arrumou os óculos sobre o nariz e ergueu a mão, interrompendo o colega.

 

— Preciso que me diga exatamente como estava o local assim que chegou. — Shoda abriu a boca para dizer que estava tudo no relatório, mas foi interrompido novamente. — Com detalhes.

 

¨¨¨

 

Andrew era um jovem jornalista norte americano que visitou o Japão pela primeira vez aos vinte anos, quando precisou cobrir um evento esportivo que acontecia no país. Nesse mesmo ano ele conheceu Reiko, uma jovem estudante universitária, e que seria sua esposa depois de dois anos de namoro. Cinco anos após o casório, Andrew foi encontrado morto em um beco ao lado de uma loja de aparelhos eletrônicos. 

 

O funcionário encarregado por abrir a loja naquela manhã esqueceu a chave em casa, mas ao invés de voltar para casa resolveu dar a volta pelo beco e entrar pelos fundos, onde havia uma chave reserva escondida. Koda Koji nunca imaginou que em algum dia em sua vida ligaria para polícia denunciando um homicídio. Menos ainda um daquele tipo.

 

Andrew, o jovem jornalista esportivo, foi encontrado morto em um beco ao lado de uma loja de aparelhos eletrônicos. Deitado no chão como se estivesse em um caixão, com as duas mãos sobre o peito e um manto de flores vermelhas o cobrindo da cintura para baixo. No entanto, o mais chocante eram as flores brancas que cobriam sua face, como um grande buquê que usava a boca do homem como vaso.

 

¨¨¨

 

O laudo definitivo da perícia ainda demoraria duas horas para ser entregue, foi a mensagem que leu antes de entrar no bar. Guardou o celular no bolso da calça e se dirigiu até o balcão, onde um rapaz baixo e de cabelo escuro limpava alguns copos. O jovem abriu a boca, provavelmente para dizer que abriram em meia hora, mas se calou quando Iida mostrou sua identificação de investigador criminal.

 

— Sinto muito por estar atrapalhando seu horário de trabalho, senhor — olhou o crachá no peito do funcionário — Mineta, mas preciso fazer algumas perguntas sobre a noite passada. — O rapaz concordou com a cabeça. — Você esteve aqui entre as dez e meia-noite?

 

— Sim, geralmente não pego o último horário de expediente, mas um amigo pediu para cobrir ele — respondeu. — Por quê? Aconteceu alguma coisa?

 

— Na realidade, sim. — Sentou-se, tirou o celular do bolso novamente e o empurrou pelo balcão até o funcionário, que pegou o objeto com uma das sobrancelhas erguidas. — Hoje pela manhã este homem foi encontrado morto, três quarteirões abaixo. A esposa dele comentou para um de meus colegas, que ele costumava frequentar esse bar — explicou. — Por acaso se lembra de tê-lo visto ontem?

 

Mineta olhou para a foto que aparecia na tela do celular e em seguida entregou de volta para o policial.

 

— Sim, tive que acordá-lo, pois estava babando sobre o balcão e eu precisava organizar tudo antes de fechar — respondeu se apoiando na bancada de madeira. — Ele chegou aqui por volta das sete e meia, eu tinha acabado de começar meu turno — explicou —, e pediu uma garrafa de whiskey e um copo. Ficou a noite inteira sentado aí, onde o senhor está.

 

— Viu se ele conversou com alguém? — O rapaz entortou as pontas dos lábios para baixo e negou com a cabeça enquanto levantava os ombros.

 

— Eu atendo as mesas também, então não saberia dizer, mas ele foi o único que ficou no balcão ontem. — Iida passou a língua pelos dentes e olhou em volta, procurando algo. — Não temos sistema de vigilância interno. — Mineta falou antes que Tenya pudesse terminar a varredura.

 

— Certo, muito obrigado. — Levantou-se pegando a carteira no bolso de trás da calça, abriu-a e tirou um cartão de dentro dela. — Me ligue se lembrar de mais alguma coisa, qualquer coisa. — O jovem pegou o pedaço de papel e balançou a cabeça. — Tenha um bom dia.

 

Iida saiu do bar e ficou parado em frente a porta, olhou cada prédio em volta. A maioria das construção daquela rua eram antigas e não tinham sistema de vigilância. Andrew e a esposa moravam cinco quarteirões abaixo, o homem voltava para casa a pé para poder diminuir os sinais do embriagamento e acabou se deparando com seu assassino. Um conhecido que ofereceu abrigo? O laudo preliminar não indicava sinais de luta, o que poderia dizer que a pessoa que matou o Sr. Smith era alguém que o conhecia. Ou alguém que não aparentava ser uma ameaça.

 

Tenya tirou os óculos de grau, esfregou o rosto e soltou um bocejo longo. Não haviam imagens gravadas que pudessem ajudar nas investigações, nenhuma testemunha aparente ou possíveis suspeitos. Apenas um homem morto que não veria o filho nascer, uma esposa arrasada, um jovem traumatizado e um beco sem nada a oferecer.

 

Ele precisava de um café.

 

¨¨¨

 

— Eai, Iida, como estão as coisas com seu irmão? — O homem loiro perguntou no instante em que ele entrou naquela sala fria e mórbida.

 

— Bem — respondeu. — Como está nosso homem? — perguntou sem dar oportunidade do assunto se prolongar.

 

O legista responsável, Kaminari Denki, seguiu até uma das gavetas e a puxou, revelando o corpo pálido e rígido de Smith. Iida mordeu o interior das bochechas com força, impedindo que a imagem do homem loiro fosse substituída por a de outra pessoa. Os olhos estavam fechados, fundos e escuros como se o estrangeiro estivesse finalmente dormindo após semanas de insônia. O restante do corpo estava coberto por um lençol branco, mas Kamino retirou o pano de cima revelando o peito com um Y costurado.

 

— Smith Andrew, vinte e oito anos, estrangeiro e blá blá blá, você já conhece o cara. — Denki falou puxando a ficha do falecido. — Vamos ao que interessa, Smith faleceu por volta das duas horas da manhã e sofreu uma traqueostomia amadora ainda vivo. — Apontou para a pequena cicatriz que havia no pescoço do homem.

 

— Foi o que o matou? — questionou, Kaminari riu e negou com a cabeça, caminhou até uma das macas de metais onde estavam alguns sacos transparentes.

 

— Não, essa abertura foi usada pra isso aqui. — O legista indicou dois sacos que continham várias pétalas brancas e galhos. — A pessoa que o matou não só cobriu ele com flores e usou sua cabeça como vaso, como recheou os pulmões do cara com isso.

 

Iida franziu o cenho. — Foi a causa da morte?

 

— Também não, mas com certeza deixou o processo mais doloroso. — Denki respondeu e entregou alguns papéis para Tenya, que apenas folheou. — Morte súbita por envenenamento, mas pouco antes de falecer por causa do veneno, passou por esse… Procedimento.

 

— Que tipo de veneno?

 

— Os testes revelaram a presença de duas toxinas, oleandrina e neriina, no organismo do Sr. Smith. São duas substâncias que causam envenenamento e podem matar uma pessoa em questão de horas. — Kaminari explicou e, sem tirar as folhas da mão do colega, indicou outros resultados do laudo. — Os sintomas incluem taquicardia, vertigem, sonolência, náusea, coma e, por fim, morte.

 

— E onde podemos encontrar essas substâncias? Alguma droga nova?

 

— É aí que as coisas as coisas ficam mais interessantes. — Kaminari sorriu. Tenya puxou o nó da gravata que usava, desconfortável com a animação do legista. — Eu fiz umas pesquisas e essas toxinas podem ser encontradas em uma planta chamada Nerium oleander, conhecida como Oleandro e é altamente venenosa, mas comumente usada como adorno doméstico.

 

— Mais flores? — Iida perguntou de maneira retórica. Tinha que concordar, aquilo era interessante. — Algo mais a acrescentar?

 

— Sim, está vendo essas marcas aqui? — Denki falou mostrando a parte de trás dos sapatos sociais, onde riscos acinzentados destoavam do preto impecável do restante do calçado. — Isso significa que ele foi arrastado até o beco, mas… — Dessa vez pegou a calça e a esticou sobre a mesa de metal. — Essas manchas no tecido indicam que ele entrou em contato com terra.

 

— Então alguém encontrou o Sr. Smith na rua, bêbado, por volta de meia-noite. Levou-o até um local com terra, o envenenou e encheu seus pulmões de flores; depois o trouxe de volta, já morto, e criou toda aquela cena no beco? — ponderou segurando o próprio queixo, Kaminare deu de ombros.

 

— Ou o envenenou primeiro. — O legista sugeriu.

 

Tenya olhou para o amigo e considerou a ideia. Um crime premeditado, com uma execução incomum e sofisticada, exibida em lugar público. O investigador conteve um suspiro, se o que estivesse pensando fosse correto a morte de Smith Andrew não seria a última.

 

Merda.

 

***

 

Itou Atsushi estava feliz, na realidade estava mais que feliz. Todo seu corpo parecia flutuar e seus lábios não paravam de sorrir, o homem que o carregava era forte e brilhava em vários tons diferentes. Rosa, verde, laranja, amarelo, azul e roxo. Era como ver fogos de artifício.

 

— Você é um caleidoscópio muito bonito, Jun — falou fascinado. Jun sorriu e o branco de seus dentes iluminaram o rosto de Atsushi.

 

— O que tinha na sua bebida, cara? — Jun perguntou enquanto carregava o amigo para fora da balada. — Eu vou chamar um táxi e vamos pra minha casa, sua mãe me mata se te ver assim — falou tirando o celular do bolso.

 

— Jun — chamou o rapaz com a voz manhosa. — Eu não consigo mais olhar pra você, dói. — Atsushi colocou uma das mãos sobre o olhos, o amigo riu novamente. — E eu preciso de água, minha garganta tá seca. Quero ir pra casa.

 

— Você parece uma criança. Fique aqui, que estou sem sinal. — Jun ajudou o amigo a se sentar na calçada e se afastou um pouco.

 

Olhando para a tela do celular, Yamamoto Jun foi se afastando de Atsushi que não parava de resmungar. Jun respondia com monossílabas, concentrado nas quatro barras que indicavam a presença de sinal. Quando finalmente o símbolo dos dados móveis apareceu, o homem sorriu e abriu o aplicativo. Preencheu os campos de informação, indicando onde estavam e qual era o destino; pagaria em cartão, depois Atsushi poderia transferir metade do valor.

 

— O carro chega em cinco minutos, Tsu — disse informando o amigo, sem notar o silêncio presente há um tempo. Virou-se para onde havia deixado o rapaz e encontrou o vazio. — Atsushi?

 

***

 

O primeiro toque soou abafado, como se estivesse dentro de uma garrafa fechada. O segundo fez Iida franzir as sobrancelhas e gemer. No terceiro ele se levantou, sentando-se no sofá e esfregou as mãos sobre a face, procurou os óculos sobre a mesa de centro e os encontrou sobre uma pilha de papéis. Contas que nunca paravam de chegar. 

 

Água. Luz. Internet. Todo mês.

 

Hospital.

 

Soltou outro gemido quando o celular voltou a tocar, ficou de pé e foi até seu quarto, no caminho tropeçou em uma garrafa de saque pela metade e praguejou quando o líquido caiu sobre o piso de madeira. Merda. Sem querer pensar sobre isso, chegou onde o aparelho estava, dentro da calça jogada na cama. Olhou para a tela. Cinco da manhã. Suspirou e atendeu a ligação.

 

¨¨¨

 

Iida chegou na cena do crime quinze minutos depois. Uma senhora ligou para a polícia, dizendo ter encontrado um corpo na viela próxima onde morava quando saiu para caminhar. Um de seus colegas ouvia o testemunho dela, anotando todas as informações pertinentes. Curiosos e jornalistas começavam a se aglomerar atrás das fitas de contenção, Tenya passou por em silêncio e se aproximou do corpo.

Um homem. Loiro. Ao seu lado, alguém disse: Itou Atsushi, completou vinte anos na noite passada. Estava em uma boate junto com um amigo, que já estava na delegacia reportando o desaparecimento quando receberam a ligação.

 

— Ele estava sentado, escorado no poste quando a Sra. Shuzenji o encontrou. Ela achou que era algum bêbado e se aproximou para acordá-lo, mas quando notou que estava morto se desequilibrou e acabou acertando a perna do falecido, fazendo-o cair desse jeito.

 

Atsushi estava caído para a direita, rígido e pálido. As mãos do garoto estavam atadas por uma fita vermelha, segurando um buquê de flores pequenas, azuis e brancas. Da boca flores maiores e vermelhas. Iida vestiu as luvas de silicone que foram oferecidas, agachou na frente do corpo e tocou o queixo do rapaz, erguendo a cabeça para conseguir enxergar o pescoço. Lá estava, um pequeno corte aberto e avermelhado.

 

— Droga… — murmurou. Balançou a cabeça e se moveu para as pernas. Calça jeans e tênis preto. Calça suja de terra, tênis ralado no calcanhar.

 

Tenya se levantou, tirou as luvas e se virou para o policial. — Acharam mais alguma coisa?

 

— Na verdade sim. — O agente respondeu entregando um saco transparente para colega. — Parece ser algum tipo de cartão.

 

Iida olhou o pedaço de papel rasgado. Havia riscos vermelhos que pareciam formar um padrão curvo, abaixo duas coisas estavam escritas em uma fonte da mesma cor. 

 

Ultura. 998.

 

Bom, já era alguma coisa.

 

¨¨¨

 

Kaminari já sabia quais testes fazer e o que iria encontrar no novo corpo, por isso garantiu que seria mais rápido dessa vez. Claro que Tenya também sabia que o homem fora envenenado e que seus pulmões estavam cheios de flores, mas era procedimento padrão e não poderia agir com base em achismo. Logo, enquanto o laudo da perícia não saia, foi atrás de mais pistas.

 

Uraraka recolheu o depoimento do amigo da vítima enquanto Iida estava no local do crime, o que facilitou sua vida, pois já sabia onde ir no momento em que entrou no carro ao sair da cena. Geralmente boates só abrem de noite, mas com certeza alguem funcionário estaria lá para atendê-lo.

 

Chegou no local as sete da manhã, com um copo de isopor em mãos. Precisou parar para comprar um café, nunca culpe um homem por atender às suas necessidades. Bateu na porta de ferro com força e esperou. Bateu novamente e só parou quando alguém apareceu.

 

— Estamos fechados. — O homem disse ao abrir a porta. Ele era alto e igualmente grande em músculos, os cabelos eram prateados e os caninos de baixo ressaltados. Iida ergueu sua identificação.

 

— Preciso falar com o responsável. — O segurança o olhou de cima a baixo, coçou a nuca e deu passagem.

 

Tenya seguiu o homem pelo espaço. O lugar era amplo e escuro, havia um bar nos fundos e as únicas mesas se encontravam nos mezaninos. Dois funcionários faziam a limpeza do chão.

 

— Estava trabalho na noite passada, Sr.?

 

— Kan, Kan Sekijiro. Mas pode me chamar de Vlad. — Kan respondeu e abriu uma porta que ficava atrás do bar, dando acesso a escadas estreitas. Os dois subiram. — E não, eu só cuido do local durante o dia. É mais fácil e eu tenho tempo de ficar com minha filha.

 

Iida balançou a cabeça e parou quando o outro fez o mesmo. Vlad bateu na porta que havia no final da escada e esperou até receber permissão para entrar.

 

— Ora, ora, o que temos aqui, Vlad? — Uma mulher perguntou ao olhar para os dois, um sorriso fino e malicioso se estendeu pela face jovem. Tenya pigarreou e se aproximou mostrando sua identificação.

 

— Iida Tenya, investigador criminal. — Com a informação, a mulher ajeitou a postura e mexeu nos óculos vermelhos.

 

 — Kayama Nemuri, dona do estabelecimento. — Ela informou de volta e indicou a cadeira a frente. — Em que posso ajudar?

 

— Hoje pela manhã um corpo foi encontrado morto e o último local em que a vítima esteve, foi em sua boate — respondeu. — Então, se possível, gostaria de olhar as gravações câmeras de vigilância, internas e externas.

 

Nemuri assentiu e virou a tela do computador na direção do investigador.

 

¨¨¨

 

Iida não poderia mentir, estava frustrado quando finalmente entrou na delegacia. As gravações não foram de muito ajuda, conseguiu identificar o horário em que a vítima e o amigo chegaram e o momento em que saíram da boate. Viu Atsushi sentado na calçada e quando o outro rapaz se afastou; pouco tempo depois, Atsushi se levantou cambaleante e desapareceu.

 

Dentro da boate as imagens foram menos esclarecedoras, o mar de pessoas que se esbarravam constantemente torna impossível identificar se alguém havia colocado algo na bebida do rapaz. Era sua teoria, afinal. Andrew ficou sozinho e como copo desprotegido durante muito tempo, Atsushi estava em uma balada onde qualquer pessoa ali tinha oportunidade de alterar sua bebida e passar despercebido.

 

A única pista que tinha era aquele pedaço de papel rasgado, que poderia ser de qualquer lugar. Ultura, 998.

 

Sentou-se na cadeira e jogou a cabeça para trás, ela latejava com força. O que ele não daria por uma aspirina e um copo de café? Grunhiu. Ajeitou a postura e ligou o computador, tinha que descobrir de onde era aquele cartão. Mesmo que não fizesse a mínima por onde começar.

 

— Ei, Iida. — Uraraka o chamou. — Kaminari acabou de ligar sobre o seu caso.

 

Tenya agradeceu e se levantou. O cartão poderia esperar.

 

¨¨¨

 

Brugmansia suaveolens.

 

— Saúde. — Kaminari revirou os olhos e balançou a cabeça.

 

— Não, a planta do envenenamento mudou. Dessa vez foi a Brugmansia suaveolens, ou Trombeta-de-Anjo. — Ele explicou. — Não é nativa, mas é possível encontrar no país. Ela pode ser usada para fins fitoterápicos, pois tem propriedades anticolinérgicas, mas é mais popular por seus efeitos alucinógenos. Porém, é altamente tóxica também.

 

— Isso não muda o modus operandi do assassino e nem serve como pista. — Tenya falou ainda mais frustrado. Saber o nome das plantas não fazia diferença alguma.

 

— Mas isso pode servir. — O legista indicou a mesa de evidências e com uma pinça mostrou uma casca preta. Iida o olhou esperando uma explicação. — Isso é tinta de carro, significa que o assassino usa um para locomover as vítimas. Ou assassina, não sabemos, pode ser uma garota bem forte e…

 

— Isso pode dizer o modelo do carro? — Iida o interrompeu.

 

— Não sozinho, mas veja o contexto. — Denki apontou para a calça. — Ambas as calças possuem marcas de terra. Listras, para ser mais exato, e não o suficiente para sujar toda a roupa.

 

— E isso pode indicar que as vítimas estiveram em um lugar sujo de terra e não sobre ela exatamente, como um carro. — Kaminari concordou com a cabeça. — A pessoa que cometeu os crimes entende bastante sobre flores…

 

— Provavelmente trabalha com elas e usa uma caminhonete.

 

— Preciso ir — disse antes de sair correndo.

 

— De nada! — Kaminari gritou. — Esses investigadores, não são nada sem a gente, não é meu chapa? — Olhou para o corpo coberto com um lençol que estava ao seu lado. — Você é um homem de poucas palavras, não é mesmo?

 

¨¨¨

 

Tenya olhou para a foto do pedaço do cartão e depois para a placa grande na fachada da loja. Katsu’s Floricultura, 3998. Sorriu, guardou o aparelho no bolso e atravessou a rua até o estabelecimento. Quando abriu a porta, uma sineta alertou sua chegada e um rapaz apareceu entre as inúmeras estantes de metal cheias de flores.

 

— Em que posso ajudar? — O homem que apareceu perguntou. Ele alto, porém menor que Iida. Cabelos loiros e espetados, olhos vermelhos e um sorriso gentil. — Procurando algo especial para uma mulher especial? Ou homem, quem sabe…

 

— Iida Tenya, investigador criminal. — Se apresentou antes que o outro continuasse a falar. — Você é o dono dessa loja?

 

— Sim, sou Bakugou Katsuki. — Ele estendeu a mão e olhou para Iida com preocupação. — Aconteceu alguma coisa? Alguém da minha família se machucou?

 

— Preciso que responda algumas perguntas, senhor Bakugou. — O loiro concordou com a cabeça. — Onde o senhor esteve na noite passada? 

 

— Na casa de uma amiga, passei a noite lá. 

 

— E entre na madrugada do dia seis? — Bukugou franziu o cenho e foi até o balcão de atendimento, onde pegou um telefone celular.

 

— Certo, nesse dia eu tava com um amigo no hospital. — Ele respondeu mostrando as mensagens de agradecimento do tal amigo. — Desculpe, estou sendo acusado de alguma coisa?

 

— Não, mas um pedaço do cartão da sua loja foi encontrada em uma cena de crime. 

 

— Furto?

 

— Homicídio — corrigiu. — Se lembra de ter vendido algumas dessas flores nas últimas semanas? — perguntou mostrando o celular com as fotos para o vendedor.

 

— Não, só vendi flores de boa fortuna e arranjos para velório. — Ele respondeu devolvendo o celular. — Essas são flores de declaração.

 

 — Como assim? — Iida olhou para o mais baixo com confusão, que o olhou de volta da mesma forma até mudar a expressão para uma de compreensão.

 

— Muitas pessoas não sabem, mas as flores podem ser usadas para transmitir uma mensagem. Cada uma tem um significado e o arranjo delas pode até mesmo criar uma história. — O rapaz explicou. — Aquela última, por exemplo, a violeta branca, ela significa lealdade ou uma promessa sendo feita. Se estivesse junto com uma rosa vermelha, passaria a mensagem de uma pessoa que é leal a pessoa amada e que pretende ficar com ela por muito tempo.

 

Iida encarou o celular. — Se importa de me acompanhar até a delegacia?

 

¨¨¨

 

Crisântemos vermelhos, significam paixão ou alguém apaixonado. Gerânios falam sobre sentimento. Lírios representam uma alma pura e Gipsofilas remetem delicadeza. A Rosa branca falar sobre um amor espiritual e a Dália significa reconhecimento. Juntas, contam sobre uma pessoa apaixonada por alguém considerado puro; um deslumbramento pela delicadeza e pela alma desse alguém.

 

Miosótis também são conhecidas como Não-me-esqueças, são pequenas flores azuis que significam amor sincero e fidelidade. A Violeta branca significa uma promessa sendo feita, enquanto a Flor-de-Lis, vermelha e imponente, fala sobre amor. Em um arranjo, elas podem dizer que a pessoa promete fidelidade e amor.

 

— Mas o interessante sobre a Flor-de-Lis, é que ela também fala sobre passar uma mensagem. — Bakugou explicou. — Então, a pessoa que fez essa união está querendo passar uma mensagem pra alguém.

 

— Ela está apaixonada e usando as vítimas como uma forma de se declarar. — Iida falou, Katsuki concordou com a cabeça.

 

— Quem faria uma coisa dessas? — O floricultor perguntou cruzando os braços e mordendo os lábios preocupado.

 

— Acho que devemos nos perguntar por quem essa pessoa está fazendo isso…

 

***

 

Ninguém acreditava quando dizia que tinha superpoderes, mas era em momentos como aquele que tinha certeza que era especial de verdade. Sua mãe sempre lhe dizia isso, desde criança e ali estava a prova. Tinha superpoderes. Era invisível. Por onde passava, as pessoas ignoravam sua existência. Ninguém olhava em seus olhos, ninguém sabia seu nome.

 

Menos ele.

 

Aquele homem foi o primeiro que enxergou sua existência. Ele era alto e brilhava como mil sóis e tinha o sorriso mais acolhedor. Um sorriso que dizia que tudo ficaria bem. Seus olhos eram bondosos e havia quebrado a barreira da invisibilidade. Diante dele, era outra pessoa.

 

A não ser quando era quem era. A não ser quando queria ser invisível.

 

Olhava aquele homem de longe, o cabelo claro entre tantas pessoas. Inconfundível. Teria cheiro de quê? Nenúfar, provavelmente, pois seu coração era puro.

 

Ou talvez lírio, girassol, rosa, violeta, madressilva, amarílis, palma, dálias, dermatite, cravo, tulipa.

 

— Preste atenção — disse. 

 

Olhou em volta e não o viu. Havia perdido ele de vista novamente, pois estava pensando naquelas flores estúpidas.

 

— Calma — falou.

 

Respirou fundo e voltou a olhar as pessoas a sua volta. Estava invisível ainda. Avistou alguns cabelos claros, mas nenhum era o dele.

 

— Ali — alertou. — Mas não é ele — respondeu. — Não importa, esse serve.

 

***

 

Tanaka Yoshiro, trinta anos, foi a terceira vítima. Diferente dos demais, ele foi encontrado dentro do próprio restaurante, na cozinha. Seu corpo estava no chão e o buquê de flores na boca, nenhuma outra planta em volta.

 

— Sabem o que dizem, o terceiro sempre deixa mais pistas. — Uma colega policial falou atrás de Iida, quando este estava ajoelhado de frente ao corpo. — Ou some com elas. Acho que ele está evoluindo.

 

— Não, isso foi feito de última hora — respondeu. — Ele levou a vítima até o local de sempre, fez o que sempre faz e depois o trouxe de volta, arrastando pela entrada dos fundos. — Mostrou as marcas nos sapatos e na calça. — Limpou o chão e estava quase saindo, mas não achou que a mensagem estava boa o suficiente e resolveu ir além.

 

— O que acha que ele quis dizer com isso? — A mulher perguntou com uma das sobrancelhas erguidas.

 

— Não tenho certeza, mas conheço alguém que pode ajudar.

 

¨¨¨

 

Iida encostou o carro de frente para a floricultura, atrás de um carro verde com a pintura gasta. Desceu e foi direto para a loja, ignorou a sineta e chamou por Bakugou, que saiu de uma porta atrás do balcão, acompanhado por outro homem. Este era menor que o loiro, mas tinha o corpo mais largo, tinha cabelos escuros e olhos verdes, o rosto cheio de sardas.

 

— Acabaram de falar no jornal da manhã, mais um homem foi encontrado morto e com flores na boca. — Katsuki alertou assim que o viu.

 

— Já estão falando disso nos jornais? Pensei que ia conseguir segurar a informação por mais algumas semanas. — Tenya suspirou.

 

— As pessoas estão ficando loucas com esse caso, já até deram um nome pro assassino: Hanahaki Satsujin. — O rapaz de olhos verdes falou. Iida olhou para ele com as sobrancelhas franzidas. 

 

— Desculpe, o intrometido aqui se Midoriya Izuku, um amigo que veio fazer uma visita. E aparentemente não sabe reconhecer situações delicadas. — Bakugou os apresentou, mas aproveitou para cutucar o amigo com o cotovelo.

 

— Iida Tenya — falou de volta, aceitou a mão que lhe foi estendida e continuou: — O que isso significa, Hanahaki Satsujin?

 

— É um nome baseado em uma doença onde a pessoa cospe flores. — Midoriya explicou, mas nenhum dos dois pareceu entender. 

 

— Nunca ouvi falar dessa doença. — O investigador falou, o outro moreno riu.

 

— É porque ela não existe, é uma doença fictícia onde uma pessoa que sofre com amor não correspondido pode chegar a tossir ramos de flores inteiras. — Ele continuou a explicação. — A pessoa só se livra disso se for correspondida… Ou morrer.

 

— Certo… — Tirou os olhos do rapaz e encarou Katsuki. — Preciso da sua ajuda.

 

— Eu vou deixar vocês lidarem com isso. — Izuku falou. — Kacchan, foi muito bom te ver e não se esquece que vamos jantar semana que vem.

 

O loiro assentiu, se despediu do amigo e esperou até ele estar fora da loja para dizer:

 

— Aceita um chá?

 

¨¨¨

 

— Clematites, Palmas, Amarílis e Dálias, novamente. Todas com o mesmo padrão de cores, avermelhadas e brancas. — Katsuki disse olhando para as fotos das flores.

 

— O que elas significam?

 

— Beleza espiritual, devoção, sabedoria e reconhecimento. Respectivamente. — O floricultor respondeu. — Talvez ele esteja querendo repetir a primeira mensagem, mas com mais intensidade.

 

— Ou talvez… — Tenya parou pra pensar. — Talvez ele queria dizer que é o único capaz de enxergar a beleza dessa pessoa e é devoto a ela.

 

— Por que acha isso? — Katsuki tomou um gole do chá e ergueu uma das sobrancelhas.

 

— Porque ele levou os olhos da vítima.

 

***

 

— Não se preocupe, vai ficar tudo bem. Você vai ficar lindo, eu escolhi essas flores pra uma pessoa muito especial e você precisa entregar elas pra mim.

 

— Ei, ei, ei. Pare de se debater, vai estragar o arranjo! Isso me deu muito trabalho, então valorize… 

 

— Ah, perdão, eu esqueci que te dei Noz-vomica. É que o último foi teixo, então ele se comportou tão bem…

 

— Pronto, eu disse que você ficaria lindo. Agora, por favor, entregue essa mensagem… E diga que será a última.

 

***

 

"Me promete que vai cuidar dela?"

 

"Pare de falar essas coisas…"

 

"É sério, Tenya, se algo acontecer eu preciso saber que você não a deixará sozinha"

 

"Nada vai acontecer, você vai ficar bem"

 

"Você não tem como saber. Então me promete... Iida…"

 

Iida.

 

— Iida! Acorde! — Tenya abriu os olhos assustado, olhou para o lado e viu Uraraka batendo no vidro do carro. — Você passou a noite aqui? — A voz abafada indagou.

 

Sem responder, o homem destracou a porta e desceu do veículo. Havia dormido no carro, no estacionamento da delegacia, pois resolveu analisar novamente todas as informações que tinham sobre os casos do Assassino Hanahaki. As vítimas não se conheciam, mas todos eram homens loiros na faixa dos vintes. Não frequentavam os mesmo ambientes, então não fazia ideia de onde eles as conhecia.

 

— O que houve? — perguntou aceitando o copo de isopor que lhe era oferecido.

 

— Achamos o quarto.

 

¨¨¨

 

Monoma Neito era um ilusionista que começaria a trabalhar em uma casa de shows, próxima ao centro da cidade. Ele tinha vinte e três anos e se preparava para o show de estreia, mas foi encontrado sem vida no palco do local. Deitado sobre uma cama de Cactos e segurando uma Rosa cor de rosa; de sua boca saiam flores vermelhas e brancas, e seu peito oco deixava claro o que o assassino havia levado dessa vez.

 

¨¨¨

 

Tentar pegar a pessoa que fazia isso, era como tentar pegar fumaça. Ninguém o via entrar ou sair, ninguém estava por perto quando arrastava um corpo para o local da exibição. Sem câmeras, fotos ou qualquer testemunha. Suspirou. Tenya já havia lidado com inúmeros casos estranhos de homicídio. Mas aquele era o primeiro serial killer que tentava capturar.

 

— Alô? — perguntou ao finalmente atender o celular, estava vibrando em seu bolso há cinco minutos.

 

Eu preciso que você venha aqui, encontrei algo interessante. — A voz de Kaminari soou do outro lado da linha.

 

— Estou a caminho.

 

¨¨¨

 

— Bom, com o buraco que ele tinha no peito, fica meio óbvio dizer que ele estava sem o coração. — Denki falou apontando para o lugar em questão no corpo da vítima. — Mas, eu fui conferir como foi feita a remoção, apesar de já saber que não é alguém com conhecimento cirúrgico, pois todos os ferimentos causados até agora pareciam ser feitos por um babuíno….

 

— Kaminari, direto ao ponto. — Tenya pediu.

 

— Certo. — Estalou o dedo e apontou para o investigador, então se virou e foi para a mesa de evidências. — Além de encontrar cortes que parecem ter sido feitos por uma tesoura de jardim e um pé de cabra, também encontrei terra e… Isso. — Entregou um pedaço de papel sujo de sangue para o moreno.

 

— "Aceita?"— Leu o que estava escrito no papel. 

 

— Esse é um novo jeito de dizer "be my valentine". — Kaminari brincou, mas recebeu um olhar reprovador do colega. — Ah, e isso estava no bolso do calça.

 

Iida pegou o outro papel entregue.

 

Katsu's Floricultura.

 

¨¨¨

 

Bakugou Katsuki era um homem interessante, as pessoas diziam que tinha um coração de ouro e que só precisava aprender a controlar sua boca, pois muitas vezes se esquecia de pensar antes de falar. Tenya havia passado por uma ou outra situação desconfortável com isso, no último mês, pois ao discutir o significado das flores com ele, Katsuki acabava soltando um comentário ou outro que não era muito pertinente.

 

Mas provavelmente era mais uma questão pessoal dele, do que um problema do floricultor. Kaminari fazia os mesmos tipos de comentários e piadas, os dois pareciam lidar com a morte com humor. Iida costumava evitar o assunto, a não ser que fosse questão de trabalho.

 

Olhou para a tela do celular, viu as mensagens que sua mãe havia deixado. Onde está? Ouvi falar do caso, o que está acontecendo? Seu irmão disse para pegar leve no trabalho, não precisa se preocupar. Daremos um jeito, vamos tentar o convênio de seu pai mais uma vez. Suspirou, desligou a tela e entrou na loja.

 

— Onde esteve na noite passada? — perguntou assim que entrou, sua voz demonstrando que apenas questionava aquilo por protocolo.

 

— Conversando com você ao telefone. — Katsuki respondeu sem tirar os olhos do arranjo que montava. — Mais uma exibição, uh?

 

— Vítima, corpo — corrigiu. — Não fale como se fosse uma obra de arte.

 

— Tecnicamente, Ikebana é um tipo de arte. — Ele rebateu, mas Tenya pigarreou o desconforto e o loiro ficou quieto.

 

— O cartão da sua loja estava no bolso da vítima. — Katsuki se virou para ele, limpando as mãos sujas de terra na calça jeans. — De novo.

 

— Deixa eu ver as fotos, talvez eu consiga lembrar se alguém comprou alguma delas recentemente. 

 

Iida entregou o celular nas mãos do rapaz e começou a circular pela floricultura. Já havia estado ali algumas vezes, mas nunca parou para olhar em volta. Haviam muitas flores ali, o que era esperado, e sabia que algumas delas eram cultivadas nos fundos da loja, em uma estufa, cuja existência Katsuki comentou entre uma análise e outra. Foi até o balcão, viu a pilha de cartões que informavam o nome da floricultura, a rua, o número do prédio, telefone para contato e site. Analisou o caixa, o computador e então viu um caderno de capa de couro.

 

— Cactos, Rosa cor de rosa, Antúrio, Hortência branca, Tulipa vermelha e Crisântemos vermelhos e brancos. — A voz de Katsuki soou atrás de si, Tenya virou para o loiro e pegou o celular de volta. — Perseverança, promessa, autoridade, capricho, amor duradouro e paixão sincera. "Meu amor é eterno e não irei desistir até te provar isso".

 

— Não acredito — murmurou soltando o ar pelo nariz como em um riso descrente. Bakugou ergueu as sobrancelhas. — Be my Valentine.

 

— Não estamos em Fevereiro.

 

— Não, esse… Cartão, é isso o que quer dizer. Seja meu. — Iida explicou. — Dessa vez o assassino levou o coração da vítima e deixou um bilhete no lugar. "Aceita?", era o que estava escrito.

 

— Ele está perguntando se a pessoa o ama de volta…

 

— Preciso descobrir quem a quem ele está se dirigindo. — Suspirou. — Não se lembra de ninguém comprando alguma dessas flores?

 

— Não.

 

— Não tem nenhum lugar onde você anote quem comprou o que e quando? — Dessa vez Katsuki foi quem suspirou.

 

— Eu só anoto encomendas feitas pela internet — respondeu.— Ou as flores que estão acabando, porque sei pra qual fornecedor ligar.

 

— Você tem mais de um?

 

— Sim, uma pessoa só não consegue cultivar sozinha tantas flores diferentes, ainda mais em lugares pequenos como os nossos.

 

—… Talvez não seja um cliente — murmurou coçando o queixo. — Posso levar essa sua lista de fornecedores, acredito que possa ajudar no caso.

 

— Claro, fique a vontade. Me ligue se descobrir alguma coisa.



¨¨¨

 

Iida estava há horas na frente do computador, conferindo nome por nome presente na lista. Não havia imaginado que seriam tantos, mas Katsuki estava falando a verdade sobre uma pessoa só não ser capaz de cultivar várias espécies; na realidade, parecia que era impossível cultivar mais de uma ao mesmo tempo.

 

Outro problema era que a maioria dos fornecedores se estavam muito distantes para serem suspeitos. Grunhiu. Entregou os olhos com os dedos e olhou para o próximo nome. Akitani Mikumo. Digitou e esperou a página de busca carregar, clicou no primeiro link que apareceu. Flowerland | As mais variadas flores, para os mais variados corações.

 

Home. Quem somos. Catálogo de flores. Como chegar. Entre em contato.

 

Clicou no segundo link. Esperou.

 

Rolou a página para baixo, até encontrar uma foto onde estavam os funcionários do lugar. Franziu o cenho ao reconhecer uma das pessoas, leu a legenda.

 

Da esquerda para direito: Toshinori Yagi, Sorahiko, Akitani Mikumo, Asui Tsuyu, Midoriya Inko.

 

Abriu uma nova janela. Digitou. Midoriya Izuku. Enter.

 

Acidente de carro deixa um morto e dois feridos.

 

Mas que merda…

 

***

 

Akitani Mikumo era tímido, inseguro e invisível. Midoriya Izuku era extrovertido, amável e todos gostavam dele. Mikumo tinha superpoderes, mas não conseguia curar as pessoas. Izuku morreu e ele não pode fazer nada, nada além de ver seu melhor amigo morrer em seus braços.

 

Mikumo era tímido, mas Izuku não era. Então, toda vez que precisava conversar com alguém, Mikumo deixava de ser quem era e se tornava Izuku. Pois ele tinha superpoderes, era invisível e mudava de forma.

 

Quando conheceu Katsuki, o loiro estava abrindo sua floricultura e entrou em contato com a Flowerland para comprar algumas espécies. Ele quem o atendeu e por telefone tudo era mais fácil. No dia da entrega, entretanto, ao realmente ver o dono da voz, Mikumo sentiu o coração acelerar.

 

— Bakugou Katsuki. — Ele se apresentou. — Desculpa, eu lembro de ter visto as informações no site, mas eu não consigo me lembrar do seu nome

 

— Sem problema, sou Izuku. — Estendeu a mão. — Midoriya Izuku.

 

¨¨¨

 

Katsuki abriu a porta da loja e sorriu para a imagem do amigo. Mikumo sorriu de volta. Izuku. Izuku sorriu de volta. 

 

— Eu só preciso trocar de roupa e então podemos ir. — O loiro falou assim que ele passou pela porta e então desapareceu pela porta que ficava atrás do balcão.

 

Mikumo esperou alguns instantes, saiu novamente e foi até seu carro. Hoje estava com a caminhonete do trabalho, pois tinha um carregamento especial para fazer. Tirou as flores da caçamba e as levou para dentro da loja, trancou a porta.

 

Tulipa, Rosa, Cravo, Flox, Palma e Petúnia, todas vermelhas. Todas demonstrando que seu amor por Katsuki era duradouro, profundo e puro, que eles estavam em harmonia, que era devoto e que estavam unidos por uma força espiritual.

 

E uma única Edelvais, branca e pura, demonstrando o amor deles seria eterno.

 

— Não lembro de ter pedido um carregamento novo. — Katsuki disse ao retornar para a loja.

 

— É apenas um presente — respondeu sorrindo. Mikumo não sorria, mas Izuku tinha um dos sorrisos mais contagiantes e bonitos.

 

Bakugou abriu a boca para falar algo, mas o celular dele começou a tocar. Ele pegou o aparelho e olhou para tela, no mesmo instante suas bochechas coraram.

 

— Quem é? — perguntou, as sobrancelhas franzidas. Izuku não franzia as sobrancelhas, mas Mikumo sim.

 

— Ah, é o Iida. Ele deve tá querendo falar sobre o caso. — Deu de ombros, tentando ser indiferente, mas Mikumo não acreditou.

 

— Você gosta dele?

 

— O quê?! Claro que não, só estou sendo o perito em flores pro caso dele! — Mikumo continuou em silêncio, a vermelhidão no rosto do mais alto aumentando a cada segundo. — Ele é bonito e interessante, mas não é nada disso… Eu juro.

 

— Então vocês não estão saindo?

 

— Não! — Katsuki respondeu prontamente, mas depois seus ombros caíram, ele coçou a nuca e desviou o olhar. — Mas, assim… Depois que tudo isso acabar… Quem sabe…

 

O celular tocou novamente, dessa vez Katsuki fez um sinal com o dedo e atendeu o telefone. Mikumo olhou para a nuca loira, seu corpo ardia como se tivesse consumido Acônito. Seu sangue era veneno e borbulhava em suas veias.

 

— Estou ocupado agora, vou sair com um amigo…

 

Mikumo olhou em volta.

 

— Sim, com ele…

 

Avistou uma fita de arranjo no chão.

 

— Eu não tô entendendo nada do que você está falando, Iida.

 

Mikumo pegou a fita, enrolou nas duas mãos e se aproximou do loiro por trás.

 

— Espera, Izuku é o que? Quem diabos é Akitani?

 

***

 

— Porra, porra, porra! — Iida não parava de repetir, os dedos doíam pela força que usava para segurar no volante. Olhou pelo retrovisor e viu o carro de Uraraka logo atrás.

 

Como pôde ser tão burro? Como pôde deixar passar algo tão básico como uma lista de fornecedores?  Se tivesse tido acesso ao caderno antes, talvez as coisas tivessem sido diferentes. Teria notado algo errado com aquele cara, teria visto que a Flowerland era o único nome na lista que tinha o cultivo de plantas ventosas.

 

Se tivesse sido mais cuidadoso, teria notado que todas as vítimas foram deixadas em um raio de 5km uma da outra, e que no meio do quadrado que formavam estava a Katsu's Floricultura.

 

Se sua mente não estivesse tão cheia com os problemas pessoais, teria imaginado que o cartão de Katsuki estava em todas as cenas porque ele era o alvo. Homem loiro na faixa dos vinte anos.

 

— Atende, atende… — implorou enquanto tentava ligar para o número do rapaz novamente.

 

Quando a ligação caiu na caixa postal pela décima vez, Iida gritou e sócio a buzina. Estava tudo bem, disse para si mesmo. Chegaria a tempo. Katsuki ainda estava vivo.

 

¨¨¨

 

Iida quebrou a porta de vidro da loja, destrancou-a e entrou junto com Uraraka. Ambos com suas armas em mão e prontos para atirar no menor sinal de ameaça. Chamou por Katsuki enquanto a mulher vasculhava entre os corredores de flores da direita, ele foi pela esquerda. 

 

— Katsuki? — Tentou novamente. Sem resposta.

 

Encontrou Ochako no balcão e sinalizou a porta que levava para a sala onde havia tomado chá com Katsuki em uma das vezes em que esteve ali. Sabia que o cômodo também dava acesso aos fundos da loja, onde estava a estufa, e à escada que levava para o pequeno apartamento onde ele vivia.

 

Uraraka encostou na parede de um lado, ele se encostou no outro. Ouviram murmúrios do outro lado. Respirou fundo, tentando acalmar o coração que batia forte em seu peito. Ele está vivo, está tudo bem. Contou com os dedos até três e apontou para Ochako, no sinal a mulher se afastou e arrombou a porta com um chute.

 

— Parado, polícia! — Ela gritou apontando a arma para alguém, adentrou a sala.

 

Iida levou um segundo a mais para segui-la e quando entrou, sentiu o estômago revirar. Mikumo estava sentado no sofá e parecia estar cantando uma canção de ninar para a pessoa deitada em seu colo, enquanto seus dedos percorriam pelos fios loiros. Katsuki estava estirado, as mãos sobre o peito e com um buquê de flores vermelhas saindo de sua boca.

 

— Eu te disse. — Mikumo falou quando Tenya se aproximou dos dois. — Só acaba quando o amor é correspondido ou quando ele morre.

 

— Você vai pagar por isso — disse, a voz trêmula e o maxilar apertado. Mikumo sorriu.

 

— Ele aceitou meus sentimentos, também me amava. — O rapaz continuou, a voz fraca e é mole. — Vamos ficar juntos pra sempre.

 

— Iida, vem ver isso. — Uraraka o chamou, ela estava agachada próxima ao sofá. Tenya olhou para ela e viu para onde apontava, pequenas bolas brancas estavam caídas no chão.

 

— Que merda é aquela? — perguntou se dirigindo a Mikumo. — Que merda é aquela?! — gritou dessa vez, mas o rapaz continuou em silêncio. 

 

Parado, sem se mexer. 

 

Sem piscar. 

 

Apenas sorrindo. 

 

Vamos ficar juntos pra sempre.

 

Estava morto.


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Notas finais do capítulo

Bom, gente, agora que leram vou explicar o que é essa fanfic.

Como o tem Hanahaki foi amplo, acabei usando a doença como uma inspiração para uma série de assassinatos. Confesso que te assistido The Sinner semana passada me inspirou horrores a seguir essa linha de investigação criminal.

Segundo o Google Tradutor, Hanahaki Satsujin seria o tal do Assassino Hanahaki. Se estiver errado, me informem, pfvr.

A fanfic mistura elementos orientais e ocidentais, mais o ocidental que qualquer coisa pq simplesmente me faltou tempo pra pesquisar mais a fundo sobre os significados das flores e como funciona essa parte de investigação no Japão. O plot surgiu ontem, sorry.

O nome do capítulo é de uma flor que não aparece na história, mas ela é considerada como a flor da morte para os japoneses.

No mais, espero que tenham gostado. Beijos.



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