Pride escrita por Aleksia Kyle


Capítulo 1
Capítulo 1 - Pride


Notas iniciais do capítulo

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Pride

by Aleksia Kyle

 

O cheiro da água pútrida se fazia presente ali. O aroma enervante era levado pela brisa congelante da madrugada para áreas bem distantes da poça, que tomava tons rubros.

Além do som da lama sendo remexida por ossos, que tentavam se reerguer, era possível ouvir o clamor e a ira dominando cada pequena singularidade do jovem de olhos amarronzados, que um dia brilharam como a lua cheia que o iluminava. O pânico e a dor transformava cada gotícula de sangue que era drenada de seu corpo pelos ferimentos em força.

A vida para si nunca havia sido fácil. Perdera os pais ainda muito jovem, sendo criado pela avó que tentava de todas as formas o proteger das incongruências do mundo, porém passaram a ser em vão durante sua adolescência. Naquela época, quando todos os amigos estavam dando o primeiro beijo, tendo as primeiras relações sexuais de suas vidas ele estava lá... tentando se entender.

Ele ainda lembra do dia em que seus “amigos” o explicaram como deveria se masturbar e lhe entregaram uma revista; passaram-se dias e dias e ele tentando de todas as formas ter as mesmas sensações que havia escutado deles, mas nada acontecia. “Será se sou normal?” “Talvez eu tenha alguma doença.” Era nisso o que pensava e repensava sempre após um novo insucesso.

Todas às vezes que os caras perguntavam se ele havia conseguido ele dizia que sim. Contava inúmeras vantagens sobre meninas que havia “ficado” e até mesmo “transado”, sempre era da boca para fora. O cara mais esperto e inteligente da escola havia aprendido a mentir, sempre quando se falava de sua sexualidade ou melhor dizendo... de sua masculinidade.

Foi assim que ele, Sasori Akasuna, aprendeu a viver durante dois longos anos... se escondendo e enganando até a si mesmo. A avó zelosa desconfiava das atitudes do neto, mas nunca conseguia fazê-lo se abrir para com ela, porém depois de tantos anos apenas os dois juntos eles foram surpreendidos pela morte inesperada da filha mais nova de Chiyo, e de seu marido. A sim como Sasori, Sakura, a filha deles estava órfã.

A união entre os primos vinha de longas datas, mas com a proximidade e com as perdas tão parecidas ela foi se encaminhando para uma confluência em que um não conseguia viver sem o outro. E foi ela, Sakura, quem conseguiu descortinar a nuvem secreta de Sasori. No início ela não entendia, mas as atitudes dele frente aos amigos e principalmente frente a um em especial a fez o confrontar.

O confronto não foi bem recebido por Sasori. Ele se negava, a acusava das coisas mais vis e inexistentes, mesmo assim ela o afrontava. Certo dia um dos “amigos” presenciou a discussão dos primos que haviam se distanciado, devido a busca pela veracidade das ações de Sasori por Sakura.

Ele ainda lembra das palavras que usou, após ter tentado persuadir o “amigo”.

— Você devia ter morrido com os seus pais!

— Sas...

— Isso mesmo o que ouviu! Era melhor você ter morrido com eles ou apenas você ter morrido naquele acidente.

O tom amargurado do jovem adolescente atingiu Sakura como se fosse mil adagas perfurando sua pele. Daquele dia em diante os primos não se falaram mais, meses depois Sasori saiu de casa a deixando sozinha para com os cuidados da avó. Um ano havia se passado quando não aguentando o clima da cidade pequena que o considerava uma “bixa” ele partiu.

Recomeçar a vida em outra cidade, em outro estado... essa era a perspectiva dele, para a tristeza de Sakura e Chiyo que nunca mais o viram. E ao tentar se reerguer em meio ao alvorecer Sasori lembrou de todas as brigas que teve com a prima, mas além disso... do carinho da mesma, da gargalhada que ela sempre soltava quando ele a enchia de cócegas; das ralhas de Chio em meio a sorrisos tortos ordenando que eles parassem de brincar, pois o almoço estava servido; dos cafunés da avó e do cheiro do bolo de baunilha que a mesma fazia e deixava a casa inteira perfumada.

Foi em meio à essas lembranças que ele conseguiu se levantar. Não só a ira e a dor iam tomando conta de si, mas as memórias mais tenras e doce de uma outra era o ajudaram e o apoiaram, mesmo que cambaleante, rumo a uma finalmente nova vida – a aceitação.

Quase 10 anos haviam se passado desde a última vez que viu as duas mulheres. Ele não sabia como elas estavam, não tinha mantido contato com nenhuma delas. Ele desejava esquecer que aquela época de sua vida havia ocorrido, contrastando com o atual momento... ali ele queria que todos os últimos anos nunca tivessem existido, principalmente o último.

Se escondendo em si próprio ele viveu em relacionamentos fracassados consigo e com mulheres que de nada o agradavam, até o dia que reconheceu um dos caras que considerava seu amigo – Deidara. Ele ainda mantinha os cabelos compridos e loiros como o raiar do Sol. O coração parou por uma fração de segundo quando o visualizou entrando por seu escritório e logo em seguida palpitações ritmadas e intensas foram sentidas, chegou a pensar que estava tendo um taquicardíaco, mas era só a sensatez batendo em seu peitoril.

Deidara havia se tornado em um ativista LGBTQ+ mundialmente conhecido, enquanto Sasori um dos mais prestigiados publicitários de Tokyo. O reencontro ocorreu devido aos preparativos para a Parada do Orgulho, Deidara estava à frente da organização e havia escolhido à dedo a agência do velho amigo que não via desde o colegial.

Ao contrário de Sasori que havia escondido para o mais profundo e inóspito recanto da memória tudo o que se relacionava ao tempo em que vivia em Konoha, Deidara vasculhava cada canto para encontrar o velho amigo. Ele ansiava o encontrar, e pedir desculpas por não ter agido quando os outros humilhavam-no ou de não ter estendido a mão quando o ruivo resolveu sair de casa. Quando descobriu sobre a agência em uma pesquisa na internet soube que era a hora de colocar todos os pingos nos i’s.

— Pensei que nunca mais o encontraria, Sasori – no rosto expressivo e sorridente era possível detectar o quanto estava contente em ver o outro.

— Deidar... – o gaguejar foi recebido com entusiasmo.

— Sakura e eu te procura...

— Você não veio falar sobre ela, Deirada – o corte da fala foi interpretado como uma zona perigosa que deveria ser revisitada com cuidado.

— Certo... então vamos aos negócios!

Daquele dia em diante os dois passaram a se encontrar sempre para o trabalho, as reuniões eram constantes até altas horas da noite e aquela não havia sido diferente. Faltava pouco mais de um mês para o evento, os dois haviam saído após mais uma maratona intensa de reuniões para beberem próximo ao escritório.

Entre idas e vindas do barman com garrafas cheias e vazias de cerveja e algumas inúmeras doses de sake, Deidara resolveu tomar um passo adiante no que vinha pensando desde o dia em que reencontrou Sasori. Em determinado ponto da conversa Deidara avançou em um beijo estalado e receptivo sob Sasori.

— Enlouqueceu, Deidara? – o bar inteiro direcionou os olhares para os dois, devido a forma agressiva que Sasori se levantou da mesa e gritou com o amigo.

— Sasor...

— Eu não sou uma bixa como você!

As palavras jogadas atingiram mais a si do àquele que as recebeu. Completamente transtornado o ruivo se direcionou a rua, não dando tempo para que o amigo conseguisse o alcançar. Sua mente estava o maltratando, ele não conseguia identificar como havia chegado até aquele ponto de sua vida. Ele gostava de mulheres! Nunca se interessou por homens!

Era isso o que ele pensava, a culpa por não ter impedido o beijo a tempo ou de ter afastado Deidara assim que sentiu os lábios dele contra os seus, solicitando passagem para um entrelaçar de línguas o corroía por dentro. Andava sem rumo pelas ruas movimentadas de Tokyo sem saber ao certo o caminho de casa, não ouvindo as buzinas atrás de si e os gritos de “bixa”, “viadinho de merda”, “merece morrer”, “aberração” direcionados a si.

Só se deu conta de tudo ao redor quando parou em um beco sem saída fétido. Ao se virar para retornar à rua principal se chocou com três homens, Sasori se lembrava deles... eles estavam no bar que a pouco havia saído. “O que eles querem?” pensou, mas quando fez menção de os interrogar foi atingido em cheio por um soco e por outro e outro, além de pontapés e por mais uma onda de xingamentos, parecida com os que ele não havia escutado antes.

Foram pouco mais de cinco minutos de espancamento, mas para ele pareceram cinco milênios. As lembranças de um passado distante surgiram em sua mente logo após o primeiro choque de punhos com sua mandíbula, que resultou em um dente sendo solto a distâncias dele.

A cada nova agressão dos três homens ele reviveu toda a vida como se estivesse se entregando a morte, mas ao fim delas e finalmente conseguindo escutar bem os risos e gargalhadas abafadas, devido a sua audição ter sido atingida ele retrucou. Aos tropeços conseguiu acertar o do meio devido a surpresa do momento. Os outros dois tentaram o impedir, mas foram novamente pegos de antemão não por Sasori e sim por Deidara, que havia conseguido os alcançar.

O loiro conseguiu imobilizar os três homens e chamar a polícia que os atendeu imediatamente, além de ter os acompanhado ao hospital. No leito Sasori apenas clamava por perdão ao amigo, antes de ser levado para cirurgia.

Sasori viveu uma vida inteira envergonhado, se renegando e se oprimindo, pois não se considerava “normal”. Deidara também se culpava, mas não por isso e, sim por não ter ajudado o amigo e seu grande amor da adolescência quando o mesmo precisou de ajuda. E ali eles se encontravam, juntos após anos de separação, ainda com ferimentos que demorariam serem curados físicos ou emocionais, mas o orgulho dos dois de estarem comemorando pela primeira vez não só a alta do hospital de Sasori ou o primeiro encontro deles de verdade, mas o orgulho por se aceitarem como são e não como a sociedade pensam que eles devem ser.

Ao canto, em meio as dezenas de arco-íris que brilhavam colorindo o trio elétrico estavam Sakura e Chiyo, o choro de alegria e de orgulho das duas em vê-los juntos pela primeira vez era indescritível para ambas.


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Notas finais do capítulo

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