O Segredo da Capital do Oeste escrita por Izzy Aguecheek


Capítulo 15
Capítulo 14


Notas iniciais do capítulo

A partir daqui, os capítulos só vão ficando cada vez maiores :v mas pelo menos agora temos a explicação do por que a Woodstock, uma menina aleatória do interior do RN, tem esse nome tão esquisito.
Também passamos oficialmente da primeira metade da história! Yay.



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Na manhã seguinte, Isaías devolveu o celular do filho, acompanhado de um sermão sobre ter mais responsabilidade e não sair escondido de novo para vagabundear. Hugo, que dormira muito pouco depois de ter passado a noite aos beijos com uma Usurpadora e armando escondido contra o pai, quase riu na cara dele. Os olhos de Isaías se estreitaram ao ver a expressão divertida do filho.

— O que foi?

Hugo piscou, tentando parecer inocente. Ele era muito bom naquilo, e qualquer outra pessoa teria acreditado, mas seu pai era a exceção.

— Nada. Eu não disse nada.

Isaías o analisou atentamente por um longo instante que pareceu se estender por uma eternidade. O coração de Hugo estava acelerado com um medo irracional de que ele pudesse de alguma forma adivinhar o que estava planejando. Durante a noite anterior, ele fizera o possível para evitar pensar na reação do pai se o pegasse procurando informações confidenciais em suas coisas, mas o pensamento continuava dando voltas em sua cabeça, zumbindo como um inseto muito insistente.

Por fim, Isaías soltou o ruído de desaprovação usual e se virou para ir embora do quarto de Hugo, onde entrara sem bater e acordara o filho sem cerimônia. Ele já estava na porta quando disse:

— Não pense que eu não vou descobrir se você aprontar alguma coisa.

A risada que quase escapou dos lábios de Hugo dessa vez era quase histérica.

— Sim, senhor – murmurou ele. Suas mãos tremiam levemente.

Quando Isaías saiu, Hugo se pôs a mexer no celular devolvido. Havia algumas mensagens de seus amigos de Natal, e uma ou duas de seu primo, porque Hugo não se incomodara em avisar a nenhum deles que estava sem celular. Ele também tinha um novo seguidor nas redes sociais, com o nome de Luiz Gonçalves, que curtira todas as suas fotos mais recentes. Hugo sorriu ao reconhecer o amigo do irmão de Jessé, que o encarara tão obviamente antes.

Ele mandou uma mensagem para Andressa para avisar que eles podiam voltar a se falar por ali, mas não esperava por uma resposta tão cedo. Primeiro, porque achava que Andressa ainda estaria dormindo. Segundo, porque aquele era o século 21, e as pessoas gostavam demais de fazer os outros esperarem. E, terceiro, porque achava que talvez o encontro deles tivesse sido o último. Eles haviam se conhecido por atração mútua, mas, agora que haviam feito o que tinham se encontrado para fazer, Hugo não achava que “atração mútua” seria o suficiente para segurá-los juntos.

Claro, talvez a missão mágica e perigosa para a qual ele a tinha arrastado bastasse. Com um suspiro, Hugo se lembrou do que prometera fazer na noite anterior. Normalmente, quando precisava fazer algo escondido, ele esperava até Isaías sair de casa, mas suspeitava que teria que mudar de tática dessa vez. Isaías sempre carregava consigo a pasta com seu computador, onde Hugo imaginava que todas as informações importantes de verdade estivessem armazenadas. Além disso, grande parte de sua estratégia antiga envolvia magia. Ele imaginou que não poderia convidar Andressa para ir à sua casa, pular a janela no meio da madrugada e resolver aquele problema por ele.

Quando ele finalmente pôs o celular de lado e se levantou, Isaías já havia saído, deixando Hugo com um dia inteiro para planejar – ou escapulir para fazer alguma coisa menos importante e mais divertida, que era o que ele provavelmente faria, se todos os jovens interessantes que ele conhecia na cidade não estivessem tão envolvidos quanto ele em conspirações políticas. Do jeito que as coisas eram, só lhe restava dar voltas em seu quarto emprestado, rezando para Isaías deixar o computador em algum lugar de fácil acesso quando fosse dormir naquela noite.

Ele estava entediado o suficiente para responder quase imediatamente quando Luiz lhe mandou uma mensagem. Aparentemente, nem todos os seus novos amigos estavam ocupados demais com jornadas impossíveis.

***

A despeito de suas reclamações sobre estar no meio da semana de provas, Michelle parecia bastante interessada nos desdobramentos recentes do que ela passara a se referir como “a saga de Andressa Takahashi e a Pedra Filosofal”, um nome que só ela achava engraçado e que Andressa torcia muito para que ela não usasse na frente de outras pessoas. A menção aos mercenários pareceu deixá-la especialmente perturbada.

— Mas Jessé tá bem? – perguntou ela. – Tadinho, ele é tão simpático...

Andressa pensou no hematoma no maxilar dele, e no brilho abatido de seus olhos. Vê-lo assim na noite anterior fora como levar ela mesma um soco no estômago; ela sentira um impulso súbito de protegê-lo, ou de caçar os homens que o haviam machucado e dar uma lição neles. Ela podia ter menos de 1,60 de altura e um poder essencialmente inútil, mas tinha certeza de que aquelas aulas de defesa pessoal feminina e o ódio em seu coração lhe serviriam de alguma coisa.

— Emocionalmente, ele deve estar pior – concluiu. – Já é ruim o suficiente ser assaltado na rua. Imagina ser espancado por dois caras querendo roubar uma informação. Ele deve ter ficado traumatizado.

Mas o que é mais um trauma pra lista, certo? Mas ela decidiu não falar essa parte. Michelle já parecia chocada e preocupada o suficiente sem isso. Seu rosto estava pálido, e ela parecia prestes a vomitar. Andressa decidiu que era hora de mudar de assunto.

— E agora, tem toda essa história com Hugo espionando o pai dele. Mal posso esperar pra ver onde isso vai dar – Ela suspirou e se deixou cair na cama da amiga. Como de costume, aparecera sem avisar e interrompera Michelle no meio de uma revisão. Qualquer outra pessoa teria ficado furiosa. – Melhor que nosso encontro, espero. Acho que não tem nenhuma chance de a gente virar um casal normal, agora.

— Foi tão ruim assim?

Andressa não respondeu de imediato. Ela desbloqueou a tela do celular, viu a notificação da mensagem de Hugo e tornou a bloqueá-la. Sabia que ele não estava esperando uma resposta rápida. Ele era esperto demais para isso – e charmoso demais, também. Dava para ver que Hugo gostava de joguinhos de sedução. Em outras circunstâncias, Andressa teria achado esse traço de personalidade atraente, e ficaria mais do que contente em jogar com ele. Agora, porém, ela simplesmente não tinha paciência, e achava que eles não tinham tempo para aquilo. Talvez eles tivessem funcionado se tivessem sido só mais um casal que se conheceu em um aplicativo, mas agora estava meio tarde para agir como tal.

Talvez ela estivesse desistindo muito fácil, mas não era como se Andressa estivesse apaixonada. Ela não era do tipo que se apaixonava, muito menos depois de dois encontros tão bizarros quanto aqueles – ou talvez a estranheza dos encontros a estivesse confundindo. Talvez não tivessem sido tão ruins assim. Ela só não tinha nada com que compará-los.

Eram um monte de “talvez”, e Andressa só trabalhava com certezas. Ela disse:

— Sei lá. Ele beija bem. – Ela não conseguiu evitar um sorrisinho. – Dentre outras coisas.

As sobrancelhas de Michelle se ergueram.

— Dentre outras coisas?

— Aham. – Andressa deu de ombros. – E ele é legal, e bonito, e tudo mais, mas o pai dele é basicamente Hitler, e ele provavelmente tem uma tonelada de problemas de autoestima relacionadas a isso. Ele é... – Ela demorou um instante para achar a palavra certa. – Demais. No sentido de excesso, mesmo.

Todos os caras na sua vida no momento são demais — observou Michelle. – Não é como se Jessé fosse uma pessoa muito simples e sem bagagem emocional.

Foi a vez de Andressa erguer uma sobrancelha pra ela.

— Eu não falei nada de Jessé.

Michelle soltou uma risada debochada pelo nariz.

— Como se eu não te conhecesse.

Andressa sentiu as bochechas queimarem, mesmo sem saber exatamente o porquê. Também havia uma mensagem não lida de Jessé em seu celular, mas era provavelmente algo sobre a Tábua ou alguma piada que ele achava que ela acharia engraçada; nada como as indiretas e flertes óbvios de Hugo, e Michelle não tinha como saber disso. Apressada para mudar o foco da conversa, ela disse:

— E você? Quando vai parar de stalkear a Woodstock no Instagram e finalmente falar com ela?

Michelle ficou vermelha como um pimentão, até a ponta das orelhas, como Andressa sabia que faria.

— Eu não stalkeio ninguém.

Como se eu não te conhecesse.

Andressa foi rápida o suficiente para desviar do travesseiro que Michelle jogou em sua direção, mas ainda conseguiu ouvir os xingamentos saindo da boca da amiga. Ela riu, sem se deixar intimidar. Michelle era calma e tolerante demais para ser intimidadora.

— Se você não falar nada, eu falo – declarou. Michelle fez uma careta.

— A gente nem sabe se ela se interessaria por... – Ela fez um gesto vago na direção de si mesma.

Demigirls?

— Eu ia dizer “por mim”, mas é, isso também.

— E você só vai descobrir se falar algo, ou se eu falar algo, e olha que eu vou falar mesmo – ameaçou Andressa, e estava falando sério. Ela se lembrou de Jessé perguntando se ela era a nova namorada de Woodstock, e do sorriso que Woodstock dera para Michelle quando as duas haviam se conhecido. – Acho que você tem uma chance.

— Duvido.

— Michelle. Como é muito mais fácil te fazer acreditar em magia do que em uma menina bonita tendo uma queda por você?

Michelle suspirou teatralmente.

— Todos nós temos nosso negócio, sabe? O seu é sair com gente aleatória que você conhece na internet e ser atraente pras outras pessoas. O meu é ler livros de fantasia e ficar sonhando acordada – Ela deu de ombros, e um sorriso estranho surgiu em seus lábios. – No fim das contas, as duas coisas nos trouxeram ao mesmo lugar, né?

***

Já passava das três da manhã quando Woodstock recebeu a mensagem de Hugo sobre a pesquisa de Isaías.

Ela acordou com um sobressalto ao ouvir o barulho da notificação. Estava sentada à escrivaninha, com um caderno de anotações e um novo livro sobre a história do Rio Grande do Norte abertos à sua frente. Havia passado o dia inteiro reunida com Luiz e Fernanda, trocando pesquisas e discutindo teorias, e, ao chegar em casa, havia tanta informação girando em seu cérebro e ela se sentia tão inquieta que não conseguira dormir. Aparentemente, continuar a pesquisa em casa fora uma má ideia; depois da noite mal dormida, ela adormecera no meio do estudo.

Woodstock esfregou os olhos e olhou para a tela do celular. Os documentos tão todos protegidos por senha, dizia a mensagem. Mas ele deixou o e-mail logado no celular. Tem um monte de msgs sobre a Tábua com um tal Prof. Dr. Rodolfo Armando de Farias.

Foi preciso apenas alguns minutos de pesquisa na internet para descobrir que Rodolfo Armando de Farias era professor do departamento de História da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte. Woodstock encaminhou a mensagem para Luiz, que era aluno do curso, perguntando se ele o conhecia. Se a resposta fosse sim, ela já sabia o que fariam no dia seguinte.

Sua garganta estava seca; ela se espreguiçou, e se levantou, com intenção de ir até a cozinha. Parou no meio do caminho ao ver que a televisão da sala estava ligada, o volume quase inaudível. Na tela, havia um filme em preto e branco que lhe pareceu familiar. Woodstock sentiu um nó se formar na garganta. Aquele era um dos filmes preferidos de seu pai. Ela o assistira milhares de vezes nas noites que passara no hospital com ele, e algumas vezes depois de sua morte, com a mãe.

Dessa vez, Cristina decidira assistir ao filme sozinha. Ela estava encolhida no sofá, enrolada em um cobertor, como se não fosse uma noite quente e abafada de verão. Mesmo com a pouca luz vindo da tela, dava para ver que seus olhos estavam inchados. Woodstock se aproximou devagar, dando à mãe tempo de se recompor antes de se sentar ao lado dela.

— Tá tarde – disse, porque não conseguiu pensar em mais nada. Cristina assentiu.

— Você deveria estar na cama.

— Você também.

Elas assistiram ao filme em silêncio por alguns instantes. Woodstock se inclinou para olhar pela janela. Dava para ver o homem parado na frente da casa de Jessé, usando um uniforme de uma rede particular de segurança. Ela sabia que havia uma mulher com a mesma farda em frente à porta da oficina, e que nenhum deles era de empresa nenhuma, a menos que você considerasse uma organização política underground como uma empresa. Ter os membros da Corja de guarda ali a tranquilizava e perturbava ao mesmo tempo. Era bom sentir que sua mãe estava protegida, mas ela odiava ser lembrada do motivo pelo qual ela precisava de proteção.

Foi Cristina quem finalmente rompeu o silêncio, em um tom baixo e suave:

— Você não estava saindo escondida de novo, estava?

Ela não falou de forma acusatória, mas foi como levar um soco no estômago.

— Não – Woodstock engoliu em seco. – Mãe, eu já pedi desculpa. Eu não quis assustar você.

Cristina se virou para fitar a filha. Havia um brilho estranho em seus olhos castanhos, tão parecidos com o da filha, e demorou um instante para Woodstock perceber, horrorizada, que eram lágrimas.

— Tudo isso me assusta – retrucou ela. – Era uma coisa quando você ficava lendo livros e pesquisando na internet, mas isso é diferente. Tem guardas armados na frente da nossa porta. Você chegou aqui sangrando ontem à noite, e não pense que eu não vi o estado de Jessé. E você nem me conta o que está acontecendo, Carla. Claro que isso me assusta.

Woodstock se sentiu como se tivesse engolido uma bola de boliche. Era verdade que Cristina sabia muito pouco sobre o que estava acontecendo. Ela sabia que Woodstock queria salvar Jessé, que precisava da Tábua de Esmeralda por isso, que estava recebendo ajuda de uma organização agora, e que, se o objeto chegasse a Isaías Vancini, coisas ruins aconteceriam. Mas Woodstock não soubera explicar a ela que o que ele queria era escravizar e potencialmente dizimar o grupo mágico do qual ela mesma fazia parte. Sua mãe não tinha nada de mágica; Woodstock herdara tudo do pai. Magia a deixava nervosa, e talvez ela tivesse razão.

— Eu não posso só dar as costas a isso, mãe – disse Woodstock, sem muita convicção. Cristina já sabia disso. – Jessé é meu melhor amigo. Ele precisa de mim.

— Eu não estou dizendo que não precisa – Cristina ergueu uma mão para afagar o cabelo da filha, que um dia fora tão longo e cacheado quando o dela. – Mas você não pode se sacrificar pelo mundo, minha filha. Você é muito nova para ser uma heroína.

Woodstock fechou os olhos por um instante. Ela queria muito acreditar naquilo, mas não conseguia. No fundo, achava que era uma daquelas crianças que cresceram muito rápido: assustada, perdida, desesperada por algum tipo de consolo, mas ainda assim adulta.

— Eu não tô tentando ser uma heroína – respondeu ela, por fim, abrindo os olhos. – Eu só tô tentando ajudar.

Cristina tocou o rosto da filha suavemente.

— Carla, Carla, Carla. Você não tem jeito, não é?

A repetição de seu nome fez com que a garganta de Woodstock se fechasse. Seu pai lhe dera o apelido de Woodstock depois que ela cortara o cabelo e o pintara de loiro, aos 14 anos. Era uma referência ao passarinho amigo do Snoopy, do qual seu pai fora fã. Jessé rapidamente aderira ao apelido, bem como seus outros amigos da escola. Depois da morte do pai, ela passara a usá-lo até para se apresentar para desconhecidos. Ela se tornara Woodstock, maga Metalúrgica, Usurpadora, pesquisadora de itens mágicos e salvadora de amigos. Woodstock, militante política, altruísta, sempre colocando os outros à frente de si mesma. Woodstock, carregando o mundo inteiro nas costas.

Sua mãe nunca lhe chamara assim. Para Cristina, ela sempre seria Carla. E Carla era só uma menina.

Woodstock não conseguiu pensar em uma resposta para aquilo, mas, felizmente, Cristina não parecia estar esperando uma. Ela puxou a filha para um abraço demorado e murmurou:

— Tudo bem. Só quer dizer que você é filha do seu pai – E, depois de se afastar, analisando bem o rosto da filha: - Jessé precisa de você, e é ótimo que você esteja lá para ele. Mas eu também preciso de você, Carla. Então, tente ficar em segurança, certo?

Ciente de que não conseguiria falar sem chorar, Woodstock apenas assentiu. Sua mãe lhe deu um beijo na testa e pegou o controle remoto da televisão para desligá-la.

— Agora, vai dormir. Você não vai poder salvar o mundo se estiver caindo de sono.

Woodstock soltou uma risadinha trêmula pouco característica dela, desejou boa noite à mãe e voltou para o próprio quarto. Ela fez o possível para tentar dormir, sem muito sucesso. O buraco que havia em seu peito desde a morte do pai latejava como um dente careado.

Consequentemente, ela acordou mais tarde do que pretendia no dia seguinte. Luiz já havia respondido dizendo que sabia quem era o tal Rodolfo Armando de Farias, e que eles provavelmente conseguiriam falar com ele se fossem até a UERN durante a tarde. Woodstock sabia que o calendário da universidade estava completamente irregular devido a um período de greve no ano anterior, e que, por isso, os alunos só teriam férias poucas semanas antes do natal – o que provavelmente era péssimo para eles, mas pelo menos seria útil para ela.

Ela não ficou nem um pouco surpresa ao sair do quarto e ver Joana sentada no sofá da sala, confortável como se ali fosse a casa dela. E, de certa forma, talvez fosse.

— Deixe-me adivinhar – falou Woodstock. – Autoescola?

Joana deu de ombros.

— Tirar título de eleitor, ir na autoescola, sei lá. Aparentemente, Jessé tem muitos compromissos agora que completou 18 anos.

Ela não sabia quase nada a respeito da pesquisa deles sobre a Tábua de Esmeralda. Toda a família Amorim era extremamente protetora com relação à caçula, e Jessé não era exceção. Não havia nada no mundo que pudesse convencê-lo a envolvê-la naquilo. Woodstock não sabia se essa era a melhor decisão, mas nunca discutira com ele. Ela era praticamente parte da família, mas sabia que certas decisões não lhe cabiam.

Então, Jessé não estava disponível. Ela mandou mensagens para Andressa e Hugo, e, ao que parecia, só um deles poderia acompanhá-la; Andressa tinha um compromisso de família, aniversário de uma tia ou coisa parecida, que sua mãe não a deixaria faltar. Luiz, claro, já confirmara que estaria lá, tanto porque ele era o encarregado do assunto na Corja, quanto porque tinha aula na universidade naquele horário.

A mãe de Woodstock estava na oficina, como de costume. Woodstock atravessou o recinto o mais rápido possível, torcendo para não ser vista, mas não adiantou; ela já estava quase na porta quando Cristina a chamou de volta. Ela se virou devagar, xingando mentalmente. Assim que estava próxima o suficiente da mãe para conseguir falar com ela sem que os funcionários e clientes a ouvissem, disse:

— Mãe, eu só vou ali na universidade. Não vai acontecer nada.

Cristina lhe lançou um olhar desconfiado, ainda focada nas peças que estava consertando.

— Na universidade, é?

Woodstock conteve um impulso de revirar os olhos.

— É. Pesquisa. Vamos conversar com um professor de história.

Cristina ficou em silêncio por um longo instante. Por fim, disse:

— Eu não conseguiria te impedir de ir, não é? – Ela suspirou. – Deixe o celular ligado.

— Eu volto logo – prometeu Woodstock. – Volto a tempo de te ajudar aqui, eu acho.

Tecnicamente, ela estava de “férias” da oficina durante aquele mês, depois de passar dois anos trabalhando sem tirar um único dia de folga. Mas Woodstock não sabia ficar parada por muito tempo. Ela tinha certeza de que, se não fossem todos os novos desdobramentos em sua pesquisa pela Tábua, apareceria para trabalhar durante as férias. Não gostava de deixar a mãe sozinha, e não era como se tivesse muito mais o que fazer.

Ela correu porta afora antes que a mãe tivesse tempo de fazer mais recomendações. Cumprimentou a funcionária da Corja com um aceno de cabeça, mas a mulher sequer reconheceu sua presença.

Apesar de conhecer muitas pessoas que estudavam lá, Woodstock nunca fora à Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, campus de Mossoró. Ela havia terminado o ensino médio havia quase dois anos, mas, entre ajudar sua mãe na oficina e a pesquisa desesperada pela Tábua de Esmeralda, nunca havia passado muito tempo pensando no futuro. Gostava de trabalhar na oficina. Aos quatorze anos, depois da morte do pai, ela havia implorada à mãe que a deixasse trabalhar lá. Cristina temia que o trabalho interferisse em seus estudos, e demorou dois anos para permitir que ela trabalhasse lá como aprendiz. Quando Woodstock se formou, finalmente começou a trabalhar em tempo integral, e aquilo parecia ser o suficiente para ela.

Ela sabia que a maioria das pessoas da sua idade haviam seguido para a universidade, mas também sabia que a maioria das pessoas da sua idade não tinham um melhor amigo e uma comunidade mágica para salvar, e não era como se ela precisasse de curso superior para fazer o que fazia, tendo os poderes e a prática que tinha. Os clientes da oficina sempre a elogiavam, dizendo que ela parecia ter um “toque mágico”, sem ter ideia de como aquilo era verdade. No último ano, ela estivera estudando em seu tempo livre, mas não tinha certeza de para quê. Se fosse sincera, precisaria admitir que passara tanto tempo procurando a Tábua que não tinha ideia do que faria depois que a encontrasse.

Então, quando chegou à UERN, Woodstock não tinha ideia de para onde ir. Por sorte, encontrou com Hugo perto da entrada, parecendo tão perdido quanto ela. Ele acenou de maneira quase tímida enquanto ela se aproximava.

— Eu não tenho ideia de onde a gente tá – informou, desnecessariamente. Hugo tinha dezesseis anos e vinha de outra cidade. Woodstock não esperava que ele conhecesse o campus. – Mas mandei mensagem pra Luiz. Ele vai encontrar com a gente aqui.

De fato, não demorou muito para Luiz aparecer, os cabelos cacheados balançando ao vento, sorrindo para eles como se eles tivessem se encontrado para tomar um café e relaxar, e não consultar uma fonte de pesquisa de um maníaco sobre um objeto ridiculamente poderoso. O sorriso pareceu se alargar ao ver Hugo, que sorriu de volta com um quê de divertimento.

— Vocês chegaram rápido – observou ele. – Bem, eu andei perguntando por aí sobre esse professor que você me falou. Ele deve estar saindo da aula em – Ele fez uma pausa para verificar o relógio de pulso. – Uns dois minutos, eu acho, e ele tem uma hora vaga depois. Então, com alguma sorte, ele deve ter um tempinho pra falar com a gente.

Parecia uma péssima ideia: emboscar um professor desconhecido depois de uma aula, perguntar sobre uma relíquia que ninguém tinha certeza se existia, e torcer para ele achar isso razoável. Mas Woodstock não via uma alternativa melhor, então ela assentiu.

No fim das contas, foi mais fácil do que o que ela era esperava. Luiz disse que estava escrevendo um artigo para uma revista, citando nomes e parecendo bem convincente. O professor Rodolfo ficou encantado ao ver jovens tão interessados em um assunto tão incomum, e imediatamente começou a procurar uma sala vazia onde eles pudessem conversar.

— Essa foi fácil – murmurou Luiz para Woodstock, enquanto eles seguiam o professor. – A maioria dos professores não é tão legal assim.

Hugo não parecia tão convencido.

— Ele é amiguinho do meu pai – lembrou ele. – Quão legal uma pessoa dessas pode ser?

Ao invés de se sentar à mesa do professor, Rodolfo puxou uma carteira e sinalizou para que os jovens fizessem o mesmo, formando um pequeno círculo. Ele era mais jovem do que Woodstock esperava, mas os cabelos ralos e as linhas de expressão no rosto denunciavam certa idade. Sua empolgação fez com que Woodstock se lembrasse de um tio seu que sempre fazia piadas sem graça e tentava parecer mais novo do que realmente era.

Suas primeiras palavras, porém, não foram nem um pouco o que Woodstock estava esperando.

— Bem, isso é curioso. Tem alguma série, ou um jogo, ou algo do tipo, que ficou famoso entre os jovens recentemente?

Os jovens trocaram um olhar rápido.

— Acho que não entendi sua pergunta – respondeu Luiz, cuidadosamente. Rodolfo fez um gesto vago com a mão.

— Sobre a Tabula Smaragdina, quero dizer. Ela se tornou um tópico popular entre as pessoas da idade de vocês, ou...? Quando isso acontece, geralmente é por causa de um filme ou algo assim.

Luiz sacudiu a cabeça. Agora, além de confuso, parecia preocupado.

— Não. Nada desse tipo. Por que a pergunta?

— Bem, por incrível que pareça, vocês não são os únicos a pesquisarem sobre isso na universidade recentemente – Rodolfo deu de ombros. – Semana passada, um colega meu me pediu recomendações de livros e fontes. Disse que era para uma aluna. Pesquisa independente, eu acho – ela era de outro departamento, nada a ver com o curso de História. Não perguntei muitos detalhes, mas parece que ela estava fazendo uma pesquisa sobre textos lendários ao longo da história e sua mistificação.

O coração de Woodstock deu um salto. Luiz era o responsável pela pesquisa da Corja, então aquilo não estava vindo deles. Talvez fosse realmente uma pesquisa acadêmica independente de uma aluna curiosa, mas Woodstock não acreditava nisso. A maioria das pessoas sequer acreditava na existência da Tábua de Esmeralda. Quem quer que estivesse interessado o suficiente para pesquisar sobre ela, provavelmente tinha alguma ligação com a comunidade mágica – talvez até com Isaías Vancini, ou com os mercenários que haviam agredido Jessé.

— Acho que talvez eu conheça – disse Luiz, que estava claramente pensando a mesma coisa. – O senhor saberia informar o nome dela?

— Como eu disse, não pedi pelos detalhes – Rodolfo olhou bem para ele, desconfiado. Seu olhar se demorou na camiseta que ele vestia: era a farda do curso. – Mas eu não me preocuparia com isso. Você é aluno de História, certo? Com certeza, sua pesquisa deve estar seguindo uma linha bem diferente. Qual a dúvida de vocês, exatamente?

Para surpresa de Woodstock, foi Hugo quem respondeu, levantando a mão como se estivesse em uma aula de verdade:

— A Tábua de Esmeralda é uma relíquia grega, certo? Foi criada por aquele Hermes... Hermes alguma coisa, que era um deus grego – Aparentemente, ele andara fazendo a própria pesquisa. Rodolfo abriu um sorriso quase condescendente.

— Bem, ninguém sabe ao certo quem era Hermes Trismegisto. Ele pode ter sido o próprio deus grego Hermes, ou um filho ou neto, ou um dos deuses egípcios, como Thot ou Anúbis...

Hugo parecia estar contendo a vontade de revirar os olhos. Dava para ver que ele, como Andressa, não tinha muita paciência com figuras de autoridade.

— Certo. Mas a Tábua foi criada na Grécia, não foi?

— Acredita-se que sim.

— Então, por que todo mundo tá tão convencido de que ela veio parar nesse fim de mundo? – Ele hesitou, parecendo se arrepender. – Desculpa. Quis dizer “nessa cidade”.

Woodstock poderia facilmente ter respondido a essa pergunta, e, pela expressão de Luiz, ele também, mas ambos preferiram deixar Rodolfo explicar.

— Sim, de fato, é uma história bem longa – O professor sorriu. Dava para ver que gostava muito de falar do assunto. – Acredita-se que a Tábua de Esmeralda tenha sido criada na Grécia, embora não se saiba exatamente onde. A primeira versão do texto de que se tem conhecimento é uma tradução árabe, então não há como ter certeza...

Talvez fosse uma coisa boa que Andressa não estivesse ali, pensou Woodstock, com certo divertimento. Ela definitivamente já teria perdido a paciência e dito a Rodolfo para ir direto ao ponto.

— Claro, a versão mais famosa é a tradução para o latim. Isso porque, como todas as relíquias da época, a Tabula Smaragdina acabou indo parar nas mãos do Império Romano. Alguns pesquisadores chegam ao ponto de atribuir o sucesso do Império à posse da Tábua, ao menos em parte. – Rodolfo deu de ombros. – Eu, particularmente, não concordo com essa hipótese, mas essa é outra discussão completamente diferente. O fato é que, com a parte oriental do Império Romano se tornou o Império Bizantino e o início das invasões árabes, a Tábua passou de mão em mão, sendo dada como perdida por um longo período de tempo.

Hugo parecia um pouco perdido, mas assentiu para o professor prosseguir. Luiz estava claramente bebendo cada palavra.

— Ela ressurgiu em meados de 724, durante a conquista árabe na Península Ibérica. Acredita-se que ela tenha sido determinante para a vitória dos mouros na Batalha de Guadalete, o que me parece muito mais provável do que sua suposta relevância no Império Romano...

— Hm, licença – Hugo tornou a levantar a mão. – Batalha de quê?

— Foi a batalha que deu a vitória aos mouros sobre os ibéricos – respondeu Luiz. Como Hugo continuou olhando para ele com expressão confusa, ele acrescentou: - Foi quando os árabes dominaram a Espanha e Portugal. Bem, uma parte. Pelo menos, até a Reconquista.

— Quando os reis católicos expulsaram os árabes – disse Woodstock, se adiantando à pergunta que ela sabia que Hugo faria em seguida.

Rodolfo assentiu, satisfeito.

— Exatamente. Depois da Reconquista, a Tábua de Esmeralda ficou sob a guarda de Fernando II, Rei de Castela e Leão – Ele olhou rapidamente para Hugo. – Parte da Espanha atual.

Hugo pareceu vagamente ofendido.

— Eu não sou completamente ignorante – informou ele. – Tive aula de história na escola, muito obrigado.

Woodstock lhe lançou um olhar repreendedor, mas o professor não pareceu se incomodar. Ele apenas continuou:

— A Tábua de Esmeralda permaneceu sob domínio da Espanha por quase um milênio. Isso só mudou em 1581, quando o rei Filipe II da Espanha passou a ser também rei de Portugal. Em algum momento de seu reinado, a Tábua foi transferida para Portugal, e permaneceu com a família real portuguesa até 1806, quando Dom João VI fugiu para o Brasil por causa da ameaça de Napoleão Bonaparte. Um membro de sua comitiva – não se sabe exatamente quem – trouxe a Tábua junto com o resto dos bens preciosos da família real, com o principal objetivo de evitar que Napoleão colocasse as mãos nela e se tornasse ainda mais poderoso.

— A história fica muito nebulosa a partir daí – concluiu. – A comitiva desembarcou em Salvador, mas a Tábua torna a sumir durante os próximos séculos, ou quase isso. Na verdade, há uma série de fenômenos ocorridos ao longo da história que poderiam indicar a presença da Tábua, em vários pontos diferentes do país. Portanto, sabe-se que é quase certo que ela se encontra no Brasil, mas é impossível ter certeza de onde.

Nada daquilo era novidade para Woodstock, mas ela ainda sentiu seu estômago afundar ao ouvir outra pessoa confirmar em voz alta que a busca deles era um tiro no escuro.

— Mas há evidências que apontam para o Rio Grande do Norte – disse ela, tentando soar otimista. Hugo ergueu uma sobrancelha inquisidora, mas não disse nada, pelo que Woodstock ficou grata.

— Esse é o foco da minha pesquisa – comentou Luiz, embora não desse para saber se ele estava se referindo à pesquisa que fazia para a Corja ou se estava só inventando algo sobre seu suposto artigo. – Particularmente o cangaço. Eu sei que os cangaceiros teriam sido os responsáveis por trazer a Tábua até aqui, se ela estiver realmente aqui, mas nunca consegui encontrar mais sobre isso. Pelo menos, nenhuma informação que indicasse o paradeiro exato dela.

Woodstock entendia o problema. Era fácil achar textos e pesquisas sobre a Tábua de Esmeralda e sobre a história do estado do Rio Grande do Norte, mas praticamente impossível encontrar algum autor que falasse da relação entre os dois temas. Nos últimos anos, ela se tornara especialista em tudo relacionado ao estado, mas isso não a deixara mais próxima de descobrir o paradeiro exato da Tábua.

Rodolfo, por outro lado, pareceu surpreso com o comentário.

— Mas a ligação é óbvia – disse ele. – Você só precisa pesquisar sobre Jararaca.

Luiz e Woodstock trocaram um olhar. Hugo suspirou, parecendo cada vez mais entediado e impaciente com a conversa. Ele disse:

— Tudo bem, eu não prestava tanta atenção na aula de história. Quem é esse?

Rodolfo lhe lançou um olhar curioso. Woodstock se perguntou, um pouco tarde demais, quão bem ele conhecia a família Vancini. Ela não achava que Hugo fosse muito parecido com o pai, mas ainda assim, se xingou mentalmente por não ter pensado nisso antes.

— Você não é daqui, é?

Hugo mudou de posição na cadeira, parecendo pensar a mesma coisa que Woodstock. Ele levou uma mão ao cabelo, mexendo nele como se pretendesse esconder o rosto com a franja, que era curta demais para isso.

— Não. Eu sou, hm, de Parnamirim. Por quê? O que isso tem a ver?

Se Rodolfo achou a resposta desnecessariamente defensiva, não demostrou. Ao contrário, ele abriu um sorriso divertido, achando graça.

— Por nada. É só que todo mundo que cresceu nessa cidade sabe quem foi Jararaca.

— Ele era parte do bando de Lampião – explicou Luiz. – Considerado um dos mais cruéis, inclusive.

Hugo fez uma careta.

— Ah, certo. A invasão e tudo mais.

Luiz riu.

— É, a invasão e tudo mais. Ele fazia parte do bando quando eles invadiram Mossoró, em... – Ele olhou para Woodstock, que completou quase automaticamente:

— 1927.

— Isso. 1927. Os mossoroenses organizaram uma resistência...

— É, eu sei – interrompeu Hugo. – Eu fui no Memorial, lembra? Parece que não dá pra passar dois minutos nessa cidade sem ouvir a palavra “resistência”. Eu me sinto numa página militante do Facebook durante um governo de direita.

Tanto Luiz quanto Woodstock precisaram abafar uma risada com o comentário. Rodolfo, por sua vez, pareceu quase ofendido.

— É uma parte importante da nossa história e cultura – observou ele, secamente. – Claro que temos orgulho disso e sempre falamos no assunto.

— Ou pode ser só porque é a única coisa interessante nesse lugar – murmurou Hugo. Rodolfo não ouviu, ou, se ouviu, decidiu ignorá-lo. Ele continuou:

— De qualquer forma, sim, Jararaca foi uma figura proeminente na invasão, principalmente pela forma como morreu e foi enterrado aqui. Durante o combate, ele foi baleado no torso e na perna, e depois, foi preso. Os guardas o tiraram da cela sob o pretexto de transferi-lo para Natal, mas o que fizeram foi levá-lo até o cemitério e matá-lo com coronhadas. Há quem diga que o enterraram vivo. Precisaram quebrar suas pernas, porque a cova era muito pequena para caber o corpo todo. Foi uma execução brutal, mesmo para alguém como ele.

— O Cemitério de São Sebastião – acrescentou Luiz. Ele franziu os lábios. – Aquele mesmo perto do teatro. O túmulo dele tá lá até hoje. As pessoas visitam, deixam oferendas, rezam pra ele...

Hugo franziu a testa.

— As pessoas rezam pra alma de um cangaceiro que invadiu a cidade delas e era conhecido por sua crueldade? – Ele sacudiu a cabeça. – Então tá, né.

— Dizem que, quem for ao cemitério à noite, consegue ver o fantasma dele – acrescentou Woodstock, em tom divertido.

— Bem, há todo um debate com relação a isso – Rodolfo lançou um olhar para o relógio de pulso que usava. – Eu adoraria entrar nessa discussão, mas infelizmente preciso estar na minha próxima aula logo. Acho que isso é tudo que posso fazer por vocês hoje.

Ele começou a se levantar, e Luiz imediatamente o imitou.

— Professor, por favor – interveio ele. – O senhor poderia ao menos concluir seu raciocínio? É difícil encontrar fontes tão seguras, sabe, e essa é a última informação que falta para minha pesquisa.

Rodolfo fez um gesto vago com as mãos.

— Bem, não há muito mais o que dizer. O caso é que muitas pessoas acreditam que Jararaca tivesse algo a ver com a Tábua de Esmeralda. Talvez ele a tenha roubado de alguém, uma família nobre de algum município que atacou – não há como ter certeza. A hipótese de que ele a tinha leva à possibilidade de ela estar em Mossoró, mas, bem, até hoje, ninguém sabe. – Ele deu de ombros. – Todo o resto é baseado em lendas urbanas. Esses são os únicos fatos concretos que posso confirmar.

Os jovens acompanharam o professor até o corredor, enquanto Luiz agradecia profusamente e lhe passava seu contato. Depois que ele se afastou, Woodstock se virou para os garotos.

— Bem, isso foi esclarecedor – Ela olhou para Luiz. – Isso te deu alguma ideia de por onde começar?

Luiz mordeu o lábio, pensativo.

— Algumas. Se Jararaca foi o responsável por trazer a Tábua para Mossoró, bem. Ele não passou muito tempo aqui, certo? Há um número limitado de lugares onde ele pode tê-la escondido, supondo que ninguém a viu e a tomou dele.

Woodstock assentiu. Em sua mente, já estava listando os lugares relevantes para a invasão do bando de Lampião a Mossoró. Graças às visitas constantes ao Memorial da Resistência e ao musical que era apresentado na cidade todos os anos, em junho, ela já tinha uma boa ideia de quais eram.

— Vou ter uma lista pronta amanhã – prometeu Luiz, como se lesse seus pensamentos. – Agora, eu provavelmente deveria encontrar Fernanda e dizer a ela o que descobrimos. Vocês vêm comigo?

Apesar do uso do plural, ele estava encarando Hugo de forma bastante óbvia; dava para ver quem ele realmente queria que fosse com ele. Hugo, por sua vez, tinha um ar um tanto convencido, e um sorriso divertido, como se percebesse o olhar e estivesse achando graça da situação. Woodstock se perguntou se ele e Andressa haviam chegado a algum lugar depois daquele primeiro encontro malsucedido. Ela fora sincera quando aconselhara a garota a desistir dele, e ainda mantinha sua opinião. Não era que não gostasse de Hugo. A questão era que não achava que os dois eram uma boa combinação.

E, claro, ela vira os olhares que Jessé lançava na direção de Andressa, mas isso era outra história.

Ela deixou que Hugo respondesse primeiro; não queria interromper um encontro, ou presenciar um fora doloroso. Ele sacudiu a cabeça, tendo a decência de parecer desapontado.

— Meu pai vai me matar se descobrir que eu saí. Tecnicamente, eu ainda estou de castigo, e acho que não seria uma boa ideia provocá-lo agora que o estou espionando.

A decepção ficou visível no rosto de Luiz apenas por um instante antes de ele se virar para Woodstock. Ela pensou em sua mãe e na promessa que fizera de voltar a tempo de ajudá-la na oficina. E em Jessé, e em como tinha que contar a ele, também.

— Tudo bem – Ela hesitou. – Você não tem aula?

Luiz deu de ombros.

— O semestre tá acabando. É só prova, a essa altura do campeonato.

Eles seguiram para a saída.


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Notas finais do capítulo

Eu, ao contrário do Luiz, não sou estudante de história, então me perdoem se houver alguma incoerência nos fatos e datas apresentadas. E sim, a história do Jararaca é real, ok? Não a parte mágica, mas a morte brutal dele em Mossoró, lenda, o fato das pessoas rezarem pra ele - isso tudo é real... e o túmulo dele também, mas isso é conversa pro próximo capítulo.



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