P.O.V da Maria Ísis

Depois de chegarmos no dormitório, arrumamos nossas roupas nos armários. Enfeitei as prateleiras da escrivaninha com alguns livros e um porta-retratos com uma foto nossa.

Almoçamos strogonoff de frango com arroz e batata-palha, e de sobremesa pudim de claras. A comida(graças a Deus!) é tão boa quanto a de casa.

As aulas começaram. A primeira que tivemos foi de biologia. Entre sístoles e diástoles, passei os vinte minutos que restaram — após perder o foco com um sinal que a professora tinha no meio da testa idêntico ao da Sabrina Sato — rabiscando algum poeminha no caderno. Gosto de escrever, é terapêutico.

Depois foi literatura, matemática e sociologia, respectivamente. Não é puxado, mas como é o início do ano letivo  devem estar só engatando para cuspirem matéria na nossa cara.

Jantamos espaguete à bolonhesa. Após comermos, ligamos para nossas mães. Tive que contar cada detalhe do dia, das aulas, de quantos pelos tinham no nariz da professora de literatura, essas coisas que mães insistem em saber. Após tagarelar como foi o dia legal dela com a tia Mari e tia Helô, ela passou o telefone para papai.

Ísis: Ah, oi pai. Tudo bem?

Sérgio: Filha, porque não me acordou? Queria ter de dado um abraço antes de sair.

Ísis: Mamãe tentou te acordar, mas você dormia como pedra. Desistimos, até que tia Mariana chegou com a Nat para irmos.

Sérgio: Mesmo assim, queria ter te visto...

Ísis: Não fica assim! Eu e você, sábado, só nós dois. Maratona de The Big Bang Theory o dia inteiro. Topa?!

Sérgio: Você sabe como animar seu pai.

Ísis: Beijos, pai. Tenho que ir.

Sérgio: Te amo, tampinha.

Ísis: Amo mais!

Ao desligar, lembrei de nossas maratonas intermináveis de TBBT, nossa série favorita. As piadas sempre foram as melhores, e ríamos demais do Sheldon irritando o resto dos personagens.

Fui tomar um banho para relaxar. Liguei a água, que escorria pelos meus cabelos negros e ondulados. Me desliguei do mundo pelo tempo em que me banhava, até ouvir alguém entrando no banheiro comunitário.

— Elas são encrenca! Não ande e nem confie em nenhuma, ouviu bem?! São cobras traiçoeiras. — poderia distinguir aquela voz a quilômetros de distância. Sabia que Amanda falaria mal de nós, mas não pensei que fosse acontecer tão depressa assim.

— Um absurdo o que elas fizeram contigo, Amanda! Como assim te deixaram trancada no armário do zelador para você não apresentar o trabalho e ficar sem nota?! Elas não têm coração? — não sabia quem era a enganada da vez. Essa história, sério?! Já vi essa cena inúmeras vezes na TV. Radio Rebel, né?!

— E já fizeram muito pior, Dandara. Teve uma vez que por eu ter tirado a maior nota da sala em matemática, no final da aula elas me cortaram com uma navalha no braço. — isso é uma acusação muito grave. Ela tá mesmo a fim de joguinhos? Tudo bem se é para ser assim, mas não vou deixar barato.

Ao terminar de me enxugar, vesti o roupão e saí de dentro do box. Lá estava ela com a cara mais lavada do mundo.

— Amanda, que surpresa! Já fazendo fofoca mentirosa para as meninas que não nos conhecem? Pensei que você esperasse mais ou menos uma semana para começar com seu veneno. Golpe baixo. — a filhote de cascavel fez uma cara de quem tinha sido pega no pulo.

— Maria Ísis, não sabia que ficava ouvindo por trás da porta... — ela é burra ou o quê?! Aquilo é um banheiro comunitário.

— Eu que estava no meu canto tomando banho, até você chegar falando barbaridades sobre mim e minhas amigas para essa menina que não nos conhece. — minhas mãos chegavam a tremer de tanta raiva que sentia. — Aliás, que mal educada sou. Prazer, sou a Maria Ísis. Não liga para o que a Amanda fala, ok?! Tudo isso é inveja de sermos amigas desde pequenas e ela não ter ninguém. Cuidado, porque ela vai te jogar fora quando cansar. Ela sempre faz isso. — estendi minha mão.

— Prazer. — pegou minha mão, cumprimentando-me. Suava frio, parecia que estava com medo, ou sei lá.

— Isso é um absurdo! Por que mentiria? É a mais pura verdade. — a safada suspirava em tom de deboche.

— Não acredito que eu estava acreditando em você, Amanda. — pela primeira vez Dandara pronunciou-se sobre o assunto — Que maluca você, fica fazendo a cabeça das pessoas para se voltarem contra as meninas, que pelo visto não tem nada de louco e errado com elas. Quer saber? Vou sair daqui e ir para meu dormitório que ganho mais. Tem uma série que eu estou louca pra terminar. Desculpa, Maria Ísis.

— Nada. — sorri pra ela — Qualquer coisa é só chamar.

— Obrigada. — ela disse e saiu, deixando Amanda com muita raiva.

— Perdi mais uma futura amiga, por sua causa! Qual é o seu problema? — a loira aguada estava furiosa, a ponto de me dar um tapa a qualquer momento.

— Qual é o meu problema? Diferente de você, eu não tenho nenhum. Da próxima vez que for tentar fazer amigas, não as ponha contra nós. — cheguei bem pertinho dela, como se fosse contar um segredo. — A verdade, cedo ou mais tarde, sempre vem à tona. Elas podem acreditar hoje em você, mas uma hora vão ver que nós que estamos certas.

A louca saiu de cara fechada, pisando fundo. Não será a última vez que ela faz isso, disso tenho certeza.

Volto para meu quarto, ouvindo um choro forte, e sei muito bem de quem é: Jade. Será que aconteceu alguma coisa?

Entro depressa no quarto e me deparo com Jade, chorando que nem uma condenada, Aria com lágrimas nos olhos e Natália se segurando para não chorar.

— Mas que porra é essa? — não aguentei e comecei a rir — Isso vai ficar registrado. Sorriam pra foto! — tiro uma fotografia delas com a cara inchada antes que virassem o rosto. A cena é hilária.

— Não faz assim, Ísis! Olha que coisa mais linda. — Jade fala com seu drama de sempre.

Estava achando que era um filme daquele de drama em que todo mundo morre, até o cachorro. Mas não. Elas estavam vendo Pretty Little Liars pela 279038279 vez.

— Eles estão acampando, essa é a cena da primeira vez deles. É lindo demais! — Aria complementa a fala de Jade.

— É, mas se vocês não se lembram, ela descobre que ele estava trabalhando para a Jenna no próximo episódio. — digo para elas. Não que eu não ame a série, pois é realmente impossível não amar, mas vi tantas vezes que já sei as falas de cor. Prefiro minhas sitcoms, ou Good Girls.

— Pelo menos a gente não está vendo aquele lixo tóxico chamado Riverdale. Eu só vejo porque amo a Cheryl, rainha do mundo. — Nat afirma com convicção. Concordo com ela, até porque Cheryl é realmente a única que presta naquela série.

— Que tal a gente parar um pouco de ver PLL e partirmos para uma série nova, desconhecida pelas quatro, e ver do início ao fim. O que acham? — jogo a ideia no ar, pois cansa elas chorando das mesmas coisas. Mas que é engraçado, é.

— Que tal Gossip Girl? — perguntou Aria, tomando posse do controle remoto.

— Muito teen. Vamos ver algo mais adulto, sei lá. — disse Natália.

— Essa tal de The Society parece ser boa — falei.

— Já vi nas férias, quando estava com insônia. — respondeu Jade — Além de ser teen.

    — E que tal essa aqui: Lucifer. Pela sinopse é uma série policial. — anima-se Aria.

— Olha o nome! Nunca que vou ver isso. — comenta Jade, fresca como sempre — Série do capiroto, tá amarrado em nome de Jesus. Deus é mais.

— Para de ser fresca, criatura. É uma série de comédia, pelo que o site está dizendo. — intervém Nat.

— Tudo bem, então. Vamos assistir. — rendeu-se Jade — Mas se eu tiver pesadelos vou ficar enchendo o saco de vocês a madrugada inteirinha!