O Leitor escrita por Cláudia Batiston


Capítulo 3
Capítulo 3




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— Muito esperto, Modred. Com uma tacada só você afastou Maze das mãos da senhora Ethel, colocando-a debaixo da sua proteção e ainda pôs uma mordaça na pessoa que mais fofoca poderia fazer sobre o assunto. – Tia Dot estava se divertindo com a ousadia do sobrinho.

— As fofocas não viram tão cedo, mas viram, pois colocar uma mulher considerada uma solteirona, de vinte e cinco anos, para cuidar de tarefas atribuídas a homens será um escândalo.

— E como Maze está? – Mudou de assunto, aquele era um campo minado, que poderia deixar sua tia ver que algo estava acontecendo em seu coração.

— Está bem. Ela está fraca dos pulmões, parece que pegou friagem na última vez que trabalhou até tarde, servindo na cozinha. Mas com os chás e remédios deixados pelo doutor Wayne irá se recuperar bem. E por favor, mantenha distância daquele quarto. Não queremos nenhuma fofoca envolvendo você.

Seu tom era afiado, havia um comando subliminar para que ele se afastasse dela, sinal de que sua tia já tinha observado algumas coisas que ele tentava esconder de todas as formas. Ela era extremamente tradicionalista, dificilmente aprovaria um envolvimento com serviçais.

— Com certeza não. Já tenho muito o que pensar com as mirabolantes bagunças que meus primos, sobrinhos e agregados andam aprontando por toda Inglaterra.

— E por falar neles. – Tia Dot respirou fundo, provavelmente viriam notícias que talvez ele não gostasse muito.

— O que foi dessa vez, tia? - Para uma família que procurava o anonimato, a sua havia se tornado saidinha nos últimos tempos, se envolvendo em um escândalo atrás do outro.

— Orion está desconfiado que Gilles tem o mesmo dom que você.

— Por tudo que é mais sagrado, espero que não! Pobre garoto!

Sentado diante de sua tia, na saleta azul de visitas, tomando um delicioso licor de cereja, Modred de repente se deu conta de que aquele menino era o filho mais novo de Orion.

— Tia, ele vivia na rua até outro dia! – Exclamou admirado ao se lembrar que o menino fora abandonado ainda bebê em um beco sujo de Londres, e que outros meninos haviam cuidado dele até que sua prima Olímpia colocou a todos sob sua proteção e, por fim, descobriram que Orion era o pai dele. - Como será que ele está aprendendo a lidar com tudo isso? Meu dom não é um dom, mas uma maldição!

— Depois que Orion o reconheceu como seu filho e o colocou sobre sua proteção, ele tem aprendido a lidar com o dom, parece que já tem algum controle sobre ele. Acredito que ter vivido na rua desde pequeno o tenha ajudado a fortalecer os próprios muros. Pois, parece que ele não se sente afetado com tudo isso. – Tia Dot mostrou a carta que tinha recebido, onde Orion pedia para que o menino ficasse com eles por algum tempo, aprendendo a usar o dom dele da melhor forma. - Sei que algumas vezes ter crianças ao seu lado pode ser difícil para lidar com seu dom, mas...

— Mas está na hora de superar esta barreira também. Eu gosto de crianças, apesar do desconforto que às vezes elas me causam, inclusive da nossa família, mesmo quando estão fazendo bagunça, a maioria mantém os muros elevados. Além do mais tenho pensado que preciso a vencer a aversão que tenho a palavra casamento, eu não sei se ainda estou pronto, mas é isto que quero.

— Modred! Esta é uma excelente notícia. Podemos ver algumas jovens da sociedade, avaliar se...

— Não tia, não será assim. Sem bailes, sem idas a eventos de temporadas. Eu irei escolher aquela que meu coração pedir. Não posso me dar o luxo de casar só para ter um herdeiro e um reserva. Isto não vai funcionar. Se eu me casar com uma mulher que não consegue manter seus muros erguidos em qualquer situação, poderá ser um desastre pra mim. Além do mais, quero casar porque ando me sentindo um tanto solitário. Desde que Alethea se casou fico pensando se não está na hora de encontrar alguém. Mas quando Argus conheceu Lorelei, me dei conta de que, mesmo tendo toda a família à minha volta, ainda me sinto solitário. E solitário de um jeito que apenas uma companheira poderia sobrepujar.

— É por isto que você anda tão interessado em Maze, querendo manter a jovem ao seu lado?

Mentir para sua tia era o mesmo que mentir para o Criador todo onipotente, ela sempre sabia a verdade. Fosse ela qual fosse, por mais dura que fosse. Esse era o dom dela, o conhecimento. Por causa desse dom que o falecido marido havia a abandonada dias depois de sua noite de núpcias. Ela não conseguiu segurar a língua atrás dos dentes quando seu marido chegou tarde da noite e para ela ficou visível que estava se divertindo com uma amante. Desde então, ela tinha se tornado quase que uma reclusa dentro de Elderwood.

— Eu não posso negar que Maze tem algo que me atraí. Ela linda, inteligente e de muros fortes. A única coisa que me preocupa é que ela não passa de uma serviçal, enquanto que eu sou o duque e o chefe dessa família de doídos que tenho a minha volta. Não sei se eu seria um bom partido para ela.

— Não sabe se seria bom partido para ela? – Tia Dot estava escandalizada. -  O sonho de toda jovem é casar com um príncipe e caso Vossa Alteza não saiba, o senhor está abaixo apenas da família real na linha de sucessão. Caso Rei George III venha a falecer juntamente com sua adorável família, o trono será imediatamente seu. Sabe disso melhor que ninguém. Afinal de contas, outros que poderiam estar mais próximos na linha de sucessão já morreram.

— Ah, mas tem o duque de Sundunmoor, o pai da mulher de Argus, Lady Lorelei.

— Você acha mesmo que o homem iria abrir mão da paz que tem em seu ducado? Não mesmo! Roland Sundun já mais abrirá mão do que ele tem para cuidar de uma nação. Casado de pouco com sua quinta esposa, está muito feliz. Ele começaria uma guerra para não ter que assumir tais responsabilidades.

— Isso não me faz ser um bom partido para uma jovem de alma nobre como ela.

— Meu querido Modred, duque de Elderwood, você precisa ter certeza absoluta que é um partido tão bom que algumas jovens matariam para estar diante de ti, dançar uma única vez com Vossa Alteza, quanto mais dividir macios lençóis com o senhor.

Modred tomou um gole do licor para apagar a imagem que aquelas palavras insensatas invocaram em sua mente. A deliciosa ideia de acordar com uma cascata de lindos cabelos vermelhos ao seu lado o aqueceu de tal forma que poderia ficar evidente em seu olhar.

— Tia, a senhora pode ter toda a razão do mundo, mas não irei me casar com uma mulher apenas por conta do título que ela ou um parente possui. Não posso imaginar uma vida ao lado de uma mulher que não possa suportar minha presença, pelo simples fato de eu conseguir ler o que vai na mente e no coração dela. A senhora não faz ideia do que é tocar uma pessoa e ver que você é considerado o melhor partido que há. Além do mais, a senhora não considerou uma coisa muito importante nesta situação toda.

— Qual? O que é mais importante que você selecionar bem sua futura esposa?

— Maze. Maze é mais importante. A senhora perguntou e falou o que eu queria e o que eu penso, mas não questionou o que ela deseja ou espera de mim. Desconfio que me veja apenas como Sua Alteza, pois nunca, em nenhum momento demonstrou interesse por mim. Eu que a procuro, eu que vou atrás dela, eu que fico encantado de conversar com ela horas a fio, eu...

— Você que anda colocando em risco o nome da jovem. Se afaste dela. Não se esqueça da origem dela, ela é uma Pug. Alfred, o tio dela, não irá permitir que você a desonre, mesmo sendo o primeiro na linha de sucessão fora da família real. E eu não quero saber de você se envolvendo com a criadagem. Desculpe, mas se for preciso a mandarei embora, tudo para te proteger.

 Aquela era uma discussão que não levaria a lugar algum e ele não iria dar a sua tia a oportunidade de maltratar a pobre da mulher, só para manter o bom nome da família. Seu tom de voz era afiado, um comando, que Modred não poderia negar, mas ele estava determinado a encontrar uma resposta para o enigma que era Maze, havia algo que ele precisava saber: o que ela significava para ele.

O mistério daqueles olhos de um azul profundo como o cair da noite era algo que estava despertando todos os seus desejos mais íntimos. Ele nunca tinha experimentado aquela profusão de sentimentos por ninguém e estava mais que disposto em descobrir até onde cada um deles iria leva-lo.


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