Meu amigo,

A última carta que trocamos foi há muito tempo. Pensei que não escreveria mais à você, pois sei que não obterei resposta. Mas eu precisava te contar como vão as coisas.

Hoje o dia amanheceu nublado, do mesmo jeito que você gostava. De manhãzinha choveu, e eu me lembrei do dia em que noivamos. Eu te levei café na cama, bem cedinho, e aí começou a chover. Você sorriu verdadeiramente antes de me beijar. Naquela época, você estava mais forte e seu rosto pálido estava um pouco corado. Quando te pedi em casamento, você chorou. Nunca pensei que ficaria tão feliz quando aceitou. Saímos para passear no parque durante a tarde quando parou de chover. Estávamos bem agasalhados por conta do frio. Vimos os pássaros e o lago. Conversamos sobre o futuro, fizemos planos e namoramos como em muito não fazíamos. Tiramos nossa foto mais bonita naquele dia, se lembra? Hoje eu me peguei olhando para ela e meu coração apertou.

Aqueles planos que fizemos nesse dia foram todos cumpridos, e pensar nisso me traz um alívio muito grande. Conseguimos nos casar antes da primavera. Nossos melhores e amigos estavam lá, assim como nossos familiares mais próximos. A cerimônia foi belíssima, porém não mais do que você. Estava elegante, como sempre, em seu terno branco. Quando te vi chegando, quase tomei seus lábios antes da hora.

Minhas memórias continuam repetindo como um gravador quebrado, hoje mais do que o normal. Você gostava do ar livre e das plantas, e por isso, no primeiro ano de casados, resolvemos criar uma horta no quintal aqui de casa. Você cuidava tão bem das plantas, e eu me apaixonava mais a cada dia que via seu sorriso tranquilo ao fazer aquele trabalho tão simples. Nessa época, você estava mais magrinho, o que não diminuía sua beleza. Hoje mais cedo, eu olhei para a horta e acenei com meus olhos fechados, sem mostrar minhas lágrimas. Foi natural, como se eu fosse encontra-lo ali, regando as plantas.

O dia em que você me contou sobre o futuro e que seu tempo aqui estava acabando, seu rosto sorridente era o mais bonito que qualquer um. Você disse que eu devia apenas aproveitar o tempo que tínhamos juntos, e foi o que fiz. Nosso último ano foi o mais incrível de todos. Começamos a plantar flores juntos. Você disse querer me dar um presente de despedida, mas também disse que não era aquilo que queria me dar. Você ainda acha que eu não entendi suas palavras? Sei muito bem o que quis dizer. Você queria me dar algo seu, e que me fizesse lembrar de você sempre que o visse. Algo para cuidar e que era apenas nosso. Você queria um filho, não é? Não fique triste por não poder ter me dado filhos. As flores foram suficiente.

Eu o amo tanto, Jushiro. Sinto sua falta, e você sabe disso.

A última flor que plantou cresceu, mas eu não posso entregar a você. Agora há pouco, eu fui até o lugar onde nossas flores foram plantadas, antes que voltasse a chover. Eu olhei para o céu e acenei, esperando que pudesse me ver. Acho que naquela hora, havia um cisco em meus olhos.

Para falar a verdade, minhas lágrimas não param. Eu me sinto vazio ás vezes. Não estou progredindo, eu sei. Mas naquela hora, eu queria que você visse. Eu ainda não tinha feito, sabe? Você pode ficar bravo comigo por ter demorado tanto, mas é isso que essa carta significa.

Adeus, meu amigo. É isso o que eu quis dizer. Eu acenei para que você pudesse me ver.