O que está morto não pode morrer escrita por PettyPite


Capítulo 1
O que está morto não pode morrer




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Uma pilha de cadáveres jazia na neve ao redor da árvore coração quando o Rei da Noite chegou. O fogo ia perdendo a força mas ainda conseguia fazer seu trabalho de trazer alguma iluminação para o bosque sagrado. Theon Greyjoy havia conseguido derrotar o que achava ser o último deles. Empunhado de uma lança de vidro de dragão ele batia o mais forte que podia em qualquer um que tentasse passar por ele para chegar até Bran. As flechas já haviam acabado, os homens já haviam morrido. Era o único que havia sobrado, mas era certo que poderia deitar junto aos mortos de tão exausto que estava.

Tentou recuperar algum folego quando viu os caminhantes brancos, há alguns metros de distância, abrirem passagem para o Rei da Noite. Até mesmo a nevoa pesada parece ter se afugentado diante dos mortos vivos ficando um pouco mais fraca e permitindo que Theon pudesse ver mostrando o rosto da criatura. Poderia dizer que ele fora esculpido em pedra de tão dura e cinza que era a expressão que carregava na face, exceto os olhos. Existia algo perturbador nos congelantes olhos azuis que fitavam Theon. Não eram olhos vivos, não eram olhos mortos. Era alguma coisa que não tinha nome. Tentou lembrar se Velha Ama tinha lhe contado sobre a intensidade do olhar dos outros quando lhe contava histórias. Com o tempo muitas coisas vão sendo esquecidas e a única coisa que sobrava era certeza de que tudo era muito melhor antes de fazer as coisas que fez. Se pudesse fazer diferente...

Tudo o que você fez te trouxe aqui.

Ainda estaria inteiro, de todas as formas que alguém pode estar. Não houve um dia desde que fora capturado por Ramsay Bolton que não desejou nunca ter saído do lado de Robb, o único e verdadeiro amigo que já tivera na vida.

Tudo o que você fez te trouxe aqui. Seu lar.

Foi o que Bran lhe disse antes de entrar em completo transe. Winterfell era o lar de Theon. Pagou o preço de ferro para entender seu lugar no mundo. Pensava que nunca seria um Stark e mesmo que tentasse eles já tinham seu próprio bastardo, Jon, e por isso não haveria espaço para outro. Então tentou ser um Greyjoy, mas também foi renegado por Balon, o pai. Esse jamais aceitaria ter um filho que tivesse pagado o preço de ouro. E  então foi pego, e dessa vez, não era nenhum nem outro, e sim Fedor, nome com o qual Ramsay lhe batizara.

Nós não semeamos.

Mas Theon semeou. Ao longo de sua vida semeou  muitas coisas das quais se arrependia. Semeou a inveja, a traição, a covardia e a hesitação em fazer a coisa certa. Eram tempo de semear algo novo, mesmo que não fosse colher os frutos. Teria alguma chance? Não sobrara um homem para lutar. Ele era a única barreira para chegar até Bran e não seria difícil eliminá-lo. Estava ferido e não havia mais nada que pudesse ser feito. A essa altura alguém ainda poderia chegar para salvá-los? Ouvia a chama do fogo, o som das espadas sendo brandidas e o grito dos homens lutando, mas não ouvia a voz dos Deuses. Por anos havia clamado por todos os deuses que conhecia, os Velhos, os Novos e também Deus Afogado, mas eles não queriam saber de Theon e também não queriam saber daquele guerra. Era tolo esperar pela misericórdia divina.

— Theon... – a voz de Bran chamou.

Bran voltara, embora não soubesse dizer para onde ele havia ido. Theon engoliu seco e virou-se encontrando o olhar sereno do Stark. Não conseguia desvendar o sentimento que havia dentro daqueles olhos. Soube que Bran agora era o Corvo de Três Olhos. Perguntou-se se os corvos sentiam medo. Queria dizer algo ao menino, nem que fosse um novo pedido de desculpas por não ter conseguido salvá-lo. Falhara, mas uma vez, em proteger sua família. Não queria olhar Bran nos olhos, mas diante daquele momento a honestidade de um olhar era o que de melhor que poderia oferecer. 

— Você é um bom homem – disse Bran. – Obrigado.

Theon não esperava por aquilo. As palavras de Bran trouxeram algo que jamais experimentara. Era a primeira vez que ouvira isso de alguém. Você é um bom homem. E foi justamente Bran a lhe dizer. A pessoa cujo Theon havia roubado o lar, traído o irmão e permitido que sua irmã fosse torturada pelo sádico Bolton. O coração encheu de algo que não sabia bem o que era. Estava emocionado. Poderia ser mesmo um bom homem? Não acreditava nem mesmo que fosse um homem. Mas era. Era um homem, não o Fedor, mas Theon... Theon Greyjoy.

O filho de Balon Greyjoy levado das Ilhas de Ferro como prisioneiro de Ned Stark para viver sob sua custódia em Winterfell. Seu sangue poderia ser de um Greyjoy mas sua alma pertencia ao norte e lhe alegrava saber que sua última gota de vida seria derramada naquela terra, por sua verdadeira família.

Aceitou as gentis palavras de Bran assentindo com a cabeça. Não havia mais tempo. Juntou toda força que lhe sobrara e correu em direção ao Rei da Noite segurando a lança de vidro de dragão. Pagaria o preço de ferro.

Eles, os outros, observaram friamente Theon correr em suas direções. Tentou estocar a lança no morto vivo mas foi em vão. Em um passo rápido a lança que segurava foi partida em duas e uma das partes ficou com o Rei da Noite que ficou-a no estomago de Theon. A madeira transpassou a coluna, mas aquela não foi a pior dor que sentiu.

Esperava por aquilo. Seria um tolo se achasse que qualquer coisa que fizesse pudesse funcionar. As pernas lhe abandonaram e ele despencou no chão. O sangue inundou-lhe a boca de Theon, mas também estava acostumado com isso e o gosto já não era tão ruim.

O Rei da Noite o abandonou Theon Greyjoy e seguiu em direção ao Corvo de Três Olhos. Não havia mais nada que pudesse ser feito. Ele aguardava o fim sob o frio da neve quando viu uma sombra agachada logo atrás dos caminhantes. Não conseguia identificar quem ou o que era, nem mesmo se era algo real. A visão turva poderia estar enganando-lhe. Fosse o que quer que fosse, estava ali escondido. A facilidade com a qual o Rei da Noite havia acabado com Theon deve ter desencorajado quem quer que tivesse a intenção de ajudar-lhes. Não poderia julgá-lo, mas também já não tinha mais tempo para qualquer conclusão e por isso concentrou-se em si e nos poucos segundos que lhe restava. Não sabia se o fogo havia apagado ou seus olhos que estavam fechando, mas aquela noite não parava de escurecer. Então era a assim o rosto da morte? Não saberia dizer, afinal, o que está morto não pode morrer.


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