Digimon Signi escrita por Maguro


Capítulo 3
A menina e seu pinguim




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Ela corria em desespero pelo labirinto de corredores negros que estava a sua volta, sem nunca encontrar o fim daquele inferno. O som de seus passos e sua respiração era consumido pelas séries de explosão que a precediam. Eram altas, contudo, assim como ela, o grande cão negro, seu perseguidor, parecia demonstrar dificuldade em enxergar naquele ambiente. Mas mesmo assim, essa era a única vantagem que tinha e Claire sabia que não iria dispor disso por muito tempo, precisava de uma alternativa.

O cão saltou, por cima de sua cabeça e a menina de corpo magro e pequeno, quase que automaticamente virou-se de maneira desengonçada na direção oposta, quase caindo. Antes que pudesse continuar com sua fuga, os olhos encontraram o verde intenso da íris daquela menina loira; sua beleza só podia ser comparada com a aura vil que emanava. O medo de Claire era palpável.

Entregue seu materializador, Claire.” Ordenou a menina, que teve como resposta uma risada que tentava esconder um pavor iminente.

Para depois você me matar assim como fez com os outros?” ela estava ofegante.

Enxergou a figura monstruosa do cão negro por cima de seu ombro, mas rapidamente voltou a visão para sua perseguidora.

Se quiser ter essa conversa novamente, então teremos.

Eu não quero ouvir nada de você, Laila. Já sei o que preciso saber: Você é uma psicopata. Nos confiamos em você e no fim você fez o que fez.”

Estou fazendo aquilo que é correto para esse mundo.”

Correto?” vociferou Claire, que maneava com a cabeça. “Se matar?

O mais forte deve sobreviver, essa é a regra. E só assim nosso mundo e o mundo deles vai entrar em paz.” Ela suspirou, estava cansada daquilo havia muito tempo, na verdade. “Vamos dar um fim nisso, Claire. Chega de fugir.” Seu dedo indicador foi de encontro com a direção da menina ofegante. “Cerberusmon...”

Não, o mais esperto deve sobreviver!” brandiu Claire, elevando seu materializador sob sua cabeça. O objeto já estava pronto para ser utilizado, ela apenas esteve ganhando tempo enquanto sua parceira se preparar.

Antes que Laila pudesse dar a última ordem, iniciou-se a materialização, e numa velocidade tremenda, da luz projeta surgiu uma figura aquilina de penas arroxeadas, da mesma cor o traço que cortava o equipamento de Claire. Ainda na posição mais alta que estava, o Digimon ave virou-se para Cerberusmon, enquanto de seu bico irradiava um brilho azul.

Prisma de Gelo!” gritou e atirou uma barragem de espinhos de gelo na direção do rosto do grande cão negro, que rugiu em agonia enquanto se afastava. Laila, concentrada em seu parceiro, não notou que novamente Claire utilizou de uma distração e agora estava numa distância perigosa de si. A garota de cabelos loiros foi mais rápida, mas ainda assim recebeu com todo impacto o soco da mão ossuda de Claire, que foi forte o suficiente para deixa-la desnorteada.

Penguinmon, vamos!” gritou Claire a seu parceiro, que numa espécie de voo, conseguiu chegar até suas costas magras, agarrando-se com toda a força enquanto a menina corria desesperada pra longe dali.

Houve momentos que seu corpo quase colidia com o chão; estava com fome, com sede e com sono. O tempo entre o último ataque e esse era curto, então Claire não encontrou o suficiente que precisava das necessidades básicas, contudo, seu instinto de sobrevivência era maior, então parecia ser movida por outra força, como uma marionete sendo controlada e desse mesmo modo, vacilando e ofegante, se viu livre daquela barreira.

Já era noite do lado de fora. Lembrou-se que Laila a encurralou ainda próximo das três horas da tarde. Agora que estava numa distância segura, levou as mãos até seu materializador, afim de checar o horário, mas algo a impediu de prosseguir. Penmon, seu parceiro, não era do tipo falatório, talvez não fosse capaz de pronunciar corretamente o idioma dos humanos, somente o suficiente para invocar seus ataques especiais. Num assovio baixo, ele chamou atenção de sua mestra.

Se eu usar meu materializador, ela vai saber onde estamos. E o pior é que aquele Digimon que ela tem é do tipo rastreador...” ela encostou as costas na parede mais próximo e deslizou até o chão, suspirando e olhando para o céu noturno. “Como que eu me meti nisso, Penmon?” ela bocejou, e quando estava prestes a derrubar as primeiras lágrimas, num salto, seu parceiro se colocou mirando o fim da rua.

Claire rapidamente levantou-se também, compartilhando da mesma sensação de seu parceiro, contudo, respondiam aquilo de formas distintas. Enquanto o Digimon pinguim mostrava bravura, pronto para o combate, Claire apertava o estômago, sentindo o frio percorrer sua espinha. Aquela sensação era comum; todos os domadores compartilhavam de capacidades únicas e capacidades comuns e dentre essas comuns estava a capacidade de sentir a presença de um semelhante quando o mesmo invocava seu Digimon ou utilizava seu materializador. Era atípico, todavia, que a presença que se fez no fundo da mente de Claire não mostrava crueldade, como Laila fazia, e também parecia extremamente próxima e longe, ao mesmo tempo. Foi a partir dai que ela determinou que sentia um domador extremamente poderoso, tão poderoso que sua força poderia ser sentida de tão longe.

Lonche...” Penmon abaixou suas asas, admirando a energia que sentia.

Acha que... Que isso pode estar na cidade vizinha?

Penmon assentiu com segurança. E Claire pensou o óbvio: Laila também deveria tê-lo sentido, o que era algo bom, porque indicava que provavelmente a menina iria atrás daquela força maior. Foi aliviador. Até que ela percebeu que cometia os mesmos erros que fizera com seus amigos.

Lee também era extremamente poderoso, mas ainda assim Laila o superou...” ela apertou seu peito, sentindo sufoco. “Penmon, não podermos deixar outra pessoa morrer por minha covardia...

Caire... Caire boa.” Penmon gesticulou, aproximando-se das pernas de sua domadora.

Precisamos ir até a cidade vizinha e ajudar essa pessoa.” E animado, o digimon descreveu círculos em torno de sua mestra, que compreendeu a animação de seu parceiro, assim como também sentia o estômago roncar.

Era arriscado fazer aquilo que estava prestes a fazer, pois temia que Laila pudesse senti-la, então mostrou-se mais cautelosa que o normal. Seu Digimon agora estava em estado de hibernação, para que poupasse usas próprias energias e que se presença, mesmo que mínima, não fosse percebida pela atenção indevida. Ao que tudo indicava, Claire havia chegado a uma estação de ônibus vazia. Duas máquinas, uma de pacotes de guloseimas e outra de bebida, estavam dispostas lado a lado, sendo que a única luz do local, além das placas de indicação, provinha das lâmpadas fluorescentes no interior dos equipamentos. Já era tarde da noite, e após muita caminhada e de se certificar que não estava mais em perigo, ela pode descansar.

Ela olhou se materializador, pensando em verificar o horário, mas desistiu. Estava faminta e precisava de forças para chegar até onde queria.

As máquinas necessitavam de dinheiro para funcionar, algo que Claire não via há tempos. Gastou os últimos trocados que havia roubado num motel parado na estrada que pegou até aquela cidade, apenas para fugir no frio da madrugada após um ataque surpresa de sua perseguidora. O parceiro da Laila era um exímio rastreador; trazia consigo traços caninos que não se limitavam a aparência. De alguma forma ele distinguia o cheiro que Claire carregava consigo.

Se fosse de haver outro ataque, já deveria ter acontecido, ainda mais que o ambiente em que estava era propenso para emboscadas. Contudo, ainda com a dúvida em seu peito, a menina se aproximou das máquinas. No lado externo que envolvia sua íris escura, cintilou um brilho arroxeado, num tom próximo do lilás. À medida que se esse brilho formava um anel ao redor do orbe da jovem, as máquinas do ambiente passaram a agir de forma estranha e então, sem nem um tipo de incentivo, doze pacotes de guloseimas e quatro latas de refrigerante caíram para fora do compartimento metálico.

Claire então voltou a si, ofegante e atenta, rapidamente correndo para algum ponto escuro e observando a movimentação. Esperou até dez minutos antes de sair do esconderijo em que estava, sem sinal de Laila. Ela moveu o corpo até onde a comida havia caído e a pegou para si, voltando rapidamente para o local escuro de antes e ali mesmo fez sua refeição.

Por conta do medo, e pelas quatro latinhas, seu olho se quer piscou. Laila e Claire possuíam habilidades únicas, todos os domadores, na realidade. As de Claire envolviam controlar qualquer tipo de aparelho tecnológico. Era um dom bruto, pouco trabalhado, então suas capacidades não iam muito além daquilo que acabara de fazer. Também havia toda a questão de não haver tempo o suficiente para fazer aquilo; quando não estava descansando, estava fugindo de uma certa perseguidora. Houveram certos momentos em que questionou o que mais poderia fazer; em um ataque de pânico num dia não tão distante dali, foi capaz de ligar e controlar um carro por alguns segundos.

Ponderar sobre seus poderes era uma forma de se aliviar, o que incluía imaginar que controlava um exército de aparelhos eletrônicos para destruir Laila. Ah, isso seria bom, pensou. Riu sozinha imaginando televisões voando na direção de sua inimiga até começar a chorar.

Seus amigos, Lee e Maggie vieram em sua memória. Toda aquela emoção de saber que haviam adquirido parceiros e que agora tinham superpoderes não parecia valer mais de nada depois da série de coisas ruins que havia acontecido. Se tivesse sido mais forte, talvez até mais persistente, poderia agora estar com eles de novo. Mas adiantaria alguma coisa? Laila já era tão forte naquela época quanto era agora e seu poder a tornava ainda mais perigosa. O dom dela não estava no que podia se ver, mas sim no sentir. Laila era uma domadora que podia esconder sua presença, dela e de seu parceiro. Era uma doença, sempre a espreita, mas nunca notada. Era como se lutasse com um inimigo invisível.

Não tenho que me lamentar...” falou a si mesma, apertando os joelhos. “Eu tenho que ajudar essa pessoa...

Claire levantou-se, andando até a beirada da plataforma.

Pela Maggie e pelo Lee” suspirou profundamente, fechando seus olhos para depois revelar novamente aquele brilho roxo. “Eu vou ajudar você, seja lá quem você for, e dar um fim a esse inferno

Os sentimentos que borbulhavam em seu peito iam desde medo e raiva até a coragem, e culminavam num olhar de bravura pueril, que temia o desconhecido, mas estava disposto a encarar o que viesse pela frente.

Eu prometo que não vou ser mais fraca, Penmon” a energia transbordava por seus olhos e se espalhou pelo ar.

Monitores ligavam e desligavam e as máquinas tremiam, como se dançassem ao som da trilha sonora de Claire. Um dos ônibus que estava estacionado também fazia movimentos semelhantes e quando as luzes do farol ligaram, Claire estava pronta. Ela o trouxe para perto de si, um ônibus de verdade, que estava atendendo as vontades de uma mente embargada num desejo forte de heroísmo. Ela adentrou o veículo, e sentindo e lembrando-se da direção da qual havia sentido a força poderosa, ela se guiou até a cidade vizinha. A única passageira daquele ônibus estava sendo observada a distância por Laila.

Deveria atacá-la agora.” A voz feminina vinha de um Digimon de pelos amarelados.

“Ela vai nos levar ao dono dessa energia, Lalamon” Laila disse, arrumando os cabelos loiros. “Meu dom me permite ocultar nossa presença, ao troco de ser incapaz de sentir a força alheia. É por isso que somos a combinação perfeita.

“Então, iremos segui-los?” perguntou Lalamon.

Certamente. A deixaremos tomar uma certa distância antes.” Ela levantou seu materializador que possuía uma faixa escura, e na palma de sua mão esquerda cintilava um símbolo estranho de tom cinza. “Evolua

Feixes de luz cinza adentraram o corpo de Lalamon que passou cintilar fortemente enquanto seu contorno mudava de forma, deixando de ser um simples canino com menos de um metro de altura, para assumir a forma do predador letal que era. Quem estava ali agora era Cerberusmon, cujo os olhos treinados eram capazes de distinguir o formado do ônibus a distância. Ele se inclinou, para que sua mestra o montasse e num grande salto, o grande Digimon cachorro saltou na noite e correu atrás do veículo.


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