Swimming Club escrita por Lis Sampaio


Capítulo 10
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

Advinha quem voltou? Eu mesma, queridos. Pensaram que eu tinha morrido? (Eu também pensaria, não julgo). Perdão DE NOVO pelo sumiço. Eu com certeza não vou mais prometer não sumir porque eu simplesmente esqueço de postar sempre, massss para compensar hoje tem um capítulo consideravelmente enorme que eu fiquei com MUITA preguiça de dividir. Talvez tenha um erro aqui ou ali porque eu terminei de revisar quase dormindo e, creio eu, que o próximo sai logo logo pra compensar a demora desse.

Enfim, bom proveito, cupcakes. ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/775974/chapter/10

A semana passou voando, e poderia ser basicamente definida pelo treino cada vez mais intenso do time de natação. Vermont tinha pego pesado com eles, alegando que ainda precisavam de muito mais treino para conseguirem medalhas na grande competição que estava por vir, mas na verdade todos sabiam que o que o treinador realmente estava fazendo era descontar a raiva nos nadadores. Ninguém sabia muito bem o motivo, mas de alguma forma o homem de olhos claros magicamente tinha ficado bem mais estressado do que o normal. Triste para eles, que tinham que pagar o pato no final.

Natalie suspeitava que aquele estresse todo vinha do mesmo motivo que o fizera se exaltar àquela noite no ginásio e sair sozinho depois. Já tinha comentado sobre o assunto com os outros, mas o único que realmente acreditava na hipótese era Gabe — que por sinal não tinha mais trocado muitas palavras com ela desde a última vez.

Era mais uma manhã de domingo corrida para as garotas do dormitório 23. Todas iriam sair naquela tarde para visitar suas famílias, e por isso a muvuca em plenas onze horas da manhã. Natalie estava em frente ao espelho do banheiro, terminando de passar sua maquiagem, quando alguém bateu na porta.

— Abram aí, to ocupada. — Tina falou enquanto remexia suas gavetas. Estava procurando um livro que prometera levar para sua irmã mais nova.

— Eu também to. — Natalie falou enquanto fazia caretas ao passar seu delineador.

Jessica suspirou, terminando de ajeitar os cabelos e indo até a porta. Ela a abriu e se assustou ao encontrar William ali, surpreendentemente vestindo uma camiseta cinza de tubarão que a garota já conhecia.

— A Natalie já tá pronta? — Ele perguntou.

— Bom dia pra você também, William. — A loira ironizou. — Natalie tá se maquiando agora.

— Só mais cinco minutinhos e eu já vou! — A menina exclamou de dentro do quarto.

O garoto revirou os olhos e se encostou no batente da porta.

— Com isso ela quer dizer que vai demorar mais dois séculos. — Ele disse.

— É, eu sei. — Jess deu de ombros. — Gostei da camiseta. A pessoa que te deu deve ter muito bom gosto.

— Ah, você acha? — Questionou, entrando na brincadeira. — Ela realmente tem. Acho que concordo que eu fico muito bem de cinza.

A menina fez uma careta.

— Não devia se achar tanto assim por causa disso. Você só fica menos feio. — Caçoou, cruzando os braços.

Assim como imaginado pelos dois, Natalie ainda demorou um bom tempo pra finalizar a maquiagem. Nenhum deles entendia a necessidade da menina de se arrumar tanto para uma festa de família, mas preferiram não comentar nada a respeito para não ter que ouvir um enorme discurso sobre sua baixa autoestima.

Jess, Tina e os gêmeos, já prontos, desceram para o portão onde os alunos saíam. Já tinham tomado café da manhã mais cedo, por isso só precisavam se preocupar cada um com suas respectivas caronas até em casa.

William tinha a função de carregar a enorme sacola onde estava o urso nadador gigante comprado na semana anterior. Já tinha sido um enorme custo para ele subir e descer as escadas dos dormitórios com aquele trambolho, e agora ainda teria que esperar seu pai com aquilo nos braços.

— Você poderia carregar isso um pouco, não acha? — O menino perguntou à sua irmã gêmea, que balançou negativamente a cabeça.

— Não tenho força física pra isso, sou velha. — Disse, rindo.

O moreno bufou, revirando os olhos. É, talvez estivesse de mal humor naquela manhã. Não era muito legal ter que acordar cedo com o pensamento de se arrumar pra pôr o pé na estrada e ficar duas horas dentro do carro com sua irmã, seu pai e um urso nadador. Não que não gostasse de sua família ou algo assim, ele os amava, mas não tinha um dia melhor pra fazer a festa da Louise?

Ele então olhou para as pessoas ao redor. Além de Natalie e as amigas, havia mais um amontoado de alunos que também tinham o intuito de passar o domingo fora. Talvez houvessem cerca de cinquenta pessoas ali? Bom, aquela era a média para o horário.

Enquanto checava se via algum conhecido ali pra conversar acabou notando, ao longe, a presença do capitão do time de natação. Gabe olhava para a estrada impacientemente, procurando por alguém que nunca chegava. Estranho. Não era ele o cara que costumava passar até mesmo as férias enfiado dentro da escola?

— O Gabe está aí também. — Will comentou, interrompendo a conversa das três amigas.

— Sério? — Tina questionou e o garoto assentiu, apontando com a cabeça para a direção onde o mais velho estava. — Uou, verdade. Que milagre ver ele saindo.

— Né? — Jess concordou. — Parece que alguém da família dele finalmente decidiu aturá-lo. Do tempo que ele passa aqui, eu tenho a impressão de que realmente o largaram como se a escola fosse um asilo.

Natalie, encostada no portão, suspirou.

— Sei lá, na verdade eu acho mesmo que é ele quem se isola. — Disse.

— Isso é fato — Tina falou. — Mas da própria família também?

A garota de cabelos cacheados deu de ombros.

— Vai saber. Dá um pouco de pena.

Depois disso, mudaram de assunto. Estavam conversando sobre um programa de variedades da TV, quando o carro dos pais de Christina chegou.

— Tina! — Duas vozes esganiçadas soaram pela rua, chamando a atenção da garota, e logo os dois irmãos mais novos, Loreen de onze anos e David de sete, apareceram na janela do banco traseiro do carro acenando freneticamente.

Tina olhou para os amigos, rindo.

— Bom, é minha deixa. Falou gente, vejo vocês mais tarde. — Disse, acenando para o grupo e saindo em direção ao carro.

Logo em seguida foi a vez de Jessica se despedir dos gêmeos, com quem esperava sua carona. Seu tio alguns anos mais velho que ela foi quem a buscou, exibindo sua carteira de motorista e avisando que tinha muita coisa pra mostrar para ela no apartamento que tinha alugado para viver com a namorada.

William e Natalie não estavam estranhando a demora do pai. Já fazia algum tempo que estavam ali, até mesmo Gabe já tinha sido pego, mas era de lei – os Campbell sempre estavam atrasados. Demorou um pouco até que o carro prateado aparecesse na estrada e buzinasse para eles.

Os gêmeos se entreolharam e correram até o automóvel, animados para ver novamente o homem sentado no banco da frente que sorria, contente.

— Pai! — Natalie exclamou, abrindo um enorme sorriso ao se sentar no banco da frente. Deu um abraço no homem de poucos cabelos grisalhos, que então se virou para o menino que entrava no carro com a grande chamativa sacola do urso.

— Will, e... o que quer que seja que você trouxe aí atrás. — Riu.

— É o presente pra Louise. — Natalie sorriu.

— Pra Louise? Desse tamanho?

— É claro. — William falou, num tom brincalhão. — Se a gente compra algo menor ou ela estraga, ou engole.

O pai Campbell riu. Não podia discordar da afirmação do gêmeo mais velho.

O homem então deu partida no carro e saiu com os filhos estrada a fora.

— Quero que me contem tudo sobre a escola nova. — Ele disse. — Não tive a mesma vantagem de poder conversar com vocês pelo telefone por todos esses dias como sua mãe teve, então desembuchem. Temos tempo o suficiente para me contarem cada detalhe dessas semanas.

Will e Natalie se entreolharam e não hesitaram em desatar a falar. Queriam literalmente falar sobre tudo, mas era difícil resumir praticamente um mês em palavras. Tinha acontecido tanta coisa, muitas delas extremamente inesperadas, por isso não contiveram a animação em comentar sobre as coisas.

Falaram sobre cada uma das pessoas do clube, da competição, das aulas, dos professores, dos horários... Ainda contaram sobre o tamanho da escola, sobre a quantidade de quadras e sobre como eram sempre bem tratados pelos funcionários. Pro Sr. Campbell, era satisfatório ouvir aquelas coisas, já que estava trabalhando muito duro pra manter os filhos na grande escola de elite para deixá-los seguirem seus sonhos como esportistas. Embora eles tivessem uma boa bolsa de estudos, aquilo não excluía o fato de uma mensalidade numa escola como a S.S ser quase um salário inteiro.

Passaram as duas horas do caminho atualizando o pai das novidades. Ele também contou algumas coisas sobre os dias longe, como por exemplo o fato de ter reencontrado um antigo colega de time, de quando ele ainda era um nadador.

— Richard é quase um socialite agora. — Comentou o homem. — Fiquei surpreso em saber que ele também acabou desistindo do esporte pra se tornar um empresário, mas parece que ele se deu melhor do que eu. — Riu.

— Richard é o cara esquisito da foto de time que você tem colada na geladeira? O de cabelos grandes? — William questionou, curioso. Há tempos não via o pai falar sem problemas sobre o seu passado doloroso no esporte.

— Ele mesmo. — Respondeu o homem.

— Espero que tenha cortado o cabelo. — Natalie disse, fazendo uma careta.

Os dois homens no carro riram, revirando os olhos.

— Bom, mas pelo menos hoje vocês vão conhecê-lo. — Falou. — Chamei Rick pra vir na festa da Louise. Se eu não me engano ele vai trazer o filho também, mas não tenho muita certeza. Acho que o menino é não muito mais velho que a Lou.

— Perfeito, mais crianças pra eu cuidar. — Natalie sorriu, sem nem um pingo de ironia. Ela realmente curtia cuidar das crianças nas festas de família.

Logo, no rádio, uma melodia conhecida pela família Campbell começou a tocar. Era uma música dos anos setenta que sempre ouviam em casa nos dias de faxina. O pai aumentou o som e os três começaram a cantar bem alto, de vidros abertos, como sempre faziam.

E então o restante do caminho passaram ouvindo música. Vez ou outra comentavam sobre algo que tinham esquecido de falar, mas não demorou mais tanto tempo até que chegassem na cidadezinha onde viviam, e, consequentemente no portão da rústica casa repleta de plantas — como esperado da casa dos donos de uma grande floricultura.

O carro entrou pela garagem e o coração de Natalie se acelerou, repleto de saudades. Finalmente a família Campbell estaria reunida novamente.

Xx

Era mais um domingo solitário para Alex. O menino de cabelos castanhos estava na velha quadra, aproveitando um pouco do sol fraco que saía naquele começo de tarde para pensar. Todos estavam visitando os parentes naquele fim de semana, mas admitia não ter tanta vontade assim de fazer o mesmo, principalmente levando em conta que não tinha mais falado com a irmã mais velha desde a outra semana, quando ela finalmente descobriria a história com o clube.

Ah, o clube. Alexander sentia falta de passar os fins de semana vazios cumprindo percursos e apostando corridas com os amigos pela pista, mesmo que correr não fosse sua maior paixão. Ok, contraditório vindo de um medalhista e do antigamente maior corredor do clube, mas na verdade, só tinha entrado naquela por influência da família repleta de prodígios. Valerie, sua irmã, era atriz; o pai era um antigo piloto e a mãe foi modelo quando jovem. Isso o fez procurar uma área pra se destacar também, porque na verdade costumava ser um Zé-ninguém dentro do seu círculo famíliar, e acabou escolhendo o atletismo.

Mas mesmo com tudo isso, tinha pego gosto pela sensação de correr, competir e estar com o time. Era bom fazer parte de uma equipe, bom ter gente com quem sempre poderia contar e melhor ainda poder ter tanta liberdade dentro de um esporte, coisa que não costumava ter em sua vida normal, até... bem, os incidentes da vida acontecerem.

Ok, humanos cometem erros. Alguns até de mais, como era o caso de Alex, mas o menino duvidava que alguém poderia ser tão idiota quanto ele fora em sua vida. Tinha demorado tanto tempo para construir tudo aquilo, toda aquela vida, pra então simplesmente jogar tudo por água a baixo tão facilmente assim em dois dias.

Isso mesmo, dois dias tinham sido o suficiente para Alex trapacear, mentir, enganar os amigos e ainda começar o caos. Suas capacidades problemáticas eram muito boas, diria.

Balançou a cabeça para esquecer o assunto. Depois de tanto tempo deitado naquela grama alta, a luz do sol já tinha começado a incomodá-lo, e foi por essa razão que levantou, limpando suas roupas. Desceu as escadas com um suspiro, chateado por não ter nem Tina pra conversar naquela tarde. A garota tinha ido visitar a família, de acordo com o que lhe contara um dia antes, e por isso deveria chegar só mais tarde.

"Vamos lá em casa também pra você não ficar sozinho, minha família ia adorar que eu trouxesse alguém comigo." Ele se lembrou do convite da mais nova, rindo. Christina definitivamente era uma das pessoas mais interessantes de toda a S.S. Era estranha na maior parte do tempo, sim, mas tinha a capacidade de dizer coisas desconcertantes até mesmo para ele, que a conhecia há apenas algumas semanas.

Se não fosse um cara tão amargurado, provavelmente já teria se apaixonado.

Seus pensamentos, enquanto andava pelo campus, começaram a girar em sua mente involuntariamente. Até que, sem querer, esbarrou em alguém.

— Ah, me descul... — Deteve a sua frase ao olhar para frente e encontrar uma pessoa com a qual não gostaria de se meter no momento. Oliver, o menino negro e de cabelos cacheados que anteriormente também poderia ser conhecido como seu melhor amigo.

Oliver revirou os olhos ao vê-lo, para então o fitar de cima a baixo. Ótimo, tudo o que Alexander mais queria era encontrar com aquela pessoa.

— Além do bom senso, perdeu sua capacidade de andar olhando para frente também? — O menino vestido com o uniforme do clube de atletismo perguntou de forma hostil.

— Talvez, mas pelo visto eu não a perdi sozinho. — Disse, mas sem tanta emoção. Na verdade não estava afim de brigar, só queria sair logo dali.

Oliver trincou os dentes.

— Não sei que tipo de posição você acha que tem pra me responder assim, imbecil.

— É, eu realmente sou um imbecil, agora tem como me deixar passar em paz? — Alexander foi firme em suas palavras. — Não quero ter que socar alguém de novo.

Aquilo foi o estopim para que o menino de cabelos crespos ficasse realmente irritado. Ele apertou as mãos e não se deteve em ir pra cima de Alex, o agarrando pelo colarinho do uniforme e olhando fundo em seus olhos.

— Você realmente não consegue aprender nada, não? Mesmo sendo afastado, excluído, odiado por todos, você ainda assim continua com seu ego enorme e sua ignorância?

O menino arrancou as mãos do ex melhor amigo de sua roupa e tentou sem muito sucesso desamassar o colarinho da blusa cinza do colégio. Respirou fundo.

— Isso não tem nada a ver com você, é um problema meu. — Falou.

— E em problema dos grandes, eu diria, já que por causa disso não vai voltar tão cedo para o clube. — Oliver deu de ombros. — Não sei como já conseguiu arranjar outra amiguinha. Me pergunto se você já contou pra ela o que fez com seus antigos amigos...

Os sentidos de Alex se aguçaram e ele franziu o cenho, olhando para o ex melhor amigo. Como raios Oliver sabia de Tina? Por acaso ele tinha ficado esse tempo todo o espionando?

— Não deveria mexer com a Tina se gostar da sua cara. — Avisou. — Porque dessa vez eu não estou disposto a ficar só num soquinho.

Oliver riu.

— Então quer dizer que ela é seu ponto fraco agora? Você não é nem um pouco original, Campshire.

Alexander respirou fundo, apertando o punho e controlando seus sentidos para que não decidisse socar logo a cara daquele imbecil. Agradeceu então aos céus quando o menino de olhos cor de mel ferozes lhe deu passagem, porém sem tirar aquele sorriso cínico do rosto.

— Não vamos brigar por hoje. Por hoje. — Ele disse e lhe lançou uma expressão desafiadora.

Alexander fulminou o garoto com o olhar antes de sair andando, sem mais tanta paciência. Ele estava certo: aquilo seria só por hoje, porque da próxima o menino de óculos não teria dó em arrebentar aquela pessoa com qualquer que fosse a consequência.

Suspirou ao sair completamente da visão de Oliver. Seu peito latejava em rancor que não deveria ser tão bem guardado. É, melhores amigos realmente poderiam criar um ódio mortal um pelo o outro do dia pra noite.

Xx

— Nati! Nati! — A vozinha fina e esganiçada da pequena Louise, de dois anos, soava pela sala de estar repetindo o mesmo nome desde a chegada dos dois tios à residência dos Campbell.

— Oi meu bebê. — Natalie falou, tirando a criança do chão e a pegando em seu colo, com os olhos brilhando e um enorme sorriso de felicidade.

Se Nat tivesse que listar as coisas mais importantes de sua vida, Louise certamente estaria em primeiro lugar. A sobrinha de cabelinhos cacheados era como seu tesouro mais precioso mesmo antes de seu nascimento, e embora a garota não soubesse de onde vinha aquela maternidade tão forte que tinha pela filha de seu irmão, sabia que era algo como um sentimento pré-estabelecido pelo universo.

A casa estava cheia naquela tarde. Além da família composta por sete pessoas — Sr. e Sra. Campbell, Natalie, William, Louise, Josh e sua esposa Miranda — estavam também alguns outros parentes que tinham ido comemorar o aniversário da caçula da família. Juntos deles, umas três ou quatro outras crianças também vinham de brinde.

Por sorte, a residência era grande o suficiente para caber toda aquela gente.

Enquanto Natalie continuava a brincar com Louise e as outras crianças, na cozinha, William tinha acabado de se enfiar numa rodinha com sua mãe e duas tias.

— Mas o Will está tão grande... — Uma das mulheres de batom comentou.

— Com certeza está cheio de garotas atrás dele. — A outra sorriu para o sobrinho, que corou com o comentário. — Não tem nenhuma namoradinha ainda?

— Que nada. — A mãe Campbell disse, rindo. — William é um mongão com essas coisas. Ele só pega e sai fora.

O menino corou ainda mais e cruzou os braços pra mãe. Como ela sabia esse tipo de coisa?

— Ah, fala sério, você que pensa isso. — A primeira tia riu. ­— Ouvi de Natalie que ele já tem uma... como é que fala mesmo...? Crush.

O menino prendeu o ar. Socaria a cara de Natalie mais tarde, ela ia ver só.

— Não sei de onde ela tirou isso. — Ele riu, constrangido. De fato, não sabia.

A mãe cruzou os braços e olhou pra ele, se segurando para não rir.

— Como assim, William, você tem uma pretendente e não me disse nada? — Ela caçoou.

— Ô Natalie — A tia gritou para a sobrinha. — Como era mesmo o nome que você tinha dito pra mim por mensagem? O nome da crush do Willy.

— É Jessica. — Natalie gritou de volta, lá da sala.

William ficou vermelho, como talvez nunca tivesse ficado antes. Jessica? Não, ele definitivamente não era apaixonado por Jessica. Pelo menos não ainda. Não tanto assim. Não do jeito que Natalie ou suas tias imaginavam.

— Jessica, Will? — Sua mãe arqueou uma das sobrancelhas, com um tom malicioso. ­— É um belo nome. Eu aprovo esse relacionamento.

E então seu rosto ficou ainda mais vermelho e ele por pouco não cavou um buraco no chão da cozinha e se enfiou dentro dele, pra não sair eternamente.

Na sala, Natalie estava sentada numa rodinha brincando de blocos de montar com as criancinhas, gargalhando por dentro enquanto imaginava a expressão do gêmeo mais velho durante a conversa com as tias. Ela com certeza seria morta depois do fim da festa, senão antes.

— Nat — Seu pai chamou — o presente enorme que comprou pra Louise ainda está no carro, deveria ir lá pegar logo antes que esqueça.

— Ah, certo. — Ela se levantou, e então no mesmo momento a campainha da residência soou.

O patriarca da família abriu um grande sorriso.

— Deve ser o Richard e seu filho. — Disse, animado porque finalmente veria o antigo amigo.

— Richard? — O avô paterno, que estava sentado no sofá ao lado do filho, questionou. — Seu amigo Rick Cabelão?

O homem grisalho assentiu animadamente, e então se levantou. Natalie saiu junta ao pai, e embora fosse tímida, estava curiosa para saber como estava o cara esquisito daquela antiga fotografia. Antes de se deter no portão de entrada, destravou o carro que estava na garagem e pegou o enorme urso nadador que anteriormente tinha sido abandonado no banco estofado do automóvel. Coitado, tinha ficado todo aquele tempo ali sozinho.

A alguns metros, ouviu o som do portão se abrindo, seguido de uma voz grave que cumprimentou seu pai.

— Gerald, você não mudou nada! — Exclamou.

— Não posso dizer o mesmo. O que houve com os cabelos, Rick? — Questionou rindo.

— Tiveram que partir por motivos de trabalho. — O outro homem o acompanhou na risada. — Esse aqui é meu filho Gabriel.

— Muito prazer, Gabriel. — A voz do Sr. Campbell pôde ser ouvida.

Natalie entrou com o urso ao ouvir os passos dos convidados e o deixou em cima do sofá, chamando a atenção de todas as crianças.

— Não, nada disso, esse aqui é o presente da Louise pessoal. — Falou com seu tom de professora do jardim de infância. — Onde ela está? Não deem isso pra ela ainda, ouviram?

Os quatro pequenos assentiram.

Foi então que, ao mesmo tempo que seu pai entrou conversando com um homem de barba, terno e cara de mau, a pequena Louise cruzou a sala correndo e indo em direção justamente deles.

— Ei, Louise! — Chamou a menina, indo correndo atrás dela sem prestar muita atenção nas pessoas que entravam. A pequena agarrou a perna de um deles, e foi só então que Natalie, num misto de surpresa olhou para cima. Ela entrou em choque no momento em que seus olhos se encontrarem com os de... Gabe?

Eles se encararam por alguns segundos, extremamente surpresos, até Natalie cortar o contato ao abaixar para pegar a sobrinha do chão.

— Ah, essa Louise... ­— Seu pai resmungou, se virando então para a menina de cabelos cacheados. — Natalie, não cumprimenta os convidados? Esse é o Rick e seu filho Gabriel.

Ela limpou a garganta e deu seu melhor sorriso. Gabe a olhou de cima a baixo, ainda perplexo.

— Hã... Oi. — Acenou para eles.

— Oi! — Louise repetiu, arrancando um sorriso do homem de barba.

— Muito bom conhecer a famosa Natalie. Seu pai falou muito de você, soube que é uma ótima nadadora. — Ele disse, e então olhou para o filho. —Vocês vão se dar bem, devem ter a mesma idade, não? Gabriel também nada, ele tem medalhas e tudo.

Novamente os dois colegas de clube se encararam. Natalie coçou a nuca.

— É, eu meio que já sei disso. — Falou, fazendo os dois adultos formarem uma expressão curiosa no rosto. — Gabe e eu somos da mesma escola e... do mesmo clube de natação.

Richard e o Sr. Campbell se entreolharam, surpresos.

— Natalie também está na S.S? — O ex-cabeludo perguntou.

— Sim, ela e William ingressaram há um mês lá. — Falou.

— Que coincidência enorme. — Observou, rindo. — Nossos filhos estudando no mesmo lugar sem sabermos.

— Nem me fale. — O acompanhou na risada. — Bom, Natalie, cuide do seu colega de clube e o apresente pro restante da família. Vou levar Rick pra ver sua mãe.

Natalie assentiu, um pouco hesitante, vendo os homens saírem em direção à cozinha. Gabe, que olhava na direção do pai com uma expressão de poucos amigos, desviou o olhar para a menina de cabelos cacheados e eles se encararam.

— Seu nome é Gabriel? — Foi a primeira coisa que Natalie perguntou.

— Sim, é Gabriel. — Ele respondeu meio distraído, ainda confuso com aquela coincidência. — Isso é estranho.

— Muito estranho. — Concordou. — Nossos pais são amigos.

— É, eles são.

Os dois adolescentes ficaram então parados ali, até Louise, ainda no colo da tia, exclamar com sua voz fofa:

— Gabiel!

O menino de cabelos castanhos deu um pequeno sorriso com aquilo. Era extremamente raro ver Gabe sorrir, Natalie observou, o garoto estava sempre mal-humorado, então era surpreendente ver uma expressão daquelas vinda por causa de uma criança. Jurava que ele era do tipo que odiava qualquer forma de vida humana.

— Bom, fique à vontade. — Natalie falou, pondo Louise no chão. — Eu não vou te fazer passar o constrangimento de ser apresentado pra todos na casa, então... está livre de mim. — Sorriu fraco.

Menino assentiu, e então finalmente se lembrou da caixa embrulhada que tinha em mãos. Ele a estendeu para a colega de clube.

— É pra sua sobrinha. — Falou.

— Ah, valeu... — Natalie pegou a caixa, e com isso veio à sua mente a vez em que se encontraram no shopping, no domingo anterior. — No dia que nos encontramos na loja de brinquedos, você ia comprar o urso nadador pra ela?

Gabriel assentiu.

— Ia. — Falou.

— Então ela ia ganhar isso de qualquer jeito? — Perguntou a si mesma, reflexiva. — Deveria ter deixado você comprar, teria economizado bastante dinheiro.

O garoto de cabelos castanhos riu baixo, e então se dirigiu até o sofá, se sentando ali. Natalie, deixando o convidado sozinho no cômodo, correu até a cozinha e puxou seu irmão da rodinha das tias, sem nem pedir licença. Sussurrou:

— Gabe está aqui.

— Gabe? — Ele perguntou. — Ah, certo, o pai acabou de passar aqui falando que tinha um colega de clube nosso na sala, mas eu pensei que fosse o urso gigante, não o Gabe.

— Pois é, Willy, pois é. — A menina falou. — Isso é estranho. Tenho que ficar fazendo sala pra ele.

William a fitou, cruzando os braços, com um sorriso cheio de satisfação.

— Nisso que dá falar pros outros que eu gosto da Jessica. — Disse. — Boa sorte com o seu melhor amigo.

— Ah não, William, nem vem. Você não pode me deixar fazendo sala sozinha. — Ela falou ao irmão. — Sério, não pode de jeito nenhum.

— Não posso? Pois já deixei. — E dito isso, ele saiu de perto da gêmea mais nova, voltando à rodinha onde ainda estava a mãe e as tias com um ar completamente satisfeito.

— Merda... — Murmurou para si mesma.

Ela então voltou à sala, onde Gabe mexia no celular sem muito interesse no restante da festinha. Apenas ele estava ali, já que até mesmo os avós da família estavam na cozinha socializando, o que seria cômico se não fosse trágico. A garota tirou o urso gigante de cima do sofá e então chamou as crianças, que corriam pela casa.

— Podem ir entregar isso aqui pra Louise agora. — Falou, e todas elas ficaram afobadas de repente. — Sem briga. — Falou firme, e eles assentiram.

Logo pôde ser ouvida uma gritaria geral dos pequenos. Louise parecia ter gostado bastante do presente, e as outras crianças aproveitavam o enorme urso juntos dela no chão da sala.

— Você se dá bem com as crianças. — Gabe observou, a vendo se sentar ao seu lado no sofá.

— Tive que aprender a me dar bem com elas. — Comentou. — Sou a babá da família. E da igreja.

— Não tenho esse problema, minha família não tem crianças e eu não vou à igreja. — Ele deu de ombros.

— Tá explicado porque você é tão chato, sequer convive com crianças.

Gabe revirou os olhos.

— Se esse fosse o problema, você seria muito legal.

A menina de cabelos cacheados arqueou uma das sobrancelhas, pronta para rebater a fala do capitão, quando atrás deles a voz do pai dos Campbell soou:

— Ei, vocês, venham socializar e comer alguma coisa. — Chamou os dois adolescentes. — Tem alguns doces.

Sem muita opção, os dois apenas se entreolharam e saíram para a cozinha, onde a família se amontoava ao redor de uma mesa para pegar os doces. A mãe dos Campbell era quem distribuía a comida. Gabe, vendo aquele monte de gente, parecia extremamente desconfortável e louco para ir embora. Pela sua cara, não estava ali por opção própria, e encontrar a colega de clube lá tinha sido uma infeliz coincidência do destino.

— E quem é esse mocinho aqui com você, Nat? — A avó materna da menina, que desfrutava de um potinho com gelatina, perguntou, e logo abriu um sorriso. — É o namorado que William me contou?

Natalie demorou a entender, e logo suspirou. Deveria se lembrar de nunca mais fazer nada com Will, porque a vingança era sempre mil vezes pior.

— Não, William é idiota. — A menina falou. ­— Esse é o Gabe, o filho do amigo do pai.

— Ah, então você é o Gabriel? — A mulher de cabelos brancos perguntou, com um sorriso admirado. Aquele olhar tão cheio de expectativa fez Gabe corar. — Seu pai estava falando de você agora mesmo. Deve ser o orgulho dele, não?

O menino assentiu, mas talvez mais por educação do que por realmente concordar, com uma expressão mais sombria do que o normal. De algum modo ele não parecia ser tão próximo do pai.

— De toda forma, você é um menino muito bonito. — A avó pôs a mão no ombro do garoto recém-conhecido. — Não sei porque, mas todo astro do esporte tem boa aparência, não acham? — E dito isso com seu tom gracioso de velhinha, a mulher saiu, deixando o questionamento no ar.

O tumulto na mesa aos poucos foi se dissipando, com a saída das crianças dali. Não demorou para Natalie ir feliz da vida atrás de alguns brigadeiros, enquanto Gabriel continuava parado. Ele olhava para a roda de conversa onde estava o pai com aquela mesma expressão de antes, distraído, quando a menina o cutucou.

— Olha, a gente não se dá bem nem nada, mas você devia ser menos chato pelo menos hoje. — Falou. — Vai conversar com as pessoas, isso é uma festa infantil. Tem doces, pessoas, crianças...

— Não gosto de festas. — Ele deu de ombros. — E eu só conheço você e seu irmão aqui. Vamos mesmo entrar num diálogo amigável?

A garota de cabelos cacheados revirou os olhos.

— É melhor do que ficar aqui parado com cara de tacho, não acha? — Questionou. — Pega um docinho aí e para de ser chato. Vamos fingir que nos damos bem. — Ela então deu em sua mão um dos brigadeiros que carregava num pratinho de plástico, e ele encarou o doce por alguns segundos.

— ...Obrigado, eu acho.

E depois disso, a festa finalmente pareceu começar. Não demorou para as tias integrarem os dois adolescentes deslocados nas conversas, e isso fez com que até mesmo Gabriel se soltasse mais do que o esperado — o que significa que ele estava falando, nada de tão extraordinário assim.

Louise foi o centro das atenções. A menininha vestida de princesa parecia mais animada do que nunca por todas aquelas pessoas ali, e logo mais outras crianças da família começaram a chegar para fazer companhia. Pouco tempo depois, a casa dos Campbell tinha virado um verdadeiro jardim de infância. Gritaria, musica infantil, balões e desenhos por todos os lados. A diferença era que os encarregados de cuidar daquela multidão de primos e sobrinhos não eram ninguém mais e ninguém menos que os dois adolescentes desocupados, Gabe e Natalie.

O mais engraçado da família Campbell era que, embora Natalie e William fossem gêmeos, Will era o cara que ficava livre de qualquer tarefa por estar sempre socializando com os adultos. Isso não fazia o mínimo sentido, já que ele era tão desocupado quanto a irmã, mas já tinha virado quase um costume então Natalie sequer se incomodava mais.

— Olha minha pizza de massinha, Nat! — Bree, uma das priminhas mais novas, exclamou. Estavam todas as crianças e os dois "cuidadores oficiais" sentados no chão da garagem brincando de fazer comidas com massa de modelar quando a baixinha se aproximou.

Natalie olhou o amontoado de cores num formato achatado e sorriu.

— Está ótima, Bree. Parece deliciosa. — Disse, arrancando um enorme sorriso desdentado da garotinha de tranças.

Ao lado de Natalie, Gabe pigarreou, sussurrando:

— Você mente para crianças frequentemente assim?

A menina revirou os olhos, segurando a risada.

— Não vou estragar os sonhos deles. — Falou. — E aquela pizza estava ótima tá?

O garoto balançou a cabeça em desaprovação, contendo um sorriso e sem tirar os olhos da massa em suas mãos. Ele estava distraído com sua escultura do que quer que fosse aquilo, quando Tony, um dos únicos meninos pequenos da família, se aproximou dele e exclamou:

— Um pinguim!

O garoto de brincos se assustou com tal afirmação tão espontânea, e logo o amontoado de crianças correu para ver o animalzinho feito em massa de modelar cor-de-rosa. Gabe se encolheu.

— Primo, faz um pinguim pra mim? — Uma das crianças falou com uma vozinha esganiçada.

— Eu também quero um! Faz um pinguim verde pra mim, primo? — Outra disse, estendendo sua massinha.

— Também quero, também quero!

Gabriel olhou para Natalie praticamente clamando por ajuda imediata. A menina gargalhou com aquela expressão tão desesperada.

— Espera aí, gente. — Ela disse, intervindo. — Gabe é só um. O que acha de ele ensinar vocês a fazerem um pinguim? Assim vão poder fazer sozinhos.

Os pequenos se entreolharam, assentindo em concordância.

— Sério mesmo, Natalie? — Questionou o capitão, a fitando com um olhar desanimado.

— Seríssimo, Gabe. — Falou, rindo.

O menino suspirou, vendo as crianças formarem um círculo ao seu redor. Logo pegou um outro pedaço de massinha e começou a explicar pacientemente aos pequenos o passo a passo para fazer o animalzinho, enquanto eles o olhavam com atenção, tentando repetir o que o mais velho fazia. Obviamente os resultados não foram os melhores já que se tratavam de crianças com uma idade média de seis anos, mas os pequenos não pareciam se importar muito com isso, pois ao final da escultura todos brincavam felizes da vida com seus pinguins.

Foi então que Joshua, o irmão mais velho da família Campbell e pai de Louise, apareceu na garagem e se dirigiu aos dois adolescentes:

— Eu assumo eles agora, podem ir comer. — Sorriu para os dois. — Ficaram bastante tempo aguentando essas pestinhas já.

Eles riram com o comentário e agradeceram ao mais velho, se levantando do chão e voltando para o lado de dentro, onde todos os adultos conversavam. Se aproximaram da mesa de doces e pegaram algumas coisas pra comer, quando Natalie falou:

— Você não foi tão mal assim cuidando das crianças. Não para um iniciante.

Gabe riu baixo.

— Eu sou bom em tudo o que eu faço. — Disse. — Até se isso envolver crianças.

— Quanta humildade, estou chocada. — Revirou os olhos.

Eles então foram para o sofá, no mesmo momento em que o celular de Natalie vibrou no bolso de sua blusa. Era do seu grupo com as outras garotas.

"Tina enviou uma mensagem em Dormitório 23"

Ela então abriu a mensagem e notou que se tratava de uma foto de um menininho sem o dente da frente com uma careta esquisita. Logo em seguida outras fotos começaram a chegar, e isso incluía fotos de Tina provavelmente tiradas despercebidas comendo um pedaço de pizza e amarrando os cabelos de uma menina pequena.

Natalie ficou sem entender muito bem, principalmente quando letras aleatórias começaram a ser enviadas, juntas de alguns emojis. Até que finalmente uma mensagem escrita e entendível chegou:

Tina: "Meu irmão mais novo pegou o celular, desculpa aí gente"

A menina de cabelos cacheados riu com aquilo. Se lembrava da amiga comentar as vezes sobre o quanto seu irmãozinho era uma peste e imaginava que fosse apenas exagero dela, mas de fato não era.

Não demorou para mais mensagens chegarem:

Jessica: "Seu irmão é muito fofo, Tina."

Rachel: "É mesmo kkkkkkk"

Tina: "Até vocês conviverem com ele."

Do outro lado da tela, Natalie riu e digitou rapidamente:

Natalie: "Parece que alguém está aproveitando o domingo"

Tina: "Nem me fale. Mal cheguei em casa e já virei uma escrava. Como está sendo o dia de vocês?"

Rachel: "Sei lá, acho que estou doente"

Jessica: "Legal, acabei de fazer uma lasanha com meu tio"

Natalie pensou um pouco. Como estava sendo seu dia? Ela então olhou para o lado discretamente, vendo Gabe mexer no celular completamente distraído e deu de ombros. Até que passar um tempo com aquele cara não estava sendo tão ruim, levando em conta de que nos últimos dias eles tinham se tornado um pouco menos... hostis um com o outro. Se isso fosse há algumas semanas, ela provavelmente já teria matado o menino de cabelos castanhos.

— Ei, não tem problema se eu contar pro pessoal do clube que você está aqui, né? — Questionou.

Gabriel deu de ombros.

— Não, eu acho. — Ele respondeu. — Desde que não fale que eu ensinei crianças a fazerem um pingum.

Rindo, Natalie tirou discretamente uma selfie com o garoto distraído ao seu lado, e enviou, dizendo:

Natalie: "Meu dia está bom, se pensarmos que Gabe está aqui em casa desde cedo, sentado do meu lado, e nós ainda não discutimos"

Tina: "O quê??????"

Natalie: "É, por coincidência do destino, o pai dele é antigo colega de clube do meu pai"

Jessica: "Fala sério, logo do Gabe?"

Natalie: "Sim, logo o Gabe"

Tina: "Parece começo de história de amor"

Jessica: "Não começa, Christina"

Tina: "Mas é"

Natalie riu com o diálogo, e então bloqueou novamente a tela do aparelho, voltando a dar atenção ao garoto ao seu lado. Ele, com as sobrancelhas arqueadas e um olhar concentrado, jogava um jogo de piano no celular.

— Posso jogar depois? — Perguntou. Natalie era um pouco fissurada por joguinhos de celular.

Aquilo fez com que o menino se distraísse e perdesse. Ele a fitou, anotando mentalmente o quanto a menina poderia parecer uma criança às vezes, e entregou o aparelho nas mãos da colega de clube. Natalie sorriu e iniciou o jogo.

Passados alguns minutos, Gabe pigarreou, começando a dizer com sua costumeira falta de emoção aparente:

— Eu tenho uma pergunta.

— Pode dizer. — Natalie falou, sem tirar os olhos da tela do celular.

— Hã... meu pai disse que o seu pai desistiu da natação quando estavam próximos das olimpíadas. Você sabe o motivo? — Questionou. — Sem querer ser invasivo nem nada. É só uma curiosidade.

Natalie respirou fundo e então pausou a partida do jogo. Ela olhou ao redor, pra ter certeza de que o progenitor não estava por ali, e então disse:

— Ele desenvolveu um trauma. De água.

Gabe ficou algum tempo em silêncio após absorver a curta informação, para então perguntar:

— Que nem... a Jessica?

Natalie assentiu.

— Como foi isso?

— Bom, quase do mesmo jeito que a Jess. O treinador deles era muito casca grossa, pegou muito no pé do meu pai e acabou que ele decidiu ir treinar sozinho fora de horário. Só que aí ele acabou tendo uma câimbra no meio do treino e se afogou porque não tinha ninguém lá. — Resumiu a história. — Por sorte minha mãe estava indo ver ele e o encontrou antes que algo ruim acontecesse. — Balançou a cabeça. — Não gosto de pensar nisso. Eu era criança na época, mas ainda me lembro de alguma coisa.

Gabe assentiu, demonstrando que tinha entendido toda a história. Engoliu a seco a culpa que lhe subiu à garganta. Na situação da Jessica, ele tinha sido o treinador casca grossa que estragou tudo, embora custasse a admitir isso a si mesmo ou a qualquer outra pessoa.

Enquanto isso, na sala de jantar, William ainda estava rodeado de adultos. Ele tinha uma Louise adormecida no colo e várias pessoas falando ao seu redor. Bom, embora sempre se gabasse por ter vantagens sob Natalie, talvez ficar com as crianças não fosse tão perturbador assim.

— William, eu tinha esquecido de comentar, mas essa camiseta é nova? — O pai Campbell comentou.

— Ah... é, é nova. — Falou, já sabendo que seria motivo de piada caso contasse que fora um presente da, agora tão famosa em sua família, Jessica.

— Quando você comprou isso? Achei bem a sua cara. — A mãe falou, rindo.

— Hã... não foi bem eu que comprei. Ganhei de presente. — Ele deu de ombros.

Uma das tias que estava ao seu lado sorriu sugestivamente com aquilo.

— Essa Jessica está te comprando com camisetas? ¬— Perguntou, fazendo o menino arregalar os olhos, surpreso com a adivinhação. — Bom, pelo menos tem bom gosto. Você fica bem de cinza.

A mãe olhou pro filho, que estava corado.

— Ela quem comprou? Uou. — Assoviou. — Vai que é tua, Will.

Ele afundou o rosto nos braços sob a mesa de vidro, desacreditado com a situação. Maldita hora em que Natalie contou para a tia sobre Jess, afinal, a sua família era simplesmente formada em fazer piadas constrangedoras sobre namorada. Formada não, inventora do termo. 

O restante da festa passou voando. Os Campbell e pai e filho convidados aproveitaram mais do que o esperado com a comida, os doces, as crianças e até a hora do parabéns. Gabe tinha fica admirado com todo o calor que vinha daquelas pessoas, a animação e felicidade numa simples festa infantil, e concluiu que aquelas pessoas eram ligadas por um laço familiar muito, mas muito forte — coisa que o mesmo nunca tinha experimentado antes, já que sua família estava longe de ser próxima.

Conseguiu concluir também, depois de um dia inteiro ao lado de Natalie, que ela não era uma pessoa ruim e muito menos de se desprezar, pelo contrário. Sua impressão ruim dela já vinha caindo há algum tempo, mas naquele momento definitivamente não existia mais. Sentia inveja da garota em tantos aspectos que sequer poderia mencionar, mas uma coisa também cresceu naquela noite: a admiração. Gabriel finalmente tinha decidido admitir a si mesmo sobre admirar a colega de clube, tanto em aspectos pessoais quanto profissionais. Ela era boa no esporte, boa com os amigos e surpreendentemente boa com ele também — aquilo já era o suficiente pra ganhar dele aquele sentimento especial.

A festa não acabou muito tarde. Logo eles tinham que voltar pro internato, depois de mais uma longa viagem no dia, e por isso se despediram rápido do restante das pessoas. Natalie, por sua vez, se deteve especialmente na pequena Louise, que a abraçou aos prantos vendo a prima ir embora mais uma vez e agradeceu pelo urso gigante à ordens da mãe. Enquanto isso, o gêmeo mais velho, como o bom revoltado do dia, entrou no carro sem muitas cerimônias, já que Josh tinha começado a importuná-lo mais uma vez a respeito de Jessica acompanhado das tias.

Não surpreendentemente, o Sr. Campbell ofereceu carona a Gabe para a escola, por motivos óbvios de que iriam todos para o mesmo lugar. O menino prontamente aceitou, sem fazer muita questão de se despedir do pai também, e internamente agradeceu por não ter que ficar mais duas longas e tortuosas horas com o homem dentro do carro.

Xx

Rachel se sentia doente. Em seu dormitório, a menina se revirava pela milésima vez sob o edredom, em meio aos travesseiros que deixava espalhados pela cama, enquanto sentia os dedos formigarem. De algumas horas até lá, a febre e o mal estar tinham piorado, e estar sozinha no quarto também não ajudava muito na recuperação — ainda mais quando não se tinha ninguém para ir com ela até a enfermaria.

Não sabia exatamente o motivo daquilo tudo. Tinha começado do nada, depois de dormir mais que o habitual por ter passado boa parte da noite sem conseguir descansar, e desde então só tinha piorado. Suas colegas de quarto, Camile e Brianna, tinham levado alguma coisa para ela comer antes de saírem para o shopping e até se ofereceram para chamar a enfermeira, mas como sempre fora muito cabeça dura, Rachel simplesmente negou a ajuda — imaginava que logo estaria bem novamente.

Erro da garota. Na verdade, nem sabia porque tinha ficado sem aceitar. Se conhecia o suficiente para saber que, além de ficar doente com extrema frequência, tinha o sistema imunológico tão péssimo a ponto de deixá-la mal por muitos dias depois de uma simples gripe.

Suspirou, se sentando no colchão macio, já farta de continuar ali. Até mesmo o ar estava mais pesado de se respirar dentro daquele quarto, e embora soubesse que era arriscado sair sem mais nem menos, não podia continuar trancada assim. Vestiu duas blusas e ajeitou os cabelos antes de sair pela porta da frente. Ela não sabia muito bem pra onde queria ir, mas só aquele maravilhoso ar fresco da noite já estava a deixando menos morta.

Pensando bem, talvez soubesse realmente o motivo de estar tão mal. A carta. Era óbvio, porque não conseguira tirar aquilo da cabeça por um segundo sequer desde aquele dia, mesmo com os conselhos de Eric que vinha pedindo frequentemente no decorrer da semana. Definitivamente aquilo estava não só acabando com sua saúde mental, como com a física também. Era ruim ter aquela indecisão e não saber como agir, mesmo com os tão bons conselhos que recebera de seu amigo universitário. E tudo só piorava quando percebia que nem sequer suas amigas poderiam ajuda-la naquela situação.

Suspirou mais uma vez e se sentou no banco em frente a fonte que havia na área verde do dormitório feminino, com o rosto apoiado nas mãos, olhando para o nada. Foi então que a menina tomou um grande susto com o par de mãos magras que deu-lhe um empurrãozinho por trás. Se virou, vendo que se tratava de Jessica, que ria do susto da amiga.

A garota de pele cor de bronze balançou a cabeça em discordância, rindo baixo.

— O que está fazendo sozinha aqui? — A loira questionou, sentando-se ao lado da amiga.

Rachel deu de ombros.

— Tomando um arzinho. Você chegou agora?

Jessica assentiu.

— Deve fazer um quinze minutos que meu tio me deixou aqui. — Respondeu. — Você está bem? Está com uma cara...

— Doente, pra variar. — A garota suspirou. — Fiquei a tarde toda de molho.

— Ah, certo, você falou sobre isso no nosso grupo. Bem que eu deveria ter imaginado. Febre?

Rachel assentiu e então voltou a olhar para o nada, reflexiva. Jessica, notando aquele ar da amiga, já sabia que não era apenas a doença que a incomodava. Embora estivesse um pouco distante de todas nos últimos dias, ainda sabia reconhecer aquele tipo de coisas de longe. Era quase um dom.

— Desembucha, o que aconteceu?

Rachel olhou surpresa pra menina, então tentando formular uma expressão séria convincente o suficiente.

— Não aconteceu nada.

— Você acha mesmo que consegue me enganar, Rae? Eu te conheço há séculos.

Ela respirou fundo e deu de ombros.

— Não é nada que você tenha que se preocupar, Jess. Alguns problemas aqui e ali, mas...

Jessica revirou os olhos.

— Eu quero a verdade.

Rachel então fitou a mais velha, e sentiu o medo entalar em sua garganta. Não conseguia esconder nada das amigas por muito tempo, principalmente da confiável Jessica, que sempre lhe dava os melhores conselhos, mas aquela situação... deveria mesmo contar antes de tomar uma decisão? Não achava que aquilo fosse ser muito vantajoso, mas esconder tudo também não seria — e além disso, estava lhe fazendo extremamente mal.

A menina puxou o ar pelo nariz e então finalmente soltou toda aquela carga pesada de seus ombros quando falou:

— Eu fui aceita na Wild Winters, e tenho um mês pra decidir se vou ou não pra fora do país.

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Swimming Club" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.