Driver escrita por oicarool


Capítulo 1
Driver




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Ele a observava todos os dias, pelo espelho retrovisor. Era parte do seu trabalho ficar em silêncio, falar apenas quando fosse questionado ou quando fosse estritamente necessário. Precisava carregar as sacolas de compras, levar cada membro da família Benedito para onde precisavam ir. Quase todos faziam questão de conversar com ele, saber sobre sua vida, exceto por ela. Elisabeta Benedito sempre entrava no carro calada, e assim seguia até o seu destino – geralmente a casa de alguma amiga, a casa de chá, o parque.

Elisabeta não era uma pessoa triste. Ela sorria genuinamente sempre que estava com outras pessoas. Sabia por seus colegas que era a filha mais generosa de Felisberto. Passava horas na cozinha conversando com os criados. Mas com ele, Elisabeta não conversava. Talvez ela apenas não gostasse de conversar enquanto ele dirigia, talvez apenas não estivesse interessada nele.

Quando sua família perdeu tudo, obrigando Darcy Williamson a procurar um emprego comum, imaginou que jamais se adaptaria. Mas, como seu pai sempre dissera, nada mais estimulante do que a necessidade. E, precisando pagar as contas e sustentar sua irmã menor, Darcy aceitou sem pestanejar o salário generoso de Felisberto. E há pouco mais de dois meses era o motorista dos Benedito.

Naquela noite, em especial, levava Elisabeta de volta para casa depois de um baile. Ela vestia um vestido vermelho escuro, bordado com todas as pedras que indicavam as posses de sua família. Darcy sabia que, se a conhecesse há um ano, ficaria encantado por ela. Céus, estava encantado por ela agora. Mas haveria uma chance de conquista-la se ainda fosse o herdeiro de um título inglês. Agora era apenas um imigrante que não tinha onde cair morto.

— Eu odeio estas festas. – ela resmungou, e Darcy perguntou-se se estava realmente falando com ele.

Assentiu, por via das dúvidas.

— Você não? – Elisabeta perguntou, erguendo a sobrancelha. – Soube que costumava viver na alta sociedade.

— Sim, senhorita. – respondeu, educado.

Elisabeta observou o semblante do motorista. Ele era fantástico. Dos olhos azuis aos cabelos sedosos, da forma como se vestia impecavelmente, mesmo em um uniforme qualquer. Darcy era alto, imponente. E Elisabeta sabia que precisava se manter afastada dele. Soube no instante em que o viu pela primeira vez e sentiu seu corpo despertar em interesse.

— Elisabeta. – ela disse, ignorando a si mesma.

— Perdão?

— Elisabeta, o meu nome é Elisabeta. Eu não gosto de formalidades.

Deveria manter-se afastada, mas acabara de sair de uma festa entediante. E Darcy era o homem mais interessante que encontrara naquela noite. Se fosse sincera, em toda a sua vida. E queria saber mais sobre ele. Queria conhece-lo.

— Como quiser, Elisabeta. – ele sorriu de lado.

— E então, os bailes? – ela questionou novamente.

— Considero que a melhor parte de ficar pobre é não precisar frequentar um baile nunca mais. – Darcy disse, fazendo Elisabeta rir.

— Me desculpe, eu não deveria rir de algo assim. – ela cobriu a boca com a mão enluvada.

— Fico feliz por entretê-la. – ele sorriu. Gostava de ouvi-la rir.

— Ainda é cedo. Vamos dar uma volta pela cidade. Eu gostaria de ouvir a sua história. – Elisabeta disse, de súbito.

— Para onde a senhorita gostaria de ir? – Darcy perguntou, confuso.

— Me surpreenda. – Elisabeta deu de ombros.

Darcy não pensou duas vezes. Havia um lugar que gostaria de levá-la. Seria o lugar onde a levaria se tivesse a chance de fazer a corte. A levaria a um excelente restaurante, e então, a levaria para ver as estrelas. Suspeitava que Elisabeta gostaria disso. E mesmo que nunca tivesse a chance de se aproximar como gostaria, queria vê-la feliz.

Era um lugar um pouco afastado do centro da cidade, Elisabeta percebeu. Estava curiosa, e sentia um frio na barriga. Não sabia porque estava fazendo aquilo. Havia sido cuidadosa nos últimos dois meses, evitando aproximar-se demais dele, evitando dar ainda mais motivos para ficar encantada por ele. Já bastavam os dias em que ficava em sua janela admirando aquele homem tão fascinante.

Seu pai contara sobre ele. Filho de um nobre que havia falecido coberto por dívidas. Todo o dinheiro da família havia sido usado para as dívidas, com exceção do pagamento de um colégio interno renomado para a irmã mais nova de Darcy. Ele ficara sem qualquer patrimônio, e ainda assim Elisabeta nunca o vira reclamar ou ficar contrariado. O carro parou de repente, no que parecia o meio do nada.

— Eu devo ficar com medo? – Elisabeta ergueu a sobrancelha.

— De forma alguma, Elisabeta. – Darcy sorriu abertamente. – Nós vamos ver as estrelas.

Darcy saiu do carro, e abriu a porta para que Elisabeta saísse. Segurou a mão dela para ajuda-la a descer. Já havia feito aquilo muitas vezes, mas parecia diferente naquele dia. Parecia haver uma eletricidade no ar que Darcy não podia explicar.

Elisabeta olhou para o céu, e realmente nunca o vira tão belo. As luzes da cidade ofuscavam a imensidão das estrelas. A lua cheia brilhava lá em cima, gerando iluminação suficiente para que Elisabeta identificasse os olhos de Darcy. Seus olhares se encontraram e Elisabeta sentiu um arrepio percorrer seu corpo. Engoliu em seco, voltando a olhar para as estrelas.

Darcy encostou-se no carro, e em uma voz mansa, começou a falar sobre estrelas. Sobre constelações, sobre seus nomes e explicações. Elisabeta nunca havia pensado tanto sobre aquilo. Mas ali, percebeu a dimensão do mundo. O quanto era pequena perto daquilo tudo, do que poderia haver em cada um daqueles pontos brilhantes no céu. E enquanto Darcy olhava para o céu, Elisabeta viu-se perdida ao olhar para ele.

Demorou um pouco para que Darcy percebesse, mas Elisabeta capturou sua atenção, como parecia fazer desde que a vira pela primeira vez. Seu olhar se uniu ao dela, e algo mudou no ar.

— Você é um homem fascinante, Darcy. – ela disse, em uma voz baixa.

— Não. – ele sorriu, balançando a cabeça em negativa. – Eu sou um homem comum. Sem um tostão no bolso agora.

Darcy disse aquilo mais para si mesmo do que para ela. Porque se estivesse ali como o homem que fora, poderia se aproximar um pouco e beijá-la. Mas o homem que era agora não poderia se aproximar da filha de um homem poderoso.

— Não somos o que pensamos que somos. Somos o que ainda nem descobrimos, somos os nosso medos escondidos, somo os impulsos que cedemos... – ela disse, distraidamente, dando um passo em direção à ele.

— Os impulsos? – Darcy engoliu em seco.

— Sim. – ela confirmou com a cabeça.

E antes que um dos dois pudesse pensar, seus lábios se encontraram com paixão. E sem que os dois soubessem, aquele era o início do resto de suas vidas.


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Notas finais do capítulo

Um ano de Orgulho e Paixão, homenageando um dos meus diálogos preferidos.



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