Pontas Duplas escrita por R4CH3L


Capítulo 1
A tesoura da inquisição


Notas iniciais do capítulo

um minuto de silêncio aos 50 minutos que gastei escrevendo a primeira versão dessa bagaça só para fechar a guia sem querer.
eu amo o cole com todo meu coração e absolutamente morreria por ele. eu tava escrevendo uma história da inquisidora dando a luz alguns anos depois de trespasser (não esperem, ela foi totalmente abandonada) e adicionei um cole mais crescido de cabelo curto e meu imediato pensamento foi: huh
enfim. essa é a história de como ele saiu da fase de cabelo comprido, com um acompanhamento leve de angst.

(o relacionamento aqui é exclusivamente materno. tente ler como romance e eu os PERSEGUIREI)



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Cole nunca precisou de olhos para ver.

Ele também nunca precisou de suas narinas para cheirar, ou de seus ouvidos para ouvir. De fato, ele nunca realmente precisou de seu corpo —isso é, o material— para sobreviver. Até então.

Cole estava descendo as escadas do último andar, admirando os vitrais da fortaleza, quando um dos corvo de Leliana bateu contra si.

Em choque, ele não sentiu o puxão da gravidade, nem escutou os gritos da própria espiã-mestre para que se agarrasse ao corrimão. Mas ele sentiu o desajeito desesperado do pássaro contra seu rosto — e sentiu a dor em suas costas quando desceu rolando até o andar de baixo, batendo em cada degrau.

Claro, Cole ficou bem (o corvo também). Leliana praticamente pulou do andar de cima, para ver se ele estava ferido; e Dorian já estava ao seu lado, checando por ossos saltados. Mas, na enfermaria, Varric ainda o olhou preocupadamente, e cochichou algo no ouvido da inquisidora que a fez ficar olhando Cole de relance pelo resto do dia.

(E suas costas doeram pelo resto da semana)

O incidente fez com que o grupo tivesse um cuidado extra com ele. Ninguém nunca realmente tinha pensado nas consequências —menos agradáveis— de sua nova humanidade até o ver encolhido na enfermaria. "Cole, cuidado com a descida"; "Cole, mantenha sua cabeça baixa por ali, o teto é baixo"; "Cole, me dê sua mão".

Mas a nova onda de preocupação só realmente fez algo de verdade quando a própria inquisidora chegou até Cole, no andar de cima da taverna, com uma tesoura prateada em mãos.

Cole a olhou apreensivo, ainda que seguisse as instruções de sentar na cama. Suas procuras na cabeça de Lavellan não conseguiram encontrar nada além de um extenso vazio, e pensamentos rápidos demais para serem seguidos.

Seu medo só passou quando ela pôs a tesoura contra sua testa e cortou um pedaço de sua franja. Aí, ele franziu as sobrancelhas, e a olhou em confusão.

— Para você poder ver, bobão. - ela respondeu, assim que notou a pergunta silenciosa na cabeça do ex-espírito. - Ou então vai cair a cada passo. -

Ele levou uma mão inconsciente até suas costas.

— Não foi culpa dela. -

— Eu sei, foi por distração. - cortou outro pedaço da franja. - A gente também vai tomar conta desse problema. É só que esse... - ela começou a alisar o cabelo onde era recém-cortado. Cole notou, com fascínio, que Lavellan provavelmente estava medindo a diferença, - ...é mais rápido de resolver. -

Cole observou ela trabalhar.

— ...Você é boa nisso. -

Lavellan suprimiu um sorriso, silenciosamente orgulhosa de si. - Eu costumava cortar o cabelo de minhas irmãs. Você é bem mais fácil de lidar do que elas. -

Em sua mente surgiu a imagem de casas entre uma floresta vermelha. Um riacho, fino e cristalino. Sarwen adorava brincar nele, pulando de pedra em pedra até chegar ao outro lado.

— Elas nunca paravam. - Cole comentou, sentindo uma nostalgia que não o pertencia.

Nesse ponto, Lavellan já estava acostumada o bastante para não estranhar. Ou oferecer algum tipo de resistência a Cole fuçar suas memórias. Então ela apenas assentiu, com um sorriso fraco.

O riacho, e logo depois a clareira. Onde Heifir—

Um vazio repentino tomou Cole e ele não conseguiu enxergar mais a floresta, ou a outra irmã. Assustado, e estranhamente cansado, ele tentou outra vez. Mas a grama seca e a menininha sorridente sumiram de sua visão tão rápido quanto antes.

Cole franziu o cenho, o coração batendo forte contra seu peito. - Eu não consigo ver. -

Lavellan imediatamente parou de cortar seu cabelo. - Esse é o efeito oposto do que quero. - ela descartou a tesoura numa mesa ao lado e envolveu as bochechas de Cole com as mãos, inspecionando os seus olhos com um cuidado profissional. E um rosto preocupado. - Caiu algum fio neles? Você quer os lavar? -

Cole negou lentamente, com a cabeça. - Não. Eu não consigo ver—

Ele piscou.

— Você. -

Lavellan o olhou de forma confusa. Mas logo os seus olhos brilharam em entendimento. - Oh. - murmurou. - Você...não consegue ver minhas memórias. -

Cole se sentiu, de repente, muito cansado e muito pequeno. Ele se debruçou sobre seus joelhos e tentou se encolher o máximo possível. Era, então, por isso que ele não conseguiu saber por que ela estava ali, mais cedo.

Lavellan ainda estava o olhando, mas agora ele não conseguia ver os sentimentos por trás. Ela estava decepcionado, pela falha de suas habilidades? Ou, talvez, aliviada?

Ela pôs uma mão em suas costas, entendendo a apreensão de Cole por um outro motivo. - Está tudo bem, não se preocupe. Faz sentindo. Você só está se tornando mais humano. -

Cole balançou a cabeça em negação, quieto. - ...Como eu vou saber como vocês se sentem? Como vou poder ajudar..? Eu

— Você não precisa ver a mente dos outros para os ajudar, Cole. - Lavellan foi rápida em o reafirmar. Ela tirou a mão de suas costas, buscando a tesoura novamente, e o mandou um sorriso brincalhão. - Nos somos densos, mas também somos honestos. -

O humor não o alcançou. Ele balançou a cabeça outra vez, mas se levantou de seus joelhos. - É incerto demais, Inquisidora. -

Lavellan continuou a cortar seu cabelo, com a calma de alguém que não estava tentando tranquilizar um assassino. - A vida é incerta, Cole —fique parado, okay?— você não pode contar com... - gesticulou vagamente, - telepatia para sempre. -

Cole não disse nada. Lavellan suspirou pesadamente.

— Nas florestas, minhas irmãs corriam até a noite chegar. Varamael perseguia animais, Sarwen

— Ela pulava as pedras do rio. -

— ...e Heifir fazia coroas de flores. - Lavellan sorriu. - Minhas irmãs eram incontroláveis, mas eram minhas. Eu não sinto falta da tribo, mas sinto delas. Para lembrar de seus rostos, de quanto me enchiam o saco—

A elfa solta um riso, baixo e extremamente dolorido.

Cole desvia os olhos. - Desculpe. -

Lavellan passa um mão veloz sobre os próprios olhos, fungando uma única e silenciosa vez. - Não sinta. Fui eu que decidi falar delas. É isso que você faz; você conta aos seus amigos, mesmo que doa. - procurou o olhar de Cole, a tesoura totalmente esquecida. - E se eles não te contam...então está bem. Não é seu trabalho consertar as pessoas, Cole. Foi isso que você nunca entendeu. - ela sorri tristemente. - Você não pode salvar todos. -

— Mas eu quero salvar vocês. -

Os olhos de Lavellan se tornam doces. Ela segura uma das bochechas dele, - Ah, querido. Você já faz isso. -

O resto do corte segue um silêncio pesado, mas calmo e agradável. Hora ou outra Lavellan para a tesoura para passar uma mão sobre os cabelos de Cole, cada vez mais curtos, e sorri de forma satisfeita.

— Varric está me ensinando a pôr o mel do copo de Leliana, sem que ela possa ver, e ajudar a cozinheira distante de seus olhos. Mesmo que eu não possa mais ser invisível. - Cole diz, em algum momento. - Você...pode me ensinar a ver? Como saber se O Touro de Ferro precisa de companhia, ou se Dorian precisa de outro par de mãos? -

Ela alisa o seu cabelo outra vez, e põe a tesoura na mesa, agora de uma vez por todas. - Claro. - responde facilmente, admirando o trabalho completo. - Sem a franja, vai ser bem mais fácil de enxergar essas coisas. -

Lavellan o entrega um espelho, e Cole o levanta até poder ver o seu reflexo. Ele parece satisfatoriamente comum. Seu cabelo está curto, arrumado, e ele consegue ver seus próprios olhos: cansados, dourados e estupefatamente brilhantes.

Absolutamente humanos.


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Notas finais do capítulo

uma alma se surpreenderia a saber o quanto demorou escrever 1.500 míseras palavras. a alma é minha? talvez

sintam-se livres para soltar seus pensamentos. comentários são o almoço de um escritor



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