Segure minha mão. Tranque a porta. Eu estou prestes a te contar, em sussurros e soluços, o segredo da minha existência.

Embora eu tenha medo, te deixo me rasgar ao meio pra descobrir o que tem dentro de mim. Me desculpa se não são flores. Eu sou feita de chuva e amores perdidos e da total certeza de que eu não mereço coisas boas.

Foi num dia ensolarado quando eu cheguei a conclusão que mereci tudo de ruim que me aconteceu. Minha esperança, lá no fundinho de algum lugar, se retorceu e se encolheu, uma única faísca me dizendo que ainda sou algo bom. Mas seus sussurros se perdem no meio dos gritos:

"Você não é suficiente.", minha mente diz. E eu sei que isso dói mais do que quando as palavras saíam da boca do meu pai. Agora elas vem de mim, e, vindo de mim, eu acredito. E acredito tanto que me isolo.

Eu estou sozinha.

Estou sozinha e sou feita de feridas que nunca vão se fechar. Sou feita de traumas. Minha personalidade foi moldada apenas com dor.

Eu não sei te dizer quando isso começou. Não sei se foi a forma como me criaram, não sei se foi toda a violência e manipulação emocional. Talvez a culpa seja dos meus pais ou talvez do garoto que partiu meu coração e destruiu todo pingo de auto confiança que eu ainda tinha. Talvez eu tenha nascido assim, quebrada.

E me sinto assim, fragmentada, arrancada da realidade. Eu vivo em um mundo totalmente diferente. Um mundo onde cada pequeno detalhe é uma ameaça. Um mundo solitário, que todos eventualmente vão embora. Sinto falta dos que foram, mas não os culpo.

Eu queria poder ir embora também.

Eu queria poder acreditar quando me respondem "sim, eu ainda te amo" e "não, você não é uma pessoa ruim" e "vai melhorar". Mas as perguntas se repetem na minha cabeça, como ciclos. Como furacões.

Você ainda me ama?

Você ainda me ama?

Você ainda me ama?

Eu sou ruim?

Eu te faço mal?

Você ainda me ama?

Alguma hora as pessoas param de responder. Elas pegam suas malas, dão um beijo na testa de despedida e vão sem olhar pra trás. E eu continuo completamente sozinha. E inteiramente quebrada.

E isso é o que eu sou. E essa é a história da minha vida.

Te agradeço por ouvir, fecho os olhos um pouco. Você está assustado.

"Ainda sou eu" afirmo. E você acredita e fica

Obrigada por ficar

Você ainda me ama?