Prodígio Vol.1 DEGUSTAÇÃO escrita por Serena Bin


Capítulo 3
Capítulo 3




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/775070/chapter/3

EU NUNCA QUESTIONEI O LEMA DA CLASSE ASPHER:INTELIGÊNCIA NÃO É UM DOM, MAS SIM UMA HABILIDADE QUE DEVE SER TRABALHADA INCANSAVELMENTE PARA O BEM DA HUMANIDADE.

No entanto, somenteagora, com Jade me contando a história do Prodígio de roupas verdes, é que realmente entendo o significado dessas palavras.

Olho para Jade com uma expressão de surpresa. É um pouco remoto que eu nunca tenha ouvido falar disso, mas então me lembro de que as pesquisas são sigilosas e manifestadas apenas aos Prodígios que a desenvolvem. Como Jade descobriu isso é um grande mistério.

— Como você ficou sabendo disso? — pergunto.

— Por aí — ela responde enigmática, então começa a rir de uma maneira engraçada e volta a sentar em sua estação de pesquisa.

Faço o mesmo e tento me concentrar nas amostras de oxigênio que cintilam dentro do frasco enegrecido, mas então me lembro de uma questão que talvez Jade possa dar jeito. Se ela é capaz de saber detalhes de pesquisas alheias, há uma grande chance de que ela saiba a resposta para a seguinte pergunta:

— Jade — cochichocutucando-a pelas costas. Ela levanta seus olhos verdes e os mantém em mim. —Você sabe o que acontece lá fora depois que escurece?

A expressão de Jade se confunde em um misto de dúvida e surpresa.

—Ouvidizer que há alguma coisa lá fora.

— O que você exatamente ouviu, Danna? — Jade pergunta, então conto que fora o garoto de roupas verdes que mencionara isso a mim horas antes.

— Bem — Jade inicia de maneira calma. —Há boatos de que depois que o sol se põe, tudo lá fora fica em total escuridão...

— Não são boatos — interrompo. —É verdade. Eu vi.

Jade me olha com atenção e volta a falar:

— Bem, eu nunca comprovei pessoalmente. O fato é que, segundo esses boatos que agora vocêdiz serem verdadeiros, depois que tudo fica escuro, há a ocorrência de um fenômeno.

— Fenômeno?

— Sim.

— Você sabe alguma coisa a respeito, Jade? — pergunto realmente curiosa.

— Não muito — ela responde. —Mas tem a ver com o oxigênio.

— Considerando que praticamente tudo em Brázar tem a ver com oxigênio... então, acho que você não sabe muita coisa — comento com um leve riso, que não contagia minha colega. Na verdade, Jade está agora me encarando como se a piada fosse infame demais para o momento. —Desculpe.

— De fato, não sei mesmo — Jade responde quieta, em seguida fica esfuziante novamente. —Tá aí uma coisa bacana para se pesquisar: o que há depois do anoitecer. Já posso me ver recebendo um bônus por essa descoberta.

— Eu já posso vê-la com cabelos, Jade —digo entrando na brincadeira. Jade e eu rimos por alguns minutos e então, quando a euforia finalmente passa, minha colega de estação se torna pensativa e por alguns instantes fica apenas olhando para o nada. Depois de algum tempo, ela quebra o silêncio.

— Às vezes, eu tenho a impressão de que eles escondem as coisas de nós — Jadediz reflexiva.

— Como assim? — contraponho. Jade responde com o mesmo tom calmo de outrora:

— Sei lá, sinto que eu, na verdade, não sei nada sobre nada. Como se o que eu sei, fosse apenas o básico, quando o que de fato é importante, não me fosse sequer apresentado. Como se eu fosse algum tipo de massa de manobra.

— Isso não faz muito sentido —pondero. —Nós somos, literalmente, os seres mais inteligentes do mundo. Fomos criados para saber de tudo sobre tudo. Acredito que não há nada que a ciência diga que já não saibamos...

— Às vezes, sinto que sabemos apenas o que a ciência quer que saibamos — Jade me interrompe de repente.

Um dos maiores lemas da Classe Aspher é: Uma geração iluminada pelo conhecimento.

Isso é ensinado a todo Prodígio ainda nos primeiros anos da infância. O que Jade estádizendo soa meio fora de órbita, porque foge ao sentido natural dos Prodígios. Que sentido há em acreditar que sabemos apenas o essencial, quando podemos calcular de cabeça a massa atômica de qualquer elemento da tabela periódica, ao passo que outra criança da mesma idade que nós, ainda esteja aprendendo o bê-á-bá? Como poderíamos ser massa de manobra, quando os próprios nativos recorreram à nós para dar continuidade à existência humana?

— O que querdizer com isso? — retorno à Jade, ela, porém, apenas sorri.

— Deixa para lá. Minha mente voa alto demais. É mais forte do que eu.

— Certo — respondo.

— Quanto ao que acontece depois de escurecer, vou ver o que posso descobrir — Jadediz e então retorna para sua estação de análises.

Em minha cabeça, agora ocupa um pouco da fala de Jade.

As palavras circundam minha mente e atraem uma série de fatos que de alguma forma fazem um pouco de sentido, porque me sinto exatamente como Jade se sente. Não é sempre, mas em alguns momentos, principalmente quando estou sozinha. Mas para mim é fácil voltar a realidade, basta apenas que eu me lembre que são os nativos que não sabem de nada. Não detêm o conhecimento nem mesmo sobre a real situação de onde moram. Não sabem, por exemplo, que a vida deles depende de nós.

Mais tarde, quando deixo o Centro de Análises, me encontro em meu quarto solitário. Deitada na cama, gasto meu tempo restante antes da hora de dormir, lendo e testando teorias relacionadas a minha pesquisa. Mas eventualmente, minha atenção muda de foco quando meu olhar encontra a janela do quarto.

Através do vidro, espio o lado de fora totalmente tomado pelo breu e tento achar alguma hipótese plausível para o que acontece depois do crepúsculo, mas nada chega realmente a fazer sentido. Lembro-me da expressão desconfiada do garoto de roupas verdes quando eu lhe dissera que estudara cada centímetro do domo e que seria impossível haver uma ameaça à noite.

De repente, estou parada em frente à janela considerando a expressão do garoto com a frase dita por Jade, momentos antes de nosso turno se encerrar. Sobre sabermos apenas o necessário. Lembro-me do rapaz me olhando com um misto de desconfiança e desdém, como se ele realmente soubesse de algo que não sei. Como se eu fosse uma tola por acreditar que não há nada de errado depois do anoitecer.

Olhando para o horizonte e enxergando nada além da escuridão, um pensamento começa a surgir em minha mente. Um conjunto de palavras soltas, embrenhadas e confusas.

"Todo saber é um conhecimento. Mas nem todo conhecimento é de fato um saber."

Quando a frase finalmente se forma, imediatamente a reconheço. Esse é um dos lemas da Classe Aspher.

 

—__

ADQUIRA O LIVRO FÍSICO NA PRÉ VENDA


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Obrigada por ler.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Prodígio Vol.1 DEGUSTAÇÃO" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.