English Boy escrita por Kiki, Tyke


Capítulo 17
Capítulo 17




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ꟷ Lucas. ꟷ  escutei a voz aflita de James do outro lado me chamando.

Levantei rapidamente para abrir a porta, a forma que a voz dele soou me preocupou. Quando demos de cara, percebi que James estava mais branco que o normal e antes que eu pudesse perguntar ele disse:

ꟷ Tião, ele está...eu não sei o que fazer.

James saiu na direção do quarto esperando que eu o seguisse. Eu olhei para Danilo e ele se jogou da cama, indo junto comigo.

Quando cheguei no quarto senti um frio na espinha ao ver que Tião estava tremendo sem controle embaixo das cobertas. Danilo correu até ele e segurou seu rosto tentando chamá-lo, mas Tião estava de olhos arregalados parecendo não enxergar as coisas ao redor.

ꟷ Ele tomou alguma coisa? ꟷ perguntei desconfiado a James, essa alternativa foi a primeira que surgiu na minha cabeça.

ꟷ Eu não sei...umas poções antes de dormir, mas ele sempre toma. ꟷ ele respondeu demonstrando um certo desespero para lembrar de mais.

ꟷ Vamos levá-lo para enfermaria. ꟷ disse Danilo, o único presente que parecia saber o que fazer. 

Danilo jogou o braço de Tião pelos ombros para erguê-lo e eu fui até eles para ajudar, apoiando o outro lado do garoto. Tião era pequeno, mas era mais pesado do que pensei de modo que em poucos passos não aguentei carregá-lo. Força física não era algo que eu possuía então quando James se adiantou para tomar o meu lugar, eu deixei sem resistência.

Os dois garoto, Danilo e James, arrastaram o outro, que ainda parecia inconsciente, pelos corredores enquanto eu os segui de perto. Toda a agitação e barulho que causamos despertou diversos alunos que pairaram bisbilhotando nas portas dos quartos. 

ꟷ Qué pasa? ꟷ um deles perguntou em espanhol. Esse garoto também era Representante do nosso ano e questionou diretamente a mim.

ꟷ No pasa nada. ꟷ respondi sem parar de andar ꟷ Vamos levá-lo a enfermería. ꟷ eu não falava espanhol muito bem, mas o portunhol sempre funcionava para nos comunicarmos.

Atravessamos o campo entre o Prédio Principal e o Aloja, em baixo de chuva. Logo que pisamos no Prédio Principal me lembrei da demônia pisadora de crianças. Segurei Danilo pelo braço antes que ele seguisse pelo caminho onde estaríamos expostos à criatura. 

ꟷ Por aqui. ꟷ  falei e fui na frente deles conduzindo na direção certa.

 Haviam três formas de chegar na enfermaria e apenas um desses caminhos era enfeitiçado para Pisadeira não nos perseguir durante a noite. Somente os Representantes sabiam esse caminho, teoricamente, por isso era nossa responsabilidade acompanhar alunos que passassem mal durante a noite.

Chegamos inteiros e encharcados na enfermaria. A Dona Esmeralda, enfermeira responsável, veio correndo perguntar o que tinha acontecido e socorrer nosso amigo. Ela levou Tião para dentro com seus ajudantes e nós ficamos na sala de espera.

Assim que sentamos no banco e percebemos nosso estado, Danilo fez um feitiço para secar nossas roupas molhadas. Um longo tempo se passou, ou pelo menos pareceu, sem conversarmos. Danilo estava de braços cruzados e atendo a qualquer movimentação dentro da sala de atendimento. James batia o pé no chão repetidamente e seu rosto refletia uma aflição palpável. Enquanto a mim, não tinha paciência para ficar sentado e aguardando, então levantei e fui até a janela que me mostrou um horizonte azul escuro e manchado de sombras. 

A porta se abriu e nós três nos viramos em sua direção. Dona Esmeralda veio tranquilamente e sem enrolação nos mandou ir embora. 

ꟷ Como ele está? ꟷ Danilo perguntou preocupado e ignorando as ordens de nos retirarmos.

ꟷ Está bem agora, não se preocupem. ꟷ a mulher respondeu impaciente.

ꟷ O que aconteceu com ele? ꟷ eu perguntei sem confiança nas palavras dela.

Dona Esmeralda fez uma pausa longa olhando entre nós.

ꟷ Falaremos direto com a família dele, novamente, não se preocupem e se retirem, por favor. ꟷ então ela nos deu as costas voltando para a sala.

Sem opção tivemos que voltar para o dormitório. Nenhum de nós sentia sono no momento então acompanhamos James até o quarto dele. Vasculhei as coisas de Tião e encontrei em seu armário três frasco de poção, cheirei o conteúdo e identifiquei a Poção do Sono e a de Brisa, mas a terceira eu não sabia o que era.

ꟷ Será que ele misturou as três? ꟷ Danilo disse espiando por cima dos meus ombros os frascos que eu segurava.

Eu busquei James esperando que ele soubesse responder.

ꟷ Não sei. ꟷ James disse antes que eu verbalizasse.

ꟷ Aconteceu alguma coisa hoje? ꟷ perguntei me aproximando de James que estava sentado em sua cama com semblante sério.

ꟷ Ele parecia triste depois que leu uma carta. ꟷ James apontando o envelope em cima da escrivaninha de Tião.

Danilo foi até lá e pegou a carta, começou a lê-la sentando na cama de Tião. Eu tomei um lugar ao lado de James que estava muito pálido. Observei ele esfregar as mãos na perna em nervosismo e instintivamente as segurei com a minha. James aquietou as mãos e fixou seus olhos nos meus ainda com o rosto muito sério, senti um arrepio. Essa sensação me deixou encabulado, portanto, ignorei isso até esquecer que tinha acontecido.

ꟷ Não fica assim. ꟷ falei baixo para apenas James escutar e acariciei amigavelmente suas mãos.

ꟷ Francisco morreu em combate com nativos. ꟷ Danilo disse sombrio.

Minha reação foi encarar o garoto na cama oposta sem acreditar, pensando se ele tinha certeza sobre o que afirmava. Danilo segurava o papel de carta e fixava o olhar no texto, relendo, as sobrancelhas juntas, a postura séria, ele parecia até mais velho daquela forma. Então, não, não foi um erro e ele estava certo.

ꟷ Francisco Lobivia? ꟷ perguntei de queixo caído.

ꟷ Quem é esse? ꟷ James questionou confuso.

ꟷ Irmão de Tião. ꟷ Danilo respondeu. ꟷ Agora os Lobivias vão declarar guerra contra os Aman.

Bufei. A família de Tião era dona de uma grande porção de terra no norte do país e vivia em conflito com a tribo dos Aman, que habitavam uma área mágica chamada de Mata dos Buritis. Os Lobivias não tinham direito nenhum sobre a terra dos nativos, mas tinham interesse comercial nos enchanté que cresciam principalmente dentro da mata. Enchanté é uma planta muito usada para fazer charmes de beleza, o principal negócio da  família de Tião.

ꟷ Tião deve estar arrasado. ꟷ falei com pesar.

Os Lobivias tomavam atitudes estúpidas por dinheiro, durante gerações. E Tião, apesar de seus defeitos, com certeza era diferente deles. Ele não se achava superior aos outros por pertencer a essa antiga família e por mais que ele pudesse ter atitudes preconceituosas com nativos, ele sempre reconheceu que os Lobivias estavam errados. O garoto estava sempre dividido entre sentir vergonha pelas atrocidades que a família fazia e o amor que sentia por seus laços de sangue. Eu sabia que era muito complicado para ele processar todo esse caos de sentimentos e perder um irmão parecia uma dor inexplicável.

Passamos boa parte da noite acordados. Eu e Danilo tivemos que explicar para James, que não sabia absolutamente nada sobre esses problemas que ocorriam aqui, especificamente os conflitos de latifundiários com nativos pelo o domínio de terras mágicas. James teve dificuldade para entender como num país tão grande e com tanto espaço poderia ocorrer algo assim. A sua dúvida era justificável, mas não mudava o fato que por séculos os conflitos existiram.

Depois nós nos distraímos falando das aulas, dos professores e qualquer assunto aleatório. Danilo estava tão amigável de novo, sem aquela carranca que manteve a semana inteira, que quase me esqueci que queria bicudar ele por ter julgado as crenças de Iara.

Mais tarde, Danilo adormeceu todo torto na cama de Tião. Eu e James continuamos conversando, ele falava sobre os problemas que a sua família tinha por causa da profissão de auror do pai. Estávamos deitados lado a lado, de barriga para cima, na cama dele. Nunca antes eu tinha estado tão perto dele, eu podia até sentir o cheiro característico que ele emanava. 

ꟷ ...uma vez um bruxo que queria vingança tentou invadir nossa casa. Eu era criança, foi apavorante. Minha mãe nos fez viajar pela Linha de Flu para a casa dos meus avós, enquanto meu pai chamou reforços no Ministério. Lembro que meu irmão entrou em estado de choque, ele tremia igual ao Tião... ꟷ ele contatava encarando o teto do quarto.

ꟷ Hum. ꟷ eu murmurei dando sinal que prestava atenção. 

Eu virei meu corpo um pouco de lado para olhá-lo. James parecia distante enquanto falava, como se sua alma estivesse em outra época e em outro continente.

ꟷ ...e as coisas só pioraram quando minha tia Hermione assumiu o cargo de Ministra da Magia. Lembro uma vez que estava jogando quadribol com meu primos no quintal de casa e um bruxo maníaco se aproximou da gente querendo que meu primo Hugo o acompanhasse, ele tinha uns 12 anos. ꟷ ele continuou contando.

ꟷ O que vocês fizeram? ꟷ perguntei, completamente atento na tensão daquela história que envolvia crianças em perigo.

ꟷ Minha prima Rose petrificou o cara e nós corremos para dentro de casa. ꟷ James riu ꟷ Parecia engraçado na época, mas hoje quando penso no que poderia ter acontecido sinto uma coisa ruim. ꟷ um arrepio perceptível percorreu o corpo dele.

ꟷ O problema é que sua família é importante demais, Jay. ꟷ eu comentei. Afinal eles eram famosos por vários feitos como guerra, esporte e política. Parecia natural que pessoas assim atraíssem atenção e riscos para suas vidas.

James virou a cabeça no travesseiro. Ele me olhou de uma forma estranha, meio contemplativo, eu apenas sustentei seu olhar sem me mexer. Não sei quanto tempo ficamos assim, mas dado um momento comecei esquecer como se respirava.

ꟷ Meus irmãos me chamam assim. ꟷ por fim ele disse alguma coisa e eu pude sentir seu hálito bater em meu rosto.

Eu não tinha percebido que estávamos próximos o suficiente para que isso acontecesse. Involuntariamente estremeci e afastei um pouco. Sorrindo divertido para ele, eu disse:

ꟷ Então me considere seu irmão agora.

ꟷ Oh! Eu poderia te trocar por Albus sem hesitar. ꟷ ele disse com um tom brincalhão e sorriu também.

ꟷ Lucas Potter. ꟷ sugeri meu novo nome como membro da família dele. Não sei porque, mas esse pensamento me fazia rir.

James gargalhou agitando a cama com a brincadeira.

ꟷ Que tal Luke Potter? ꟷ ele perguntou sugerindo outro nome.

ꟷ Luke? ꟷ eu torci o nariz para aquelas duas sílabas que não pareciam ter nada haver comigo.

ꟷ Nomes bíblicos costumam ter tradução em diversas língua, sabia? ꟷ James bancou o esperto me contando como se eu não soubesse.

Claro que eu sabia, eu tive aulas de história, uma família religiosa e curiosidade para um dia ter descoberto que Pedro, Peter, Petrus e Pietro, por exemplo, se referiam exatamente ao mesmo santo.

ꟷ Acha mesmo que não sei disso, Tiago?  ꟷ me apoiei nos cotovelos para olhá-lo por cima e falei em português zombando. 

Não me aguentei de rir quando ele fez uma careta para seu nome equivalente na minha língua. Rimos juntos e iniciamos uma extensa conversa sobre nomes. Até que chegamos no ponto onde eu contava sobre meu nome e dos meus irmãos.

ꟷ Meus pais tiveram a brilhante ideia de combinar nossos nomes, todos começam com a letra L. ꟷ confessei com uma careta para a criatividade dos meus pais.

ꟷ Engraçado! ꟷ e ele riu ꟷ Meus pais decidiram homenagear vítimas da guerra. ꟷ ele contou sorrindo como se falasse do tempo.

ꟷ ...a que seu pai participou? ꟷ perguntei hesitante.

Como sempre: aulas de História da Magia. Então, sim, eu sabia sobre a Segunda Guerra Mágica, assim chamada a volta do bruxo das trevas Voldemort que foi derrotado por Harry Potter. Eu sabia o suficiente do evento para ter tirado nota máxima no meu quarto-ano de escola. Mas trazer o assunto a tona com James...James Potter! Me deixou desconfortável, pois o que para mim se resumia a uma aula comum no ano letivo, para ele significava parte de sua vida.

ꟷ Sim. ꟷ seu tom casual evidenciava que ele não tinha notado meu desconforto ꟷ James e Lílian era o nome dos meus avós e Albus era o primeiro nome de Dumbledore. ꟷ James me olhou quando eu permaneci calado sem saber responder. Ele deve ter pensado que eu estava confuso já que começou a explicar: ꟷ Dumbledore era…

ꟷ Eu sei quem ele era. ꟷ o cortei rapidamente, pois eu conhecia o bruxo. Afinal, ele vinha nas figurinhas do sapo de chocolate e seu nome foi mencionado em diversas aulas que tive. Eu não queria soar grosseiro, mas estava curioso para perguntar: ꟷ Seus avós morreram na guerra?

ꟷ Foram mortos por Voldemort, o sacrifício deles que fez meu pai sobreviver. ꟷ James respondeu enquanto me encarou espantado pela pergunta.

ꟷ Ah... eu não lembrava, desculpa. ꟷ fiquei sem graça por esquecer de um fato tão importante ꟷ Faz uns anos que estudei sobre isso...desculpa! ꟷ me expliquei e senti a necessidade de me desculpar de novo.

ꟷ Tudo bem, porque está assim? ꟷ ele sorriu de forma reconfortante e perguntou sobre o meu constrangimento com o assunto.

ꟷ Não sei, parece triste falar sobre isso...morreu muita gente nessa época e sua família esteve envolvida na guerra.

James ficou pensativo com o meu argumento e permaneceu calado, parecendo pensar no que dizer.

ꟷ Já faz anos e eu não vive na guerra, também não sei como era se é isso que te incomoda. ꟷ depois ele sorriu ao dizer: ꟷ Sou só um garoto mimado.

Isso também me fez sorrir, porque sim, ele era um garoto mimado e não tinha nenhum problema nisso. Mudamos de assunto em seguida, voltando a falar das aulas por um longo tempo.

Quando já eram quase três horas da manhã, eu comecei a cochilar involuntariamente. Por mais que eu quisesse ficar onde estava com Danilo e James, eu não conseguia mais me manter acordado. Descansar um pouco seria essencial para não dormir em cima do caldeirão na aula de Poções mais tarde. James ao meu lado começou a pescar de sono também. Eu me sentia muito confortável onde estava e seria muito fácil fechar os olhos e deixar os sonhos me levar. Entretanto, algo gritou dentro de mim que seria completamente inapropriado dormir na cama de James e tão próximo a ele. Então, decidi ir para o meu quarto.

Ergui meu corpo, sentando, e senti minha cabeça doer de cansaço. James abriu os olhos com a minha movimentação, mas ele parecia meio adormecido ao me encarar.

ꟷ Vou para o meu quarto. ꟷ expliquei.

Eu estava entre o garoto e a parede de forma que para sair da cama precisava que ele se levantasse. James não se moveu, apenas resmungou algo irracional e virou a cabeça para o lado fechando os olhos. Eu suspirei e numa atitude mal pensada tentei passar por cima dele. Definitivamente, eu não esperava que ele levasse um susto com isso e por reflexo me segurasse com força pelos braços.

ꟷ O que está fazendo? ꟷ James perguntou bem acordado e com os olhos arregalados.

Eu engasguei por alguns segundos me sentindo muito consciente do aperto nos meus braços, que quase machucava, e sobre estar ajoelhado em cima dele de um modo tão constrangedor.

ꟷ Tentando levantar. Eu te chamei, mas você não saiu do caminho. ꟷ me senti vitorioso por não gaguejar, porém foi impossível impedir o rubor de tomar o meu rosto.

ꟷ Ah, sim. Certo.

Assim que James me soltou, me apressei em terminar a trajetória e ficar em pé.

ꟷ Vou pro meu quarto. ꟷ expliquei de novo imaginando que James não tinha entendido da primeira vez.

ꟷ E Danilo? ꟷ perguntou apontando o garoto na outra cama.

ꟷ Deixa ele aí.ꟷ dei de ombros ao ver que Danilo deveria estar num sono extremamente profundo e do jeito que seu pavio estava curto nos últimos tempos parecia péssima ideia acordá-lo ꟷ Boa noite! ꟷ  falei para James antes de sair.

ꟷ Boa noite! ꟷ ele respondeu com o sorrisinho e virou para o lado e aconchegando no colchão.


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Notas finais do capítulo

Alguns eventos estão começando acontecer aqui. Adoro!!!!
O babyJames anda sumidinho, mas logo teremos informações sobre ele.

Beijos e comentem



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