Persistente escrita por Ginger Bones


Capítulo 3
Longa Recuperação




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/773555/chapter/3

BEATRICE PRIOR

 

Depois de quase dois anos morando no Hospital de Nova York, eu finalmente estava voltando para casa, em Chicago.  

 

Não me lembrava de tudo ainda, mas desde que Caleb havia contado minha história na Audácia e a Guerra que eu terminei, muita coisa que eu perdi já tinha conseguido recuperar. 

 

Alguns pontos na minha vida ainda eram apagados. Às vezes eu sonhava com um garoto, muito bonito, por sinal. Ele devia ter uns 18 anos, era alto e moreno, com lindos olhos azuis escuros, mas eu não me lembrava do seu nome e ninguém me falava dele. Eu mesma não tinha certeza se ele realmente existia fora da minha mente, visto que sempre que perguntava por ele, as pessoas se entreolhavam como se soubessem algo que não queriam que eu soubesse. 

 

Caleb e Cara namoravam agora, e eu era grata por Cara ter me perdoado pelo que eu fizera ao seu irmão mais novo. 

 

Ainda estava em uma longa recuperação do controle dos meus movimentos. Minha coluna estava bem, o problema era neurológico mesmo. Imaginava que eu só voltaria a andar direito quando todos os furos em minha memória fossem recuperamos, embora Caleb e os outros cientistas da Athena Biotecnologies dissessem o contrário. Havia algo nos meus neurônios me impedindo de caminhar sozinha, mas os médicos não tinham certeza do quê. 

 

Juntos, os pesquisadores da equipe do meu irmão criaram uma máquina metálica que envolvia minhas pernas e se conectava à um chip preso à minha nuca, recebendo comandos direto do cérebro. Eu já havia pegado o jeito com aquele aparelho externo, como um exoesqueleto, andando para lá e para cá normalmente, embora não fosse tão rápida quanto a maioria das pessoas, graças ao metal em minhas pernas limitando os movimentos. 

 

Uma muda de roupas escuras me esperavam na poltrona do meu quarto no dia em que eu ia embora. Depois que eu terminei de me arrumar, a garota de cabelos escuros que me viu acordar do coma veio me buscar.  

 

Depois que Caleb terminou a história de como eu fui parar em um hospital sem memória e com problemas nas pernas, eu havia dormido, mas no outro dia eu acordei com a voz daquela menina me chamando. 

 

Ela tinha se apresentado como Clarisse Buckhart, a Herdeira que criara as Corporações Athena e salvara minha vida, tirando-me do olhar do Departamento, que ainda queria me matar. Com a ajuda de um garoto chamado Matthew, ela conseguiu o mesmo tipo de paralisante que Peter um dia usou em mim para me tirar da Erudição e fazer Jeanine parar de me seguir.  

 

Eu sabia que algumas pessoas choraram minha suposta morte, mas ao usar cinzas de um indigente morto no mesmo dia, Caleb tinha extinguido as chances de qualquer mau que me pudessem fazer, e eu estava enfim livre para me recuperar. 

 

Agora, quase 3 anos depois, eu já estava bem o suficiente para voltar ao mundo. 

 

Eram poucas as pessoas que sabiam que eu continuava viva, e sair do Hospital dentro das instalações da Athena, era como voltar à vida. O verão era implacável e Caleb e Clarisse me levariam para uma volta de carro pela cidade, cidade essa que eu vinha vendo pela janela durante meses, sem nunca poder ter tido a chance de ir lá fora. 

 

Eu estava animada, não podia negar. 

 

Aqueles cientistas e médicos  me tratavam bem demais, mas às vezes eu só queria ir lá fora e respirar ar puro, mas eles nunca permitiam, alegando que eu ainda não estava bem o suficiente para sair na rua sozinha. 

 

Não sabia bem o que tinha mudado, mas Clarisse me dissera que tinham coisas na cidade que ela queria me mostrar, pessoas que eu precisava me lembrar. A hora havia chegado, imagino. 

 

Clarisse me acompanha até a frente do prédio, passando pelo enorme Hall de entrada construído para lembrar uma cidade grega antiga, cheio de luzes e o teto alto pintado como o caminho do Monte Olimpo até o reino dos Deuses. Sua paixão por mitologia era mesmo notável. Será que como eu, ela também não usava seu tempo nesses prédios para esquecer o fato de que sua família não tinha sobrevivido à guerra de 3 anos atrás? Eu certamente não tinha me acostumado em ter apenas o meu irmão. 

 

A garota me deixa apoiar o peso do corpo em seu braço livre, mesmo segurando-me em uma muleta de metal, como alguém com as pernas quebradas. Ao passar pelas portas de vidro, solto-me dela e me apoio em uma das colunas de pedra em frente ao prédio, apenas observando o carro preto me esperando lá embaixo das escadas da rua. Esculturas de Hefesto, deus Ferreiro, e Gaia, a Mãe Terra, olham a rua movimentada em ambos os lados das portas abertas da empresa durante o dia. 

 

A enorme escultura da Athenas Parthenos, de Elmo e uma cobra enrolando-se em um escudo ao lado das pernas da deusa da Sabedoria, símbolo da Corporação, anuncia ao mundo onde a sede se encontra. 

 

Eu vejo as pessoas lá embaixo tirando fotos em frente à escultura de pedra, todas sorrindo apesar do calor.

 

Clarisse fica ao meu lado, esperando para descer. 

 

—Quer ajuda?- Ela pergunta. 

 

—Não, você já está me segurando desde que saímos do quarto.- Reclamo.- Deixe que eu vou sozinha. 

 

—Se você acha que consegue descer as escadas sozinha...- Ela dá de ombros, abrindo espaço à minha frente.- Vai fundo. 

 

Solto-me da pedra fria ao meu lado, volto a apoiar o peso do corpo na muleta e, aos poucos e devagar, consigo descer os vários degraus até a rua. 

 

Caleb sai do carro onde me esperava, ajudando-me a entrar no banco de trás e colocando a muleta no chão do carro. 

 

Clarisse me seguiu de perto enquanto eu descia, e se juntou ao meu irmão no banco ao lado do motorista, botando o cinto e avisando Caleb que já podia ligar o carro. 

 

—Sei que você quer muito caminhar pela cidade.- Clarisse me diz enquanto olho fascinada pela janela do carro. Sei que vivi aqui por toda minha vida, mas desde que os Muros se foram, a cidade se tornou uma nova metrópole, movimentada e cheia de tecnologia, de uma forma que eu nunca tinha visto.- Vamos te apresentar a cidade inteira quando quiser, mas primeiro quero que conheça algumas pessoas. Achamos que será bom para sua recuperação. 

 

Olho-a quando ouço a palavra "recuperação", sei que isso significa que Caleb quer testar uma hipótese. A antiga "eu" provavelmente não confiaria nele, mas imagino que não teria entrado naquele laboratório do Departamento se não o tivesse perdoado. Sem Jeanine para influenciar sua mente, decidi confiar que o que quer que ele acredite que pode me ajudar, provavelmente pode. 

 

Caleb é meu irmão e a única família que me restou. Não quero deixá-lo sozinho.

 

—Quem vocês querem que eu veja?- Pergunto. 

 

—Ele?- Clarisse pergunta olhando para Caleb, que não tirou os olhos da rua desde que o carro começou a se movimentar. 

 

—Sim.- Ele responde depois de um suspiro.- Ele.

 

—Quem é "ele"?- Pergunto. 

 

Eles se silenciam, e não obtenho resposta. Clarisse me olha sobre o ombro do banco da frente por alguns segundos, mas não fala nada e volta a olhar para frente completamente em silêncio. Ótimo. Parece que eu vou ter que esperar e descobrir de quem eles estão falando quando o vir por mim mesma.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Persistente" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.