Carta para você escrita por Carol McGarrett


Capítulo 81
Reencontro


Notas iniciais do capítulo

Capítulo passado foi Jenny e Kelly. Agora é Sophie que reencontra o pai em um momento nem tão bom.
Avisando que esse capítulo continua no próximo.
Boa leitura!



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Já tinha uma semana que meu pai estava de volta. Não tinha como eu não saber de uma coisa dessas. Todo mundo me avisou. Todos falaram. Acontece que eu ainda não tinha plena certeza se eu queria vê-lo. Dessa vez era completamente diferente.

Eu ainda não entendia como ele pôde ter voltado para ajudar a Ziva e não voltou quando eu pedi. Quando eu implorei.

Estava sentada sem conseguir me concentrar no ensaio que eu deveria estar fazendo, pensando em mil e uma coisas diferentes. Por fim, quase arremessei o notebook na parede. Eu precisava conversar com alguém, minha colega de quarto não era uma opção. Era complicado até para mim. Como eu explicaria tudo isso? Para quem?

Assim, no meu desespero, resolvi entrar no chat que a Abby tinha criado. Alguém tinha que estar online. E eu torcia que não fosse a Ziva.

Chefinha: Tem alguém por aí?

Na mesma hora.

LabQueen: Eu estou por aqui.

AMETony: Olha quem resolveu aparecer. Pelo menos online...

ElfLord: Tá sumida Kelly.

Bem... quem eu queria estava online.

Chefinha: alguma coisa que eu deva saber?

AMETony: na verdade...

LabQueen: tem um monte. Você tem que aparecer no Estaleiro, Kelly! O Gibbs tá precisando disso.

Chefinha: ele que peça ajuda para a Ziva.

AMETony: você não ficou nada feliz com isso, né?

Chefinha: você ficaria, Tony? Seu pai some no México, não liga por conta própria. Aí, do nada, uma completa estranha o chama e ele volta?

LabQueen: a Ziva não é uma completa estranha... ela já faz parte da família.

Chefinha: não há tanto tempo quanto vocês.

ElfLord: sem querer ser o chato, mas a Sophie está oficialmente na família a menos tempo que ela.

LabQueen: McGee, não diz isso!

Chefinha: eu vou fingir que você não digitou isso, Tim. Para o seu próprio bem.

AMETony: falando na Peste Ruiva, ela não aparece no Estaleiro há algumas semanas... aconteceu alguma coisa?

Chefinha: vocês estão mais perto da Jen do que eu... ela não falou nada?

LabQueen: a Jenny não anda muito feliz...

Chefinha: alguém sabe como anda a memória do meu pai com relação à Soph?

ElfLord: ele se lembra dela... pq agora tem uma foto dela na mesa dele...

Chefinha: mas...

AMETony: achamos que ele ainda não foi vê-la.

Chefinha: está explicada a infelicidade da Jen.

LabQueen: será que ele está esperando ter todas as memórias da Sophie de volta? Para assim ir vê-la?

Chefinha: ou está com medo da reação dela.

AMETony: com todo o respeito, Kelly, mas nenhuma reação da Pestinha pode ser pior do que a sua... Sophie realmente sentiu falta dele.

Chefinha: e eu não?

ElfLord: a diferença de idade pesa para que a Sophie tenha sentido mais falta do seu pai, Kelly. E ele se lembrava de você quando foi para o Safári da Margarita, já da Ruivinha...

Chefinha: Safári da margarita? A Jenny soltou isso em voz alta?

E os três ficaram calados.

Chefinha: se vocês não me responderem, eu vou presumir que sim.

AMETony: ela soltou isso na cara do seu pai, enquanto eles conversavam perto da sacada em frente ao MTAC.

Isso era ruim. Jen estava tão ou mais irritada do que eu.

Chefinha: mais alguma fofoca?

LabQueen: as coisas não estão boas por aqui, Kelly. Até o Ducky está diferente com o Gibbs. e tem algo acontecendo, só que eu ainda não descobri o que é!

Chefinha: tem alguma ideia do que seja, Tony?

AMETony: não. Já procurei saber e nada.

ElfLord: a única certeza que todo mundo tem é que envolve a Diretora.

Chefinha: estranho...

LabQueen: muito. E aí, quando você vem para resolver isso?

Chefinha: se eu for a D.C., vou ficar na casa de quem me acolheu nesses quatro meses, nem sei se vou procurar o meu pai.

AMETony: seu pai sempre sabe quando você está na cidade, Kelly. Não tem como você fugir disso.

E o Tony tinha razão. E eu detestava concordar com ele.

Chefinha: na semana que vem. Vou dobrar o turno nessa semana e ver se pego folga a partir de quinta-feira.

LabQueen: se chegar na quinta à noite, chama que nós vamos sair.

Como eu quis digitar "sem a Ziva"..., mas não fiz isso.

Chefinha: começar afogando as lágrimas não vai ser o melhor não...

AMETony: às vezes é a única saída...

Chefinha: Tony, eu não vou concordar com você de novo. Pode ir parando.

AMETony: então, Chefinha, até na semana que vem.

LabQueen: vamos te mantendo informada de tudo.

ElfLord: inclusive se a Sophie aparecer também.

Chefinha: muito obrigada. Vou indo, amanhã começo cedo. Até semana que vem.

E eu saí do chat.... dando graças à Deus por Ziva não ter dado as caras. Eu ainda não sabia como iria encontrá-la. Meu lado corajoso me dizia para ser bem sarcástica, não só com ela, mas também com meu pai. Porém, eu tenho um lado covarde, e esse lado estava me dizendo que rachar a equipe assim não faria nenhum bem.

A sorte estava lançada. Vamos ver o que vai me aguardar dentro de oito dias.

—------------------------ 

Três semanas de retorno e pelo menos uma notícia boa, a equipe já tinha se adaptado com a volta de Jethro. Se levou três semanas para que todos o aceitassem normalmente, não levou nem três horas para que ele voltasse a perturbar a minha paz.

Tudo o que eu fazia era motivo de crítica. Ou ele queria me tirar do sério ou ele estava testando algum limite, ou ele queria que eu falasse algo. Acontece que eu fiz uma promessa a mim mesma, eu não vou falar nada. Ele não vai me afetar dessa vez.

E nessas três semanas eu tive que me controlar, tanto na agência quanto em casa.

Eu tinha o dom de falar demais em casa. Ou Sophie que é uma excelente interrogadora, não sei. A única certeza é a de que eu sempre comento sobre o dia. E tive que me policiar para não comentar sobre a volta de Jethro. Eu ainda não sabia o efeito que isso causaria na minha filha.

E vinha dando certo, nem Kelly tinha comentado nada, assim, Sophie permaneceu no escuro.

Até uma tarde de quarta-feira.

Tony estava devidamente infiltrado como Tony DiNardo. Ele já tinha até conseguido conquistar a confiança da filha de Benoit. Só restava saber quando o detestável papai estaria na cidade. E era isso que estava demorando.

Depois de uma reunião no MTAC, Tony desceu para sua mesa e eu fui para a minha sala, pelo canto do olho vi que Jethro não estava gostando da nossa proximidade. Ele lançou o olhar assustador na direção do agente italiano e para mim restou um olhar de desgosto. Nada que eu já não estivesse acostumada.

Estava entrando na antessala quando meu celular tocou. Pela tela vi que era da escola de Sophie. Olhei a hora, ainda era muito cedo para que ela saísse de lá. E antes mesmo de atender a chamada eu já estava buscando pela minha bolsa.

— Shepard.

— Senhora Shepard. É a diretora Olsen do Colégio Benjamim Franklin.

— Sim, estou ouvindo.

— Estou te ligando para que venha buscar a Sophie. Ela está na enfermaria, reclamando que está com muita dor de cabeça. Como na ficha dela não consta autorização para que possamos medicá-la, estamos te avisando para que venha buscá-la.

Diretora Olsen nem tinha terminado a frase eu já estava correndo escada abaixo para pegar o elevador. É claro que o meu desespero não passou despercebido por ninguém e antes que eu entrasse no elevador, todos estavam de pé, olhando na minha direção, inclusive Jethro.

Com as férias de Stanley eu passei a vir com o meu carro, e dei garças à Deus de ter parado na entrada principal hoje.

Pelo caminho, que fiz mais rápido do que normalmente faria, fui pensando em Sophie, nas últimas semanas ela vinha reclamando constantemente de dor de cabeça. Comecei a me preocupar que poderia ser algo mais grave, e eu não tinha corrido com ela para o médico mais cedo.

— Que bela mãe eu sou. – Me xingava cada vez que o nome de alguma doença incurável ou perigosa passava pela mente.

Eu nem me lembro de ter trancado o carro quando parei na frente do portão principal da escola. Me lembro de me identificar e quando o Porteiro, Sr. Dale, me permitiu a entrada, praticamente corri pelos corredores, meus saltos ecoando alto no lugar vazio.

Olsen estava me esperando na porta da Diretoria e me guiou até a enfermaria, onde Sophie estava deitada, de lado, tampando o rosto com um travesseiro.

— Ela está dormindo agora. – A enfermeira, uma senhora de cabelos bem brancos que me lembrou a minha avó, me disse.

— Ela sentiu algo mais além de dor de cabeça?

— Ela reclamou de enjoo e das luzes. Não sou médica e longe de mim querer diagnosticar algo, mas acho que sua filha pode ser uma das pessoas que sofrem de enxaqueca severa.

Consegui respirar. Enxaqueca. Não tinha cura, mas de todas as possibilidades que tinham passado pela minha mente, essa era a melhor das opções.

— Eu vou levá-la a um neurologista infantil. – Afirmei.

— Precisa de ajuda para levá-la?    

 - Preciso saber onde estão os materiais dela...

Nessa hora, uma garotinha ruiva apareceu na porta da sala.

— Oi... Senhora Shepard!

— Olá, Emily! – Cumprimentei a garotinha que era uma das melhores amigas de Sophie. E, também era filha de Diane e Fornell. E cada vez que eu pensava nisso eu tinha que rir da regra 39. Coincidências existiam sim!

— A Tia Isa me pediu para guardar os materiais da Sophie e trazer para a senhora.

— Muito obrigada, minha querida. – Me agachei para dar um abraço nela.

— A Sophie vai ficar bem, né? Porque quando ela começou a passar a mal, ela ficou verde.... agora tá todo mundo chamando ela de Hulk...

— Ela vai sim. Só precisa de um remédio e descansar um pouco. E você precisa voltar para a aula. – Falei o mais docemente que pude.

— Eu já vou indo!! Tchauzinho.

— Tchau Emily!

E a pequena ruiva saiu correndo pelo corredor.

— Não corra ou você pode cair. – Alertei. Ela parou de correr e saiu pulando.

Coloquei a mochila de Sophie no ombro e a peguei no colo, ela estava ficando cada dia mais pesada.

— Muito obrigada! – Agradeci à enfermeira e levei Sophie embora.

Logo que saímos do prédio, Sophie reclamou da claridade. E afundou o rosto ainda mais em meu ombro.

— Calma, Miniatura. Já estamos quase no carro.

— Mamãe, tá doendo...

— Eu sei, bebê.

Abri a porta, e percebi que realmente não tinha trancado o meu carro. Ajeitei Sophie no assento e ela reclamou mais uma vez da claridade. Tirei os meus óculos escuros e coloquei nela.

— Melhor um pouco?

— Se eu não abrir o olho sim... – Ela disse choramingando. – Vamos para casa?

Estava prestes a responder quando o meu celular tocou. Era Cynthia.

— Sim, Cynthia.

— Ah... senhora... está tudo bem?

— Mais ou menos. O que aconteceu?

— A senhora saiu tão desesperada que eu estou com metade do prédio me perguntando se algo tinha acontecido.

— Quem está aí?

— Abby, Doutor Mallard, Sr. Palmer, a Oficial David e os Agentes DiNozzo e McGee. E eu só liguei para a senhora porque a Oficial David me ameaçou com um clipe de papel.

Respirei fundo. É claro que todos tinham notado e que iriam fazer uma tempestade em um copo d’água. Escutei Abby falando:

— Pergunta da Sophie! Eu tenho certeza de que é a Sophie! Toda mãe sai desesperada quando se trata de seus filhos.    

 - Avise para Abby e para todos que Sophie vai ficar bem. Mas peça a Ducky para me esperar em minha sala, preciso falar com ele.

Cynthia passou o recado e pude ouvir o sibilar de Ziva e o desespero de Abby.

— Eu sabia que ela estava mal!! Tadinha da Jibblet!!

Pude ouvir o telefone trocar de mãos e logo a voz de Abby se fez ouvida.

— Jenny, tem certeza de que não precisa de nada? Eu posso fazer qualquer coisa no meu lab. É só me falar. Você vai trazer a Sophie para cá, não vai? Me diz que vai, ou vamos todos na sua casa!!

Eu amava aquela equipe, mas às vezes, só às vezes, eles tinham o dom de serem dramáticos demais.

Olhei pelo retrovisor, Sophie estava com a cabeça escondida atrás do cardigan dela. Levá-la para minha casa, que não tinha ninguém, era fora de mão.

— Sim, Abby, eu estou levando Sophie comigo. E me prometa uma coisa.

— Qualquer coisa!

— Nada de fazer muito barulho, ela está com muita dor de cabeça.

 - Eu prometo.

Quando eu cheguei, parei dentro da garagem de provas, assim Sophie não teria que encarar a luz do sol de novo. E, com muito custo, a tirei do carro.

— Vamos, Ruiva. Chegamos no Estaleiro. Ducky vai dar uma olhada em você e eu te prometo que vamos consultar um médico para saber o motivo dessas suas dores de cabeça, tudo bem?

Sophie só balançou a cabeça uma vez.

Com ela no colo, chamei o elevador, levou um bom tempo para que chegasse até onde estava e fiquei aliviada quando as portas se abriram e não tinha ninguém lá. Porém, não pude dizer o mesmo da viagem de subida. Parou em cada andar, e cada vez era um que entrava, como se eles soubessem que eu tinha chegado com Sophie. O primeiro foi Palmer, que se desculpou e disse que estava levando a maleta de Ducky até a minha sala. Mais um andar e Abby e Tim entraram. Abby como sempre extremamente preocupada com Sophie. Ficou me rodeando no pequeno espaço tentando não atrapalhar, e ver Sophie ao mesmo tempo. No próximo andar, Tony e Ziva, e eu posso jurar que os dois estavam fazendo algo que não era a hora nem o lugar, a julgar como Ziva ficou vermelha e Tony tinha a gravata torta.

Eu esperava que todos descessem no terceiro andar. Mas eles resolveram seguir até o quarto, ou melhor, me seguirem, e quando as portas se abriram no andar, deve ter sido até cômico. Todos saíram antes de mim e me esperaram. Logo que pus os pés para fora do elevador, Sophie se encolheu, reclamando da claridade que entrava pelas janelas e pela claraboia. Andei o mais depressa que pude até a minha sala, com todos cinco ao meu encalço. Querendo saber de Sophie ou se tinha algo para ajudarem.

Fiquei grata pela preocupação, mas toda a falação não estava ajudando muito. Sophie começou a se remexer em meu colo e tampou os ouvidos.

— Mamãe, eu tô passando mal. – Ela falou com uma voz estranha.

Dei uma conferida, e ela estava ficando verde. Uma péssima notícia, ela estava enjoada.

Apressei o passo e assim que entrei na antessala, Cynthia foi se levantando.

— Senhora o Agente....

Ela não terminou, Jethro abriu a porta da minha sala na hora e eu corri com Sophie no meu colo sala adentro até o banheiro.

Foi a conta.

Minha filha não tinha nada no estômago para pôr para fora, mas, mesmo assim tossia sem parar.

— Calma filha. Respira. – Dizia enquanto segurava o cabelo dela.

Quando a ânsia passou. Dei um copo de água para que ela pudesse lavar a boca e a peguei no colo.

— Um pouco melhor?

Ela só balançou a cabeça confirmando.

— Quero ir para casa.

— Eu sei, eu só vou pegar algumas coisas aqui, Ducky vai dar uma olhada em você e já vamos, tudo bem?

Sophie escondeu o rosto em meu ombro e sai do banheiro com ela, para encontrar todos nos esperando com cara de preocupação.

E foi só aí que eu me lembrei de um detalhe. Sophie não sabia que Jethro estava de volta. E era justo ele quem me olhava com mais preocupação do que todos.

— O que ela tem? – Jethro perguntou. E só de ouvir a voz dele, Sophie começou a chorar.

— Até uma opinião médica, dor de cabeça. – Respondi a ele. – Calma, filha. Calma. – Me sentei no sofá para acalmar os soluços de Sophie.

Com muito jeito, Ducky conseguiu tirar todos da sala.

— Ducky, eu preciso de você. – Pedi.

Mas Tony, Ziva, Tim, Abby, Jimmy e Cynthia ficaram parados na porta. Eles não queriam ir sem saber o que Sophie tinha. E depois do tanto que vi como eles se importavam com a minha filha, eu não poderia simplesmente ignorar suas feições preocupadas.

— Assim que eu tiver uma posição de Ducky, eu falo com vocês. – Garanti e só assim, eles nos deixaram a sós.

Minha filha continuava a chorar no meu ombro. Chamei Jethro para se sentar do meu lado, não tinha mais jeito, ela tinha escutado a voz dele e agora teria que vê-lo, mesmo que não fosse a melhor hora.

— Hei, Ruiva. – Dei um beijo na têmpora dela. – Olhe quem está aqui!

— Eu sei quem é. – Ela murmurou, virando a cabeça para o outro lado. – E ele deve estar com raiva de mim.

Jethro fez menção de se levantar e ir embora. Eu segurei o seu braço e o fiz sentar de novo.

— Por que não conversa com seu pai? Eu sei que você está morrendo de saudades dele. – Falei mansamente.

Sophie trocou de posição novamente, olhou por baixo do meu queixo para onde o pai estava sentado e depois escondeu o rosto novamente.

— Ruiva, olhe para mim. – Jethro pediu.

— Tá claro. – Ela reclamou.

Pedi que Ducky fechasse as cortinas.

Com a sala praticamente em uma penumbra, Sophie conseguiu mudar de posição, mudando o rosto para meu ombro esquerdo, ficando com o rosto mais próximo de Jethro, mas não deixou o meu colo, muito pelo contrário, apertou seus braços ao redor do meu tronco.

— Oi... – Ela estava tensa. Com medo de ser rejeitada mais uma vez.

Jethro saiu da poltrona e se ajoelhou do meu lado, ficando ao lado de Sophie. Pude sentir que ela ainda chorava. Eu e Ducky assistíamos à cena. Ele ainda um tanto consternado que a relação de pai e filha tenha chegado ao ponto de que a filha caçula desconfiasse do amor do pai, já eu estava pronta para qualquer coisa que Sophie precisasse que eu fizesse.

Jethro chegou mais perto de mim, para que pudesse ver Sophie, ela se encolheu um pouco em meu abraço, porém não virou o rosto, e ele levou uma mão ao rosto dela para enxugar as lágrimas que escorriam.

— Olá, Sophie. – Ele falou com uma voz mansa para não a assustar.

A ruivinha ainda soluçava, mas manteve o olhar fixo no pai.

— Eu senti a sua falta, papai. – Ela disse entre soluços.

— Eu sinto muito, Ruiva. Sinto mesmo. – Ele falou e eu tentei não olhar para ele.

— O senhor se lembra de mim agora? Não está mais bravo comigo?

— Eu nunca estive bravo com você, filha. Nunca. E espero que você me perdoe um dia.

Se Sophie não estivesse passando mal, eu tenho certeza de que já teria passado para o colo do pai.

— Eu nunca fiquei brava com o senhor. Eu sempre vou amar o senhor. – Ela disse baixinho, e agarrou a minha blusa com mais força.

Eu tive que piscar rápido para impedir que meus olhos derramassem as lágrimas que haviam se formado. Vi que Ducky também fazia um esforço para não chorar. Jethro tinha sido pego de guarda baixa com essa declaração e não conseguiu responder nada.

Sophie tornou a virar o rosto na direção do meu pescoço, a dor de cabeça ganhando a batalha.

— Não quer ir para o colo do seu pai? Não quer dar um abraço nele? – Perguntei acariciando os cabelos dela.

Ela negou balançando a cabeça. Ainda estava magoada com tudo o que acontecera.

— Minha cabeça tá doendo muito, mamãe.

Era a deixa para Ducky.

Jethro se sentou do meu outro lado, observando sempre Sophie. Ela, por sua vez não queria me soltar, e eu acabei sentada entre os dois homens com ela no colo.

Ducky fez um monte de perguntas a ela e a mim. As mais importantes, quanto tempo tinha que ela vinha sentindo as dores.

— Mais ou menos um mês. – Respondi por Sophie. Ducky olhou para ela que confirmou.

— E dói olhar para a luz. Eu vejo um monte de pontinhos. – Ela falou chateada.

— Está vendo os pontinhos agora, minha criança?

— Sim. Estão em todos os lugares.

Olhei alarmada para Ducky. A cada resposta que Sophie dava, eu ficava ainda mais apavorada.

— Se você pudesse numerar de um a dez a sua dor agora, Sophie, qual seria a nota?

— Nove. E tá piorando...

Olhei para a minha filha, ela estava esverdeada e um suor pegajoso brotava de sua testa.

— É melhor que eu a leve...

Levantei-a em meu colo e fomos para o banheiro. Novamente eram só espasmos, Sophie não tinha nada pôr para fora. Dessa vez, Jethro veio comigo e assim que a coloquei sentada no meu colo, ele entregou o copo de água para ela.

— Obrigada. – Ela sussurrou, mas parecia formal demais até para uma criança.

— Ducky foi buscar um remédio para ela. Não deve demorar. – Ele se dirigiu a mim, já que a ruivinha parecia concentrada no copo que tinha em mãos.

E ficamos em silêncio, até que Sophie me estendeu o copo. Jethro fez menção de levá-la no colo, mas ela se agarrou com força no meu pescoço.

E a situação ficou ainda mais estranha.

Com pouco Ducky estava de volta. Um comprimido em uma mão e na outra uma xícara de chá.

— Beba isso, minha pequena. – Ele estendeu a mão onde estava o comprimido.

— Que remédio é? – Perguntei.

— Paracetamol. Não vai fazer mal algum, talvez nem diminua a dor dela, mas pode ajudá-la a relaxar.

Sophie engoliu o comprimido e depois tomou o chá, sempre quietinha, sem sair do meu colo, mas de tempos em tempos, olhava na direção de Jethro.

— Ducky, você conhece algum neurologista infantil? – Perguntei para ele que tinha se sentado ao meu lado.

— Uma amiga minha é. Vou entrar em contato com ela para você, Jennifer.

Assenti.

— E não se preocupe tanto. Pelas respostas que ela me deu, estou quase certo de que é enxaqueca, mas sempre é bom ter exames detalhados. Agora, deixa-a descansar um pouco e você, tente se acalmar, não se precipite. – Ducky me deu um tapinha no ombro. – Quanto a você, pequena Sophie, vamos ficar um pouco mais quietinha, quanto menos se movimentar, menos enjoo vai sentir. – Ele deu um beijo no alto da cabeça dela e se foi para a porta. Notei que ele não conversou com Jethro.

— Tchau, Tio Ducky. Muito obrigada pelo chá. – Sophie cortou o estranho silêncio.

Depois ela se ajeitou e começou a cochilar. Efeito do remédio.

E foi só aí que Jethro abriu a boca. Com um gesto, me chamou para perto da janela. Deitei Sophie no sofá e o segui, parando na sua frente, mas virada para onde minha filha estava deitada.

— Tem um mês que ela vem sentindo dores de cabeça? – Ele perguntou cético.

Resolvi não entrar no seu joguinho de “vamos achar o culpado”.

— Nenhuma tão intensa como a de hoje. Mas ela chora praticamente todas as noites até que pega no sono, Jethro. Não importa o que eu faça. A dor de cabeça é uma consequência de noites mal dormidas.

Ele deu um passo para trás.

— Acha que é sério? – Ele resolveu mudar de tática.

— Vou me apegar ao que Ducky disse. Sei que ele logo vai me ligar com a data da consulta.

Ele assentiu uma vez.

— Se importa se eu aparecer hoje?

Como eu quis perguntar se ele se lembrava do endereço. Porém, eu queria evitar qualquer atrito que terminasse conosco discutindo e Sophie acordando.

— Não. Mas não posso garantir que ela vá conversar com você. – Pontuei.

— Se ela não quiser me ver.... – Ele começou e eu tive que cortá-lo.

— Você vai ficar e vai se explicar para ela, Jethro. Eu fiz isso, disse que você precisava de um tempo, que o seu acidente foi grave e você precisava reorganizar seus pensamentos. Contudo, ela precisa ouvir isso de você. Ela precisa ouvir que você nunca ficou com raiva dela por motivo nenhum.

— É isso que ela pensa?

— Sim. Ela acha que fez algo errado naquela noite e você está bravo com ela.

— Precisa de ajuda para levá-la para casa. Eu posso te ajudar.

— Se você quiser fazer algum favor, ligue para Kelly. Ela é a outra ponta solta do seu retorno, Jethro. E amanhã ela vai estar aqui. Se é que não vai sair hoje, já que tenho certeza de que alguém já deve ter falado para ela o que está acontecendo aqui.

— Kelly é complicada.

— Kelly está tão magoada quanto Sophie, Jethro. Só que a pequena está receosa com o que você vai fazer. Já Kelly, ela tem muito o que falar e enquanto não organizar tudo o que ela está sentindo e colocar para fora, vai ficar te ignorando. Você a conhece melhor do que eu. Ela não consegue ficar com raiva de uma pessoa por muito tempo.

— Você sempre conseguiu interpretar Kelly melhor do que eu... – Ele comentou.

— Eu sou filha e meu pai também me magoou muito, Jethro, mas diferente de Kelly, eu nunca pude conversar com ele para perguntar o porquê...

— Onde Kelly está ficando? Ela não se mudou com Henry, se mudou?

— Não. Estão olhando uma casa, ainda. Ela está ficando na minha casa quando vem...

E Jethro parou me encarando. Novamente buscando respostas no meu rosto para as perguntas que só ele sabia quais eram.

— Mais alguma coisa? - Perguntei diante de seu olhar.

— Por quê? – Ele disse do nada.

— Me desculpe?

— Por que ajudar a Kelly? Eu lembro das cartas, de todas elas. Mas nunca entendi. O vínculo entre vocês...

— Por que você é tão preocupado com a Abby? Com o Tim? Tenta pôr um pouco de juízo na cabeça do Tony? Por que você voltou pela Ziva, Jethro? – Retruquei. – Você poderia ser o chefe e deixá-los viver a vida deles, errando e batendo as cabeças até acertarem, mas você sempre os coloca no caminho certo. Sem motivo aparente a não ser o fato de que você sempre vai pensar em todos eles como seus filhos. É a mesma coisa com Kelly. Eu a entendo porque passei por algumas coisas que ela passou. Só isso. E não quero que ela cometa erros que eu cometi.

— E a equipe? Você os manteve unidos. Abby me contou.

Olhei para Sophie.

— São a família dela, também. E você não faz ideia do que fizeram para ela durante esse tempo.

Ele pareceu entender o ponto, mas ainda me olhava estranho.

Encarei os olhos azul cobalto.

— Tem mais alguma coisa, Jen? Algo que eu não me lembro?

— Sobre o que? – Eu sabia onde ele queria chegar. Sempre temi essa conversa.

— Nós...

— Jethro.... você não parece que confia nas minhas palavras. Não ainda. E independente do que eu te disser, você vai acreditar?

Ele parou e me encarou, quando sustentei o olhar, ele os desviou.

— Sabia. Sua desconfiança é comigo. – Não tinha emoção na minha voz. – Talvez você precise de tempo para tentar se lembrar.

— Tem mais alguma coisa para que eu me lembre? – Ele quis saber, sua voz um tom mais alto, como se ele próprio lutasse contra algumas lembranças.

— Eu não sei, Jethro. Não sei o que você sabe. O que você se lembra. Mas se quer uma dica sobre tudo isso, comece com seu porão. Acho que algumas respostas estarão lá.

— Quando tivermos uma posição sobre o que Sophie tem, eu faço isso.

— Eu espero que ache o que está procurando.

— Até mais tarde, Jen. – Ele disse e fechou a porta delicadamente.

Jethro saiu e Cynthia entrou.

— Pois não, Cynthia?

— O Doutor Mallard ligou. Disse que a Sophie tem uma consulta amanhã bem cedo. Já desmarquei a sua agenda da parte da manhã.

— Que horas?

— Às oito em ponto. Ela será a primeira.

— Ótimo. Mais alguma coisa?

— Ziva, Tony, Abby, McGee e Palmer estão plantados na porta do MTAC querendo notícias.

— Jethro já desceu, ele deve tê-los informado. – Falei começando a juntar as minhas coisas.

— Eles querem a resposta da senhora. – Ela falou sem graça.

— São os melhores seguranças que uma criança poderia ter, não são? – Comentei.

— Com todo respeito, Senhora. Eu também estou preocupada com ela. – E Cynthia lançou um olhar para onde a minha filha dormia.

— Só um minuto. – Pedi para ela. Peguei o meu celular e achei o número de Abby.

— JENNY! – Ela gritou do outro lado da linha.

— Eu sei onde vocês estão. Podem entrar. Sem barulho, por favor. – Pedi e desliguei o telefone.

Não deu vinte segundos e batiam na porta.

DiNozzo foi o primeiro a aparecer, Abby o empurrou para poder entrar, depois vieram Ziva e McGee, ambos mais silenciosos. Jimmy foi o último. Eles pararam na frente da minha mesa e me olharam como se eu fosse castigá-los.

— Não sei o que ela tem. – Não pude disfarçar o meu tom de derrota. – Amanhã ela tem uma consulta médica e muito provavelmente terá uma bateria de exames para fazer. Todo pensamento positivo é bem-vindo.

Abby prendeu a respiração. Os demais olharam para onde Sophie estava e ficaram apreensivos.

— Se precisar de qualquer coisa, Diretora. – Ziva se ofereceu.

— É só ligar. – Tony completou.

— Até de uma babá. Eu adoro crianças! – Abby disse a meia voz.

— Agradeço. Vou levá-la para casa. E só gostaria de fazer uma pergunta.

Todos me olharam sérios.

— Quem contou para Kelly?

— Mas como... – Abby arregalou os olhos.

Mostrei a tela do meu celular.

Tinha dez chamadas não atendidas, todas de Kelly. E mais de vinte e cinco mensagens. A última chegou enquanto eu encarava o sexteto na minha frente. E assim dizia:

JEN, PELO AMOR DE DEUS. QUE HISTÓRIA É ESSA QUE A SOPHIE TÁ DOENTE E COM DOR DE CABEÇA E ENJOADA?? EU ESTOU INDO AGORA MESMO PARA CASA!! ME RESPONDA OU EU VOU ACHAR QUE É ALGO MUITO PIOR DO QUE É!

— Se importam de me contar? – Pedi.

E os seis levantaram as mãos.

— Muito obrigada. Agora corram atrás do calmante para a Chefinha. – Falei cansada.

— Kelly só iria chegar amanhã. – Tony comentou.

— Eu sei, DiNozzo. Agora eu tenho uma criança passando mal e uma noiva neurótica completamente dramática para lidar nessa noite.

— Devíamos ter ficado calados.... – McGee murmurou.

— Teria me ajudado, um pouco. Mas agora já era. – Comentei.

— Jenny... – Abby começou.

— Diga, Abbs.

— Nos mantenha informados durante a noite e depois da consulta também? Até as irmãs do meu grupo de boliche estão preocupadas com a Sophie.

— Elas sabem da Sophie? – Perguntei assustada.

— Ah, sabem. Elas conhecem a Sophie. Já jogamos boliche todas juntas! – Abby disse com um sorriso.

E eu fiz uma nota mental para começar a interrogar Sophie cada vez que ela saía com alguém da equipe.

— Vou mantê-los informados, e vocês vão para casa, o expediente já acabou a um par de horas. – Falei ao pegar Sophie no colo e seguir para porta. McGee e DiNozzo a mantiveram aberta para mim, Abby e Cynthia me ajudaram com minhas coisas, Palmer foi na frente para chamar o elevador e Ziva caminhava do meu lado. Quando notou que ninguém estava perto o suficiente, me perguntou em hebraico:

— Como ela reagiu ao Gibbs?

— Nada bem. Ele vai vê-la à noite.

— Com Kelly por perto?

— E tem outro jeito?

— Ela não está muito feliz com ele e muito menos comigo.

E agora mais essa.

— Kelly está muito magoada. Dê um tempo para ela assimilar tudo. – Pedi.

Ziva me deu um aceno de cabeça, se despediu de Sophie e foi para a escada, voltando para a sua mesa, ao lado da de Jethro. Não sei o que ela disse a ele, mas logo Gibbs se levantava e, depois de lançar um olhar na minha direção, pegou a suas coisas e se foi.

— E de novo ele faz uma coisa que Ziva pediu... – Abbs comentou.

— Vocês também não! – Sibilei para os demais.

— Kelly está possessa com isso. – Tony comentou.

O elevador chegou e agradeci mentalmente que os meninos ficaram no andar.

— Boa noite para vocês. – Falei antes das portas se fecharem e os três menearam a cabeça em resposta.

Ajeitei Sophie no banco de trás. Me despedi de Cynthia e Abby e segui para casa.

Para a longa noite que me esperava pela frente.


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Notas finais do capítulo

Tim resolveu viver perigosamente hj... se a Kelly estivesse perto dele, com certeza uma cabeça tinha rolado.
Safári da Margarita é a melhor que inventaram para o sumiço do Gibbs... Ah, como eu adorei quando a Jenny jogou isso na cara dele!!
Sim, eu sou maluca e tive que colocar a Emilly como uma das melhores amigas da Sophie... e antes que me peçam, já está escrito o dia que a Diane descobre a paternidade da garota!
Tadinha da Sophie... acho que eu preciso benzer essa menina... primeiro o pai e agora isso... Eu sou má com ela.
E aí... o que acharam do reencontro? Sophie vai ser diferente e aceitar o pai de primeira ou ela vai afastá-lo?
Sim, até as irmãs de caridade sabem que a Sophie existem... aliás, D.C. inteira sabe... ô garotinha famosa.
Antes que me matem... Sophie não está doente... Enxaqueca é uma m.... e só quem sofre sabe!!
Próximo capítulo, Gibbs X As Filhas. Kelly tem muito o que falar para ele.
E como eu avisei no capítulo passado, lencinhos são recomendados novamente.
Até lá!! E muito obrigada por lerem e comentarem!!



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