Num Ano Qualquer escrita por Sak Hokuto-chan


Capítulo 7
Numa Noite Qualquer II


Notas iniciais do capítulo

Poderia ter saído um pouco antes? Poderia. Mas eu estava numa onda nervosa de bads e revisões :(
Orphelin, obrigada pela carneiro-betagem -q



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Numa Noite Qualquer

Parte II

Que ótimo, era tudo que Aiolia precisava. Menos de 24 horas com os gatos e já tinha perdido ambos – mais a Lithos – dentro de casa.

— Seu irmão vai me matar. – Moveu o braço para os lados, a lanterna do celular lançando uma luz patética pela sala.

— Shion nunca mataria você. – Mu se abaixou, iluminando o vão entre a estante e o chão com o próprio celular. – Ele sabe que eu não o perdoaria se fizesse isso.

— E agredir? Nem todo traumatismo craniano mata.

Mu emitiu um som estranho que abafou com uma tosse.

— Ora, vamos. Como você mesmo disse, nós cercamos a casa inteira e tomamos todos os cuidados possíveis.

— Ainda assim, você não vai descansar até a gente encontrar os três. – Aiolia subiu no sofá e espiou em cima da estante.

— Você me conhece, prefiro ter certeza de que eles estão seguros. – Mu se levantou e seguiu devagar para a cozinha, meio chamando e meio cantarolando os nomes dos pets foragidos.

O ruído do abre e fecha das gavetas recomeçou. Aiolia revirou os olhos. Era a terceira vez que Mu procurava velas. À toa. Com tanta coisa acontecendo desde que se mudaram, nenhum deles havia pensado nesses detalhes.

É claro que Mu não se conformava com o crime terrível de ter se esquecido de algo tão simples. Já devia estar criando uma lista de compras mental com tudo quanto é item de emergência.

Por fim, Mu deve ter se tocado de que nenhuma vela ou lanterna apareceria por mágica, pois ele voltou para a sala, passou as mãos pelos cabelos e respirou fundo.

— Vejamos, os únicos cômodos abertos que restam são os quartos.

— Não o seu. Eu tirei o Atla de debaixo da sua cama e fechei a porta ao sair de lá.

— Menos uma opção. Em compensação, levaremos horas para encontrá-los se estiverem escondidos no seu covil.

— Ou seja, é capaz de a gente não encontrar hoje. Minha bateria estava nas últimas quando filmei os três. Vai acabar a qualquer instante.

— Não tenho muito tempo também.

— Hey, a vizinha deve ter velas sobrando.

— Não tem a menor chance de eu sair sob esse dilúvio. – Mu apontou para a janela.

O breu total indicava a falta de energia na rua inteira. Apenas alguns relâmpagos tornavam possível ver o vendaval sacudindo as árvores com furor, a chuva golpeando os galhos sem dó.

— Ué, quem falou pra você ir? Eu vou.

Mu o encarou, os traços élficos à luz fraca de seu celular.

— Nem pensar.

— Não acha que a vizinhazinha vai me agarrar, né?

Aí, Mu fez um beicinho tão irresistível que Aiolia teve que beijá-lo. Ele retribuiu por um momento e se esquivou, torcendo a ponta de uma mecha de cabelo entre os dedos.

— É perigoso sair com tantos raios.

— Eu sou atleta, qual é? Vou e volto super-rápido.

Querido, você ficaria doente. Tenho más lembranças de cuidar de você doente.

— Ehh, você falou que nem foi tão ruim da última vez.

— Isso deve significar que os deuses não me pouparão uma segunda vez. – Mu espalmou as mãos em suas costas, empurrando-o. – Vá ao seu quarto procurá-los. Eu termino aqui.

Aiolia subiu a escada aos saltos. Caramba, os trovões rugiam feito um bando de leões furiosos. Como ouviria Lithos?

No quarto, usou o celular para dar uma checada geral na bagunça.

Okaay, se eu fosse um gato… – Aiolia direcionou a lanterna para baixo. Cadê a caixa em que Reg e Atla se enfiaram mais cedo?

Tsc, vazia. Deitou no chão, de bruços, e sondou embaixo da cama. Não era tão alta quanto a de Mu, Lithos era a única que caberia ali.

— Cadê você, pestinha?

Um barulhinho soou tão baixo que podia ser fruto da sua imaginação. Ou não.

— Lithos? – Aiolia ficou em pé, a porcaria do celular morrendo justo nessa hora. – Droga. Mu? Mu, vem cá!

*

O cheiro de pipoca recebeu Mu assim que alcançou a porta do covil. A mesmíssima sensação de adentrar uma sala de cinema.

Aiolia revirava as cobertas, piorando a situação da cama.

— Acho que ouvi a Lithos choramingar, mas minha bateria morreu.  

Mu pressionou os lábios. A luz de seu celular dava ao semblante de Aiolia um ar devasso. Desviou o olhar e foi até a escrivaninha repleta de mangás e jogos empilhados. Lithos não conseguiria chegar ali – a não ser que os objetos no chão tivessem dado apoio para que ela subisse.

— Vamos aproveitar que amanhã é domingo para arrumar este covil. Sem falta.

— Que tal não?

— Como consegue causar tanta desordem se, entre aulas, estágio e treinos, você mal fica em casa?

— Minha mãe diz que é um talento. – Aiolia vasculhava perto da TV e do videogame. – Olha, um pacote novinho de balas e– Ahá!

Mu apontou o celular para ele.

— Nah, esquece, é o Simba. – Aiolia arremessou o leão de pelúcia em sua direção.

Oh. Mu o apanhou e imagens da festa de dezesseis anos de Aiolia preencheram sua mente. O primeiro beijo entre eles, seguido por todos aqueles beijos escondidos. Reprimiu um suspiro. Que nostalgia.

Uma vontade insana de abraçar Aiolia, como se não o visse há dias, o invadiu. Que estranho. Mu colocou o leãozinho sobre um punhado de palhetas em uma prateleira e não voltou a fitá-lo.

Houve um farfalhar perto da escrivaninha.

— Lithos? – Ele se ajoelhou, esmagando uma pipoca abandonada.

Hmm, outras pipocas, livros, algumas baquetas, a mochila de treino de Aiolia toda aberta, uma bolinha?

— Lithos? – Tocou na bolinha peluda camuflada dentro da mochila e ganhou uma lambida em troca. – Eu a encontrei, amor.

O único celular que os auxiliava nas buscas cedeu na mão de Mu, deixando-os no completo escuro.

— Por um triz, hein? A gente não ia encontrar ela nesse breu.

Lithos não se mostrou disposta a abandonar a proteção da mochila. Mu não insistiu. Caso a tirasse dali, ela poderia correr e esconder-se de novo por causa do temporal.

— Gatos são verdadeiros ninjas. Eles só podem estar aqui e, se estão aqui, estão seguros. Saber disso te tranquiliza?

— Hum…

— Não quer mesmo que eu vá arranjar velas com a vizinha-mãe?

— Não há necessidade. – Mu esticou a mão devagar. A parede estava por ali.

— Você vai trombar em todo canto e ficar cheio de marcas roxas.

Mu encolheu os ombros. Alguns hematomas nas pernas ou braços nem se comparariam aos que Aiolia deixava em seu pescoço em dias de rebeldia. Não que fosse um problema. Aliás, qualquer hematoma era preferível a um Aiolia doente ou atingido por um raio.

— Quem diria, tem algo em comum entre você e o Milo: ambos são ciumentos não assumidos.

— … Quê? Estou preocupado com sua saúde. – Mu endireitou as costas e cruzou os braços. – Estou pensando que um raio pode atingir essa sua cabeça descabelada e você achando que estou enciumado?

O silêncio de Aiolia emanou descrença.

— A vontade que eu tive de te abraçar, há pouco, se tornou uma vontade imensa de te jogar pela janela.

— Acho o máximo sua tranquilidade ao dizer isso. Espera, por que não me abraçou se queria?

— Não sei, foi estranho. – Mu massageou as têmporas. – Apesar de você estar comigo, eu senti sua falta. Não mude de assunto!

— Também estou sentindo sua falta. Desde que você colocou a gente na seca, no Dia dos Namorados. E, sim, sei que não faz nem uma semana.

Em um instante, Aiolia surgiu na sua frente. A frequência cardíaca de Mu aumentou tanto que o fez ofegar. Que capacidade impressionante essa de se mover em silêncio, na escuridão, sem tropeçar na bagunça pelo caminho.

Com os olhos se adaptando à penumbra, os contornos de Aiolia, abaixado diante de si, apareceram. Se abrisse a cortina, enxergaria melhor e… E ele subiu as mãos frias por seus ombros e pelo pescoço, parando em suas faces como sempre fazia quando queria admirá-las.

— Eu não quis dizer este tipo de falta. – Mu engoliu em seco. – Eu…

A franja dele encostou em sua testa e as pontas de seus narizes se tocaram.

— Hmm, não este tipo de falta…

A respiração de Aiolia em seus lábios, tão, tão próxima, cheirava a bala de… de… Ah. Ele desviou o rosto para o lado e o envolveu em um abraço apertado.

Impedido de realizar uma manobra escapatória, Mu se aquietou. Aiolia mordiscou seu pescoço e arrepios dedilharam sua coluna. Oh, certo, talvez fosse este tipo de falta.

— Ehrm, a Lithos está bem aqui na sua mochila.

— Vai demorar pra ela sair daí – Aiolia murmurou sobre sua pele, causando uma nova onda de arrepios.

A julgar pela chuva que continuava desabando, era impossível discordar.

— Falta encontrarmos os gatos.

— Não sobrou nenhuma iluminação.

Verdade. Mu fechou os olhos e… Aiolia se afastou. Levantou-se com tanta brusquidão que Mu teria ficado atordoado se pudesse enxergar os movimentos com clareza.

— Droga! – Aiolia continuou se afastando, acertando coisas pelo caminho.

Céus, o que deu em você? – Mu se levantou e foi atrás dele, tropeçando nas mesmas coisas.

— Eu sou um namorado compreensivo. Eu falei que sou. Porque eu sou. Eu tenho que esperar você querer.

Mu franziu a testa.

— Eu quero.

— Não, você está cedendo porque pressionei. Depois, vai ficar aborrecido porque seu plano era… era… os pets… Agh, não estou em condições de pensar. – Aiolia saiu do quarto com ímpeto. – Vou ao banheiro.

— Aiolia! – Mu apressou o passo, deslizando os dedos pela parede. Não seria inteligente correr pela casa no escuro.

Não precisou ir longe. Sua mão esbarrou na de Aiolia sobre o batente da porta de seu próprio quarto.

Putz.

— Deixe-me adivinhar. – Mu cutucou a cintura dele. – Você não fechou a porta do meu quarto, como achou que tinha feito.

— Ou o Reg abriu. Ninja, lembra?

Uhum.

Mu avançou pelo quarto, inspirando o perfume de lavanda, e abriu a cortina. Apesar do gesto não resolver a falta de luminosidade, os relâmpagos ocasionais permitiam visualizar o ambiente.

Que alívio não haver caos por ali. As opções para Regulus e Atla se esconderem eram poucas: a cama, o guarda-roupas, a mesinha de cabeceira e uma poltrona.

— Aposto que você se enfiou embaixo da cama de novo, Atla! – Aiolia soava exasperado.

Passada a surpresa pelo rompante dele, calor pinicava as bochechas de Mu. Era como se fosse o culpado por estragar o clima, sendo que tinha sido Aiolia a interromper tudo.

— Encontrei uma bola de pelos ronronante. Não consigo ir além de encostar as pontas dos dedos nela e ela não está a fim de se mexer.

— O importante é sabermos onde eles estão. – Mu tateou a parte externa do guarda-roupas, parando no puxador de gaveta. Abriu e remexeu no conteúdo com cuidado. – Ah, de algum modo, a outra bola de pelos se aninhou entre as minhas meias.

— Ótimo, missão cumprida. Os três pets foram localizados.

— Sim, amanhã compraremos lanternas e velas. – Deixou a gaveta entreaberta e se aproximou da cama. – E organizaremos o seu covil. Não pense que esqueci.

Aiolia bufou de leve, com o ar de alguém resignado a cooperar com um absurdo.

Okay, okay. Bom, vamos dormir, né?

Ele deu um passo para longe e Mu o segurou pela parte de trás da blusa, mantendo-o no lugar.

— É melhor eu dormir no meu quarto.

— É melhor você me escutar. – Mu apertou o ombro dele, incitando-o a se virar. – Você falou o que quis e nem me deu oportunidade de contestar.

Aiolia se remexeu em silêncio.

— Você disse que eu ficaria aborrecido depois. Talvez eu ficasse, um pouquinho. Comigo, não com você. Seria pela minha incapacidade de resistir mesmo sentindo dificuldade em…

— Fazer sexo na presença de pets?

— É. – Mu clareou a garganta. – Aliás, se eu não quisesse, não cederia, não importa o quanto você tentasse. Sendo sincero, eu já queria. Era este tipo de falta que eu estava sentindo mesmo.

Graças aos céus pela escuridão impedir Aiolia de ver seu rosto. Com certeza, tinha adquirido um tom lamentável de vermelho.

— Enfim. Não parece que algum deles vá pular em nós, ou conseguir ver algo hoje.

— Espera aí, o q–

Mu envolveu o pescoço dele com os braços e o puxou. Se deixasse Aiolia terminar de processar suas palavras, ele soltaria um eu sabia! atrevido. Eles caíram no colchão. Que sorte a cama estar atrás de si, ou os dois teriam acabado no chão. Não era a maneira correta, tinham deitado de forma atravessada, contudo, o importante é que o corpo quente de Aiolia ficou em cima do seu.

— Huh, você–

— Faça um comentário espertinho e eu mudo de ideia.

Aiolia soltou uma risada alta.

— Não era para rir também.

— É que estou feliz. A gente encontrou os pets e meu namorado é supersexy.

Sexy? Não tinha dito ou feito nada sexy. Porém, diante da felicidade de Aiolia pressionada em sua coxa, não duvidou.

Outro relâmpago cintilou janela afora, dando uma visão perfeita do semblante de Aiolia. Ele sorria feito uma fera esfomeada que encurralou um carneiro perdido.

O estômago de Mu se contraiu, mas não de um jeito desagradável.

— Esqueça seus planos – Aiolia sussurrou em seu ouvido. – Você não vai conseguir nem andar amanhã.

*


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Notas finais do capítulo

Que bom que esse probleminha de pets escondidos foi resolvido, agora podemos seguir para problemas mais graves, não é? ;D Pode ser que alguns outros personagens comecem a aparecer de agora em diante também ^^

Obrigada pelas reviews: Suh Domingues, arianinha, Orphelin e Svanhild ♥

Que tal este capítulo? :3 Orphelin, espero que tenha gostado...

P.S.: Para quem acompanha Encounter, saiba que não a abandonei. Ela só está passando por uma megarevisão.



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