— Axel!

O ruivo virou ao ouvir a voz conhecida e quase sempre animada. Encontrou Kairi parada atrás de si, com um sorriso tímido e alegre, segurando ambas as mãos atrás do corpo. Isso fez com que ele percebesse melhor a roupa que vestia: Um vestido mais curto e mais bem trabalhado do que o qual ela estava usando quase todos os dias, e também havia cortado o cabelo.

— Hey, Kairi. - Axel a cumprimentou de volta. - Você está bem fofinha com essa roupa nova. - deu um dos seus sorrisos cheios de dentes, fazendo Kairi balançar o rosto negativamente.

— Não é nada demais! - ela exclamou ainda envergonhada, mesmo que lutasse contra de forma corajosa. - Mas eu admito que você foi a primeira pessoa que eu quis mostrar. - Kairi confessou ao se sentar ao lado de Axel no tronco.

Axel teve que se surpreender. Isso o fez pensar: Quando aquilo havia acontecido? Quando ele se tornou amigo de uma garota tão mais nova, e quando os dois ficaram tão próximos? Desde que chegou à ilha para treinar com Kairi, ele se via cada vez mais com vontade de ficar do que sair. Sentia-se em casa, de uma forma que nunca sentiu antes. Principalmente graças à ela.

Deveria ser só o efeito de uma Princesa do Coração, certo?

Kairi continuava falando, como fazia quando estava realmente empolgada:

— Minha avó que fez para mim. - ela passou a mão no vestido, com muita afeição na voz. - Mas o meu pai odiou o meu cabelo. Ele sempre diz que garotas não podem ter cabelo curto.

— Eu nem percebi a caretice do seu pai. - Axel comentou irônico. - Ele só tentou me prender algumas vezes depois que descobriu a minha suposta idade.

— Mal sabe meu pai que eu estou mais segura com você do que com outros garotos da minha idade. - ela comentou em tom um tanto exasperado. Axel a cotovelou, mas ele estava rindo.

— Hey! O que isso quer dizer?

Kairi riu como a criança que era.

— Nada, nada! - ela exclamava entre os risos. A risada dela sempre foi contagiosa, e causava uma felicidade que deveria ser proibida. Axel não entendia como alguém poderia lhe fazer tão bem, em tão pouca interação. - Mas você não acha que está na hora de trocar de roupa? Esse casaco da Organização é quase um esqueleto...

Ela continuou após deixar de ser atacada e rir. Axel acabou franzindo o cenho, desviando os olhos dela. Olhou para as próprias mãos, ainda enluvadas, e os pulsos escondidos sobre o tecido grosso do casaco. Ele suava. Não suava antes, quando era um Nobody. Mas não se lembrava exatamente dessa não vida que viveu como Axel. Tinha apenas flashes, pensamentos flutuantes.

Ainda estava se acostumando com tudo isso: Ser humano. Pois havia muito tempo que Lea não era humano. Humanos suam quando usam muita roupa em temperatura quente. E estava sempre quente nas ilhas que Kairi morava.

Axel estava notando tudo muito lentamente.

Lea sempre odiou usar casacos como aqueles. Isso era coisa de Isa. Mostrava o máximo de pele, e era sempre criticado por isso. Não usava protetor solar o suficiente, dizia Isa. Não se importava o suficiente, não era responsável o suficiente.

No fundo, a verdade era que Isa era todo o seu auto controle. 

— Axel? - Kairi o chamou mais uma vez. O ruivo piscou para ela. Kairi deu um sorriso amarelo, exasperada. Ela ainda tinha muita paciência, estando acostumada com Sora e Riku. - As vezes eu sinto que você está longe demais para que eu te alcance.

— Desculpe. - Axel se forçou a falar, soando extra sincero, franzindo o cenho. - É hábito de Nobody. Mesmo que eu não seja mais um, eu continuo agindo dessa forma. É difícil perder esses hábitos. Perder o Axel. 

Kairi segurou o braço dele na mesma hora, olhando-o profundamente nos olhos. Ela transbordava determinação.

— Você não é mais um Nobody, ouviu? Eu espero que entenda isso, nem que eu tenha que repetir todos os dias!

Axel passou alguns segundos surpreso, mas ele acabou soltando uma risadinha. Não sabia exatamente do quê, de si mesmo, da garota, ou da situação; ou por conta da histeria, de achar graça na desgraça ou a felicidade proveniente de Kairi.

— Obrigado pelo o lembrete, Kai, mas esse não é um problema que precisa se preocupar. - ela o soltou ao ouvir isso. - Eu estou me acostumando. Eu só... Bom, usar a Keyblade ajuda. Treinar com você ajuda. Talvez eu devesse realmente aposentar o casaco.

— Eu posso te ajudar! - Kairi exclamou. - Podemos arranjar uma roupa nova juntos. - Axel sorria para ela. Kairi corou de leve. - Eu estou feliz que você esteja melhorando. De verdade. Você se tornou alguém que eu não conseguiria perder.

Como muitas vezes antes, Kairi abraçou o braço dele e deitou a cabeça sobre o ombro do ruivo. Ela se aproveitava um pouquinho da diferença de altura. Axel acabou aprendendo que Kairi era muito carinhosa com todos que considerava, e nunca foi difícil para a princesa considerar alguém. Então, antes que notasse, estava sendo abraçado tanto quanto Riku e Sora. Axel não conseguia ver maldade naquilo, ou arranjar forças para se afastar. O toque de Kairi era como brisa refrescante, revitalizando energia.

— Eu agradeço, princesa. - Axel apoiou o queixo sobre a cabeça dela, ainda focado no pôr-do-Sol no horizonte, que assistia antes da garota aparecer. Era quase um ritual, sentar naquele tronco para poder observar o pôr-do-Sol que pintava os céus e as ilhas de vermelho e rosa, como se estivessem sangrando as cores mais bonitas enquanto o a luz do dia morria e deixava a escuridão da noite nascer. - Apesar de eu odiar a ideia de comprar roupas com você, eu aceito.

— Hey! Não me faça parecer superficial, ok?

— E você também se tornou alguém assim para mim. - Axel abaixou o tom de voz, sem ousar encarar Kairi naquele momento. Ela ofegou. - Provavelmente você entende o quão difícil é deixar alguém entrar no seu coração de novo, principalmente para um cara como eu.

— Sim... - Kairi respondeu, perdida na surpresa. - Mas você também é bem mais forte do que imagina.

Axel olhou para ela surpreso.

— Hey. Eu não quero ouvir isso de uma garota de quinze anos. - e apertou o nariz dela de leve. Kairi exclamou e levou as mãos ao rosto.

— Então não me faça dizer!— Kairi exclamou, protegendo o rosto de futuros ataques. - É sério. - ela respirou fundo, agora afastando as mãos. - Eu tento não falar sobre, para não ser chata ou te afastar, mas eu fico preocupada com você voltando para o passado. Eu vejo você preso em seguir em frente, mas olhando para o passado sempre. E eu fico genuinamente preocupada. E outra, eu tenho quase dezesseis! 

Nesse momento, Kairi se tornou difícil de encarar. Como se tivesse muita luz na figura dela, a ponto de fazer os olhos de Axel queimarem. Então ele voltou a olhar para o pôr-do-Sol, tão diferente do pôr-do-Sol de Twilight Town. Tudo era diferente. O mar límpido e azul, o céu enorme e infinito sobre suas cabeças e se estendendo por todo o horizonte, como se fosse tudo que existisse e não apenas uma barreira para outros mundos, enquanto a brisa fresca os acertava no rosto e refrescava suas peles. 

Axel se lembrou, então, de Roxas dizendo que gostaria de ir à praia.

E ali Axel estava.

— Eu posso ser forte pra seguir, mas no final eu sempre olho para trás, huh. - Axel murmurou para si mesmo, ainda sem voltar a olhar para Kairi. Mas ela ouviu. - Mas isso tem conserto? Eu tenho conserto?

— Como você sempre diz, você precisa se lembrar. O que te faz olhar para trás são as pessoas que você ama, e você precisa se lembrar que elas sentem orgulho de você quando segue em frente e olha para o futuro. Se fizer isso, vai se consertar com o tempo.

Axel ainda sentia pontadas de dor no peito naquela parte. Como facadas.

— Como você pode saber disso, Kairi? - ele questionou incrédulo e com dor, apertando as mãos umas com as outras.

— Eu sei o que a Naminé sente. - Kairi foi objetiva em responder. - E não é difícil deduzir o que o Roxas ou a Xion pensa. Se eu pudesse, Axel, - ela pegou as mãos dele, chamando a sua atenção. - eu abraçaria forte todos vocês até que pudesse remendar todos os seus corações quebrados. Mas, infelizmente, eu só posso abraçar o seu. - ela apertou a mão dele. - Quem sabe, um dia, quando virarmos Keyblade Wielders, a gente não encontra a Naminé e o Roxas por ai? 

— Isso seria utopia. - Axel praticamente gaguejou, sem condições de sequer se mover naquele momento, como se tivesse levado uma surra por tudo que Kairi dizia, fazia e sentia. Era uma surra boa, mas uma surra em níveis que Axel não sabia lidar. Havia muitos anos que nada do tipo lhe acontecia consigo.

— É um sonho. - Kairi corrigiu. - E todos os sonhos podem se tornar realidade. - ela deu um sorriso grande, digno da alma jovial que tinha. - Enquanto isso não acontece, vamos cuidar de remediar o seu coração, ok? Got it memorized?

Axel não tinha nada a dizer ou fazer além de responder:

— Got it.