Hidden escrita por Invisibleflower


Capítulo 1
Zheng Hui




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— C-Casada?! - A surpresa na voz da editora quase a fez rir. Rapidamente, ela ficou vermelha, tossiu e fez uma expressão constrangida. - D-Desculpe Senhorita Zheng, eu imaginava que você ainda estivesse solteira. 

Hui sorriu com suavidade para a mulher á sua frente. Fan Lin era sua colega de trabalho, e parte da sua equipe responsável pela publicação de seus livros. Baixinha, com um rosto arredondado como o de um esquilo e uma franja longa, ela era uma das pessoas com a melhor capacidade de julgamento crítico que a loira conhecia. 

— Sim, Senhorita Fan. Me casei em agosto, enquanto estava em Chengdu, minha amada terra natal. Lamento muito comparecer hoje sem meu marido.

As duas estavam em uma festa de celebração dos 60 anos da empresa. Uma festa de gala, com direito á presença de escritores, empresários famosos e, claro, empregados com melhor fama e nome. Zheng Hui era uma escritora em ascensão, com dois livros lançados. "O Tigre e o Tao" e "Lótus Afogada". O tema de wu xia* e suas poesias que mesclavam referências orientais e ocidentais tinham feito muito sucesso entre os leitores de língua chinesa, mesmo fora do país. Em menos de um ano, a escritora já tinham visitado Taiwan e Hong Kong para sessões de autógrafos em eventos literários, fora entrevistada em rede nacional e até teve a alegria de receber cartas de figuras importantes elogiando seus trabalhos. Agora, ela estava com um novo projeto e com mais vigor do que nunca. 

Pelo canto de seus olhos negros, Hui pôde perceber que alguns convidados conhecidos tinham prestado atenção na sua conversa. Bebericou o chá que tinha em mãos, indecisa sobre como deveria se sentir naquele momento. "Era o que você tanto queria, não é?", disse sua consciência. Suspirou. Pelo menos agora, as más línguas teriam que procurar uma nova desculpa se quisessem arruinar sua carreira. 

— Mas quem é ele, então? - perguntou Lin. - Você disse uma vez que não estava em um relacionamento. 

— Prefiro não contar muito sobre a minha vida para quem não tenho muita intimidade. - Zheng sabia que aquela mentira iria colar. - Existem muitos que querem a minha infelicidade da mesma forma que um faminto deseja um prato de arroz, Fan-Fan. Meu esposo não é alguém muito conhecido, embora sejamos dois artistas. Espere uma outra festa como esta que eu trago ele aqui. 

O som do tilintar de um garfo em uma taça atraiu a atenção dos presentes. O presidente-chefe da empresa, Lun Wei, estava sentado no centro do salão, e todos ficaram nele. Como de esperado, era um discurso sobre a intenção do momento e honrarias para alguns homens mais velhos. Quando ele terminou de falar, propôs um brinde.

— Á essa empresa inspirada no nosso Grande Mestre, patrono dos pensadores, Kong Fu Zi.

— Á essa empresa inspirada no nosso Grande Mestre, patrono dos pensadores, Kong Fu Zi.- repetiram em coro.

... 

Já era quase meia-noite quando Hui voltou para casa. Ela tinha pegado um táxi, e observou durante o caminho os arranha-céus e as cores vibrantes das luzes LED que vinham das ruas e das pontes. Isso a lembrava de como tinha vindo de um local tão simples, uma garota de uma cidadezinha do interior, e tinha ido atrás de seus sonhos na competitiva e turbulenta Shangai. Vendedores ambulantes enchiam as calçadas vendendo comida e bugigangas. Os bares lotados estavam tocando quase no último volume música pop chinês. Mesmo os mínimos detalhes, Zheng os apreciava. Sempre faria de tudo para permanecer onde chegou. 

Subiu pelo elevador, abriu a porta do apartamento, e tirou os sapatos antes de entrar. A luz da cozinha estava ligada, e ela guardou a bolsa no cabideiro e foi até lá. 

Óbvio que era... Ele. Seu dito cônjuge. Huang Yu. Estava cozinhando algo em uma panela wok, distraído. Zheng sabia o que era aquilo. Pad Thai. Seu primo amava comida tailandesa. Camarão fresco em um pote, pimenta chilli, pedaços cortados de tofu, macarrão de arroz e o resto dos ingredientes jaziam em cima da pia. Ela pigarreou e Yu se virou na sua direção.

— Boa noite, Hui. - cumprimentou-a. - Como foi na festa da sua empresa? 

— Como era de se esperar. Formal. - respondeu. - Você chegou tarde hoje também, não é? 

— Cheguei aqui há vinte minutos atrás. Não deu tempo de comer algo na rua. Me desculpe por usar sua cozinha tão tarde. 

— Não tem problema. - disse ela, começando a guardar as coisas de novo na geladeira. - Meus colegas de trabalho já sabem que não estou mais solteira.

— Reagiram bem?

— Minha editora reagiu com surpresa. Os outros que estavam fofocando sobre mim também, eu aposto. Vão ter outra coisa para falar de mim. Mas você vai ter que ir comigo mais cedo ou mais tarde em um desses eventos enfadonhos. 

— Se não bater com a minha agenda, claro que sim. - ele desligou o fogo e colocou a comida em prato. - Não está com fome? 

— Eu não como frutos do mar também.

— Jura? Vou ter que lembrar disso. Tem sopa de arroz e legumes que preparei hoje de manhã e não quis comer. 

— Eu como com você então. - Hui esquentou a refeição e o casal foi até a sala para a comer. 

Sentados em silêncio perto um do outro, ela ainda se sentia desconfortável. Demoraria para se acostumar a não viver mais sozinha. Ela e Yu tinham uma rotina que permitia que não passassem muito tempo juntos, mas em breve teriam que aparecer mais em público, perante conhecidos e familiares para manter a farsa. 

— Haverá uma exposição sobre a história sino-coreana em breve que meus amigos me indicaram. - disse, após terminar de comer. - Quer ir? 

— Minha amiga Kim que é a responsável. Ela me ameaçou de morte se eu não ir. 

— Entendo muito bem o que é isso. - disse ele, fitando-a.

Yu sorriu. Zheng percebeu que nunca antes tinha visto o primo tão relaxado á ponto de fazer isso de maneira tão natural. Geralmente, ela só o via durante o Ano Novo Chinês, afastado, conversando com outros membros da família. Hui baixou o olhar e pegou os pratos para lavá-los. 

— Deixe a panela wok para mim. - ele interrompeu-a enquanto estava na pia. - Vá dormir, você deve estar cansada. 

Hui assentiu. Ela se dirigiu ao seu quarto, tomou um banho e foi se deitar. 

Yu fez o mesmo. 

Mas eles não dormiram no mesmo quarto.


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Notas finais do capítulo

Glossário de palavras:

Wu xia: Gênero de luta chinês (artes marciais).



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