O equilíbrio perfeito escrita por Ragnar


Capítulo 1
Capítulo 1— O fogo do dragão tudo consome




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Nos vales mais distantes, onde consideravam que além da grande Europa era a queda para o abismo e depois disso a segregação era o fato mais marcante para depois de toda exploração e descobrimento do novo mundo, muitas pessoas sofriam com a separação de raça e social, sendo rebaixadas para menos do que eram pela cor de pele.

Não era novidade para os escravos que seguiam as ruas dos brancos como um olhar desdenhoso, como se estivessem pagando por um crime divino da qual nunca pediram, mas Olivia nunca sequer se importava com tais olhares, mesmo que a grande maioria dos homens brancos a olhassem como nunca olhariam para suas esposas ou amantes, olhavam com o mais nojento dos olhares e quando se aproveitavam, tratavam mulheres como Olivia como sempre foram consideradas, menos que nada.

Arrumar os mantimentos frescos da padaria mais próxima já que os mantimentos demoravam a chegar por conta dos rebeldes, não se apressava e nem mesmo andava devagar para causar alarde e raiva dos patrões. Trajada de forma simples e que de certa eram maltrapilhos, o pior da qual poderia passar seria ser jogada na sarjeta junto com os porcos, mas até mesmo aquele empilho de carne era mais privilegiado que Olivia.

Teria sua satisfação, sairia daquela vida um dia e nunca mais voltaria, morreria para viver um amanhã mais digno, mas não o faria quando sua mãe ainda se mantinha presa aos costumes como ama das crianças e antes foi ama de leite dos pequenos e padrões filhos do patrão.

Adentrou os fundos do casarão, deixando a cesta na mesa e ajudando no que era ordenado pela governanta na cozinha, ajudando tanto com o jantar que seria servido como na arrumação na sala de jantar que seria para visitantes.

Desejava sim colocar um pouco de veneno no vinho, colocar mofo no pão fresco e vê-los engasgar, mesmo que sua moral estivesse no limite, não levantaria a mão pela boa educação que sua mãe lhe deu do berço, esse que não sendo de ouro, era tudo que tinha.

A maldade do lugar que a condicionou como escrava a estava corrompendo. A deixando amarga por um dos filhos do patrão que a encarava de forma nojenta, da patroa que a queria longe por Olívia ser mais bela que suas filhas e sobrinhas, por ser atraente de corpo e rosto, ser educada e mesmo sim, mulata e com traços de um espanhol puro com uma escrava negra.

Mas aquele tormento teve fim e não veio das mãos de Olívia e sim da própria desgraça daquele povo. Do fogo do inferno que comia cada pedaço da grande mansão que trabalhava com sua mãe, a chance de fugir daquele lugar foi sua salvação. Com uma bolsa de pano velha, uma saca de moedas de ouro, um vidreiro com leite de cordeiro e três pães, Olívia não olhou para trás e assim como a pouca minoria daqueles senhores, se viu livre com a ajuda daqueles debaixo.

A floresta poderia não ser o melhor lugar, mas ficaria escondida, se manteria longe e não ousaria abaixar cabeça para senhor nenhum!

Se acomodou melhor quando pareceu chegar em uma caverna e logo supôs que algum bicho perigoso estaria se acomodando, então não perdeu tempo de adentrar, não se intimidou quando o escuro engolia a tudo e adentrou, se escolhendo no próprio escuro para esconder sua existência.

Quando esperou demais, tratou de arrumar as coisas ali para sobreviver, uma tocha para se iluminar e ser usada para se aquecer a noite. Rasgando da própria roupa do corpo, envolvendo um pedaço de galho e usando o conhecimento que aprendeu quando muito nova, mas não fazendo a chama aparecer, apenas foi para o fundo da caverna e esperou, estando certa ao ver homens procurando escravos fugitivos, mas nenhum deles chegou perto da caverna.

Eles apenas a olharam e saíram, proferindo maldições e parecendo com medo do lugar.

Olívia não entendeu de início e seguiu sua vida ali, iria começar ali e partiria quando a chama do momento se apagasse. Mas ela não partiu e aqueles dias ali foram os mais reconfortantes possíveis.

Não adentrou mais a fundo a caverna, também não queria se perder e morrer tão cedo. Como foi tola de não tê-lo feito antes e com a chama que se formou ali, imaginou do porque os homens brancos não terem se aproximado.

Amarrou a bainha do vestido maltrapilho para poder correr, a chama parecia viva e dela, passos ecoavam lá do fundo, não eram humanos e Olívia quase gritou, mas segurou tal terror ao ver a criatura iluminar a tudo pela frente e a incluído nesse meio.

“Quem ousa interromper o meu sono?” Rosnou, ventas saindo de seu nariz e o cheiro de queimado chegando ao nariz “Humano? Saía da minha caverna! Já!” Ameaçou, mas em nenhum momento avançou contra.

“Não!” Respondeu, erguendo o queixo e inflando o peito, o olhar encarando o da outra “Não saio daqui caso isso custe a minha liberdade e acredite, daqui meu corpo não sai e nem se move para onde tem outros de mim”

A sua ousada e brava coragem acabaria a matando, mas não daquela vez. O cenho claramente franzido e o pensar atravessando cada feição de seu rosto, a criatura não pareceu ofendida e pensava, a encarando.

“Irá atrair outros dos seus, é uma servente de toda a vida dos homens e quando fala de liberdade, afirma tal” E andando até Olívia, o ser chegou perto de si e a analisou “Não soa como ameaça e nem ameaçaria uma mosca, mas vejo que tem uma coisa valiosa...”

“Não tenho dinheiro...” Sussurrou, sentindo a outra tão próxima

“Tem estupidez” A corrigiu “Ficara em meus domínios, mas terá que me dar algo em troca...” Contava, terminando de analisa-la e parando na sua frente “Irá caçar meu alimento, animais grandes” Explicava.

“Aprendo rápido, qualquer coisa para não voltar a ser escrava...” Murmurou.

“Ótimo” Sorriu, satisfeita.

E aquele foi o trato de ambas, o alimento pela liberdade. Olívia aprendeu rápido, de fato, usou a teimosia e mãos machucadas para arrumar uma forma de alimentar a fera. A primeira tentativa foi um gato selvagem, usou uma pedra lascada amarrado em uma vareta grande apenas para feri-lo e, por sorte, abate-lo.

Na quarta vez, conseguiu atingi-lo e levar a carne pesada até a caverna. Como não sabia o nome de tal criatura, gritou pela caverna e ela veio, furiosa por ter acordado e curiosa com o que a outra tinha trazido.

“Próxima vez, me chame direito!” Vociferou, zangada.

“Mas eu nem sei seu nome!” Rebateu, cansada e irritada pela demora da caça.

Silêncio, conseguiu calar a fera e a deixou surpresa pela atitude ousada. Não furiosa, mas descrente pela situação e só assim Olivia notou que palavras e como elas saíram de sua boca.

“Satya... Meu nome é Satya” Respondeu, abaixando e pegando o gato selvagem morto, o colocando ombro “Não grite novamente” Declarou.

Os dias passaram de tranquilos e toda vez que Olívia trazia a caça, chamava o nome da criatura em um tom normal e ela logo vinha até si, pegando o alimento e voltando para o fim da caverna. Foi assim por um mês em que a dieta de dela mudou e carne entrou na rotina, sendo o roubo na cidade algo comum.

“Meu nome é Olívia” Contou, sorrindo entusiasmada para Satya e vendo o cenho dela franzido levemente.

Desinteresse puro.

Assar a carne e faze-lo fora da caverna para não incomodar o monstro. A única vez em que Satya a chamou pelo nome foi quando se cansou de ver Olívia comer pelo lado de fora e a convidou para comer com ela, assando a carne de outra forma e arrancando cada osso de forma minuciosa.

Não conseguia notar, mas Satya tinha um olhar diferente com ela naqueles dias... Algo escondido que se nublava em seu olhar amarelo e selvagem, Olívia tinha algo e não escondia, sentia empatia e um vínculo com Satya, algo como uma parceria e se confirmou quando melodiava uma canção de ninar.

Considerou que incomodou Satya ao vê-la sair da sua escuridão, se calando e ela parando no mesmo passo.

“Continue”

E Olívia prosseguiu. Soube que no quinto mês ali, Satya apreciava vê-la cantar.

No oitavo mês, acabou passando mal. Satya a puxou para o fundo da caverna onde haviam tesouros antigos e bens preciosos dos homens através dos tempos. Considerou que aquela dor fosse pela carne de peixe que tinha comido ou algum doce humano da qual perdeu o costume de apreciar e dessas teorias, Satya não gostou de nenhuma.

“Se eu morrer, quero morrer livre... Quero morrer aqui...” Sussurrou e Satya a calou, repousando um dedo em seus lábios.

Aquele ardor que queimava no peito de Satya e a reclusão de algo dentro dela lutava, temia a resposta, mas não a cura. Buscou em sua aparência mais primitiva um meio de arranjar uma cura para o mal estar de Olívia, se transformando em um dragão e voltando apenas quando obteve o que queria.

Um frasco pequeno e azul.

Mas a felicidade e satisfação durou pouco ao sentir, em meio ao verão, um frio dentro da caverna da qual viveu séculos. Olívia estava quente, mas seu peito não mexia. Tinha chegado tarde e mesmo assim, derramou o conteúdo do frasco na boca de Olívia, esperando um resultado que não viria e de tão poucos segundos, o respirar veio.

Dele, o calor humano e aquele sorriso voltaram para a visão de Satya.

Do sangue do dragão que tudo consumia, o sangue de Satya era um dos ingredientes, dando assim parte de sua imortalidade para Olívia.


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