UMA CRIANÇA COM SEU OLHAR

            Há quanto anos eles seguiram rumos diferentes? Dez? Uma década que, para Angel, mais parecia a eternidade. Eles seguiram caminhos separados no momento em que ele deixou Sunnydale, e ainda assim, não conseguia parar de pensar nela: Buffy. Seu amor de uma vida inteira, os amantes destinados, mas que nunca conseguiram ficar juntos. E por quê? Por causa de sua maldição.

            Angel não era um homem comum. Há muito havia deixado de ser homem. Era um vampiro sanguinário, que depois de séculos de crueldade, foi amaldiçoado com uma alma. Sua penitencia era vagar pela eternidade, sofrendo pela dor que causou aos outros. Até que ela surgiu.

            Buffy era uma garota de 16 anos quando se conheceram. Uma menina, ainda assim, com um dever enorme. Ela era a caça-vampiros. Que sina triste a dele. Apaixonar-se por aquela a quem deveria odiar. Aquela a quem caçava sua espécie. Por obra do destino, Buffy também o amava, e em seu aniversario de 17 anos, ela trouxe de volta o terrível Angelus. Quando sua alma foi restaurada, eles ainda tentaram, porém ambos sabiam que jamais ficariam juntos, ao menos não naquela época.

            Então, surge uma esperança, a profecia Shanshu. Angel agarrou-se aquilo, sua esperança de tornar-se humano novamente e ter a possibilidade de viver com o amor da sua vida. Mas não foi fácil, e ninguém disse que o seria. Angel lutou, fez amigos e inimigos ao longo do caminho. Perdeu pessoas importantes, e ganhou outras.

            Ele chegou muito perto de desistir, mas então, um dia, um milagre! Após a mais terrível de suas batalhas, ele finalmente recebeu sua recompensa. Ele enfim era humano. Angel levou alguns meses para descobrir se a humanidade era uma bênção ou uma maldição. No fim, ele decidiu que sua nova vida era o que ele queria que fosse.

            Com pouco mais de dois anos e meio desde a última vez que se falaram, Angel ainda relutou alguns meses, mas com a ajuda de seus amigos, decidiu que era a tão esperada hora de rever Buffy. Ele não contou a ela que se tornou humano, nem disse que iria vê-la. Seria uma surpresa. Como uma jogada de poker, seria all in. Ou tudo, ou nada.

            E lá estava ele...

*****

            ─Estou indo! ─Buffy gritou do outro corredor, enquanto a campainha tocou algumas vezes. “Quem seria àquela hora?”, perguntou-se enquanto corria para atender.

            Abriu a porta e teve que piscar algumas vezes. Ela não sabia se era um sonho, ou se era real, mas parado em sua porta, não ninguém menos que...

            ─Angel! ─Sorriu.

            ─Buffy... ─Angel deu-lhe um meio sorriso, ainda um tanto envergonhado por estar ali.

            Buffy o observou de cima a baixo. Os cabelos de Angel estavam perfeitamente alinhados, com nenhum fio fora do lugar. Tinha um buquê de flores amarelas nas mãos. Usava calça de alfaiataria e camisa. Seu perfume tomou conta dela assim que abriu a porta. Angel estava tão incrível quanto Buffy se lembrava.

E ela? Buffy sabia que envelhecera alguns anos, afinal o tempo passa para todos os mortais. Pior que a idade, eram seus trajes. Estava metida em um pijama de flanela, os cabelos despenteados e sem nenhuma maquiagem. Dando-se conta de seu estado, ela apressou-se em fechar a porta, diante de um Angel muito surpreso.

Ela correu para o quarto, abriu seu guarda-roupa e pegou seu melhor vestido preto. Vestiu-se com pressa, e com a mesma rapidez com que se trocou, arrumou os cabelos e passou um batom. Era o melhor que conseguiriam em tão pouco tempo, contudo era melhor do que estava antes.

Voltou para a sala e abriu a porta, porém Angel não se encontrava mais lá. Buffy saiu correndo de seu apartamento, apenas empurrando a porta atrás de si, e correu para fora. Desceu os poucos lances de escada com sua ainda agilidade de caçadora, e correu para a rua. Fora de seu prédio, ela viu a figura de Angel do outro lado da rua, afastando-se cada vez mais.

─Angel! ─Ela gritou e correu para ele. Angel parou ao gritarem seu nome, e tudo que viu foi Buffy correndo para ele, antes da loira se jogar em seus braços. Como agora era humano, e não tinha a mesma força que antes, não conseguiu segurá-la.

Os dois caíram no chão, com Buffy sobre ele. A loira começou seu pedido de desculpas, mas então sentiu o calor de sua pele. Encostou o ouvido em seu peito, e para sua surpresa, havia batimentos cardíacos ali dentro. Não precisava de palavras para entender, e assim ela riu. Riu muito, emocionada e surpresa.

Depositou um beijo em seus lábios, e ela não se importaria de ficarem juntos ali, exceto que estavam na rua, e os pedestres os encarava como se fossem bêbados. Buffy se levantou, e pegando a mão de Angel, o guiou para seu apartamento.

*****

Buffy não queria ser madura. Não quando, depois de tanto tempo e tantos desencontros, eles enfim poderiam estar juntos. Não naquela noite, onde seus sonhos com Angel se tornavam reais. Ele era humano e estava ali para ela. Que as perguntas e suas respostas ficassem para amanhã. Ela sabia que Angel tinha muito a contar, e ela também, mas não naquela noite. Aquela noite foi feita para os amantes destinados estarem juntos.

De mãos dadas, voltaram para o apartamento. Eles entraram e Buffy fechou a porta atrás de si. Angel jogou o casaco em qualquer lugar pelo chão, e voltou a beijá-la quando sentiu uma terceira presença junto deles. Parou, e ambos se voltaram para o corredor.

Uma menina de uns seis anos os observava com curiosidade. Ela tinha os cabelos loiros como os de Buffy, os mesmo olhos verdes, e vestia um pijama rosa, segurando um porco de pelúcia também rosa. Angel observou calado como Buffy foi até a menina e pegou-a em seus braços. Deu-lhe um meio sorriso sem jeito e disse:

─Angel, esta é Iris. ─Fez uma pausa. ─Minha filha...

*****

─Hora de dormir, querida. ─Buffy disse a Iris.

Angel conseguia ouvi-las, parado no corredor. A menina perguntava sobre ele, e Buffy dava perguntas vagas, dizendo que era muito tarde para conversas. Pouco depois a menina voltou dormir e a loira saiu do quarto, fechando a porta arás de si. Encarou Angel, que a interrogava silenciosamente com o olhar.

─Acho que devo explicações.

─Acha? ─Retrucou. ─Quando pretendia me contar que tinha uma filha? E o pai dela?

─Está tarde, Angel. ─Ela soou verdadeiramente cansada. ─Deixe para amanhã.

Angel não tinha outra alternativa a não ser concordar. Como a noite entre eles havia se desfeito, acabou dormindo no sofá. Era até confortável, considerando que já dormira em lugares piores. Acomodou-se no sofá, mas sua mente estava lotada demais para conseguir dormir. Soltou um suspiro pesado e fechou os olhos.

*****

O sol batia em seu rosto quando acordou. As cortinas estavam abertas, e a luz corria livre pela casa. Ainda tinha seus receios em relação à luz do sol, mas o medo de voltar a ser vampiro era cada vez mais distante. Quando abriu os olhos, viu Iris de pé a sua frente, observando-o com olhos curiosos. Deu um sorriso envergonhado para a menina.

─Oi, Iris, não é mesmo?

─Você é um amigo da mamãe?

Angel assentiu, sentando-se no sofá. Esfregou o sono do rosto, para em seguida esticar os músculos doloridos. Estava ficando velho, pensou.

─Iris... ─A voz de Buffy veio de outro cômodo. ─Venha comer. Você ainda tem que ir para a escola.

─Mas... ─A menina resmungou e fez biquinho, no entanto, correu para a cozinha, onde sua mãe deveria estar.

Angel ficou de pé, e devagar andou até elas. Iris estava sentada enquanto Buffy lhe servia panquecas. Buffy sorriu.

─Senta com a gente. Todo mundo acordou um pouco tarde hoje.

Buffy agia como se fosse mais um dia normal em sua rotina. Angel relutou em obedecer, contudo, o olhar de Buffy o convenceu de vez. Sentou-se ao lado de Iris e os três tomaram café da manhã, com Iris enchendo-o com as perguntas de uma criança. Meia hora depois Iris foi para a escolinha, restando os dois adultos no apartamento.

Angel e Buffy sentaram-se de frente um ao outro no sofá. Buffy segurou-lhe as mãos, enquanto Angel permanecia calado, esperando Buffy falar. A loira soltou um suspiro pesado.

─Eu salvei o pai de Iris de alguns vampiros. Eu me sentia sozinha, e então começamos a sair. Seu nome era James. Um mês depois bati em sua porta para dizer que estava grávida. Embora sua família não aceitasse, James me apoiou em tudo. Pensávamos até em nos casar...

Ela fez uma pausa, e Angel secou uma lágrima solitária que teimava em escorrer por seu rosto.

─Onde ele está?

─James sofreu um acidente de moto. Ele se foi dois dias antes de Iris vir ao mundo. Sua família nunca gostou de mim, então eles nem sequer olharam para Iris.

─Alguém sabe sobre Iris?

─Apenas Dawn e Willow.

─Por que nunca me contou?

─Depois de tantos anos, não poderia correr para você. Eu tinha que me virar sozinha. Hoje sei que fui covarde por esconder Iris. Agora é tarde.

─Nunca é tarde. Eu vim procurá-la com a esperança de que ficássemos juntos e não pretendo ir embora.

Buffy riu, em meio algumas outras lagrimas que teimavam em cair, então Angel a abraçou apertado. Ela estava em casa.

─Você vai ficar? Com a gente?

─Sempre. ─Era uma promessa que ele ficaria mais que feliz em cumprir. Depois de tantos anos, estava verdadeiramente feliz, e nada atrapalharia sua felicidade.

*****

Iris chegou da escola e o amigo de sua mãe ainda estava lá. Buffy chamou-a para um canto, como tinha algumas coisas a dizer. Ela e Angel ficariam juntos, mas sabiam que teriam que ir devagar.

─Iris, você sabe que Angel é um amigo da mamãe. Ele vai ficar alguns dias na cidade, então você vai vê-lo muito aqui. Então, eu estive pensando que talvez quisesse conhecê-lo melhor. O que acha de nós três irmos ao parque no domingo?...

Angel sorriu enquanto observava a cena entre mãe e filha. Estava feliz, pois tinha tudo que sempre quis. Era humano, tinha Buffy e agora uma família. Ele amava Buffy, e amaria a filha dela como se fosse sua. Talvez no futuro tivessem seus próprios filhos, mas no momento, era muito mais do que poderia desejar.