Free Fallin' escrita por MrsSong


Capítulo 7
6. Rododendro


Notas iniciais do capítulo

Comecei a escrever. Perdi. Aí eu decidi não escrever e a cena não saía da cabeça. Oh well, pau na máquina.



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Rododendro

Perigo. Atenção.

Ele lia em um dos bancos da praça. O início da noite mostrando os não-naturais porém comuns tons de rosa e lilás do céu de São Paulo. O ar era péssimo, mas as cores eram bonitas, concluiu.

— Quem vê pensa que é tão culto e refinado. - ouviu a voz dela. Quando não era ela? Durante anos supôs que ela seria uma memória de infância, a menina bonita que nunca saberia que era, mas que ele passaria anos sem pensar nela.

Ele tinha certeza de que era capaz de esquecer de si mesmo antes de esquecer de Giane. Mesmo que - você sabe - jamais admitisse para ela o que admitia quando acordava no meio da noite perseguido por memórias que tentava suprimir.

Giane entregue em sua cama, sufocando os sons de prazer como quem não queria demonstrar o quanto nesse aspecto eram bons um para o outro. O quanto enquanto dois animais, funcionavam... O problema vinha quando saíam das quatro paredes de seu quarto de infância.

— Eu fui muito bem criado, fique você sabendo. - começou e a encarou de soslaio. - Já você poderia usar umas aulas de etiqueta, maloqueira.

— Tosco. - ela disse em tom brincalhão e sentou ao seu lado, pegando o livro de suas mãos. Correu os dedos pela lombada com uma delicadeza que quase o fez cair no buraco de minhoca de suas memórias primitivas.

Giane não era tão frágil assim em plena luz do dia. Alguma coisa não estava certa.

— Desembucha, maloqueira. - exigiu e ela o encarou por alguns segundos como se elaborasse a negativa que ele refutaria e começariam os jogos acusatórios.

Por um milagre, ela simplesmente suspirou.

— Eu me diverti na sessão de fotos. - disse simplesmente. Uma meia verdade, mas uma que ele gostou de ter ouvido.

Se fosse sincero consigo mesmo temeu pela segurança de Giane. Apesar de saber que ela sabia se cuidar, também tinha consciência de quão tóxica pode ser a indústria que ele a convenceu a se juntar.

— Bom ouvir que às vezes eu dou uma dentro. - ele disse tentando decifrar qual era o problema dela pelo corpo: notou que estava usando um short em vez de seus macacões usuais e estranhou um pouco, mas Giane ainda vestia uma camiseta com as mangas arrancadas inúmeras vezes maior que ela, talvez sua talvez de Bento. Ele nunca sabia quando e onde Giane ia roubar uma roupa sua, mas ao longo dos anos perdeu mais camisetas e moletons para a garota do que era capaz de contar. 

— Às vezes. - ela admitiu com um sorriso tímido. Então corou e cruzou as pernas. Fazia tanto tempo que não as via tão expostas que ele teve que controlar um comentário debochado sobre ela finalmente ter se tornado mulher.

— Tem mais coisa nisso. - afirmou e ela encobriu o rosto com o cabelo, como uma barreira de proteção. O que quer que fosse era mais complicado do que ela ter se divertido.

— O fotógrafo, Caio, ele me convidou para sair e... - ela não conseguiu completar a linha de raciocínio pois ele já estava de pé.

— Aquele filhinho de papai metido a artista te assediou? Eu vou pegar a câmera dele e enfiar tão fundo... - foi sua vez de não conseguir completar o que quer fosse a ameaça, pois Giane se levantara e o segurava pelo rosto.

Os olhos em fúria como se em uma supernova. O magnetismo dos olhares era quase insuportável.

— Ele não me assediou, criatura! - as bochechas vermelhas, a Giane amazona que ele tanto admirava. - E. Eu. Não. Preciso. De. Alguém. Que. Me. Defenda.

Ele estava em transe por ela.

— Eu sei, mas não significa que eu não queira! - ele rosnou e segurou o rosto dela e Giane soltou um suspiro. - Entende de uma vez que eu me importo com você, mulher! Eu morro e mato por você, Giane!

Os olhos arregalados dela iam o assombrar para sempre.

— Eu disse que te namorava! Eu disse que não queria sair com ele porque eu te namorava! - ela admitiu num sussurro. - Eu não sei porquê. Eu deveria ter aceitado o convite do Caio... Eu...

— Não.

Um em transe pelo outro. O desejo estampado a certeza de que mais um passo metafórico.

— Giane? Fabinho? - a voz de Bento estourou a bolha deles, que se afastaram com certa hesitação. - Gente, estou interrompendo alguma coisa.

— O quê? Ah, não. - Fabinho disse segurando Giane pelo braço discretamente. Ela não fugiria dessa vez. Ela seria dele.

— Eu quero te apresentar alguém, Fabinho. - Bento começou e os dois seguiram o amigo. Franziu a testa ao ver a mão de Fabinho repousando na cintura de Giane, mas optou para conversar de homem para homem com o amigo.

Talvez Fabinho tenha encontrado alguém em Giane. Bento segurou a risada de imaginar a explosão que seria o relacionamento daqueles dois. Se bem que de um jeito torto eles se complementavam, quando pensava nisso.

Os dois melhores amigos juntos... Fazia e não fazia sentido. E, talvez, sair junto com Malu.

Double date com Giane e Fabinho.

Se aproximaram do Cantaí e subitamente Fabinho sentiu a mão de Giane agarrar seu pulso. Foi então que ele soube: estava prestes a conhecer a meia-irmã.

— Giane... - sussurrou e ela assentiu. A mulher que caminhava na direção deles era Malu Campana.

E é claro que ela era um ser que parecia iluminado como Bento. Principalmente quando tudo que ele queria era odiá-la.

— Fabinho, eu quero te apresentar a amiga que te falei. - Bento sorria empolgado com a possibilidade de apresentar a nova amiga ao quase-irmão. - Malu, esse é o Fabinho.

— Muito prazer. - Fabinho disse com o tom mais neutro que pôde. Malu lhe sorria suavemente e abriu ainda mais o sorriso ao ver os dedos de Giane entrelaçados com os do rapaz.

— O prazer é todo meu. - ela disse.

Fabinho não tinha cantado jocosamente a mulher por mais atraente que ela fosse e isso supreendeu o melhor amigo. Talvez seu interesse em Giane fosse real.

— Eu queria que vocês se conhecessem antes de irmos ajudar na reforma da Toca e... - Fabinho se perdeu durante o discurso sobre trabalho voluntário de Bento, depois perguntaria para Giane. Estava procurando detalhes no rosto de Malu que fossem parecidos com o próprio rosto. Uma pinta que fosse, o cheio de sorrir...

Sentiu cotovelos se chocando contra suas costelas e viu a expressão séria de Giane, mas antes que pudesse revidar Malu soltou uma bomba:

— Meu pai se dispôs a dar algumas câmeras e ensinar as crianças maiores a filmar e editar vídeos e eu queria muito que elas filmassem as experiências da Toca e criar um canal que elas possam produzir... Claro tudo com permissão dos pais.

A palavra PAI sufocou Fabinho. Ele não estava pronto para encontrar Plínio Campana. Queria fugir, queria pegar a mãe e correr para as montanhas, queria pegar a mãe e Giane e nunca mais voltar.

O dedos de Giane começaram a fazer movimentos suaves em sua palma. Ela parecia tão tensa quanto ele.

— Fabinho, a Irene me disse que poderia ensinar ballet para as crianças e eu nem contei para você ainda Malu...

— Quando falou com a minha mãe? - Fabinho perguntou subitamente.

— Hoje? Ela estava voltando do estúdio e passou na Acácia atrás da Giane... - Bento abriu um sorriso que dizia mais do que queria dizer. - Onde você esteve falando nisso? Saiu correndo da Acácia hoje.

— Ela foi fazer um teste de modelo. - Fabinho disse rapidamente. - A Sílvia viu a maloqueira e achou que ela daria um excelente antes numa propaganda de antes e depois.

— Você, Giane? Modelo? - Bento perguntou confuso, mas não queria que a amiga interpretasse que não era bonita o suficiente. Giane era linda, mas não era o tipo de garota que gostava das frescuras de modelo.

— Ah, é fácil. Você sorri e eles fazem o resto. - Giane deu de ombros contendo a sensação de julgamento. Só Fabinho tinha lhe dito que ela conseguiria e sabia que seria a piada da Casa Verde.

— É e ela ganha uma grana com isso. Que mal tem? - apoiou Fabinho. - E se ela sair muito esquisita, a gente arruma depois.

— Foi você que meteu ela nisso, né? - Bento perguntou temendo que o melhor amigo estivesse manipulando Giane para benefício próprio. Ele não faria isso, faria?

— Ah, claro. O que quer que eu diga para essa daí, ela vai fazer o extremo oposto. - Fabinho revirou os olhos. - A menos que eu peça pra me matar, aí ela vai que vai.

— Me respeite, Bento. Você acha mesmo que um Fraldinha ia me pôr num esquema que eu não quisesse estar? - Giane perguntou revirando os olhos.

 A conversa entre os amigos era divertida para Malu, mas ela não podia deixar de sentir que alguma coisa estava estranha. Malu encarava Fabinho sem entender como alguém que não lhe atraía fisicamente, era tão interessante de olhar. Alguma coisa nele parecia chamá-la e ela não conseguia mais conter a curiosidade:

— Fabinho, já nos encontramos? O seu rosto é tão familiar...

— Talvez na Class Mídia? Ele trabalha lá. - sugeriu Bento e Malu pareceu considerar.

— Acho que não. Eu não frequento a agência.

— Rede social? - sugeriu Giane rapidamente. - Vai ver ele estava no fundo de alguma foto que algum amigo seu postou?

— Será? - Malu franziu o nariz.

— Eu tenho uma dessas caras bem comuns. - Fabinho sorriu amarelo.

A conversa voltou para assuntos da ONG.

x

Malu entrou no apartamento do pai, pois não aguentaria uma noite em casa. Não essa noite. Ela sentia que precisava estar naquele apartamento.

Caminhando pelo corredor do imóvel, pareceu notar uma foto de seu pai com Hector Babenco quando Plínio estava no início de carreira. Nunca tinha reparado na fotografia mas naquela noite ela lhe chamava.

Encarando de volta estava alguém que se parecia muito com o rapaz que acabou de conhecer. Fabinho era a cara de seu pai!

O mundo era engraçado assim, supôs.

Irene. A mãe de Fabinho se chamava Irene.

Será? Não era possível! Ou será que era?

x

— Quais suas intenções com a Giane? - Bento perguntou a Fabinho quando os dois estavam sozinhos.

— Como assim? - fingiu não entender. - Ela é sua amiga, cara. Eu só quero viver em paz.

— Fabinho, faz um tempo que eu te vejo pra cima e pra baixo de segredinho com ela. Você sabe que ela é inocente. - Bento alertou. - Ela merece mais que o seu tipo favorito de relacionamento.

Fabinho riu.

— Cara, se ela não está incomodada, você não deveria estar. - antes que o melhor amigo falasse alguma coisa ele continuou. - Primeiro que ela ia odiar essa conversa pelo simples motivo que essa conversa implica que ela não sabe se defender. Segundo que você deveria parar de ver ela como uma menina. Ela já é mulher e tem um tempo.

Estranhamente, Fabinho tinha razão.

— Só não magoe ela. - pediu.

Fabinho não quis dizer que talvez quem acabaria magoado seria ele. Giane partiria seu coração em milhões de pedaços e ele deixaria. De novo e de novo.


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Notas finais do capítulo

É isso. Espero que tenham gostado.



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