Acordo Perfeito escrita por BCarolAS, cecimaria


Capítulo 4
Capítulo 3




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O que a estranha descompensada disse a Darcy o atingiu, mesmo que ele se negasse a admitir. Naquela madrugada ele não conseguiu dormir direito. Levantou várias vezes para checar se Victória ainda estava na cama. Em determinado momento ele começou a olhar o quarto. O papel de parede estava gasto. Era o mesmo de quando ela morava lá, antes do divórcio, e havia carneirinhos por toda a parede. Ele se sentou na poltrona e a observou dormir. Odiava acreditar que estava sendo um péssimo pai. E ao mesmo tempo não sabia o que fazer para mudar isso.

Quando Darcy desceu para tomar café-da-manhã, Victória já estava sentada à mesa e espalhava seus ovos mexidos no prato, sem realmente comer nada. Quando ele se sentou, ela se voltou a ele:

—O senhor vai me bater? - Seus olhos azuis brilhavam de medo e Darcy ficou assustado.

—Bater? De onde você tirou isso?

—Quando eu aprontava a mamãe me batia. Ou me trancava no quarto sem comida por um dia. Vou ficar de castigo, então?

—Sem comida? Brianna te batia? - Darcy passou as duas mãos pelo cabelo. - Como eu nunca soube disso antes?

—Ela me dizia que se eu contasse para alguém seria pior. -  Ele apoiou a cabeça na mesa. Depois, se levantou e foi até a cadeira da filha, e se ajoelhou.

—Perdão. Me perdoe por não ter estado lá para você. Me perdoe por ter deixado a vida separar a gente. Me perdoe por deixar você acreditar que eu não lhe amo, porque, Vicky, não há nada no mundo que eu ame mais. Acha que consegue me perdoar?

—Sim, papai. - Ela balançou a cabeça e então Darcy a abraçou. Aquilo foi estranho para os dois, mas Darcy achou que ele poderia se acostumar.

—Eu quero fazer um acordo com você: eu prometo não mandar você para lugar nenhum que você não queira, e você promete que não vai mais fugir. O que acha?

—Então o senhor não vai me mandar para a Suíça?

—Eu nunca sequer cogitei isso. Era uma ideia da Susana - Ele falou se sentando. - Mas não fique chateada com ela, Susana só quis ajudar. E eu preciso encontrar uma preceptora para você.

—Eu posso estudar sozinha, eu já fazia isso. A mamãe só me ensinava coisa de moda mesmo.

—Sua mãe não te ensinou lições?

—Não.

—Francês, português? Matemática, geografia? - Ela balançou a cabeça negativamente. - Meu Deus. Eu irei contratar alguém o mais rápido possível.

—Eu posso dizer se não gostar? - Victória questionou.

—É claro que sim.

E aquela, foi, sem sombra de dúvidas, a primeira conversa honesta que teve com a sua filha e também a primeira vez desde que ela chegou que ele viu algum progresso. Victória começou a comer seus ovos e em um determinado momento, sorriu para Darcy. Ele respirou um pouco aliviado. Iria no escritório hoje promover o Clarkson. Dedicaria esse ano da sua vida a se reconectar com a filha.

Mas antes de sair de casa, ele recebeu um telefonema dizendo que um velho amigo se encontrava na cidade. Depois de passar no escritório e deixar Clarkson com metade das suas atribuições, Darcy foi até o restaurante onde Camilo o esperava.

—Darcy, meu amigo! Como é bom te ver!

—Camilo! Que bons ventos os trazem a Londres?

—Negócios, negócios… Estamos começando uma nova marca de café. Grãos especiais, para uma clientela exigente. - Eles se sentaram e Camilo continuou enquanto olhava o cardápio.- E onde melhor do que Londres para encontrar essa clientela? Então creio que estarei indo e vindo bastante a partir de agora. O que é um infortúnio!

—Posso saber por que passar um tempo aqui em Londres com seu velho amigo é algo tão ruim assim?

—Nada contra Londres e meu velho amigo! - Ele riu. - O problema é quem eu estou deixando em São Paulo.

—E quem você está deixando em São Paulo?

—O nome dela é Jane, futura senhora Camilo Bittencourt. - Darcy deu uma risada ao observar os olhos sonhadores de Camilo. - É Darcy, eu fui fisgado. Jane é a moça mais bela, sensível e delicada que eu já conheci. Ela é honesta e tudo nela é bonito, os olhos, a forma como ela vê a vida…

—Acho que o cupido realmente te acertou.

—Você não faz ideia! Já não consigo me lembrar como era vida antes dela. Mas chega de falar sobre mim! O que anda acontecendo na sua vida agora?

—Bom, eu também estou num novo relacionamento. Uma brasileira.

—Ah é mesmo? - Camilo se debruçou um pouco sobre a mesa. - Me conte tudo. Você está apaixonado? Consegue escutar os sinos tocando? Como ela é?

—Eu gosto bastante da Susana, mas acho que nada que faria Camilo Bittencourt achar digno dos cinemas.

—Darcy… Achei que você tinha aprendido sua lição com Brianna.

—Camilo, você é um romântico. Eu sou prático. Susana é uma mulher interessante e uma boa companheira. Nos damos muito bem. Além do mais, eu tenho outras prioridades na minha vida agora.

—Maior que encontrar um grande amor?

—Reconquistar o amor de minha filha. Victória está morando comigo agora.

—E o que aconteceu com Brianna? E por que reconquistar? Vocês sempre se deram tão bem!

—Brianna foi embora com um americano e deixou Victória em Pemberley, sem sequer me telefonar. Deixou um bilhete. E nos últimos anos eu fui um pai bastante ausente. Você acredita que ontem a Victória fugiu de casa?

—Meu Deus, Darcy! Mas ela está bem?

—Sim, uma estranha a encontrou e a convenceu a voltar para casa. E o pior de tudo, eu tive que escutar um sermão da moça! Mulherzinha desaforada. Gritou comigo na minha casa, me disse que era um péssimo pai e ainda me xingou. E ainda disse a Victória que se eu não me comportasse voltaria lá para gritar comigo novamente. - Darcy deu gole na sua bebida. Só de lembrar da discussão da noite anterior já sentia o sangue ferver.

—Mas ela era bonita? - Camilo levantou a sobrancelha.

—Uma encrenqueira, isso sim! Do tipo que a gente precisa ficar bem longe. - Camilo levantou ainda mais a sobrancelha.

—Darcy?

—Belíssima. Como jamais vi igual. - Foi a vez de Camilo gargalhar.

—Acho que nunca tinha visto uma mulher te desestabilizar assim. Você devia ter pego o endereço dela. Convidado para um jantar.

—Você já está romantizando tudo. Parece Charlotte.

—E por falar nela, por onde anda Charlie?

—Paris. Estudando administração, economia… E não sei mais o que. Toda vez que nos falamos ela está começando uma nova disciplina.

—Desse jeito eu vou contratar ela assim que sair da faculdade. Minha mãe adora mulheres de negócios.

—Nem pense nisso. Charlotte vai assumir a empresa da família e eu vou voltar para o campo. Não roube minha presidente. - Os dois amigos continuaram conversando e rindo até às duas da tarde, quando Darcy tinha uma entrevista com uma candidata a preceptora para Victória.

 

Elisabeta voltava de uma entrevista de emprego em um restaurante fino em Chelsea. Estava feliz, pois tinha conseguido um emprego como garçonete. O dinheiro era curto, mas pelo menos não seria despejada. Começaria amanhã. Chegou em casa e encontrou Ludmilla sentada na janela, fumando um cigarrete.

—Está muito frio para você estar na janela, não acha? - Ela perguntou a Ludmilla. A amiga apagou o cigarro e fechou a janela.

—Desculpe. Tive um péssimo dia.

—O que aconteceu, Lud?

—Para começar recebi um telegrama do meu pai exigindo que voltasse para casa, pois precisava me casar, ter um lugar na sociedade, blablablá. Porém, ele me fez uma proposta tentadora: assumir a vice-presidência da fábrica de tecidos. O que me levou a segunda parte ruim do meu dia. O Januário recusou meu pedido de casamento.

—Você pediu o Janu em casamento??

—E ele disse não, dá para acreditar? Ele disse que eu estava querendo me casar pelos motivos errados. Mas chega de falar sobre mim! Ontem a senhorita chegou eu já estava dormindo! Isso não é típico de Elisabeta Benedito. Então vamos, me conte tudo. Onde estava? E o mais importante: com quem estava? - Elisa riu.

—O nome dela era Victória. - E quando Ludmila levantou as sobrancelhas em surpresa, Elisabeta gargalhou. - Não devia ter mais de 9 anos de idade e tinha fugido de casa. Então eu a convenci a voltar, a deixei em casa e disse umas coisinhas para o arrogante do pai dela.

—Elisa, como assim? Não entendi nada.

Então Elisabeta contou sobre seu encontro com a pequena Victória, o que a menina havia contado sobre o pai e então sua discussão com o pai dela.

—E ainda nem te disse o pior. Você acredita que ele quis me pagar para ir embora, quando eu comecei a discutir com ele? Conheço bem o tipinho. Daqueles que ficam de terno em casa até tarde da noite. Se esconde atrás de uma bela mesa de escritório e dá carteiradas por aí.

—Calma, Elisa. Você não acha que está dando importância demais para um caso pequeno? Você nem os conhece.

—Eu sei, eu sei. Mas não pude evitar. Você deveria ter visto a tristeza da menina. Os olhinhos dela. E o pai. O que tem de tamanho tem de arrogância. - Ela bufou e resmungou. - Senhor Williamson. Pois eu mandei ele enfiar o dinheiro dele…

—Williamson? Lorde Williamson? Ou o Conde Williamson? Onde você disse que era mesmo a casa dele?

—Kensington Palace Gardens. - Ludmilla gargalhou.

—Pois saiba que você mandou o Conde de Pemberley enfiar o dinheiro nos fundilhos. Ah meu Deus, Elisa! Só você mesmo.

—Você o conhece?

—Todo mundo o conhece! Você não lembra do escândalo do Duque de Hampshire? Que a princesa e a esposa pegaram ele na cama com a amante?

—Acho que sim. Uns dois anos atrás, não é?

—Pois bem, menina! A amante era a Lady Williamson, esposa do filho do Conde. Mas se eu não me engano o velho Conde de Pemberley faleceu tem pouco tempo, o que torna o filho dele, o novo Conde, que deve ter sido com quem você discutiu.

—Isso faz sentido. Victória me disse que os pais eram separados. Pobre garota.

—O que eu quero saber é se ele é tão bonito quanto falam. É um homem recluso. Não costuma frequentar as altas rodas, apesar do status.

—Ele é apresentável. - Elisabeta levantou e foi até a cozinha se preparar um chá.

—Poxa. Tinha ouvido das minhas amigas que ele era um partidão. Alto, moreno, olhos azuis…

—Verdes.

—Perdão?

—Os olhos dele são verdes. - Elisabeta corrigiu. - E se eu não soubesse que ele era um péssimo pai  e se ele tivesse se mantido de boca fechada, talvez eu considerasse bonitinho.

—Bonitinho? - Ludmilla foi até a Elisa

—É. Bonitinho. Mas tenho outra notícia: consegui um emprego!

Elisabeta encerrou o assunto sobre a família do conde, mas isso não foi o suficiente para mantê-lo longe dos seus sonhos. Alguns eram pesadelos onde eles se estapeavam na discussão. Em outros eles apenas jantavam com a Victória. Mas os olhos dele a perseguiram por todas as noites desde então.

 

***

Passada duas semanas e 5 preceptoras, Darcy já estava cogitando ele mesmo ensinar Victoria. Das candidatas, três se demitiram pois disseram a ele que sua filha é:

a) Indiciplinada, segundo a Senhorita Carry Parker.

b) Questionadora demais das regras sociais, segundo a senhora Martha Smith.

c) Rebelde e sarcástica, segundo a senhorita Lily White.

Não eram qualidades aceitáveis para uma pequena dama. Já as outras duas que Darcy precisou demitir foram porque:

a) Ele flagrou a senhora Emilia Braun “disciplinando” sua filha com uma palmatória.

b) Louise disse que ela sabia mais que a senhorita Mia Evans.

Naquela tarde ele estava sentado em frente a lareira e jogava uma partida de damas com ela.

—O que faremos? - Ele perguntou a filha.

—Eu não posso ir a escola como os filhos da senhora Houston?

—Não é adequado para uma mocinha como você. A menos que…

—Que fosse um colégio interno.

—O que está fora de cogitação.

—Poxa vida! Eu queria estudar. Elisa me disse que para ela viajar o mundo ela só precisou estudar muito e ter coragem. Eu queria ser como ela.

—Elisa…?

—É papai, a moça que me trouxe para casa, que gritou com o senhor. - Ela tinha um sorriso no rosto.

—Ah, aquela moça.

—Sabia que ela é do Brasil que nem a vovó?

—Não, não sabia. - Bom, aquilo explicava o fato dela tê-lo xingado em português. E o sobrenome nada convencional em terras britânicas.

—Pois é. Ela é incrível! Eu quero ser igual a ela quando for adulta! - Victoria ergueu o queixo ao falar de Elisa, um sorriso discreto no rosto e um brilho nos olhos que Darcy não foi capaz de ignorar. A filha estava completamente encantada pela estranha descompassada.

Antes que Darcy pudesse expressar qualquer opinião sobre, a porta principal abriu, trazendo uma lufada de ar frio e uma moça loira sorridente.

—Ouvi dizer que minha sobrinha finalmente voltou para casa!

—TIA CHARLIE! - Victória saiu correndo e se atirou nos braços de Charlotte.

Darcy levantou sorrindo, e também foi até Charlotte.

—Só em Londres para estar essa nevasca toda no início de novembro! - Ela abraçou o irmão. - Olá Darcy!

Charlotte explicou que estaria ali apenas aquele fim de semana, e tinha ido para ver como Victória estava se saindo. E era claro que a primeira coisa que Victoria tinha que contar era de sua pequena aventura algumas semanas atrás. Charlotte olhou para Darcy com uma interrogação no rosto e ele logo se levantou.

—Charlotte, minha irmã, você chegou no momento certo. Eu tenho um jantar com Susana agora a noite. Você pode cuidar de Victória?

— Será um prazer! - Ela abraçou a sobrinha e disse a ela. - Nós nos divertiremos horrores!

Darcy deixou Susana escolher o restaurante. Era um tradicional restaurante francês, muito requisitado pela alta sociedade. Darcy o detestava pois era certeza que encontraria alguém da “nobreza inglesa”, e esse essa um círculo social que ele evitava desde o escândalo de Brianna. Mas Susana gostava exatamente dos mesmos locais, dos mesmo eventos, então, vez ou outra, ele abria uma exceção. Essa era uma dessas vezes. Enquanto eles se encaminhavam para mesa que o metre os guiava, Susana reclamava.

—Olha Darcy, eu nunca neguei ser uma mulher que precisa de atenção. Cuidado, carinho. Sempre deixei bem claro meus gostos e necessidades, e ultimamente sinto que você não vem os cumprindo! Tudo tem sido sobre sua filha. É Victoria para cá, Victoria para lá! E minha necessidades, meus desejos?

—Eu sinto muito, Susana, mas Victoria é minha prioridade no momento.

—E você admite assim, sem peso na consciência? Nós nunca mais passamos algum tempo de qualidade juntos. Bom, você sabe o que eu quero dizer. - Dito isto Susana passou o seu pé embaixo da mesa na perna de Darcy.

—Eu compreendo. Mas minha filha precisa de mim neste momento. Eu só posso pedir que você tenha paciência.

—Até quando Darcy? Até quando eu preciso ter paciência? Quando você será só meu novamente? Se você tivesse me ouvido sobre o colégio na Suíça…

No entanto, uma confusão começou do outro lado do restaurante, que chamou a atenção dos dois. Darcy e Susana se voltaram para o lado oposto de onde eles estavam, e observaram uma garçonete discutir com um cliente. Demorou exato meio minuto para que Darcy reconhecesse a irritada garçonete. Afinal, ela também tinha dito poucas e boas para ele. Então algo o ocorreu. Darcy teve o que acreditou ser a melhor ideia de todas.


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